O Globo
A turma do palácio foi mesquinha com o
vice-presidente Geraldo Alckmin ao forçar o fingimento de que Lula não
precisava transmitir o cargo antes de internar-se no Sírio-Libanês. Palacianos
são assim mesmo, têm horror à ideia de que o monarca seja substituído. Num caso
extremo, basta olhar a lista de indiciados pelo golpe de 2022/2023.
Se Alckmin não precisava assumir, em que
condição ele foi chamado, na segunda-feira, para receber o primeiro-ministro da
Eslováquia?
Os palacianos de 2024 reprisaram um mau filme
do século passado. Era o ocaso da ditadura, e a clique perdeu a parada.
No início da tarde de 18 de setembro de 1981,
o presidente João Baptista Figueiredo estava no Rio e fazia ginástica quando
sentiu-se mal. Uma ambulância levou-o para o Hospital dos Servidores do Estado.
A turma do palácio comandou a operação e ele entrou numa maca, com o rosto
coberto.
Aos 63 anos, Figueiredo estava um caco, mas dissimulava ser um cavalariano atlético. Cardiopata, tinha uma conjuntivite crônica e a coluna vertebral estropiada. O general que chefiava o Serviço Nacional de Informações redigiu uma nota informando que o presidente “sofreu pequena indisposição” e no hospital “constatou-se ligeiro distúrbio cardiovascular”. Tudo mentira, o presidente enfartara.
Indo ao coração do problema, o porta-voz da
Presidência descartou a necessidade de sua substituição temporária. Foi
acompanhado pelo general que ocupava o Ministério da Educação. O
vice-presidente era o paisano Aureliano Chaves, ex-governador de Minas Gerais.
O dia terminou sem que Aureliano fosse
chamado. Pairava sobre o país o temor de que se repetisse a crise de 1969,
quando a clique palaciana escondeu a isquemia do presidente Costa e Silva,
impediu a posse do paisano Pedro Aleixo e colocou no poder uma Junta Militar.
O Brasil escapou dessa crise por obra e graça
do chefe da Casa Civil, professor João Leitão de Abreu. Ele estava em Porto
Alegre, desembarcou no Rio, ouviu os médicos que cuidavam do presidente e
conversou com os ministros militares. Vinte e quatro horas depois da chegada de
Figueiredo ao hospital, foi o então ministro do Exército, general Walter Pires,
quem deu a notícia: Aureliano assumiria a Presidência, pois “isso de
vice-presidente não assumir é uma tradição que tem de ser quebrada.”
A relação de Lula com Alckmin é de cordial
lealdade, mas palácio é palácio. A mesquinharia impediu que se desse uma
demonstração de normalidade. Faltou ao Lula 3.0 um Leitão de Abreu.
Esse gaúcho calado foi um dos personagens que
passaram pela História apagando o próprio rastro. Ex-ministro do Supremo,
chefiou o Gabinete Civil de dois generais. Evitou destrambelhos de Figueiredo,
desossou a candidatura de Paulo Maluf à Presidência, abriu o caminho para a
eleição indireta de Tancredo Neves e voltou a Porto Alegre, para tomar seu
chope e torcer pelo Grêmio.
Lula como paciente
Com seu histórico médico, se Lula fosse um
paciente comum, teria feito a tomografia marcada para sexta-feira, dia 6. Teria
escapado das dores de cabeça que sentiu nos dias seguintes e da emergência da
terça.
Novamente, se Lula fosse um paciente comum,
não entraria em avião por um mês.
O paciente Winston Churchill
Desde o tempo dos faraós, os monarcas não
gostam de más notícias.
O primeiro-ministro inglês Winston Churchill
(1874-1965), um gigante do século XX, teve um AVC em 1949 e o episódio foi
habilmente escondido. Um ano depois, ele não se sentia bem e perguntou ao seu
médico:
“Vou ter outro derrame?”
Sir Charles Watson, que se tornaria Lord
Moran, respondeu, sem dizer muito:
“Você tem espasmos arteriais quando está
muito cansado.”
Churchill encerrou a conversa:
“Você não deve me assustar.”
Em 1953 teve outro derrame, novamente
maquiado. O leão continuou como primeiro-ministro até 1955 e morreu aos 90
anos, dez anos depois.
Gastança
A oposição começou a colecionar casos de
gastos com nepotismos e boquinhas do governo. Para uma administração que
pretende ver aprovado um pacote de gastos, é calcanhar de Aquiles numa
centopeia.
Cinco mulheres de ministros foram nomeadas
para cargos vitalícios em Tribunais de Contas dos Estados. Uma dúzia de maganos
do primeiro e segundo escalões aninharam-se em conselhos. Isso, sem falar no
parque de diversões do patrocínio de eventos e nas viagens internacionais de
ministros monoglotas com escolta de assessores.
Astúcia na jogatina
A denúncia é da senadora Damares Alves
(Republicanos-DF):
Das 101 casas de apostas autorizadas pelo
Ministério da Fazenda, 28 têm a mesma sede e 17 pertencem a sócios de empresas
concorrentes.
A senadora pergunta:
“Isso não chama a atenção dos senhores? Uma
empresa que vai pagar R$ 30 milhões para ter uma autorização não pode pagar R$
1 mil em uma sala? Tem que estar todo mundo numa mesma sala? Não chama a
atenção esse comportamento estranho entre as empresas?”
A senadora tem autoridade para fazer essas
perguntas. Em abril de 2020, na fatídica reunião do Ministério em que o
presidente Jair Bolsonaro fritou o ministro Sergio Moro, o poderoso Paulo
Guedes, da Economia, defendeu a abertura de cassinos para endinheirados. A
ideia era uma flor do orquidário de Bolsonaro, mas Damares, ministra da Mulher
e dos Direitos Humanos, fulminou:
“Pacto com o Diabo!”
A proposta de abertura dos cassinos atolou,
mas o Coisa Ruim enfiou-se na liberação das casas de apostas.
A fraude do cotista
O médico recém-formado Pedro Fellipe Pereira
da Silva Rocha foi condenado pelo TRF-5 a pagar R$ 550 mil à Universidade
Federal de Alagoas (Ufal) por ter fraudado o sistema de cotas, declarando-se
pardo.
Fraudadores dessa bem-sucedida política
social são coisa comum. O que tornou interessante o caso do doutor foi uma das
afirmações de sua defesa:
“Por fim, questiona-se: qual o dano que a
Universidade Federal de Alagoas efetivamente sofreu? Nenhum!”
O sujeito mentiu, conseguiu uma vaga na
faculdade de forma fraudulenta, usa esse tipo de argumento e sairá por aí,
praticando a Medicina.
O tamanho da Bancada da Bala
Por 267 votos contra apenas 85, a Câmara dos
Deputados aprovou um projeto de combate à pedofilia que incluiu uma emenda
prevendo a castração química de pessoas condenadas por abusos sexuais contra
menores. A emenda mal foi discutida e havia sido rejeitada pela relatora,
Delegada Katarina (PSD-SE). O projeto seguiu para o Senado.
A castração química era uma bandeira do então
candidato Jair Bolsonaro, mas não progrediu ao longo do seu governo.
O resultado mostrou o poder de fogo da
bancada da bala e a indolência da bancada governista em matérias que envolvem a
segurança pública.
A incapacitação química de criminosos sem um amplo debate é coisa arriscada. Oliver Wendell Holmes, um dos maiores juristas da Corte Suprema dos Estados Unidos, e baluarte da liberdade de expressão, defendeu em 1927 a esterilização dos incapazes, dizendo que “três gerações de imbecis são o suficiente”.
Tem um deputado do PL que gosta de assediar e ameaçar menores de idade,e tem um certo ex presidente que quando via adolescentes ''pintava um clima''.
ResponderExcluirA coluna de hoje mostra que até a Damares tem razão de vez em quando...
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