sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

Ricos querem sair de fininho do baile do ajuste fiscal - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Conflito distributivo chega às vias de fato com reação de juízes, procuradores, militares

Justiça e Ministério Público passaram a bater em público na tentativa do governo de conter supersalários, parte do pacote Lula-Haddad. No fundo, é mais um movimento de resistência a tantas tentativas de limitar penduricalhos que elevam a despesa com servidores. É mais uma reação à tentativa de limitar gastos com Legislativo, Judiciário e Ministério Público, não apenas na esfera federal, instituições que despendem relativamente mais que seus pares em outros países. É outra manifestação dos mais ricos contra planos de arrumar as contas dos governos. A mesma gente que pede "responsabilidade fiscal" e pimenta nos olhos dos outros.

O conflito distributivo mais e mais chega às vias de fato, pois as contas públicas estão em situação crítica e, de resto, apareceu um governo que, mal ou muito mal, quer fazer o dito ajuste também tirando dinheiros de ricos.

Em junho, estourou de vez a revolta contra os impostos de Fernando HaddadFoi o protesto furioso contra a mexida no PIS/Cofins. Desde o final de 2023, graças em parte a medidas desastradas do governo, havia revolta contra o fim das desonerações (reduções) de impostos sobre a folha de pagamentos e para empresas do setor de eventos, cultura etc. (Perse). O projeto de aumentar imposto vai para o vinagre.

A mexida nos supersalários dos servidores nem vai arrumar grande dinheiro. Ainda assim, é preciso catar qualquer moeda a fim de dar um jeito nas contas. Sem mais receita, não haverá acerto fiscal.

Economistas criticaram a ideia de isentar do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 mensais porque temem buraco ainda maior nas contas do governo. Isto é, seja por erro técnico do projeto tributário do governo, seja por omissão do Congresso, a tributação sobre ricos não compensaria o rombo da isenção. Mas muita gente quer mesmo é apenas derrubar a tributação sobre ricos, um acinte de pequena e injusta.

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Na presente situação, seria necessário cobrar mais dos mais ricos e não isentar ninguém. Em vez de o governo tomar emprestado a juros reais de 7% ao ano a fim de cobrir o déficit, o governo arrecadaria um pouco mais e tomaria emprestado um pouco menos.

Diminuir as isenções de impostos ("gasto tributário") é necessário. Note-se que a arrecadação possível com o corte de desonerações é menor do que diz a conta da Receita e o dinheiro não vai apenas "para o agro" ou "ricos"; além do mais, essas isenções engordaram nos anos petistas. Ainda assim, é urgente. Vai levar tempo para a reforma tributária abater o excesso de favores com impostos. O governo, porém, não consegue cortar nem as isenções marcadas para morrer, por lei. A elite econômica quer sair de fininho do baile do ajuste.

Não haverá conserto sem que se mexa também na despesa da Previdência (INSS), que é 42% do gasto federal e cresce ao ritmo real de 4,1% ao ano mesmo se excluídos gastos com precatórios. Cresce muito mais do que o PIB. A médio prazo, a receita tende a crescer no ritmo do PIB. Logo, a despesa previdenciária vai esmagar as demais, a não ser que a carga tributária cresça sem limite. Lula 3 não quer mexer no reajuste dos benefícios previdenciários.

Governo e esquerda não têm noção do tamanho do problema. Ricos e direita já se animam com a ideia de um ajuste à moda de Javier Milei, motosserra no couro do povo.

É um conchavo social suicida.

 

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