Folha de S. Paulo
Conter a hemorragia só com juros causa danos;
tensão não passa sem acerto fiscal
O Banco Central
prometeu levar a taxa básica de juros, a Selic, a 14,25% até março.
Afora grande milagre, a taxa ficaria nessa altura teratológica até maio, quando
ocorre a terceira decisão a respeito de juros de
2025. Não é impossível que a Selic venha a ser ainda maior até lá, embora por
enquanto o arrocho extra pareça improvável. Pode ser que vá a perto de 15%, a
partir de maio.
O BC colocou um torniquete na sangria da inflação, em particular na pressão que o dólar faz na inflação. A coisa estava perto do descontrole. Se vai estancar a sangria, é a questão. Além do mais, torniquete por muito tempo causa problemas, necroses.
O BC procurou também diminuir o custo da
transição de Roberto
Campos Neto para Gabriel
Galípolo e para uma equipe nomeada majoritariamente por Luiz Inácio
Lula da Silva. Dada a confusão recente, com dólar na
casa dos R$ 6 e juros de um ano galopando para 15% ao ano, o custo da transição
aumentou. Galipolo poderia assumir com uma situação difícil de governar,
piorada por alguma dúvida a respeito do compromisso da nova diretoria com o
cumprimento das metas de inflação. Ao contratar uma alta de juros até bem
entrado 2025, o BC comprou uma espécie de seguro para a transição. Seguros têm
custo, porém.
Por enquanto, não é certo que o preço do
dólar vá parar pela casa dos R$ 6, que a inflação corrente vá ao menos ficar
pelo patamar de 5% ao ano onde praticamente está, que as expectativas
de inflação para 2026 e 2027 vão ficar ao menos abaixo do
limite superior da meta (de 4,5%). Mesmo com esse arrocho de política
monetária, os efeitos sobre expectativas podem demorar a aparecer e são
incertos.
O motivo da sangria não pode ser controlado
pelo BC. Dólar e taxas de juros estão em alta desde abril deste 2024 porque: 1)
se foi a perspectiva de controle do aumento de gasto e, pois, de que a dívida
pública deixe de crescer sem limite; 2) houve dúvida duradoura sobre o que
seria (e será) do ritmo da baixa de juros nos EUA e,
mais importante e recente, do que Donald Trump vai
aprontar nos EUA (o que pode redundar em dólar mais caro etc.).A dúvida maior,
óbvia, é a mesma que se enraizara desde antes dessa reunião de arrocho do BC. O
que o governo vai fazer?
Por ora, na melhor das hipóteses espera-se
que o governo cumpra suas metas fiscais. Ainda assim, a dívida
pública continuará a crescer em ritmo de país em guerra,
epidemia ou colapso financeiro. Sem sinal de que tal cenário mude, mesmo com
uma política que faça efeito daqui a alguns anos, o motivo da sangria
permanece. Quanto mais se aperta o torniquete dos juros, mais danos: dívida
pública crescendo ainda mais rápido e PIB prejudicado.
Com taxas de juro maiores e aumento de gasto
público um pouco menor em 2025, talvez a atividade econômica esfrie. Mas
economia tem crescido além do que se espera por motivos em parte desconhecidos.
De resto, nem sempre taxas de juros altas batem de imediato no emprego (temos
exemplos no Brasil deste século; PIB cresceu bem mesmo 2023 com juros além de
13%).
Suponha-se que o PIB embique para baixo.
Donos do dinheiro especulam até se o governo pisaria no acelerador de despesa
de novo.
Sobre Trump, nada podemos fazer. O que resta
é nos protegermos desse furacão. Por ora, temos apenas um torniquete. Só isso
não vai prestar.
Trump é um furacão mesmo!
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