sexta-feira, 12 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Não se espera alta dos juros

Correio Braziliense

O detalhamento da inflação mostra, de forma clara, que os preços estão sob controle, numa tendência que é favorecida pela própria estabilidade econômica

No mês em que se comemora os 30 anos do Plano Real, como que em uma deferência, a inflação oficial divulgada recuou, com o índice ficando abaixo, inclusive, do que previa o mercado financeiro. É uma boa notícia, principalmente considerando que o índice de preços caiu de 0,46% em maio para 0,21% em junho, mas é como se estar em um carro olhando pelo retrovisor. Essa queda da inflação é pontual e, já no próximo mês, deve refletir a escalada do dólar e o reajuste dos combustíveis. A perspectiva de aumento da inflação em julho e no acumulado de 12 meses não deve ser, no entanto, motivo para que o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), decida por elevar a taxa básica de juros, hoje em 10,5%. 

Fernando Luiz Abrucio - As frentes de defesa da democracia

Valor Econômico

Os autoritários precisam ser deslegitimados em suas propostas de quebra democrática

O medo de perder a democracia marcou a eleição parlamentar francesa. A derrota da extrema direita foi um alívio similar à vitória numa guerra. Essa angústia democrática se espalha por vários países, em maior ou menor grau e de diferentes formas. Não se trata de dizer que o mundo caminha inexoravelmente para a hegemonia autocrática. Mas também não se pode concluir que o momentâneo sucesso francês contra os autoritários é a tendência global mais provável. O que está em jogo é a compreensão das maneiras mais eficazes de proteger o sistema democrático.

A tendência de crescimento dos países democráticos foi a tônica no mundo do final da década de 1970 até o início do século XXI. A consolidação de modelos efetivamente autoritários na Rússia e na Turquia deram início a um novo ciclo, no qual surgiram vários governos autocráticos, inclusive em lugares que tinham passado por transições democráticas alguns anos antes. No entanto, do mesmo modo que essa onda antidemocrática ganhou espaço internacional, diversas nações conseguiram escapar do autoritarismo ou reverter aquilo que a literatura tem chamado de “democratic backsliding”, ou seja, o retrocesso democrático.

Dani Rodrik - Do que a nova esquerda precisa

Valor Econômico

Uma nova esquerda deve enfrentar de frente tanto a nova estrutura da economia quanto o imperativo da produtividade

As recentes eleições na França e no Reino Unido, juntamente com a atual campanha presidencial dos Estados Unidos, refletem os dilemas que os partidos de esquerda enfrentam enquanto tentam criar novas identidades e apresentar alternativas verossímeis à extrema-direita. Foi a extrema-direita quem capitalizou primeiro a reação crescente contra o neoliberalismo e a hiperglobalização após a crise financeira global de 2008. Há uma década, podia-se justificar uma reclamação sobre a “abdicação da esquerda”.

Em sua defesa, os partidos de esquerda estão numa posição melhor hoje. O Partido Trabalhista britânico acabou de vencer de forma esmagadora, encerrando 14 anos de governo conservador. A coalizão de esquerda Nova Frente Popular (NFP) na França tem uma chance muito melhor de impedir a ascensão da extrema-direita do que as forças centristas aliadas ao presidente Emmanuel Macron. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, levou seu país a um território inexplorado com novas políticas industriais e verdes, embora esteja atrás de Donald Trump nas pesquisas.

José de Souza Martins - A vitória do Partido Trabalhista na Inglaterra e o Brasil

Valor Econômico

No Reino Unido, o processo histórico é expressão da conciliação de tradição e modernidade; aqui, não temos a consciência de que o movimento modernizador resulta da unidade dos contrários

As eleições gerais no Reino Unido e a avassaladora vitória do Partido Trabalhista, com ampla derrota do Partido Conservador, após 14 anos no poder, não me permitem resistir à comparação com o que tem acontecido no Brasil. Aqui, as coisas, historicamente, acontecem pelo avesso. Tivemos um presidente que se supunha rei e dono do poder. Entendia que estava lá para mandar, e não para cumprir um mandato e ser mandado pelo povo.

Somos um país capitalista que funciona ao contrário. Aqui, quem lucra além dos bons costumes vê lucro no prejuízo, progresso no atraso. Como naquele país imaginário de Lewis Carroll, em que quanto mais Alice caminha, mais longe fica do seu destino. Um país que anda para trás.

Thiago Prado* - Tarcísio vai para o risco em 2026?

O Globo

Donos e diretores dos principais institutos de pesquisa divergem sobre o melhor caminho para o governador de SP

A melhora nos índices de popularidade nas pesquisas Quaest e Ipec divulgadas nos últimos dias levou o presidente Lula a figurar novamente entre os raros líderes globais que hoje conseguem ter mais de 50% de aprovação popular em seus países, segundo o levantamento mensal da empresa Morning Consult (em junho, apenas Narendra Modi, da Índia, Andrés Manuel López Obrador, do MéxicoJavier Milei, da Argentina, e Viola Amherd, da Suíça, alcançaram o patamar num ranking de 25 chefes de Estado). Mesmo faltando mais de dois anos para a corrida eleitoral de 2026, a principal pergunta que ronda as conversas de quem mexe com política hoje não envolve Lula, mas o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Afinal, ele trocará a, em tese, tranquila reeleição ao Palácio dos Bandeirantes e arriscará uma candidatura ao Planalto? O tema divide donos e diretores dos mais relevantes institutos de pesquisa do Brasil.

— O Tarcísio não tem necessariamente uma escolha a fazer. Se as condições se apresentarem, e ele virar o nome de consenso da direita para substituir Bolsonaro, ficará difícil não ser candidato. Pode parecer medo. Ele será levado, mesmo que não queira — diz Felipe Nunes, da Quaest, um dos autores do livro “Biografia do abismo”, que cunhou a expressão “polarização calcificada” para descrever o cenário político brasileiro desde as eleições de 2022.

Bernardo Mello Franco - Na mira da polícia

O Globo

Cláudio Castro saiu em defesa de PMs após abordagem truculenta em Ipanema

Aconteceu na Rua Prudente de Morais, a poucos metros da Praia de Ipanema. Cinco adolescentes caminhavam na calçada quando uma dupla de policiais se aproximou de armas em punho. Os três negros foram revistados com truculência. Os dois brancos foram poupados do esculacho.

A cena resume o racismo nosso de cada dia, naturalizado por quem não costuma se ver na mira de um revólver. Por uma soma de fatores improváveis, a abordagem virou notícia. As imagens foram flagradas por câmeras de segurança. O relato da mãe de um dos meninos viralizou nas redes sociais. Os três alvos da dura eram estrangeiros e filhos de diplomatas.

Flávia Oliveira - Presos por racismo

O Globo

As prisões são incomuns, mas não inexistentes

A dúvida emergiu da condenação, pela Justiça espanhola, de três torcedores do Valencia por insultos racistas contra Vini Jr., craque do Real Madrid e da seleção brasileira. O trio foi sentenciado a oito meses de prisão e banimento dos estádios por um par de anos, por crime contra a integridade moral com agravante de discriminação racial. Não irão ao cárcere, porque a legislação local permite que penas de até dois anos sejam suspensas, em casos de crimes não violentos, se o juiz acreditar que o réu não voltará a delinquir. A decisão, por inédita, foi celebrada.

Simon Schwartzman - O Plano Real e outros planos

O Estado de S. Paulo

São as mudanças institucionais e de cultura, e não planos com metas ou orçamentos detalhados, que, a longo prazo, podem fazer a diferença

Meio de penetra, também participo da festa dos 30 anos do Real, como responsável que fui, na presidência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por cuidar da credibilidade dos índices de preços da nova moeda. Apesar das turbulências desde então, os resultados principais do Real ainda persistem, como o controle da inflação, o fortalecimento das instituições financeiras e a abertura da economia. Duas explicações principais têm sido oferecidas para seu sucesso: a qualidade técnica dos economistas responsáveis e a liderança política de Fernando Henrique Cardoso, que fez com que o Congresso aprovasse as reformas necessárias para que o projeto ficasse de pé. Contribuiu também o sentimento de urgência criado pela inflação galopante, que facilitou sua aprovação.

Vinicius Torres Freire - O grande deboche do Congresso

Folha de S. Paulo

Sistema político se fecha cada vez mais em si mesmo, irresponsável, e se dá anistia

A repulsiva emenda constitucional da anistia a lambanças de partidos políticos é mais uma pá de cal e de lama na possibilidade de renovação política. É um deboche, um descaramento cínico, que reafirma a tendência de o Congresso se tornar uma espécie de cooperativa ou corporação destinada a preservar feudos, currais políticos, e incrementar as prebendas dos neocoronéis.

As extravagâncias perdulárias dos fundões eleitorais e partidários já revoltam. Há mais, mais importante. Os integrantes da corporação mais e mais tomam o poder sobre as fatias restantes e minguantes do Orçamento, aplicando verbas à matroca e sem responsabilidade alguma sobre a eficiência e a justiça do uso dos recursos ("emendas"). Governam para o curral e para os amigos. Contribuem para a inviabilidade orçamentária do governo federal, que deve chegar em menos de meia dúzia de anos, se não houver reforma fundamental.

Luiz Carlos Azedo - Deputados anistiam multas nas prestações de contas dos partidos

Correio Braziliense

A Transparência Partidária estima que o montante total das multas pode chegar a R$ 23 bilhões

A toque de caixa, a Câmara dos Deputados aprovou, ontem, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (PEC), que perdoa as dívidas tributárias de mais de cinco anos dos partidos políticos e permite o refinanciamento de outras multas aplicadas às legendas. Essas dívidas partidárias são decorrentes de desvios e erros nas prestações de contas dos recursos dos fundos Partidário e Eleitoral, principalmente o não cumprimento de cotas destinadas às mulheres e aos negros e pardos.

A PEC será enviada ao Senado. A mudança deve entrar em vigor nas eleições deste ano. R$ 4,9 bilhões para financiamento de campanha em 2024 serão distribuídos entre 29 partidos, conforme estabelecido pela Lei Eleitoral. O PL é o partido que vai receber a maior fatia — 18% do fundo —, seguido do PT (13%) e do União Brasil (11%). A PEC é uma autoanistia por má gestão de recursos públicos e subfinanciamento de candidaturas de mulheres, negros e pardos.

Bruno Boghossian - O guichê especial da Abin

Folha de S. Paulo

Arapongas de Ramagem atuaram para praticar ou acobertar principais crimes atribuídos ao grupo do ex-presidente

Abin do governo Jair Bolsonaro tinha um guichê especial a serviço de quase todos os crimes atribuídos ao grupo do então presidente. Numa estrutura que não era nada "paralela", servidores que davam expediente na agência ajudavam a turma a intimidar autoridades, fugir de investigações e atacar as eleições.

O trabalho de espionagem apareceu primeiro no varejo da delinquência política do governo. As apurações mostraram que um núcleo da Abin monitorava desafetos, como o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Segundo o relatório da PF, a ordem neste caso partiu do chefe da agência, Alexandre Ramagem.

Hélio Schwartsman - Maleabilidade ideológica

Folha de S. Paulo

Mesmo assim continuamos a usá-los porque permitem que falemos às nossas tribos

Os conceitos de esquerda e direita ainda fazem sentido? Cada vez menos.

Os termos surgiram na França pré-revolucionária, quando tinham precisão geográfica. Os representantes da nobreza e do clero, que defendiam as teses mais conservadoras, se sentavam à direita do rei; os da burguesia, com ideias de mudança, ficavam à esquerda. Era possível, portanto, prever as posições de um deputado apenas sabendo onde ele se sentava. De lá para cá, o mundo se tornou mais complexo e mais confuso.

André Roncaglia - A bancada BBB saiu ganhando na reforma tributária

Folha de S. Paulo

Indústria e serviços sofisticados pagarão mais impostos para que agronegócio e indústria de armas prosperem

Nesta quarta-feira (10/7), terminou a votação da regulamentação da reforma tributária na Câmara dos Deputados. A criação de um IVA (Imposto sobre Valor Adicionado) alinha o Brasil às melhores práticas internacionais com mais de três décadas de atraso. A não-cumulatividade e a simplificações do sistema tributário aumentarão a produtividade e desonerarão as exportações.

reforma substitui cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ISS e ICMS) pela CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), destinada à União, e pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), para estados e municípios. A alíquota final será repartida entre os dois novos tributos para manter os níveis de arrecadação de cada esfera de governo. Seu valor depende, contudo, da quantidade de exceções à nova regra.

Ruy Castro - Caindo no real

Folha de S. Paulo

Pelo dinheiro pré-real, 20 qualquer coisa não queria dizer nada. Só pensávamos em milhares

O festival de reportagens sobre os 30 anos do Plano Real não apenas fez justiça a uma medida que tirou o Brasil do buraco como serviu para que eu dirimisse uma dúvida que me perseguia desde a sua implantação. No dia em que ele foi lançado, uma nota de 1 real comprava 1 litro de leite, 1 kg de açúcar ou uma dúzia de ovos. Com 50 centavos de real, pagava-se uma passagem de ônibus ou 1 litro de gasolina. Era formidável. Nos governos anteriores, a inflação era tal que um deles lançou uma moeda de 500 mil cruzeiros. Como era possível que 500 mil unidades da moeda nacional coubessem num bolsinho?