O Globo
A sociedade brasileira demonstrou o apego ao
regime democrático. E atribuo isso à resposta institucional firme
Há dois anos testemunhamos uma série de
acontecimentos que constará dos anais da sociedade brasileira como um dos mais
sombrios momentos da nossa democracia.
Acompanhamos atônitos o intolerável!
Extremistas inconformados com o resultado eleitoral levando adiante um ataque
contra as instituições republicanas, atentando, mais precisamente, contra a
democracia brasileira.
Não foram meras investidas às sedes dos
Poderes da República. Na verdade, foi uma tentativa violenta de tomar o poder,
em afronta, afinal, ao Estado de Direito.
Também não foram acontecimentos isolados, mas o que aconteceu no 8 de Janeiro de 2023 foi o clímax de eventos decorrentes do processo de radicalização política, alimentado pela disseminação de notícias falsas, desinformação e discursos de ódio, que se apresentaram como ameaças reais à nossa estabilidade democrática.
Ora, se não tivemos tempo de maturar com o
episódio da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos, em janeiro de 2021,
passado um biênio do malfadado ataque às sedes dos Poderes, tiramos algumas
preciosas lições. E é isto o que proponho: aprender com os erros passados e
revalorar o princípio democrático, considerando, sob inspiração de Simon Sebag,
que a única maneira de compreender o passado é sacudindo o presente, assim como
que o melhor remédio para os crimes do passado é lançar o máximo de luzes sobre
eles.
A pesquisa quantitativa “A democracia que
temos e a democracia que queremos” — promovida pelo Observatório da Democracia
da Advocacia-Geral da União e pelo Ipespe — mostrou que seis em cada dez
brasileiros (59%) acreditam que a democracia passou por um risco de golpe. Já
69% dos entrevistados responderam que as fake news nas redes sociais atrapalham
e confundem os eleitores.
Com efeito, ao rejeitar amplamente os atos
golpistas, a sociedade brasileira demonstrou o apego ao regime democrático. E
atribuo isso à resposta institucional firme, eficaz e adequada.
Centenas de envolvidos, organizadores e
financiadores foram identificados, processados e têm sido responsabilizados,
evidenciando um duro recado àqueles que flertam com rupturas antidemocráticas
em nossa sociedade.
Ademais, restou demonstrada a necessidade de
protegermos eficientemente as instituições democráticas pátrias. Se os
acontecimentos patentearam a sua resiliência, deixaram a importante lição de
que a democracia exige atenção constante, participação cidadã ativa e
compromisso coletivo com os valores republicanos. Requer cuidado constante e
cultivo permanente.
Bem por isso, devemos lembrar o ocorrido para
construirmos caminhos que previnam a repetição de tragédias semelhantes.
Somente assim o Brasil poderá seguir nos trilhos, robustecendo a sua democracia
e garantindo que a vontade do povo prevaleça ante levantes ditatoriais.
A lição que fomos forçados a aprender é que a
libertação do indivíduo da ameaça do arbítrio depende da guarda constante e
zelosa da ordem constitucional, figurando como primeira linha de defesa das
ações e políticas públicas do governo legitimamente eleito.
Mas não só. Acredito que o princípio
democrático deverá ter como referência a plena fruição dos direitos
fundamentais, nas diversas gerações e dimensões, de modo que sejam uma
realidade cotidiana, presente nas escolhas diárias de cada cidadão brasileiro.
Não é por outra razão que a democracia, ainda
que pontuada por crises, tem se mostrado eficiente e resiliente, capaz de
encontrar novos caminhos que justificam não apenas sua continuidade, mas o seu
aprofundamento.
E é por isso que o 8 de Janeiro de 2023
jamais pode ser esquecido, mas lembrado sob um olhar prospectivo, para que não
nos prendamos aos graves erros do passado e avancemos no aperfeiçoamento das
instituições republicanas e da democracia.
*Jorge Messias é advogado-geral da União
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