Valor Econômico
Argentina e India, com Milei e Modi amigos de Trump, não foram poupados do choque tarifário
O Brasil, Austrália e Reino Unido, as maiores
economias com as quais os EUA tem superávit comercial, vão sofrer menos do
tarifaço sobre as importações anunciado por Donald Trump.
No entanto, apesar de o Brasil ter sido atingido somente com a alíquota mínima de 10% do imposto de importação, ainda assim haverá um impacto grande nas exportações brasileiras. O especialista em comércio Rodrigo Pupo nota que, considerando as exportações brasileiras aos EUA em 2024 (US$ 40,4 bilhões), os importadores americanos teriam que pagar assim mais de US$ 4 bilhões de tarifas de importação apenas para produtos brasileiros.
Mas há oportunidade, diz ele, apontando uma
vantagem competitiva para o Brasil nas exportações aos EUA em alguns setores na
medida em que outros países terão imposto de importação muito maior que o
Brasil, como Vietnã (46%), China (34%), África do Sul (30%), Índia (26%),
Coreia do Sul (25%) e União Europeia (20%).
Após o anúncio de Trump, houve dúvidas, em
diferentes setores no Brasil, sobre o tamanho real da tarifa adicional. É que a
aplicação das tarifas será assim: primeiro, tem a 'tarifa básica', uma taxa
universal de 10% sobre todos os produtos importados, independentemente da
origem, entrando em vigor imediatamente em 5 de abril, afetando cerca de US$
3,3 trilhões em importações anuais dos EUA com base em dados de 2023.
E segundo, as 'tarifas recíprocas' adicionais
de cada país, alvejando 60 nações, calculadas para refletir metade das tarifas
ou barreiras comerciais (incluindo medidas não tarifárias, como subsídios ou
manipulação de moeda) que esses países impõem às exportações dos EUA. Essas
taxas maiores, variando de 20% a 49%, começam em 9 de abril e podem ser
ajustadas por meio de negociação.
Mas o comunicado divulgado pelo USTR, mais
tarde, observou:' O presidente Trump imporá uma tarifa recíproca
individualizada mais alta aos países com os quais os Estados Unidos têm os
maiores déficits comerciais. Todos os outros países continuarão sujeitos à
linha de base tarifária original de 10%'.
O Brasil não tem superavit com os EUA e não
aparece no anexo listando os 60 países que sofrem as tarifas recíprocas
adicionais. Após dúvidas, a conclusão a que chegaram setores brasileiros foi de
que o país será penalizado mesmo só com alíquota de 10% adicional à tarifa
atual aplicada.
No primeiro carregamento que entrar nos EUA,
a partir do sábado, os exportadores vão constatar o tamanho exato da taxação.
Quando esteve em Washington na semana
passada, em contatos com negociadores americanos, o secretário de Assuntos
Economicos do Itamaraty, Mauricio Lyrio, usou o argumento dos ‘três limpos’, em
referência ao Brasil, Austrália e Reino Unido.
A diplomacia brasileira usou as próprias
cifras americanas para argumentar contra as tarifas sobre os produtos
nacionais. Basta ver que o superavit no comércio de mercadorias dos EUA com o
Brasil, quando calculado por Washington, é enormemente maior do que as
estatísticas brasileiras. Segundo o USTR, o saldo americano foi de US$ 7,4
bilhões, comparado a apenas US$ 283,8 milhões contabilizado pelo Brasil. A
diferença tem a ver com metodologia diferente pelos países.
Além disso, o Brasil colocou na mesa outra
cifra que o governo Trump trata com certo desdém, que é o gigantesco superavit
que os americanos tem no comércio internacional de serviços. Somente com o
Brasil, o saldo americano foi acima de US$ 21 bilhões no ano passado nesse
setor, que inclui serviços financeiro, viagens, serviços de engenharia,
advogados e médico, entre outros . No total, os EUA venderam quase US$ 30
bilhões a mais (mercadorias e serviços) do que compraram em geral do Brasil em
2024.
No Brics também, o Brasil sai como o menos
afetado, comparado à reciprocidade tarifária aplicada por Trump à China, de
34%, à Indonésia de 32%, à África do Sul de 30%, à India de 26%.
Ao mesmo tempo, ser ‘muito amigo’ de Trump
não ajudou a Argentina de Javier Milei e a India de Narendra Modi. Os
argentinos foram taxados também com 10%, como o Brasil, e a India ainda mais,
em 26%.
O caso da Argentina e da India vinha gerando
expectativa, pela proximidade de seus dirigentes com Trump.
A Argentina também acumulou deficit de US$
2,1 bilhões no comércio de mercadorias com os EUA no ano passado. Mas, para
quem continua falando em acordo comercial com os EUA, o pacote dito de
reciprocidade de Trump pode ser um ‘reality check’ para Milei. O governo Trump
quer exportar, levar indústrias de volta para seu território e não exatamente
abrir o mercado.
No primeiro mandato de Trump, Jair Bolsonaro
também tentou usar a dita amizade íntima entre ambos, mas nunca conseguiu obter
a retirada de sobretaxa ou aumentar cotas para o aço brasileiro, apesar da
insistencia de seu governo em Washington.
Na América do Sul, o Paraguai, Uruguai e
Bolívia, os outros sócios do Mercosul, também sofrerão tarifa adicional de 10%,
assim como Colombia, Peru e Chile.
A continuação das discussões entre Washington
e Brasília na semana que vem foi confirmada em conversa hoje entre o ministro
das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e o chefe do USTR, Jamieson Greer.
Diante da obsessão de Trump com a tarifa de
importação do etanol no Brasil, de 18% comparado a 2,5% aplicado pelos EUA, não
se pode excluir uma barganha envolvendo essa taxa com um eventual
restabelecimento das cotas para o aço semiacabado brasileiro.
Como a coluna publicou no sábado, o aço é um
dos mais afetados, com a tarifa adicional recentemente de 25%. Mas fica
excluido do pacote de tarifa recíproca.
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