É preciso dar um basta à sanha arrecadatória
O Globo
Setor produtivo faz bem em exigir suspensão
de aumento do IOF. Governo deve cortar gastos e emendas
É oportuno e certeiro o manifesto de entidades empresariais defendendo o cancelamento do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), definido pelo governo federal na semana passada. Incapaz de promover um programa confiável de controle de gastos, pressionado pelo crescimento das despesas — em especial as previdenciárias, vinculadas ao crescimento real do salário mínimo — e cioso de despejar recursos públicos em seus projetos de estimação, mais uma vez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva partiu para cima do bolso do contribuinte. Para tapar o rombo que se vislumbra no Orçamento, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aumentou o IOF em várias operações, inclusive empréstimos e câmbio. Tal medida inibe a tomada de crédito, desestimula investimentos e inevitavelmente acarretará repasse aos preços, com impacto na inflação. Diante da taxa de juros já nas alturas — 14,75% —, o setor produtivo decidiu dar um basta à sanha arrecadatória.
O manifesto descreve de forma didática o
impacto da alta do IOF. “Com as medidas, os custos das empresas e dos negócios
com operações de crédito, câmbio e seguros serão elevados em R$ 19,5 bilhões
apenas no que resta do ano de 2025”, afirma o documento. “Para 2026, o aumento
de custo chega a R$ 39 bilhões.” A maior tributação sobre o câmbio tem impacto
negativo na importação de insumos e máquinas imprescindíveis ao bom
funcionamento e à modernização do parque produtivo. A medida também aumenta “a
carga tributária do IOF sobre empréstimos para empresas em mais de 110% ao
ano”, dizem os empresários.
Assinam o manifesto representantes de
praticamente todos os setores que geram riqueza no país: Confederação Nacional
da Indústria (CNI), Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA),
Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) e Organização das
Cooperativas do Brasil (OCB). As entidades exigem que o Congresso invalide o
decreto do Executivo. Seria mesmo uma medida acertada. Como menciona o
manifesto, o Brasil tem uma das cargas tributárias mais altas do mundo. Se o
governo precisa de recursos para cumprir a meta fiscal com que se comprometeu,
o caminho recomendável é outro: um programa robusto de corte de gastos, tanto
do Executivo quanto do Legislativo — a começar pelas bilionárias emendas
parlamentares.
Pressionado, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB),
prometeu discutir a revogação do decreto em reunião com líderes partidários. O
país, disse ele, “não precisa de mais imposto”. Nos próximos dias, ficará claro
se Motta convocará mesmo uma votação para descartar o aumento descabido do IOF.
Os parlamentares deveriam aproveitar e anunciar cortes nas emendas
parlamentares, uma aberração no Orçamento da União sem paralelo no mundo.
Juntas, as duas medidas mostrariam um Congresso comprometido com o equilíbrio
das contas
públicas e o crescimento sustentado da economia.
Os signatários do manifesto lembram que o
Brasil precisa de “um ambiente melhor para crescer — e isso se faz com aumento
de arrecadação baseado no crescimento da economia, não com mais impostos”.
Concluem o texto com um chamado: “É hora de respeitar o contribuinte”. Na
verdade, já passou da hora.
Epidemia de gripe reflete ineficácia do
programa de vacinação
O Globo
Com a cobertura em 32%, ante meta de 90%,
hospitais estão lotados de pacientes com vírus influenza
Ninguém pode se dizer surpreso com o aumento
dos casos de gripe.
A despeito de surtos acontecerem todo ano, mais uma vez as emergências estão
lotadas, e leitos de hospitais ocupados por pacientes que não precisariam estar
ali. A vacina, distribuída gratuitamente na rede pública, protege justamente
contra hospitalizações e mortes. Mas a adesão lamentavelmente anda baixa. O
índice de cobertura está em torno de 32%, bem inferior à meta de 90%
estabelecida pelo Ministério
da Saúde.
No início de maio, o boletim Infogripe, da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz),
já alertava sobre o aumento de internações por influenza, vírus causador da
gripe, em diferentes regiões. No decorrer do mês, o quadro piorou. O boletim
mais recente informa que o vírus está em franca expansão na maior parte do
país. A situação deveria preocupar autoridades de saúde.
Números levantados pelo GLOBO mostram que,
entre março e abril, os casos de síndrome respiratória aguda grave provocados
por influenza subiram 373% no Amazonas, 335% em Santa Catarina, 311% em São
Paulo, 277% no Paraná, 218% no Rio Grande do Sul e 141% na Bahia. Só na cidade
do Rio de Janeiro, as internações por influenza cresceram 270%.
A campanha nacional de vacinação contra a
gripe começou em abril, tendo como alvo crianças pequenas, gestantes e idosos.
Até agora não decolou, apesar de estar em curso nas regiões Nordeste,
Centro-Oeste, Sul e Sudeste. O Ministério da Saúde afirma ter distribuído mais
de 51,3 milhões de doses aos estados. Mas elas acabam encalhando nos postos por
falta de interesse, erros de gestão, dificuldades de acesso, horários
inadequados, desinformação ou hesitação da população.
Não faz sentido sobrecarregar
prontos-socorros e hospitais com uma doença cuja gravidade é evitada com a
vacina. O país tem enormes carências na saúde. A falta de leitos é problema
recorrente. Além disso, é um contrassenso o governo gastar dinheiro em vacinas
que muitas vezes vão para o lixo por perderem a validade, para depois gastar
ainda mais dinheiro com internações evitáveis no SUS.
A situação merece atenção de todos — governo
federal, estados, prefeituras e sociedade. O Ministério da Saúde precisa
ampliar as campanhas educativas, enfatizando a importância da vacinação para os
grupos prioritários e combatendo a desinformação disseminada nas redes sociais.
Os municípios, responsáveis pela aplicação das doses, precisam ter atitude mais
ativa, levando as vacinas a pontos de grande circulação, como estações de
metrô, trem e terminais de ônibus, ou usando postos móveis. É compreensível que,
em meio a tantas outras doenças, os cidadãos minimizem a influenza. Mas ela
pode causar sofrimento, levar ao hospital e até matar. E prevenir não custa
nada.
Congresso tende a rejeitar mais um aumento de
imposto
Valor Econômico
Qualquer aumento de impostos feito por um
governo que se recusa a cortar gastos seria mal-recebido de qualquer forma, mas
a alta do IOF trouxe perplexidade a todos, das lideranças do Congresso às
instituições financeiras
A reação de empresários, investidores e
Congresso ao aumento do IOF que o governo pretende fazer foi muito ruim, e a
medida depende agora do jogo de forças político no Legislativo, desfavorável ao
Planalto. O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB),
deu resposta ríspida e demagógica ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao
dizer: “O Brasil não precisa de mais imposto. Precisa de menos desperdício”.
Haddad havia dito que a responsabilidade fiscal é uma tarefa de todos, insinuando
erroneamente que elevar a carga de IOF é a única saída possível - excluiu a
opção de cortar mais gastos, a solução simples e correta.
Tecnicamente, o aumento do IOF pode fechar
parte de uma conta que admite um rombo de R$ 31 bilhões nas contas públicas ao
fim de 2025. Mas o imposto é ruim e afeta muitos setores econômicos. Os
primeiros a se livrarem da medida foram os investidores brasileiros que remetem
recursos ao exterior, individualmente ou via fundos, que seriam sobretaxados de
uma hora para outra, tornando nulas todas as opções de aplicação com base nas
hipóteses de rentabilidade feitas antes da medida. Os bancos têm incentivado a
diversificação dos investimentos rumo ao exterior, e o IOF maior foi uma
surpresa inesperada e bastante desagradável.
Mais importante do que a fatia privilegiada
de investidores que podem aplicar no exterior, que foram poupadas pelo recuo da
Fazenda, é a das empresas que produzem no país, de qualquer porte, que terão de
pagar o IOF maior. Depois de aumentar muito a taxa de juros, a carga extra de
imposto acentuará o custo do crédito interno, tornando proibitiva a contratação
de empréstimos para empresas que ainda têm condições de fazê-lo e piorando as
condições das que precisam de alguma forma rolar suas dívidas diante de condições
adversas.
Entre os analistas, há certo consenso de que
a Fazenda usou um péssimo imposto para arrecadar. Sua finalidade não é essa,
para começar. Com fins regulatórios, ele foi desenhado para permitir respostas
rápidas a mudanças abruptas na economia, especialmente na área cambial. O IOF
foi usado logo após a derrubada pelo Congresso da CPMF, outro imposto sobre
transações financeiras com o qual ele guarda semelhança.
Investidores revoltados logo o associaram à
contenção de desvalorizações cambiais e regulação de fluxos de capitais. A
inadequação do instrumento para obter o fim desejado - arrecadar mais - foi tão
grande que levantou suspeitas sobre intenções inexistentes. Durante a
maxidesvalorização do fim de 2024, provocada pelo erro crasso de anunciar ao
mesmo tempo medidas para controlar gastos e diminuir receitas, o governo Lula
pode ter pensado em utilizar o IOF para deter a perda de valor do real -
instrumento considerado válido pelo Fundo Monetário Internacional para deter a
saída de divisas do país. Não é o caso, porém. Há reservas sólidas e saídas
moderadas de dólares, enquanto aumentam as chances de ingressos de moedas
fortes no país com a guerra cambial de Trump.
Qualquer aumento de impostos feito por um
governo que se recusa a cortar gastos seria mal-recebido de qualquer forma. O
aumento do IOF, no entanto, trouxe perplexidade a todos, das lideranças do
Congresso às instituições financeiras. Com receio de vazamentos, a Fazenda
deixou de fazer articulações necessárias, em primeiro lugar com as lideranças
políticas, que poderiam indicar ao governo a temperatura do Congresso para
aceitar carga tributária maior - em princípio, nenhuma. Depois, ao que parece,
não foram aparadas as arestas com o Banco Central, responsável pelas operações
de câmbio. O BC disse depois que é contrário ao uso do IOF para a finalidade
desejada.
O ministro da Fazenda não contou com
retaguarda no governo. Ele disse que tudo foi discutido com Lula, diretamente,
mas seus desafetos na Casa Civil não deixaram de assinalar o desgaste político
para o presidente, que em tese o teria aprovado. Por fim, restou o Congresso,
onde o governo se equilibra sobre uma base cada vez mais infiel e que já deu
sinais suficientes, em entrevistas dos principais líderes dos partidos de
sustentação, que não seguirão o presidente em sua tentativa de reeleição.
O governo errou ao escolher o aumento da
arrecadação para fechar as contas públicas, embora este tenha sido um método
aprovado pelo Congresso para que ele se efetive. O regime fiscal pressupõe que
as contas públicas só fecharão com aumento de arrecadação, cuja efetivação
deslancha mais gastos, e os parlamentares a aprovaram. A reação contrária do
Congresso agora sugere que a proximidade do calendário eleitoral passa também a
influir cada vez mais em suas decisões. Ao Congresso também não é fácil a escolha
entre a rejeição total ou parcial ao IOF maior. Restam empresas e consumidores
interessados em adquirir dólares como alvos do imposto. Livrar ambos significa
anular os planos do governo e rejeitar o aumento do imposto. A solução não é
ruim e forçará o Planalto a encontrar outras alternativas que não penalizar
mais uma vez o setor produtivo e os contribuintes, para finalmente reduzir seus
gastos.
Se quer evitar alta do IOF, Congresso deve
limitar emendas
Folha de S. Paulo
Há ótimos argumentos contra mais um aumento
de imposto, mas parlamentares precisam cortar parte das despesas que criaram
"O
Executivo não pode gastar sem freio", e "o Estado não gera
riqueza, consome". Foi assim que o presidente da Câmara
dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB),
reagiu ao aumento da carga tributária promovido pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT).
Na semana passada, as autoridades econômicas
projetaram uma expansão da despesa federal, apesar de bloqueios e
contingenciamentos, e decretaram alta do do Imposto sobre Operações Financeiras
(IOF). Motta poderia aproveitar a ocasião para dar consequência prática às
preocupações que externou.
Um bom começo seria liderar um esforço para
limitar o gasto impositivo a ser executado
por meio de emendas parlamentares ao Orçamento —de quase R$ 39 bilhões
neste ano, ante um total previsto de pouco mais de R$ 50 bilhões em despesas
criadas por deputados e senadores.
Essas emendas de pagamento mandatório,
individuais e de bancas estaduais, equivalem a um quarto dos recursos chamados
discricionários do governo, basicamente para custeio e investimento. Com a
expansão insustentável dos pagamentos de salários e aposentadorias promovida
por Lula, as emendas totais deverão responder por quase metade dos gastos
federais livres em 2027.
Desde o anúncio do aumento do IOF, deputados
e senadores de partidos de oposição propõem a votação de decretos legislativos
que cancelem essa ampliação da carga. Há certo ceticismo quanto a tal
possibilidade. Sem a receita extra do imposto, o governo teria de contingenciar
e, no limite, cancelar certas despesas, o que afetaria também verbas de
interesse direto dos parlamentares.
Em vez de se deixar levar pelo menor e mais
mesquinho dos interesses, o Congresso
Nacional faria bem em desta vez inverter expectativas. Ao mesmo tempo
em que tratasse de apagar o canetaço do IOF ou de convencer o governo a
fazê-lo, apresentaria uma contenção do gasto executado por indicação de seus
membros.
Além do montante sem paralelo conhecido nas
principais democracias, a maior parte das emendas parlamentares constitui mais
uma modalidade de despesa obrigatória e indexada à arrecadação, características
em geral incompatíveis com uma boa gestão orçamentária.
O IOF é sem dúvida um imposto daninho, a não
ser quando empregado, com muita moderação, para regular pontualmente fluxos
financeiros. O governo Lula decretou o aumento de alíquotas com fins de
arrecadação, de modo desesperado, porque esgotam-se seus meios de expandir a
receita tributária com apoio político do Legislativo.
Há excelentes argumentos
para se opor ao aumento do tributo e à própria estratégia petista de
buscar a redução do déficit fiscal sem conter a gastança. O Congresso não pode,
porém, fazer dessa questão um mero palanque. Se quer mostrar responsabilidade,
precisa também pôr freio nas despesas que cria.
Restrição à transparência sob Lula é
inaceitável
Folha de S. Paulo
Ministério da Gestão não faz mais que a
obrigação ao desbloquear documentos que somam R$ 600 bilhões em verbas da União
Foi necessária a pressão de entidades de
defesa da transparência durante um ano para que o Ministério da Gestão e
Inovação recuasse de sua decisão nada republicana de bloquear informações sobre
a aplicação de verbas da União.
Em maio de 2024, a pasta restringiu
o acesso na plataforma TransfereGov a mais de 16 milhões de documentos
relativos a contratos firmados desde 2007. Laudos, atas, termos de parceria,
prestação de contas e notas fiscais de convênios com ONGs, empresas e governos
estaduais e municipais só poderiam ser visualizados pelos cidadãos após
solicitação por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), de 2011.
Estima-se que o material envolva mais de R$
600 bilhões. Ainda mais preocupante, parte dele se refere a repasses por
emendas parlamentares do chamado "orçamento secreto", que o Supremo
Tribunal Federal (STF) declarou
inconstitucional em 2022 justamente por falta de transparência.
O Ministério da Gestão alegou que seguiu um
parecer da Advocacia-Geral de União (AGU) sobre a
aplicabilidade da Lei
Geral de Proteção de Dados (LGPD), de 2018 —para resguardar dados que
seriam sensíveis, como nome, CPF, contracheque, RG e e-mail de entes privados.
Trata-se, porém, de interpretação distorcida
da LGPD, como a AGU indicou em nota: "O parecer mencionado em nada impede
que os documentos continuem plenamente acessíveis, auditáveis e publicamente
disponíveis".
O princípio é claro. Quem recebe verba
pública precisa estar sujeito a normas de publicidade.
A LGPD vem sendo usada de forma obtusa.
Segundo relatório do acórdão 506/2025, julgado em março pelo Tribunal de Contas
da União, de 580.236 pedidos analisados de acesso à informação no âmbito da
administração pública federal entre 2019 e 2023, 30,8% foram indevidamente
classificados como restritos, e em vários usou-se a proteção de dados como
justificativa genérica.
Após representação aberta por Ministério
Público e TCU, o Ministério
da Gestão se reuniu com a AGU e decidiu, na sexta-feira (23), dar início à
publicação do material, que tem prazo de 15 dias para ser concluída.
Considerando que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito com discurso de defesa à transparência, marcando diferença em relação a seu antecessor, Jair Bolsonaro (PL), o bloqueio promovido é ainda mais vergonhoso. Espera-se que a pasta e o governo petista busquem respeitar, de fato, as boas práticas de gestão da informação relativa ao uso que se faz do dinheiro do contribuinte.
Flagrante abuso de autoridade
O Estado de S. Paulo
Abertura de inquérito sem lastro contra
Eduardo Bolsonaro é sinal da perigosa guinada das mais altas esferas do
Judiciário para criminalizar a liberdade de expressão e as lides políticas
Atendendo a pedido da Procuradoria-Geral da
República (PGR), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de
Moraes autorizou a abertura de um inquérito policial contra o deputado
licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Segundo o procurador-geral Paulo Gonet, o
parlamentar estaria nos EUA em “enérgica” campanha para que o governo
norte-americano imponha sanções a autoridades brasileiras, entre as quais
Moraes e o próprio Gonet, com o objetivo de “embaraçar o andamento do
julgamento técnico” contra Jair Bolsonaro, além de “perturbar os trabalhos
técnicos que se desenvolvem no Inquérito 4.781”, o famoso inquérito das fake
news, ambos em curso na Corte.
Seria menos preocupante para o País se
estivéssemos apenas, por assim dizer, diante de um erro jurídico e
institucional cometido simultaneamente pela PGR e pelo STF. Trata-se de algo
muito pior do que isso. Tanto o pedido de investigação contra Eduardo Bolsonaro
como a anuência para sua instauração constituem flagrantes casos de abuso de
autoridade, sugestivos da perigosa guinada que as mais altas esferas do
Judiciário brasileiro têm dado para criminalizar o exercício da liberdade de
expressão e interferir indevidamente nas lides políticas.
Como se sabe, Eduardo Bolsonaro, de fato,
partiu para um doce autoexílio nos EUA para desde lá liderar uma campanha
política contra o STF, a PGR e a Polícia Federal (PF), instituições tidas como
algozes de seu pai e aliados, todos réus em ação penal por suspeita de
envolvimento até a medula numa desabrida tentativa de golpe de Estado. Dito
isso, como a própria peça da PGR deixa claro, tudo o que o chamado “03” tem
feito nos EUA não passa disso, de manifestações de cunho político por meio de
postagens nas redes sociais, gravações de vídeos e entrevistas. Ao que consta,
por mais sórdidos e injustos que sejam os termos, isso não é crime.
Mas, de acordo com a constrangedora petição
do parquet – uma das mais vexatórias já subscritas por uma alta
autoridade do Ministério Público Federal –, Eduardo Bolsonaro teria cometido
três crimes: coação no curso do processo (art. 344 do Código Penal), obstrução
de investigação sobre organização criminosa (art. 2.º, § 1.º, da Lei
12.850/2013) e abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L
do Código Penal). Nada menos.
A base fática para essas gravíssimas
imputações é frágil, para não dizer inexistente. O próprio procurador-geral
chega a escrever que “as evidências conduzem à ilação de que a busca por
sanções internacionais a membros do Poder Judiciário visa a interferir sobre o
andamento regular dos procedimentos de ordem criminal, inclusive ação penal, em
curso contra o sr. Jair Bolsonaro e aliados”. Ora, uma investigação policial
que se sustenta em “ilação” tem nome: abuso de autoridade. Em português
cristalino, assim o diz o art. 27 da Lei 13.869/2019: “Requisitar instauração
ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa,
em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de
ilícito funcional ou de infração administrativa – detenção, de 6 (seis) meses a
2 (dois) anos, e multa”.
Ao fim e ao cabo, nenhuma sanção foi imposta
pelo governo dos EUA contra quaisquer das citadas autoridades brasileiras até o
momento. Tampouco está comprovado em que medida a suposta influência de Eduardo
Bolsonaro seria determinante para orientar uma decisão de alto nível do governo
dos EUA. E, ainda que tivesse sido, soberanos são os EUA para sancionar quem
quer que seja, nacional ou estrangeiro, de acordo com o seu ordenamento
jurídico e os princípios que regem a sua política externa.
Digamos que, eventualmente, Alexandre de
Moraes seja proibido de entrar nos EUA ou de movimentar recursos por meio de
instituições financeiras daquele país. De que forma isso comprometeria sua
jurisdição e suas prerrogativas de ministro do STF em território brasileiro?
Mais bem dito: um Estado Democrático de
Direito que colapsa porque uma ou duas autoridades foram sancionadas por nação
estrangeira já foi abolido há muito tempo – e por outras razões. Além disso, é
forçoso dizer que um julgamento “técnico” que sucumbe à verborragia de alguém
como o sr. Eduardo Bolsonaro não vale as folhas dos autos.
Vexame iminente
O Estado de S. Paulo
Ao aumentar IOF para elevar arrecadação e
cumprir regras fiscais, governo toma atribuição do Congresso e arrisca ver a
medida derrubada por parlamentares. Melhor revogar o decreto
A tentativa do ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, de salvar a meta fiscal com base em um decreto presidencial está por um
fio. Depois de recuar do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF)
sobre aplicações de fundos brasileiros no exterior e remessas de pessoas
físicas destinadas a investimentos fora do País, o ministro corre o risco de
ver o Congresso derrubar o restante das propostas que apresentou na
quinta-feira passada e que sobretaxam operações de crédito, câmbio e seguros.
Já há ao menos 19 projetos de decreto
legislativo (PDLs) protocolados na Câmara e no Senado que visam a revogar o
decreto presidencial 12.466, que elevou o IOF sobre essas operações. A maioria
deles foi apresentada por deputados do PL e do Novo, mas também há propostas de
autoria de partidos da base do governo Lula da Silva, como MDB, União Brasil e
Solidariedade.
Tantas iniciativas para derrubá-lo em tão
poucos dias no Congresso refletem o repúdio da sociedade ao aumento da carga
tributária. Sete entidades já pediram ao Congresso para que intervenha no
assunto, entre elas as confederações nacionais da indústria (CNI), do
agronegócio (CNA), do comércio e serviços (CNC), das instituições financeiras
(CNF) e das seguradoras (CNSeg), além da Associação Brasileira das Companhias
Abertas (Abrasca) e da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB).
Em nota conjunta, as entidades argumentam que
a medida deve aumentar o custo dos empréstimos para empresas em mais de 110% ao
ano. Ainda de acordo com as entidades, o decreto vai encarecer a aquisição de
insumos e bens de capital importados para investimentos e ampliar as distorções
entre produtos do mercado financeiro.
De fato, as entidades têm razão. Não é
correto recorrer a um imposto regulatório, como o IOF, para resolver um
problema de arrecadação. Elevar ou reduzir impostos regulatórios é uma
prerrogativa do Executivo para incentivar ou desestimular uma determinada
conduta ou atividade econômica. É por esse motivo que essas mudanças podem ser
feitas por decreto.
O governo pode propor a elevação de outros
tipos de tributo para aumentar a arrecadação, mas cabe ao Legislativo aprovar
ou rejeitar a medida. Na hipótese de que uma proposta como essa fosse aprovada,
seria preciso cumprir a noventena e/ou o princípio da anualidade para que ela
pudesse entrar em vigor.
Mas, como ficou claro na semana passada, o
objetivo da Fazenda ao elevar o IOF é obter R$ 20,5 bilhões neste ano e R$ 41
bilhões em 2026 para, assim, reduzir a necessidade de congelar gastos para
cumprir o limite de despesas e a meta fiscal.
Na prática, portanto, o decreto proposto pela
Fazenda atropelou uma atribuição que pertence ao Congresso, razão pela qual os
projetos de decreto legislativo propostos na Câmara e no Senado se sustentam e
podem, de fato, prosperar.
É raro que um projeto de decreto legislativo
seja pautado em plenário. Na maioria das vezes, trata-se de um protesto isolado
de um deputado ou senador incomodado com uma decisão que afeta seus eleitores.
Mas não é este o caso do decreto em questão.
Por mais diplomático que seja o presidente da
Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), será difícil ignorar esse clamor. O
deputado já indicou que vai submeter o tema ao colégio de líderes da Casa e,
uma vez que a proposta seja pautada, basta que haja maioria simples de votos em
uma sessão com mais da metade dos parlamentares para que ela seja aprovada.
Por meio de suas redes sociais, Motta também
já deixou clara sua posição contrária a medidas que aumentem impostos. “Quem
gasta mais do que arrecada não é vítima, é autor”, afirmou. Foi uma resposta ao
ministro Haddad, que, em entrevista ao jornal O Globo, disse que a
manutenção do arcabouço fiscal “depende muito mais do Congresso” do que do
governo.
É comum que Legislativo e Executivo entrem em
acordo para impedir que o presidente da República veja um de seus atos
derrubado por deputados e senadores. Diante de uma iminente derrota, a melhor
estratégia para o Executivo seria revogar o decreto presidencial por iniciativa
própria para evitar mais um vexame.
Mais uma eleição de mentirinha
O Estado de S. Paulo
Esvaziadas e boicotadas, eleições locais na
Venezuela consolidam Nicolás Maduro
A Venezuela é pequena demais para o ditador
Nicolás Maduro. Os poucos cidadãos que se dispuseram a participar da mais
recente fraude eleitoral no país, domingo passado, para “eleger” governadores e
renovar o Parlamento, puderam “votar” até em candidatos para o governo de
Essequibo, território que pertence à Guiana, mas que Maduro considera parte da
Venezuela.
Essa foi, digamos, a nota pitoresca de uma
votação como outra qualquer na Venezuela chavista: pouco importa em quem os
venezuelanos votam, pois o resultado já é conhecido de antemão. Para surpresa
de ninguém, o governo ganhou de lavada.
Ainda que já tenham se tornado corriqueiras,
as eleições de mentirinha na Venezuela não deixam de causar indignação,
sobretudo porque o governo não se esforça nem mesmo para disfarçar a
manipulação grosseira dos resultados. De acordo com o Conselho Nacional
Eleitoral, órgão totalmente controlado por Maduro, os partidos governistas
conquistaram mais de 80% das cadeiras do Parlamento, além de 22 dos 23 governos
estaduais em disputa.
O mesmo CNE informou que 42,6% dos 21 milhões
de venezuelanos aptos a votar o fizeram. Mas as imagens de locais de votação
esvaziados parecem corroborar a versão da oposição, segundo a qual o
comparecimento foi de apenas 16%.
O desencanto com o regime de Maduro e o
boicote de parte da oposição ao processo explicam os números baixos. A
principal líder oposicionista, María Corina Machado, hoje na clandestinidade,
disse que não faria sentido participar das eleições porque os resultados não
seriam respeitados, a exemplo do que aconteceu na eleição presidencial do ano
passado, escandalosamente roubada por Maduro.
Mas nem todos os oposicionistas pensam como
María Corina: Henrique Capriles, que já foi o principal nome da oposição em
outras disputas presidenciais, participou das eleições e conquistou uma vaga no
Parlamento. Para ele, a abstenção era de interesse do regime e o boicote ao
pleito foi um erro. É essa divisão da oposição que facilita a vida do ditador
Maduro. Se mantivesse a união apresentada na eleição presidencial e que
desafiou seriamente a ditadura, a oposição poderia provocar algum desconforto
ao governo. Dividida, perde o pouco poder que tem.
Enquanto a oposição vive seus dilemas
existenciais, a ditadura de Maduro segue voando em céu de brigadeiro. A nova
“vitória” eleitoral dá ao regime as condições ideais para dar um verniz de
legitimidade a uma reforma constitucional que aprofunde a transformação da
Venezuela num Estado totalmente controlado pela ditadura.
Como mostra a altíssima abstenção nas recentes eleições, será difícil para Maduro convencer seus compatriotas a referendar uma reforma da Constituição que tende a aprofundar o fim da democracia no país e a solidificar a cleptocracia instalada no Palácio Miraflores. Isso, claro, não será necessariamente um problema para Maduro, pois uma de suas especialidades é ditar o resultado de eleições na Venezuela. Mas mostra o tamanho do abismo que há entre o ditador e a maioria de seus infelizes súditos.
PL da Devastação e retrocessos em série
Correio Braziliense
A ausência de outras vozes do governo
contrárias ao PL sinaliza que a ministra Marina Silva parece estar sozinha. O
ataque a que foi submetida, nesta terça, no Senado ilustra que os retrocessos
no país vão além das questões ambientais
O Senado Federal aprovou, na semana passada,
o Projeto de Lei 2.159/2021, que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O
texto havia sido aprovado na Câmara em 2021, mas sofreu mudanças significativas
— e bastante negativas para a biodiversidade brasileira — ao passar pelo crivo
dos senadores. O projeto é discutido no Congresso desde 2004, a partir de uma
proposta do ex-deputado federal Luciano Zica. Em suma, a última versão aprovada
pelo Senado flexibiliza todo o licenciamento ambiental brasileiro, o que deu ao
texto a alcunha de PL da Devastação por parte de organizações ambientais.
Uma das mudanças principais passa por uma
emenda do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Defensor da exploração do
petróleo na chamada Margem Equatorial, o político quer criar a Licença
Ambiental Especial (LAE), documento único para projetos listados como
prioritários pelo governo federal, com rito especial de análise máxima de um
ano, com dispensa de etapas hoje existentes. O objetivo parece claro: passar
por cima do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), principal responsável por travar a liberação da exploração
do chamado "ouro negro" na Amazônia.
Mas esse não é o único ataque ao meio
ambiente promovido pelo PL da Devastação. O texto também quer criar a Licença
Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), uma autodeclaração por parte do
empreendedor para quaisquer intervenções, com exceção daquelas "de alto
impacto no meio ambiente". É como se um jovem, ao completar os 18 anos,
declarasse ser capaz de dirigir um carro apesar de não ter sido aprovado no
exame de direção.
Para além do retrocesso óbvio, especialistas
alertam para o enfraquecimento de órgãos ambientais fundamentais no processo de
licenciamento ambiental, como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai),
o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o próprio
Ibama e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). Esses órgãos
existem para mapear os impactos diretos de empreendimentos com grande potencial
de dano — a exemplo, hidrelétricas e barragens de mineração. Mas não só. É
durante o licenciamento ambiental que se mapeiam potenciais danos indiretos
dessas intervenções, como o aumento do conflito fundiário em áreas de
conservação.
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do
Clima, na figura da ministra Marina Silva, tem se posicionado contrário ao PL
com a seriedade e a assertividade que o tema merece. "Não podemos
retroceder nem um centímetro nas agendas que o Brasil já avançou, inclusive no
licenciamento ambiental, que, agora, sofreu um golpe de morte no Congresso
Nacional", disse Marina, durante evento em comemoração ao Dia
Internacional da Biodiversidade, no Rio de Janeiro, na semana passada.
A ausência de outras vozes do governo contrárias ao PL sinaliza que a ministra parece estar sozinha. E sob ataque de parlamentares. Convidada para falar sobre licenciamento ambiental no Norte do Brasil ontem, na Comissão de Infraestrutura do Senado, Marina abandonou o local após bate-boca e demonstrações explícitas de misoginia. O episódio — muito aquém do que se espera de debates democráticos sobre temas que interessam ao país — ilustra também que os retrocessos no país vão além das questões ambientais.
Eduardo Bolsonaro sob investigação
O Povo (CE)
Jair Bolsonaro também será ouvido no
inquérito, por afirmar que é o responsável pela manutenção financeira do filho
no exterior, sendo, portanto, o suposto beneficiário das ações dele nos Estados
Unidos
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), determinou a abertura de inquérito para investigar
supostos crimes cometidos pelo deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP),
atualmente morando nos Estados Unidos. Segundo a Procuradoria Geral da
República (PGR), Eduardo Bolsonaro estaria atuando nos Estados Unidos contra
autoridades brasileiras, especialmente o ministro Alexandre de Moraes.
A abertura da ação deu-se a pedido do
procurador-geral da República, Paulo Gonet, apontando que o filho do
ex-presidente Jair Bolsonaro estaria cometendo os crimes de coação no curso do
processo, obstrução de investigação de organização criminosa e tentativa de
abolição violenta do Estado Democrático de Direito, nos processos que tramitam
contra o pai.
É de conhecimento público — mesmo porque o
próprio deputado divulga suas atividades — que Eduardo atua em instâncias do
governo e do Congresso americano para impor sanções a ministros do STF, por
suposta perseguição que seu pai estaria sofrendo.
A propósito, Moraes determinou também que
Jair Bolsonaro fosse ouvido, por afirmar que é o responsável pela manutenção
financeira do filho no exterior, sendo, portanto, o suposto beneficiário das
ações dele nos Estados Unidos.
As alegações de Eduardo de que apela a um
país estrangeiro, pois sofreria "perseguição" em seu país, são
insustentáveis. O Brasil é reconhecidamente uma nação democrática, com as
instituições funcionando nos limites da legislação aprovada pelo Congresso
Nacional. O deputado tem, portanto, assegurado o direito à ampla defesa em seu
próprio país, o que ele não teria em um "estado de exceção", como ele
diz vigorar no Brasil.
Enquanto a temperatura sobe, o mais provável
é que as diplomacias brasileira e americana estejam em intensas negociações
para evitar que a linha de não retorno seja ultrapassada. O papel das
diplomacias profissionais é evitar o choque, que inevitavelmente acontecerá,
caso o Congresso ou a Justiça dos EUA, aplique sanções a Alexandre de Moraes.
Espera-se que a situação não chegue a esse
ponto de ruptura, pois o Brasil teria a obrigação de encarar o episódio como a
intervenção inaceitável de um país estrangeiro em sua política interna, ou
seja, um ataque direto à sua soberania, o que seria um abalo nas relações entre
Brasil e Estados Unidos, que já duram 200 anos.
No mais, seria interessante conhecer a
opinião dos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) e do Senado,
Davi Alcolumbre (União-AP) sobre o inquérito. Eles consideram normal que um
congressista alie-se a um governo e a parlamentares de um país estrangeiro para
que sancionem um ministro da mais alta corte do país? Eles concordam que o
Brasil vive em um "estado de exceção"?
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