quarta-feira, 25 de junho de 2025

O desabafo de Freire Gomes para Toffoli - Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Comandante disse, em 2022, que Moraes extrapolava funções e ministro revidou: ‘Código do Marechal’

Em agosto de 2022, o ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli e o então procurador-geral da República, Augusto Aras, foram convidados para uma reunião reservada com os comandantes militares na casa do chefe da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, em Brasília. Havia no ambiente a preocupação de que as tropas fugissem do controle se Jair Bolsonaro perdesse as eleições.

Mais do que isso, um sentimento parecia prevalecer na cúpula militar, às vésperas do 7 de Setembro: a irritação com o ministro Alexandre de Moraes, que acabara de assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O general Freire Gomes, à época comandante do Exército e hoje testemunha da Procuradoria-Geral da República na ação da trama golpista, estava exasperado. Dizia que Moraes usurpara suas funções ao chamar os 27 comandantes das polícias militares para discutir a segurança das eleições. Queria providências.

O convite para os coronéis da PM era mesmo incomum. Desde 2021, porém, ministros do STF e Aras mantinham conversas com os fardados, pois viam indícios de conspiração em curso. Um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, por exemplo, mostrava que as interações dos quartéis com as redes de apoiadores de Bolsonaro só aumentavam.

O almirante Almir Garnier, comandante da Marinha e disposto a colocar tropas à disposição de Bolsonaro – como se soube depois – fez coro com Freire Gomes. Baptista Junior, o anfitrião, achava que o risco de tudo desandar era forte. Aras, por sua vez, mais ouvia do que falava.

Foi então que Toffoli lançou mão de um argumento caro às Forças Armadas para defender Moraes. “O que o Alexandre fez está estritamente dentro da lei. Tudo isso consta do Código do Marechal”, disse ele.

Era uma referência à lei 4.737/1965, sancionada pelo marechal Castello Branco, que instituiu o Código Eleitoral na ditadura militar. Aras também afirmou que não havia ali qualquer conflito com a Constituição.

Baptista Júnior confidenciou a interlocutores que, após aquela reunião, os chefes das Forças fizeram um pacto: não apoiariam nenhuma ruptura se Luiz Inácio Lula da Silva ganhasse as eleições. Após a vitória de Lula, o brigadeiro foi ainda mais enfático durante conversa com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, em dezembro. “Se alguém for bancar isso, saiba quais são as consequências”, avisou.

Quase três anos depois, o anfitrião daquele jantar e Freire Gomes são testemunhas de acusação. Bolsonaro, Heleno e Garnier viraram réus. Mas, ao que tudo indica, esta história ainda terá muitos capítulos no ano eleitoral de 2026.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.