sábado, 26 de julho de 2025

As ameaças de Trump ao mundo globalizado - Marcus Pestana

Vamos retomar de onde paramos na última semana? Representaria Trump o fim da globalização? Quais serão as consequências se acordamos no dia primeiro de agosto com tarifas de 50% sobre os produtos brasileiros importados pelos EUA?

Parece-me essencial separar o que há de jogo político e ideológico nesta história da esfera objetiva dos interesses e objetivos econômicos.

Achar que tudo que estamos vivendo - às vezes mais parece mistura de realismo fantástico com uma ópera bufa - é fruto apenas de um personagem inusitado, imprevisível, exótico, destemperado, grosseiro, mentiroso, ousado, autoritário, me parece no mínimo superficial e equivocado. Embora Donald Trump mereça cada um desses adjetivos.

Trump ressurgiu, em 2024, com o perfil de um super-herói, que colocaria os EUA em primeiro lugar e faria a América grande novamente. Para isto não disfarça seus ímpetos imperialistas; o uso da chantagem aberta; o desconforto com os ritos democráticos e republicanos de compartilhamento do poder com o Congresso e o Poder Judiciário; a retórica ufanista e o uso de fake news e bravatas.

Precisa permanentemente alimentar a bolha de fiéis seguidores, que enxergam nele o mensageiro de uma nova hegemonia americana e o supremo líder da direita conservadora autoritária mundial.        

 Por outro lado, os EUA ainda são a maior economia do mundo. No entanto, têm um mega déficit fiscal de mais de US$ 1,9 trilhões ao ano; uma dívida de 120,9% de seu PIB, em veloz crescimento; e, a perspectiva de agravamento com o último pacote de corte de impostos e gastos, proposto por Trump e aprovado por exígua maioria pelo Congresso americano, que resultará num desequilíbrio adicional de US$ 3,3 trilhões, em 10 anos. A arrecadação com as novas tarifas estão, inclusive, ajudando a amenizar esse rombo fiscal.

Além disso, os EUA têm um déficit comercial que bateu nos US$ 918,4, em 2024. Os dois déficits gêmeos exigem a manutenção do dólar como moeda padrão nas transações internacionais. Por isso, as tratativas no âmbito dos BRICs sobre vias alternativas incomodam tanto.

Também a defesa das empresas americanas, como as Big Techs, e a obstrução à construção de uma futura hegemonia chinesa são objetivos centrais na estratégia de Trump. A postura do governo e do judiciário brasileiros frente as grandes empresas do mundo digital e a prática do multilateralismo e a busca de parcerias alternativas pela diplomacia brasileira estão também por trás da reação americana.

Nada justifica, no entanto, a quebra de uma aliança histórica; ameaçar nossa soberania; imiscuir-se em questões institucionais e políticas internas; usar tarifas de comercio exterior como ferramentas de chantagem. No caso brasileiro, tudo é injustificável, já que o Brasil, há anos, acumula déficits comerciais contra os EUA.

Cautela, firmeza, habilidade e diálogo com segmentos da economia americana afetados pelas verdadeiras sanções impostas ao Brasil é o caminho. Pode haver deflação, juros menores, desemprego, queda das exportações, aqui. Pode haver inflação e desorganização de alguns segmentos lá. Mas não é cancelando o visto de sete membros de nosso STF ou impondo tarifas de importação absurdas ao Brasil, que reconstruiremos os laços históricos de cooperação entre Brasil e EUA. 

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