sexta-feira, 25 de julho de 2025

As pressões dos EUA por acesso preferencial a minerais brasileiros - Assis Moreira

Valor Econômico

Governo Trump tem mais margem de manobra agora, mas os europeus já garantiram acesso melhor

Os EUA nos últimos governos sempre tem tentado garantir o acesso sem restrições e de preferência somente para eles a minerais críticos brasileiros. São minerais essenciais para muitas tecnologias modernas e para a segurança nacional e econômica.

O apetite dos EUA por minerais estratégicos do Brasil já foi manifestado no primeiro mandato de Donald Trump (janeiro 2017-janeiro 2021), mas negociações não prosperaram. A demanda continuou no governo do democrata Joe Biden, sem resultado.

A ameaça de sanção agora por Trump envolvendo tarifa de 50% sobre produtos brasileiros pode acelerar negociação mais concreta nessa área sensível, a margem de manobra de Washington é bem maior, mas a exclusividade exigida pelos EUA parece não ter como ser obtida.

É que um dos pontos do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia (UE) é precisamente sobre melhor acesso europeu a minerais críticos no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.

O pacote fechado em Montevideu, em dezembro de 2024, estabelece que, uma vez o acordo em vigor, o Mercosul reduzirá ou eliminará taxas de exportação, acabará com restrições na exportação e monopólios. Para a UE, com as condições de tarifas que foram negociadas com o Mercosul, poderá importar mais barato, significando custos reduzidos e maior competitividade para o bloco.

Deu seu lado, o Itamaraty observou que no acordo com a UE o Brasil garantiu o direito de aplicar restrição às exportações de minerais críticos se julgar apropriado, por exemplo, para estimular a agregação de valor no país. Mas confirmou na ocasião que, se adotar imposto de exportação a esses produtos (o que não é o caso hoje), a alíquota aplicável à UE deverá ser mais baixa do que a incidente sobre outros países, não podendo ultrapassar 25%.

Conforme o Itamaraty, o pré-acordo UE-Mercosul, adotado em 2019 no governo Bolsonaro, proibia qualquer incidência de direito às exportações no comércio entre Brasil e UE.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, destacou em Montevideu que o entendimento permitirá à UE diversificar abastecimentos e escapar a dependências excessivas. E que ‘tanto para as importações como para as exportações, o acordo reforçará a competitividade da Europa em todos os domínios’. Ela apontou mais oportunidades de investimento. As empresas da UE terão o direito de se estabelecer e não sofrerão discriminação para investir nas indústrias do Mercosul. O acordo facilitará o investimento europeu no desenvolvimento de indústrias locais para processar minerais críticos.

A Alemanha, a maior economia europeia, e o Brasil tem discutido bilateralmente já há algum tempo um novo modelo para parceria global, com empresas e produtos para atender as demandas mundiais e não apenas para atender os dois países, como bastante foco em minérios estratégicos.

Nesse cenário, os EUA ficaram atrás na corrida por minerais estratégicos brasileiros. No final do governo Biden, a então embaixadora americana no Brasil, Elizabeth Bagley, declarou que os EUA pretendiam comprar minerais críticos do país, deflagrando sinal de alerta em círculos do governo em Brasília.

A fala foi na ocasião vista como nada trivial e do tipo ‘queremos minerais críticos’, ou seja, ter simplesmente o acesso. Já o objetivo destacado em Brasília tem sido na outra direção, de estimular o processamento e agregação de valor dessas commodities no país.

No atual governo Trump, depois das primeiras turbulências tarifárias, uma delegação de representantes do governo e do setor privado brasileiro foi em maio a Washington para discutir uma agenda de cooperação, que poderia incluir minerais.

Na ocasião, a secretária de Comércio Exterior do MDIC, Tatiana Prazeres, como publicamos, apontou a importância na agenda para cooperação em ‘minerais críticos nas condições corretas’. Ou seja, ‘não é qualquer tipo de cooperação que nos interessa. É importante valorizar a capacidade de processamento no país, o que não é incompatível com os americanos em fornecimento confiável’.

O Brasil é o maior produtor mundial de nióbio, com 82% da extração. O produto serve para aplicação em alta tecnologia. A UE destaca commodities estratégicas que o Brasil tem e a participação delas no abastecimento europeu:

PRODUTO - % global do Brasil - % no suprimento da UE – Utilização

Alumínio/Bauxita – 10,4% de extração - 12% - produção de alumínio

Grafite natural - 7,5% da extração - 13% - Baterias e refratários para a produção de aço.

Niobio - 88,8% do processamento – 82% - Aço de alta resistência e superligas para transporte e infraestrutura; Aplicações de alta tecnologia (capacitores, ímãs supercondutores, etc.)

Manganês - 6,1% de extração - 8% - produção de aço e baterias

Metal de silício - 7,2% do processamento – 9% - Semicondutores, fotovoltaicos, componentes eletrônicos e silicones.

Vanádio - 4,8% de processamento - 7% - Ligas de baixa resistência e alta resistência

Tântalo - 15,9% de extração. – 16% - Capacitores para dispositivos eletrônicos e superligas.

ARGENTINA

Litio. – 11% de processamento – 6% - baterias, vidro e cerâmica, e metalurgia do aço e do alumínio.

Fonte: Comissão Europeia, 2024

Sem surpresa, a intensificação da rivalidade geopolítica entre os Estados Unidos e a China transborda para o campo dos minerais essenciais, e eleva as pressões sobre produtores como o Brasil, como já escrevemos.

Minerais críticos como terras raras, lítio, cobalto e nióbio são essenciais para as transições digital e verde e garantir suprimento que assegure ambições economicas e ambientais de certos países.

A China, com enormes reservas, domina atualmente o processamento global de minerais essenciais muito procurados para a fabricação de baterias para veículos elétricos e armazenamento de energia renovável. De seu lado, os EUA negociam acordos com mais países para expandir seu acesso a esses minerais importantes.

Com produção nacional limitada, tanto os EUA como a Europa dependem muito das importações, incluindo da China, fornecedora de commodities como grafite, elementos de terras raras e outros minerais para baterias, e da Rússia, que fornece alumínio, níquel e titânio.

O governo Trump é particularmente agressivo para garantir acesso a minerais estratégicos. Basta ver como agiu com a combalida Ucrânia.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.