Correio Braziliense
"Apesar de reconhecer que houve
descumprimento das restrições, o magistrado classificou o gesto e as
declarações do ex-presidente uma 'irregularidade isolada', advertindo, porém,
que qualquer nova infração resultará em prisão imediata"
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Alexandre de Moraes decidiu não converter em prisão preventiva as medidas
cautelares impostas a Jair Bolsonaro. Apesar de reconhecer que houve
descumprimento das restrições, o magistrado classificou o gesto e as
declarações do ex-presidente uma "irregularidade isolada",
advertindo, porém, que qualquer nova infração resultará em prisão imediata. A
decisão alivia a tensão entre Bolsonaro e o Judiciário, mas o ambiente político
permanece carregado, especialmente diante do impasse diplomático entre o Brasil
e os Estados Unidos por causa do tarifaço de 50% sobre os produtos brasileiros,
que está a sete dias de entrar em vigor.
Ao ter trechos de seu discurso na Câmara dos Deputados divulgados on-line, Bolsonaro burlou, ainda que indiretamente, a decisão de Moraes de proibir o uso das redes sociais. O ministro ressaltou que "a Justiça é cega, mas não é tola" e proibiu explicitamente o uso de entrevistas ou discursos como "material pré-fabricado" para postagens de aliados. Todas as cautelares estão mantidas: tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno e nos fins de semana, restrição de contato com outros investigados, proibição de se aproximar de embaixadas e de manter comunicação com diplomatas estrangeiros.
Bolsonaro, no entanto, continua na fronteira
da transgressão das decisões judiciais. Na quinta-feira, participou de um culto
evangélico na região administrativa de Taguatinga, ao lado da ex-primeira-dama
Michelle Bolsonaro, que denunciou publicamente uma suposta "censura
prévia" contra o marido. Ele chorou durante a celebração, reforçando sua
estratégia de vitimização perante sua base eleitoral.
Enquanto o embate jurídico no Brasil parece
momentaneamente contido, a tensão entre o governo brasileiro e a Casa Branca
continua. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem uma semana para aceitar as
exigências da Casa Branca, que investiu contra o julgamento de Bolsonaro, o
comércio da 25 de Março em São Paulo e o Pix, além de taxar as exportações
brasileiras em 50% e ameaçar dobrar essa aposta. Ontem, no Vale do
Jequitinhonha, manteve a corda esticada. Relembrou os 580 dias que passou preso
em Curitiba, criticou a "perseguição judicial" da Operação Lava-Jato
e comparou sua própria resistência às atuais pressões de Trump. "Um cara
que passou fome até os 5 anos e sobreviveu não vai correr", afirmou.
Lula disse que rejeitou acordos que, segundo
ele, feririam sua dignidade e destacou a mobilização popular que o apoiou
durante a prisão. O discurso teve tom de palanque eleitoral, emocionou o
público e reforçou sua imagem de líder combativo em defesa da soberania
nacional. Essa postura tem servido para melhorar a aprovação do petista e do
governo, segundo as pesquisas de opinião. Lula afirmou que está pronto para
negociar.
Terras raras
"Eu fiquei pensando: o que fazer? Ele
não quer conversar, se ele quisesse conversar, ele pegava o telefone e me
ligava", disse. Ironizou a situação: "Se Trump estiver 'trucando',
ele 'vai tomar um seis'". No "truco", um jogo de cartas,
blefa-se muito. "Pedir o 6" significa aumentar a aposta de três para
seis pontos após um pedido de truco. Quando um jogador ou dupla pede
"truco", o adversário pode aceitar, aumentando a aposta para quatro
pontos, ou "fugir", perdendo a rodada e cedendo dois pontos ao
adversário.
Se o adversário não aceitar o truco e optar
por "pedir o 6", a aposta dobra novamente, passando para seis pontos.
A partir daí, quem pediu o 6 pode aceitar, dobrar para nove pontos ("pedir
9") ou fugir, perdendo a rodada e cedendo seis pontos ao adversário. Lula
é um negociador experiente, tanto quanto Trump, um foi sindicalista e o outro é
empresário. A comparação com o truco é enigmática sobre como Lula pretende
conduzir a posição do governo a partir 1º de agosto.
A retaliação norte-americana tem motivações
econômicas, além das políticas. Ontem, uma nova carta foi posta na mesa. O
presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Raul Jungmann, revelou
que autoridades norte-americanas reforçaram o interesse nos minerais críticos e
estratégicos brasileiros (MCEs), como nióbio, lítio, cobalto e terras raras.
Segundo Jungmann, o encarregado de negócios da embaixada dos EUA no Brasil,
Gabriel Escobar, reiterou a preocupação de Washington com o acesso seguro a essas
matérias-primas.
O Brasil ocupa posição privilegiada nesse
tabuleiro geopolítico. Possui a segunda maior reserva conhecida de terras raras
do mundo, atrás apenas da China, que hoje domina a cadeia global de refino.
Esses minerais são cruciais para carros elétricos, turbinas eólicas,
semicondutores e equipamentos militares, o que explica a disputa cada vez mais
intensa entre as grandes potências. Em meio às tensões com o Brasil, os EUA
buscaram um acordo emergencial com a China para garantir o fornecimento de
terras raras.
Em Genebra, Pequim comprometeu-se a retirar
restrições às exportações para os norte-americanos, em troca da flexibilização
de sanções impostas por Trump. O entendimento, porém, ainda enfrenta
desconfianças, já que a China passou a controlar rigorosamente a destinação dos
materiais, temendo que abasteçam a indústria militar norte-americana. Essa
disputa coloca o Brasil em uma encruzilhada estratégica. Com reservas
abundantes e infraestrutura mineradora, o país ainda exporta matéria-prima
bruta, sem agregar valor tecnológico.
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