Correio Braziliense
É um sistema de governo que combina o
presidencialismo e o parlamentarismo. Os dois modelos clássicos são os da
França e de Portugal. Duas PECs tramitam no Congresso
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assume a presidência do Mercosul, em Buenos Aires, na Argentina, a elite política e a alta magistratura brasileira se reúnem no Fórum Jurídico de Lisboa, criado pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), um dos autores da proposta de implantação do semipresidencialismo no Brasil. Ao saudar os presentes, entre eles o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), destacou o caráter transdisciplinar e internacional do evento, que conta com 57 painéis, quase 500 palestrantes de várias nacionalidades e estimativa de 2,5 mil participantes. “O Fórum se consolidou como um ponto de encontro fundamental para o diálogo entre o Brasil e a Europa”, afirmou.
Apelidado de “Gilmarpalooza”, o evento se
realiza desde 2013, no recesso parlamentar e do Judiciário, com a participação
de magistrados, advogados, políticos e empresários. Longe dos holofotes de
Brasília, o encontro mistura glamour, muita articulação política e lobbies
poderosos junto ao Congresso e aos tribunais federais. Inteligência artificial,
democracia e sustentabilidade são os temas deste ano, mas o prato principal é a
crise entre o Lula e o Centrão, cujo escalada reanima as conversas de bastidor
sobre a adoção do semipresidencialismo, uma velha proposta de Nelson Jobim que
ressurge nas crises.
O evento reúne os ministros do STF, Luís
Roberto Barroso, presidente da Corte, André Mendonça, Flávio Dino e Alexandre
de Moraes, além do anfitrião, Gilmar Mendes. Do governo federal, participam os
ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia), Camilo Santana (Educação),
Jader Filho (Cidades), Jorge Messias (AGU) e Ricardo Lewandowski (Justiça).
Todos tentam jogar água na fogueira da crise, depois de Lula ter decidido
recorrer ao Supremo para manter o decreto que aumenta as alíquotas do Imposto
sobre Operações Financeiras (IOF), derrubado pelo Congresso por meio de um
decreto legislativo.
Entre os políticos, além de Motta, participam
do encontro os caciques do Centrão Arthur Lira (PP-AL), Ciro Nogueira (PP-PI) e
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), entre outros parlamentares, como os paulistas Tabata
Amaral (PSB), Orlando Silva (PCdoB) e Alex Manente (Cidadania). E os
governadores Cláudio Castro (PL-RJ), Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP),
Mauro Mendes (União-MT), Helder Barbalho (MDB-PA), Ronaldo Caiado (União-GO),
Eduardo Leite (PSD-RS) e Rafael Fonteles (PT-PI). Promovido pelo IDP (Instituto
Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa), que tem Gilmar como sócio,
em parceria com o Lisbon Public Law Research Centre e a FGV Justiça, da
Fundação Getúlio Vargas, o evento termina sexta-feira.
Projetos na Câmara
Gilmar e Temer são autores de uma das três
propostas de semipresidencialismo sugeridas ao Congresso, entre 2016 e 2018.
Defendem uma transição para o semipresidencialismo como um modelo mais
equilibrado, capaz de evitar crises como os impeachments de Fernando Collor e
Dilma Rousseff. Temer chegou a sugerir uma “reforma de transição em 2030”, ou
seja, que não prejudicaria o Lula caso seja reeleito.
Dois projetos, porém, estão em tramitação. A
PEC 9/1996, de Nelson Jobim (então PMDB-RS), que prevê um presidente com papel
simbólico e o primeiro-ministro com apoio da maioria da Câmara, que teria poder
de derrubar o governo por moção de censura. Em caso de impasse prolongado, o
presidente poderia dissolver a Câmara e convocar eleições. Outro projeto (PEC
21/2021), de autoria do ex-deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), foi apresentado
em meio à crise política do governo Bolsonaro. Nele, o presidente mantém papel
relevante, inclusive pode dissolver a Câmara em caso de crise, após aprovação
de voto de desconfiança do primeiro-ministro pelo Parlamento. O projeto é
inspirado na Quinta República Francesa, mas adaptado à realidade brasileira.
O semipresidencialismo é um sistema de
governo que combina elementos do presidencialismo e do parlamentarismo. Os dois
exemplos clássicos de semipresidencialismo são a França e Portugal, mas eles
operam com lógicas institucionais distintas. No semipresidencialismo francês, o
modelo é dualista e há coabitação entre o presidente da República e o
primeiro-ministro. Funciona da seguinte maneira: o presidente da República é
eleito por voto direto, exerce o papel de chefe de Estado com amplos poderes,
especialmente em política externa, defesa e nomeação do primeiro-ministro, que
é chefe de governo e cuida da administração interna e da condução cotidiana do
Executivo. A Assembleia Nacional pode derrubar o governo por moção de censura,
obrigando o presidente a nomear um novo premiê ou dissolver o Parlamento.
É um modelo flexível. Quando o presidente tem
maioria no Parlamento, ele domina o governo e atua quase como chefe de governo
e de Estado ao mesmo tempo, caso do governo Sarkozy (2007-2012). Quando é de um
partido diferente da maioria parlamentar, o presidente se restringe à política
externa e de defesa, e o primeiro-ministro lidera as políticas internas, como
ocorreu no governo Mitterrand/Chirac (1986-1988). É um sistema altamente
personalizado no presidente, com forte liderança do Palácio do Eliseu.
Em Portugal, o sistema tende à centralidade
parlamentar, com o primeiro-ministro muito poderoso e o presidente como uma
“última instância” de estabilidade institucional, com poder de dissolver o
parlamento e convocar eleições em caso de impasses institucionais.
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