segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Cenário eleitoral, por Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

Não se sabe ao certo o que vai acontecer amanhã, o que dizer dentro de um ano

O cenário político ganha uma conotação eleitoral cada vez mais acentuada, como se qualquer medida governamental ou iniciativa partidária devesse ser vista predominantemente sob essa ótica. Com a geopolítica tomando uma forma interna, graças às ações conjuntas da dupla Trump/Bolsonaro e à esquerdização do governo Lula, não se sabe ao certo o que vai acontecer amanhã, o que dizer dentro de um ano. No entanto, o tempo da política segue o seu ritmo a despeito das intempéries e aproveitando-se delas. De um lado, estamos longe das eleições de outubro de 2026; de outro, não falta muito para o fim do ano, quando começará o embate propriamente eleitoral.

Note-se, preliminarmente, que o acúmulo de pesquisas, com diferentes institutos tentando atrair a atenção, termina por acentuar esse quadro, fazendo com que traços políticos atuais tenham projeção para o futuro. Por exemplo, todas as pesquisas mostram Jair Bolsonaro como candidato, quando isso é praticamente impossível. Está inelegível e será muito provavelmente julgado e condenado nos próximos meses. Acontece que a sua presença nas listas eleitorais vem a fortalecer a polarização vigente. Produz-se, assim, um desencontro com a realidade, uma vez que não mais existirá no próximo ano a oposição Lula x Bolsonaro. Em consequência, os candidatos de centro-direita e direita temem se apresentarem e dizerem o que pensam para não contrariarem o “não candidato” Bolsonaro. Isso não deixa de ser uma certa esquizofrenia política.

Na perspectiva da esquerda, salvo por razões de saúde ou tropeços nas pesquisas de opinião, Lula será candidato à reeleição. Já deixou de governar há bastante tempo para dedicar-se completamente à sua campanha. Não há outro candidato petista viável, ninguém podendo lhe fazer sombra. Haddad não tem mostrado viabilidade eleitoral e seria apenas uma eventual solução de emergência. Ademais, o atual discurso esquerdizante e ideologicamente ultrapassado não deixa de ser uma preparação para o PT passar para a oposição. Não seria difícil fazer essa transição. Quanto à outra candidatura de esquerda, do PSB, na figura de Geraldo Alckmin (embora não se possa dizer que seja propriamente de esquerda), ela não é factível pela simples razão de que o PT é um partido de projeto hegemônico, sempre voltado para exercer solitariamente o poder, sem saber dividi-lo. Nunca aceitaria outro nome que não fosse propriamente seu.

Na perspectiva da extrema direita, Eduardo Bolsonaro, dado o seu posicionamento contrário ao Brasil – tendo contribuído para o tarifaço de Trump – deu literalmente um tiro no pé. Ademais, provavelmente será julgado e condenado, não podendo candidatarse no próximo ano. O mais provável é sua permanência nos EUA. Michelle Bolsonaro tem forte presença no meio evangélico, ganhando eleitoralmente com isso. As diferenças internas à família Bolsonaro, porém, possivelmente a farão optar por uma candidatura ao Senado pelo Distrito Federal, dada como certa. Flávio Bolsonaro, embora seja da família o mais moderado, ainda não se apresentou como possível candidato, permanecendo refém de uma decisão paterna.

Na perspectiva dos governadores, ainda Bolsonaro-dependentes, a safra é excelente, podendo-se dizer que qualquer um tem qualificações para exercer a função presidencial. O governador Tarcísio tem surgido como candidato com maiores chances, sob a condição de vencer previamente o núcleo bolsonarista, que impede qualquer candidatura de voo próprio. Seria um candidato altamente competitivo. O governador Ronaldo Caiado (GO) é outro excelente candidato, exímio articulador político e sempre alinhado com posições de direita, mostrando coerência em sua trajetória. No Paraná, Ratinho Junior, com ótimo governo, tem se mostrado eleitoralmente competitivo, segundo as pesquisas de opinião, além de contar com o apoio de seu partido, o PSD, e de seu presidente, Gilberto Kassab. O governador Zema (MG), também na mesma linha, está tentando se viabilizar, tendo lançado sua candidatura, alinhando-se com a concepção bolsonarista, embora não tenha sido sacramentado por Jair Bolsonaro. O mesmo se pode dizer do governador Leite (RS), tentando ainda se impor nacionalmente, adotando um perfil distintivo de centro-esquerda.

Por último, não se deveria descartar a candidatura do ex-presidente Michel Temer. Seria a pessoa mais preparada para ultrapassar a polarização vigente, instalando um governo de unificação nacional. Conseguiu, após o fracasso do governo Dilma, recolocar o País no caminho do crescimento, de reformas estruturais, de responsabilidade social e fiscal. Haverá sempre alguém a dizer que a sua idade seria um empecilho. Ora, o argumento não se sustenta. Lula não é nenhum adolescente. Logo terá 80 anos. Trump tem 79 anos. Herdando um país destruído, Adenauer fez da Alemanha o que é hoje, assumindo a chancelaria com 73 anos e deixando o poder com 87 anos. •

 

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