terça-feira, 26 de agosto de 2025

Fogo e fumaça na era Trump, por Fernando Gabeira

O Globo

Na maior parte das vezes, é melhor não se deixar levar pela confusão das redes e pelas bravatas dos políticos

Desde muito jovem sou ligado às notícias. Durante algum tempo, minha tarefa no Jornal do Brasil era ler todos os jornais pela manhã e planejar a edição do dia seguinte. Sou, portanto, um grande consumidor de informação.

De uns tempos para cá, com o advento das redes sociais, o volume se amplificou. Não só jornais e revistas, como blogs, podcasts, robôs, grupos, opiniões, comentários e influenciadores invadiram a cena. O que era uma grande onda virou tsunami, impossível de surfar.

Dentro desse contexto, no entanto, procuro analisar um dado importante em nosso cotidiano: a posição dos Estados Unidos em relação ao Brasil e à América Latina. Para alguns, trata-se apenas de uma repetição da velha tendência imperial de determinar a vida dos países do continente. Acontece que há fatos novos: além da cacofonia das redes, há um presidente especializado em bombardear o mundo com uma sucessão de notícias. É um presidente que tem uma rede própria e usa parte do tempo para postar projetos, ideias, avisos e devaneios.

A incompreensão dessa tática de Trump acaba produzindo um nervosismo inútil e prejudicial. É o caso da Lei Magnitsky aplicada a Alexandre de Moraes. Bastou o anúncio, sem detalhes de como será usada, para que se desencadeasse um psicodrama nacional. Um ministro escreveu um despacho, as ações dos bancos brasileiros caíram na Bolsa de Valores, e as redes estão cheias de ameaças anunciando que o país quebrará.

A Lei Magnitsky se aplica às empresas e indivíduos nos Estados Unidos. Moraes é apenas alguém que vive de salário e faz a maioria de suas compras no território brasileiro. O máximo que pode acontecer é migrar para o Pix. É possível dizer muito sobre isso, menos afirmar que é uma tragédia.

Uma noite dessas, fui dormir depois de ler inúmeros posts sobre um avião da CIA que pousou em Porto Alegre e foi para São Paulo. Eram muitos os boatos. Chegaram a extravasar para a mídia convencional. Fui dormir tranquilo porque sei que a CIA é uma agência que trabalha discreta e clandestinamente. Usa aviões, helicópteros, barcos, carros, ônibus e motocicletas, enfim, o que for necessário. A última coisa que teria é um avião que, ao pousar num país, seria facilmente identificado como sendo da CIA.

Outra notícia que segui de perto: o envio de três destróieres americanos ao Caribe, com a missão de pressionar a Venezuela. Deveriam chegar em 36 horas. Passado o tempo, li no site venezuelano TalCual que os três estavam muito longe: um em Guantánamo, Cuba; outro, no Panamá; o terceiro, na costa americana.

Maduro convocou 4 milhões de milicianos, fez discursos e desfilou com aquele casaco com a bandeira da Venezuela. Os navios americanos não apareceram porque, no seu lugar, o Furacão Erin sacudiu o Caribe. Choveu muito na Venezuela, houve até apagão em Caracas. Se os venezuelanos tivessem se preparado para as inundações, no lugar da invasão americana, talvez tivessem mais eficácia.

O jornalismo explora muito as tensões. Temo estar me transformando num antijornalista porque, na maioria dos casos, vejo crises cheias de som e fúria significando nada. Estou pronto para iniciar um novo gênero: o Correio Zen, órgão destinado a mostrar que, na maior parte das vezes, é melhor não se deixar levar pela confusão das redes e pelas bravatas dos políticos. Preciso apenas de um patrocinador que aceite perder dinheiro com serenidade.

 

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