Valor Econômico
Debate no Congresso Nacional é necessário para se fazer uma completa reavaliação de benefícios fiscais sem governança e resultados limitados
O timing não é perfeito, porém começam a
surgir no Congresso conversas importantes para buscar soluções para se evitar o
iminente colapso fiscal já contratado para o início do próximo governo, antes
que seja tarde demais.
A sabedoria política recomenda que grandes reformas, principalmente aquelas impopulares, sejam propostas e discutidas no primeiro ano de mandato. Com a popularidade em nível máximo e contando com a boa vontade dos partidos que querem desfrutar das delícias do poder, presidentes recém-eleitos conseguem avançar propostas que impõem perdas a grupos específicos, em prol do bem comum.
Aconteceu assim com a onda de PECs liberalizantes
no início do governo FHC, a reforma da previdência dos servidores públicos
(Lula I), o encaminhamento da lei de cotas e a criação do fundo de previdência
complementar dos servidores (Dilma I), a aprovação do teto de gastos e as
discussões que levaram à reforma trabalhista (Temer), a segunda reforma da
previdência (Bolsonaro) e a recente reforma tributária do consumo (Lula III).
No entanto, a fúria reformista dos primeiros
meses vai cedendo à medida que o capital político se esvai e a nova gestão se
acomoda ao rame-rame da condução das políticas públicas e consome sua energia
lidando com as recorrentes crises com os demais Poderes.
Na próxima semana o governo Lula III entra no
terço final do seu mandato. A esta altura, com Trump tocando o terror nas
relações internacionais e a política interna dominada pelo julgamento de
Bolsonaro e seus asseclas, o líder petista espera no máximo aprovar o projeto
de isenção do imposto de renda para quem recebe até R$ 5 mil por mês - feito
importante não apenas para diminuir a regressividade da tributação da renda,
como principalmente para impulsionar a popularidade no ano eleitoral.
Em outra direção, sua própria equipe
econômica alerta, no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), para o
quase completo estrangulamento das contas públicas a partir de 2027. Além do
crescimento explosivo da dívida pública, as atuais regras de reajuste de benefícios
tendem a consumir a quase totalidade dos recursos disponíveis para a execução
de gastos discricionários (aqueles que permitem ao presidente implementar
políticas para imprimir sua marca junto à população).
Em condições normais, o problema seria
empurrado com a barriga até que o horizonte político se definisse com as
eleições de 2026. Entretanto, pela gravidade da situação, começa a se construir
uma sintonia entre lideranças do Executivo e do Legislativo que pode pavimentar
o caminho para a formação de acordos sobre dois importantes itens dessa agenda.
Na semana passada comentei aqui os principais
pontos do projeto de reforma administrativa, que deve ser apresentado em breve
pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) e que contou com importantes contribuições
da equipe do Ministério da Gestão e Inovação dos Serviços Públicos, da ministra
Esther Dweck. Embora a melhoria fiscal não seja a principal justificativa para
uma ampla modernização das regras do funcionalismo, o pacote de medidas para
combater os supersalários de algumas carreiras tem o potencial de gerar dezenas
de bilhões de reais de economia nos próximos anos.
Para completar, será realizado nesta
terça-feira (26) na Câmara dos Deputados o evento “Gastos Tributários: caminhos
para a eficiência”, organizado pelo Tribunal de Contas da União, a entidade
MaisProgresso.org e as consultorias de orçamento da Câmara e do Senado.
Participarão do debate os deputados Mauro Benevides Filho (PDT-CE), Pedro Paulo
(PSD-RJ), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Adriana Ventura (Novo/SP), além do
secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, a subsecretária de
Política Fiscal do Ministério da Fazenda, Débora Freire Cardoso, e o consultor
de orçamento do Senado Fernando Moutinho.
Gastos tributários são incentivos concedidos
pelo Estado para alcançar algum objetivo de política pública por meio de
isenções e regimes tributários especiais. Estima-se que representem, só no
âmbito federal, pelo menos R$ 544,5 bilhões em 2025, o que significa mais do
que o triplo do orçamento do Bolsa Família ou o dobro de todos os investimentos
públicos previstos para este ano.
É muito dinheiro que o governo abre mão todos
os anos com baixo retorno para a sociedade. Em relatório que será divulgado no
evento, o TCU avaliou os 16 principais programas de gastos tributários, que
representam 91% do total dos recursos, entre eles o Simples, a Zona Franca de
Manaus, as isenções para filantropia e as deduções do imposto de renda. A
constatação é que 15 deles apresentam risco alto ou médio em termos de falhas
de governança, lacunas no monitoramento e ineficácia de resultados.
Tanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
quanto os presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre, já
destacaram a necessidade de se rever muitos desses benefícios tributários.
Com o evento que se realiza nesta terça,
espera-se que sejam lançadas as bases para um debate sério para se fechar
muitos desses grandes ralos de dinheiro público.
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