Correio Braziliense
O secretário de Estado, Marco Rubio, convidou
o chanceler Mauro Vieira para reunião presencial entre ambos em Washington,
para tratar da relação entre Brasil e Estados Unidos
As equipes dos governos de Brasil e Estados
Unidos devem retomar contatos de bastidores ao longo desta semana para
alinhavar os preparativos da reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da
Silva e Donald Trump. O secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio,
terá uma conversa com o chanceler Mauro Vieira para avaliar a possibilidade
dessa primeira reunião entre os dois presidentes ocorrer na Malásia, aproveitando
a eventual presença de ambos na cúpula da Associação das Nações do Sudeste
Asiático (Asean, na sigla em inglês), evento em que as principais lideranças do
bloco do sudeste asiático.
Realizadas duas vezes por ano, as cúpulas ocorrem desde fevereiro de 1976. Criada em agosto de 1967, a Asean é composta por dez países: Brunei, Camboja, Cingapura, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Tailândia e Vietnã. Lula e Trump estão convidados para o encontro.
Até agora, as negociações com a Casa Branca transcorreram com muita cautela e
discrição. O encontro entre ambos na Assembleia-Geral da ONU, nos bastidores do
plenário, quando Trump e Lula se abraçaram, fora combinado entre os assessores
com a aprovação de ambos; o que não estava acertado foi Trump tornar público o
abraço e a “boa química” que rolou entre ambos em plena assembleia.
O tom positivo do encontro funcionou como uma espécie trégua e mudou da água
para o vinho o contexto político das relações entre os dois países, que
formalmente estavam congeladas. Apesar de os discursos oficiais terem se
chocado e mantido duras críticas, ambos relataram um encontro pessoal promissor
do ponto de vista de um acordo. Contatos secretos de alto nível antecederam
aquela terça-feira, dia 23, em Nova York. Mesmo assim, havia muitas incertezas.
O primeiro sinal de reposicionamento de Trump veio na videoconferência do dia
11 de setembro entre o vice-presidente Geraldo Alckmin e o embaixador Jamieson
Greer, representante comercial dos EUA (USTR). No dia 15, o enviado especial
Richard Grenell foi despachado por Trump para conversas a sós com o ministro
Mauro Vieira (Relações Exteriores) no Rio de Janeiro.
Ambos se encontraram fora do Palácio do Itamaraty, para evitar vazamentos: o
Copacabana Palace, o mesmo onde foi gravado o assassinato de Odete Roitman,
interpretada por Débora Bloch, na novela Vale Tudo. Depois, Grenell se
encontrou com o assessor especial da Presidência, Celso Amorim, no dia 22, em
Nova York, véspera da Assembleia-Geral da ONU.
Republicano, Grenell é um diplomata muito experiente, foi embaixador dos
Estados Unidos na Alemanha de 2018 a 2020, participou das negociações de paz na
Sérvia e no Kosovo, de 2019 a 2021, e dirigiu interinamente a Inteligência
Nacional no Gabinete de Trump em 2020.
Antes, havia sido porta-voz do Departamento de Estado dos EUA nas Nações Unidas
durante o governo George Bush. Foi fundamental para mudar a avaliação de Trump
sobre a situação brasileira, muito contaminada pela atuação do deputado Eduardo
Bolsonaro (PL-SP) e do influenciador Paulo Figueiredo junto ao Departamento de
Estado.
Agenda complexa
No dia seguinte à assembleia da ONU, Mauro Vieira e Marco Rubio se encontraram
e acertaram que a primeira conversa entre Trump e Lula seria por telefone, o
que ocorreu no dia 6 de outubro. No dia 9, o Ministério das Relações Exteriores
divulgou oficialmente o estágio das conversas. O ministro Mauro Vieira manteve
contato telefônico com Rubio após ao telefonema entre Lula e Trump.
Acordaram que equipes de ambos os governos manterão reunião na próxima semana
em Washington, para dar seguimento ao tratamento das questões
econômico-comerciais entre os dois países, conforme definido pelos dois
presidentes. Rubio convidou Mauro Vieira para uma reunião presencial entre
ambos, para tratar dos temas prioritários da relação entre o Brasil e os
Estados Unidos.
O encontro entre Lula e Trump na Malásia dependerá dessas tratativas. Um novo
ciclo de relações entre Brasil e Estados Unidos pode passar por três eixos:
comércio e tecnologia, energia e meio ambiente e segurança estratégica. O
objetivo seria atualizar a parceria histórica com base numa agenda pragmática
de reciprocidade e inovação.
No eixo econômico, propõe-se a revisão das tarifas impostas pelos EUA a
produtos brasileiros e um acordo de facilitação comercial e inovação
industrial, que reduza barreiras técnicas e estimule cadeias produtivas
conjuntas em setores como semicondutores, fertilizantes, agritech e
biotecnologia. O Brasil garantiria estabilidade regulatória e o acesso a
matérias-primas estratégicas; os EUA, transferência tecnológica e investimentos
diretos.
No segundo eixo, ambos poderiam firmar uma parceria para transição verde, com
aportes do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Exim Bank
norte-americano para projetos de hidrogênio verde, biocombustíveis e
reflorestamento da Amazônia. O Brasil ofereceria créditos de carbono e know-how
em bioenergia; os EUA, financiamento e tecnologias limpas.
No eixo político-estratégico, o acordo incluiria mecanismos permanentes de diálogo sobre democracia, direitos humanos, combate a desinformação, segurança cibernética e vigilância de fronteiras. Uma cláusula de arbitragem comercial poderia substituir medidas unilaterais e reforçaria a previsibilidade institucional.
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