domingo, 12 de outubro de 2025

Riscos e desafios na rota da COP30. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Boicote de Trump e atraso em entrega de metas ameaçam cúpula de Belém; Lula deve ser cobrado por nova aposta no petróleo

A um mês do início da COP30, autoridades brasileiras buscam argumentos para rebater o pessimismo que ronda a cúpula em Belém. A agenda climática está sob ataque de Donald Trump, que voltou a retirar os EUA do Acordo de Paris. Mas o problema seria menor se estivesse restrito ao boicote americano. Outros grandes poluidores, como União Europeia e Índia, resistem a apresentar metas para reduzir emissões e frear o aquecimento global.

Até aqui, apenas 62 países apresentaram suas metas voluntárias para reduzir as emissões, as chamadas NDCs. “Temos que reconhecer que estamos frustrados com os dois prazos de entrega que não foram cumpridos, inclusive por países-chave”, disse na sexta-feira o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago.

O debate sobre quem deve pagar a conta da emergência climática também continua emperrado. O presidente Lula tem martelado que os países ricos precisam financiar a transição energética das nações em desenvolvimento. O problema é convencê-los a soltar o dinheiro.

Na COP15, em Copenhague, ficou acordado que a ajuda seria de US$ 100 bilhões por ano até 2025. Os repasses nunca chegaram perto disso. Na última cúpula, em Baku, o objetivo foi elevado para US$ 300 bilhões por ano até 2035. Hoje ninguém sabe de onde tirar a bolada.

“Mesmo que se use a contabilidade mais criativa, a gente sabe que esses números estão muito distantes. Os países ricos não pagaram o que deveriam pagar”, resumiu na sexta o embaixador Mauricio Lyrio, negociador do Brasil na COP30.

Um dos maiores desafios de Belém é resolver essa equação financeira. Para evitar um fiasco, será preciso incluir o setor privado no rateio. Estão na mesa ideias como taxar grandes fortunas, petroleiras e companhias aéreas — a aviação civil é responsável por 2,5% das emissões de gases de efeito estufa.

Para o Brasil, a agenda climática pode significar uma oportunidade única de desenvolvimento, sustenta o embaixador Corrêa do Lago. Ele elogia os esforços do país, mas diz que é preciso acelerar os investimentos em energias renováveis. “O fato de estamos à frente nesse debate não garante que sempre estaremos. Às vezes a gente acha que já está tão bem que não precisa mais progredir”, alerta.

Na COP28, em Dubai, Lula afirmou que era preciso livrar o mundo da dependência dos combustíveis fósseis. Em novembro, o discurso será confrontado com a decisão de buscar novas reservas de petróleo na chamada Margem Equatorial, na foz do Amazonas. “Todos nós vivemos contradições, e essas contradições devem ser manejadas”, disse na sexta a ministra Marina Silva, que ficou vencida nesse debate.

O presidente ainda não havia iniciado o terceiro mandato quando lançou a candidatura do Brasil a sediar a COP30. A escolha de Belém virou problema com a disparada dos preços de hospedagem. Ainda assim, o governo aposta no evento para coroar a volta do país ao centro do palco internacional.

Em menos de um ano, o Brasil terá recebido o G20, o Brics e a cúpula da ONU sobre mudanças climáticas. Não é pouca coisa para um país que, há pouco tempo, teve um chanceler que negava o aquecimento global e dizia se orgulhar da condição de pária.

 

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