O Globo
Se houve negligência ou avaliação incorreta
dos riscos oferecidos pelo Master, isso deve ficar claro
A economia brasileira vai terminando 2025
demonstrando resiliência maior que a calculada e descrevendo um pouso bem mais
lento que o esperado diante de um choque de juros duradouro como o praticado
pelo Banco Central.
Do ponto de vista da economia real, o governo tem muito bumbo para bater, a despeito da permanência dos juros altos. O desemprego fechará o ano na menor taxa histórica, a inflação, mesmo beirando o topo da meta, foi domada, e o PIB deverá crescer acima do projetado pelo terceiro ano consecutivo. Esses deverão ser alguns dos estandartes de Lula na campanha à reeleição, encorpando o discurso de um mandato dedicado a reduzir as desigualdades econômicas e sociais.
Juntam-se a esses dados projetos de
iniciativa do Executivo com alto potencial de impacto eleitoral, como a reforma
do Imposto de Renda e o Programa Luz do Povo, que estabelece a tarifa social de
energia elétrica, entrou em vigor em meados do ano e é reconhecido em pesquisas
como um canhão em termos de popularidade.
Acontece que a desaceleração mais lenta que o
esperado, tanto da economia como da inflação, lança uma dúvida quanto à
possibilidade de o Copom começar a baixar os juros já em janeiro, como espera o
governo, e essa é uma água no chope do Planalto neste réveillon.
A pressão pela queda dos juros, restrita a
Lula, ao entorno palaciano e ao PT quando o BC estava sob o comando de Roberto
Campos Neto, viveu uma trégua durante os primeiros meses da troca da guarda,
mas, no último período, ganhou a adesão do ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, e até de setores do empresariado e dos bancos.
Se a permanência de crescimento considerável
e a atividade econômica ainda mais tépida que o imaginado levarem a novo
adiamento do início de queda da Selic, o tom das cobranças sobre o colegiado
comandado por Gabriel Galípolo tende a subir. Isso coincide com um período em
que o BC aparece no epicentro de um caso eivado de esquisitices: o inquérito
que apura a suspeita de fraude na tentativa de venda do Banco Master ao BRB, que
tramita no Supremo Tribunal Federal sob a relatoria de Dias Toffoli.
A forma como Toffoli tem conduzido as
investigações, cercadas de cuidados, com a decretação de sigilo e decisões para
lá de controversas, como o anúncio de que haveria uma acareação antes mesmo dos
depoimentos individuais das partes, deixa o BC vulnerável e tem levado à
hipótese de mesmo a liquidação do banco, decretada pela autoridade monetária,
ser anulada pelo Supremo.
A Febraban e outras entidades ligadas ao
setor financeiro saíram em defesa da autonomia do BC e da necessidade de
preservar sua independência como regulador do sistema, mas o governo, o tempo
todo, tem se mantido distante da polêmica, evitando tomar parte dos lances
muitas vezes confusos que têm marcado o caso.
A depender de como o desenrolar do inqu
Master deixar vulneráveis diretores ou o colegiado como um todo e tomar a
agenda do BC no início de 2026, a confluência desse assunto com a necessária
decisão sobre os juros poderá tornar tudo ainda mais inflamável para a instituição
na largada do ano eleitoral.
Existe intensa pressão política nos
bastidores desse que já é o escândalo financeiro mais rumoroso das últimas
décadas, e o cipoal de relações exposto até aqui recomenda extrema cautela por
parte das autoridades que conduzem as investigações, além de responsabilidade
para não fragilizar uma instituição vital como o BC.
Se houve negligência ou avaliação incorreta
dos riscos oferecidos pelo Master, isso deve ficar claro, mas carregar nas
tintas nesse caminho como forma de até rever a liquidação do banco de Daniel
Vorcaro pode levar a uma crise de proporções razoáveis pelo grau de incerteza
que isso acarretará para todo o sistema financeiro e para a credibilidade do BC
como órgão fiscalizador. E misturar esse tema com a cada vez maior pressão pela
queda dos juros, então, é apostar duplamente no caos.

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