sábado, 14 de março de 2009

FRASES DE HOJE

"O Lula não quer ser líder da América do Sul. Ele quer ser presidente dos EUA!".

(Eliane Cantanhêde sobre o encontro de Lula com Obama, hoje)


Berlusconi me definiu como um catocomunista [católico comunista]. É uma velha ofensa que era utilizada antes do meu nascimento contra todos os católicos progressistas. Talvez fosse útil que seu auxiliar lhe explicasse que ele é tecnicamente um clérico-fascista.

(Dario Franceschini, novo secretário do PD italiano, proveniente da esquerda democrata-cristã.)

DESPOTISMO FABRIL E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: O CASO DA EMBRAER

Luiz Werneck Vianna1
DEU NO BOLETIM CEDES/IUPERJ

O acento pessimista, a versão de que o Brasil perdeu a crença em si mesmo, incapaz de formular um destino de afirmação para seu povo, entregue à servidão voluntária aos mecanismos de mercado, parece se ter tornado uma nova moda entre intelectuais. De fato, há bons motivos para o desalento, sobretudo quando se atenta para a situação de degradação em que se encontra o sistema dos partidos e da representação política no país. Também não é animadora a distância que a sociedade civil mantém em relação à esfera pública, confiada quase que exclusivamente ao controle dos profissionais da política. Esta hora de crise mundial do sistema financeiro ainda mais generaliza o azedume na mídia e nos chamados formadores de opinião – não haveria mais lugar para as pretensões de mais um surto de modernização. A escalada da violência urbana e a sucessão de escândalos na “classe política” apenas confirmariam o diagnóstico de esgotamento das antigas promessas de se instituir, aqui,uma cultura e uma civilização originais.

O diagnóstico, a tal ponto se acha confundido com o senso comum, que os fortes sinais que o infirmam ou são ignorados ou têm sua interpretação rebaixada. A decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região no caso da demissão de mais de quatro mil trabalhadores da Embraer de mandar, por medida liminar, suspender as rescisões contratuais, é um destes vigorosos sinais.

Em primeiro lugar, porque dá plena conseqüência aos princípios e aos direitos fundamentais estatuídos na Carta de 88 no mundo do mercado de trabalho, trazendo para a dimensão sistêmica da economia o valor ético “dignidade da pessoa humana”. São claros os termos da decisão ao mobilizar o texto constitucional: “o poder diretivo do empregador [...] não é absoluto, encontrando limites nos direitos fundamentais da dignidade da pessoa humana”, para, mais à frente, sentenciar que “a dignidade da pessoa humana é um valor superior que deverá presidir as relações humanas entre as quais as relações jurídico-trabalhistas”.

Em segundo lugar, pelo próprio contexto em que a decisão foi produzida, propício, diante da gravidade da crise econômico-financeira, a admitir exclusivamente argumentos e intervenções de caráter instrumental em detrimento de razões estranhas à lógica do mercado. A decisão judicial, porém, dirige-se a este mundo e às suas contingências, e não ao mundo da lua. E, nesse sentido, não desconhece que o mercado está submetido a leis próprias, e não tem como ser dirigido pela força de canetadas, embora deva operar em comunicação com os valores, práticas e instituições que lhe chegam de outras regiões do social. Assim, não vai se negar o caminho das demissões dos trabalhadores de empresas que perderam, ou estão perdendo, a sua viabilidade econômica, desde que a sua necessidade seja comprovada em um cenário de negociação sindical, em obediência ao que dizem as leis, em particular as de proteção do trabalho, e sob a arbitragem do poder judicial.

Em terceiro lugar, pela evidência de que o movimento sindical trouxe para si os fundamentos e os princípios da Carta de 88, e passa a provocar a ação do juiz a fim de arbitrar questões que transcendem a região do econômico-corporativo, na medida em que, quando suscita o valor da dignidade da pessoa humana, no interior de um confronto tradicionalmente interpretado como de natureza mercantil, envolve a sociedade inteira. E, finalmente, pela indicação de que há poderes, em nossas instituições republicanas, capazes de se por em sintonia com os comandos
constitucionais que nos orientam no sentido de criarmos uma sociedade mais justa.

Rio de Janeiro, 06 de março de 2009.

1 Professor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ) e Coordenador do Centro de Estudos Direito e Sociedade (CEDES/IUPERJ).

Aécio avança com Serra indefinido

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Mais que definir qual será o candidato à Presidência da República, os partidos de oposição estão travando uma dura batalha de bastidores para decidir a melhor estratégia para os próximos meses. O governador de São Paulo, José Serra, em tese o favorito, decepcionou os dirigentes dos Democratas que jantaram com ele na quinta-feira. Querendo dar a partida para o enfrentamento com o governo, o DEM encontrou um candidato arredio, que se declarou impossibilitado de iniciar uma campanha já este ano, alegando questões institucionais para refrear os ímpetos oposicionistas de seu principal aliado. Já o governador Aécio Neves, que perdera espaço dentro das articulações com o DEM, avançou alguns passos adiante se encontrando com dirigentes democratas no próprio território de Serra.

Estando em São Paulo para uma conversa com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e com o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, o governador de Minas recebeu do presidente do DEM, Rodrigo Maia, a notícia de que o partido pretende fazer em Belo Horizonte a mesma reunião que fez com Serra, para mostrar que não tem preferências. Segundo Maia, o nome de Aécio já foi muito forte no partido, ficou muito fraco e hoje está voltando a ter espaço porque, enquanto Serra está muito arredio, Aécio voltou a conversar com as pessoas, voltou a procurar o DEM.

Se essa declaração de neutralidade já parece uma mudança considerável de posicionamento político, nos bastidores sabe-se que a decisão de Aécio de iniciar uma campanha nacional soa como música aos ouvidos dos democratas, que consideram perda de tempo não realizar logo uma mobilização, diante da exposição que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, está tendo.

Enquanto o governador José Serra prefere não iniciar uma campanha até o ano que vem, alegando, segundo relato de membros do DEM que participaram da reunião, que sendo governador tem "questões institucionais" que o impedem de aprofundar as críticas ao governo federal neste momento de crise econômica, o governador Aécio Neves e os integrantes do DEM concordam que é preciso a oposição se mobilizar.

O governador José Roberto Arruda, do Distrito Federal, disse na reunião que "ou se ganha na política ou não tem vitória eleitoral". Na segunda-feira, houve a primeira reunião dos três partidos de oposição - PSDB, PPS e DEM -, em São Paulo, que teve a palestra de Drew Westen, assessor político ligado aos democratas americanos, que participou da campanha de Barack Obama, autor do livro "Political Brain" ("Cérebro Político").

Segundo ele, o grande pecado de Obama depois de eleito é que ele não está contando a história da crise, não está querendo responsabilizar George Bush pelos problemas que os Estados Unidos estão vivendo. Daqui a pouco, disse ele, o cidadão vai ver aquela história mal contada e vai pensar: pelo menos no governo Bush eu estava empregado.

O presidente do DEM, deputado federal Rodrigo Maia, acha que o problema da oposição é esse: "Ou a gente conta a história do governo Lula, faz a crítica à incompetência dos projetos do PAC que não andam, a crítica ao inchaço da máquina, à incompetência do governo, à corrupção do governo e de seus aliados, à irresponsabilidade do Lula, que tratou da crise com deboche, e agora estamos pagando um preço altíssimo, ou então daqui a pouco teremos um governo forte no meio de uma crise pela qual ele não é responsável".

Lembrando que o próprio ex-presidente Fernando Henrique dissera outro dia que todas as crises que enfrentou vieram de fora, e nem por isso deixaram de culpá-lo, Maia diz que "política é personalista, temos que ter um vocalizador". Na mesma reunião, Serra foi cobrado pelo ex-deputado Luis Carlos Santos pela frase em que dizia que a crise era uma responsabilidade dos três níveis de governo, federal, estadual e municipal. "Ou a gente é oposição ou vai perder a eleição", cobrou Santos.

O governador José Serra tem limitado suas críticas ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e o deputado Rodrigo Maia diz que o partido discorda dessa posição: "Nós só falamos bem dele. Achamos que o BC tem que ser independente, e o Serra não. Ele é intervencionista, nós somos liberais", comenta o presidente do DEM.

Para ele, quem vai disputar uma eleição presidencial tem que resolver os palanques regionais, movimento político fundamental, e Serra "não quer saber disso por enquanto". Enquanto isso, ressalta, "eles estão operando para a Dilma, e nós ficamos olhando", dando como exemplo o "Blog da Dilma", lançado por um grupo de correligionários.

Mas, mesmo insatisfeitos com a falta de disposição de Serra para dar início a um processo de oposição formal ao governo, o DEM não apenas não quer definir qual o melhor candidato, que deve ser tarefa do PSDB, como não quer apressar o processo: "O prazo é o que gere unidade. O ideal é o mais rapidamente possível, mas, se precisar de um ano para ter unidade, vamos aguardar", diz Maia.

Por sua vez, o governador Aécio Neves diz que sua proposta de viajar pelo país "é racional". "O que eu quero é contrapor nosso movimento ao do governo, que vai crescer. Vamos viajar pelo país nos fins de semana, vamos unir as oposições, DEM e PPS para fazer grandes movimentações. Se nós fizermos esses eventos juntos, acaba com a ideia de que vamos ficar divididos", diz ele.

"Temos uma chance real de vencer as eleições, mas numa disputa que não é simples. Não vamos subestimar a Dilma", adverte o governador de Minas. (Continua amanhã)

Fiat lux!

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O Congresso Nacional ainda tem muito a fazer antes de corresponder ao atributo de transparência aludido pelo presidente do Senado, José Sarney, em sua manifestação de contrariedade às denúncias de condutas irregulares na Casa.

A primeira providência é aposentar a peneira de tampar o sol. A segunda, parar de empurrar para dentro do armário todo e qualquer acontecimento entendido como fato do passado. A terceira, simplesmente agir de maneira correta: cumprir as regras, instituir controles e punir os infratores.

Feito o básico, aí sim se poderá pensar e reconhecer como veraz a afirmação do senador José Sarney de que o Parlamento não faz nada que não seja à "luz do dia".

Por ora a realidade não lhe confere crédito.

Pode, por exemplo, ser tido como transparente um Poder que considera lícitos para efeito de atuação parlamentar os delitos anteriores ao início do mandato?

E o que absolve os crimes cometidos no curso da missão delegada por ordem do corporativismo explícito, pode?

Evidentemente que não. Assim como não há transparência na decisão de se divulgar notas fiscais a partir de determinada data, mantendo sob sigilo o passivo dos mesmos documentos.

Há, sim, uma óbvia presunção de culpas e uma evidente intenção de absolvê-las coletiva e liminarmente. Isso, no lugar de fazer todos inocentes, põe o coletivo sob suspeita, o que fere a instituição e garante aos malfeitores um lugar à sombra.

O presidente do Senado, portanto, não defende a Casa quando saca da peneira para tampar a luz do sol. Antes, contribuiu para empurrá-la mais alguns degraus escadaria abaixo.

Poderiam, tanto ele quanto o presidente da Câmara, Michel Temer, agir diferente? Poder para isso não lhes falta.

Podem participar do Conselho da República, podem substituir o presidente do País, podem decidir impasses em votações do plenário.

Como não podem revogar uma ordem para pagamentos abusivos ou impedir prorrogação artificial de sessões com o fito exclusivo de assegurar um extra aos funcionários?

Como não podem afastar do posto um diretor que durante dez anos empresta o imóvel funcional aos filhos? Como não podem ordenar uma revisão total de procedimentos?

Não só podem como deveriam virar tudo de cabeça para baixo, sacudir a poeira e partir para a volta por cima.

Para isso, no entanto, é preciso que estejam de fato imbuídos do espírito de defesa do Poder Legislativo, hoje fragilizado em consequência do monumental equívoco de ignorar a mudança dos tempos, a evolução da sociedade, a alteração da percepção de representados a respeito de seus representantes.

A relação vai deixando cada vez mais de ser de reverência e admiração típica de súditos. O eleitorado há algum tempo adquire a noção republicana de que dele emana o poder que em nome dele deve ser exercido.

Na visão retrógrada ainda preponderante na cabeça não só de parlamentares, mas também do presidente da República, de governadores, ministros, prefeitos e mesmo de muito burocrata sub do sub, aquele dístico é só um enfeite no enunciado da Constituição.

A mentalidade obsoleta reza que se mantenha indiferença às denúncias a fim de não ceder aos ditames da opinião pública, perigosíssima, vide a ascensão de Hitler pela vontade popular, a preferência da maioria pela pena de morte e sofismas afora.

O que se cobra hoje do Congresso não é nenhuma barbaridade. Ceder aos ditames e à pressão da opinião pública significa nada mais que fazer o certo como manda a regra, pôr um fim em privilégios de antanho, rever conceitos, manter a coluna vertebral o tanto quanto possível ereta e caminhar no prumo para o futuro.

Há distorções nos outros Poderes? Que o Congresso, na condição de colegiado representativo da sociedade, corrija as suas e, quem sabe, faça a diferença.

Na base da teimosia, na opção sistemática pelo malfeito, não é demais repetir: o Congresso deixa o País à mercê da ação de salvadores, caçadores e arrivistas sempre prontos a se apresentar como líderes da virada da maré.

José Sarney viu esse filme algumas vezes, a última faz apenas 20 anos. Há de convir: não vale a pena ver de novo.

Fanfarra

Fernando Collor de Mello é um personagem instigante, reconheça-se. Consegue suscitar no espectador algumas dúvidas, não obstante já tenha oferecido motivos de sobra para que a respeito de seus propósitos não restasse a menor dúvida.

E qual são as incertezas? Se ele imagina realmente que engana alguém fazendo pose de estadista na presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado, se aposta que um surto amnésia coletiva tenha varrido da memória do Brasil a figura do moralizador cassado por corrupção, ou se acredita, de fato, na própria pantomima em molde de reedição.

Seja qual for a resposta, conta emergir de santo no altar da lama geral pela arte e a manha da comparação.

O novo recorde da corrupção

Coisas da Política :: Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


Na temporada de escândalos estimulada pela antecipação da campanha eleitoral por iniciativa do presidente Lula com o lançamento da candidatura da ministra Dilma Rousseff sem consulta ao desprezado Partido dos Trabalhadores, o pequeno município de São Benedito, a 300 km de Fortaleza, credencia-se à conquista da taça da corrupção. Não pelo volume de dinheiro, mas pela singularidade da trapaça: a compra de votos com dinheiro falso.

Da modéstia de mais uma trampa na série que enriquece uma longa coleção de roubos no cofre da Viúva, o caso do município cearense distingue-se pela criatividade dos autores. E certamente que a curiosidade pelo desfecho da proeza merece ser acompanhada pela mídia. A Polícia Federal informa que os inquéritos instaurados estão andando no passo tardo da burocracia. A perícia nas cédulas anexadas ao processo será realizada pela Polícia Federal, com a ajuda do Banco Central.

Num requinte de cuidado, o Ministério Público Federal deverá ouvir os eleitores que aparecem em um vídeo gravado pela oposição e que acusam correligionários do prefeito Júnior Brandão, do impoluto PMDB, de propor a barganha do voto por R$ 100 e R$ 200. E, para fecho do primeiro capítulo da novela da corrupção em dose dupla, o detalhe esclarecedor: o caso só foi descoberto porque os vendedores de voto por notas falsas, na urgência do dinheiro falso caído do céu, desandaram a gastar a fortuna em compras na feira da cidade. O olho treinado dos feirantes desconfiou daquelas notas de tosco acabamento.

A aparente irrelevância de uma malsucedida compra de votos, mesmo com o ineditismo da dose dupla do dinheiro falso, ganha relevo no preocupante cenário nacional, com evidentes sinais de que, no governo e na oposição, o controle vai escapando das lideranças. E, nos dois lados, as iniciativas no clima de salve-se quem puder estão sendo articuladas no segundo escalão.

O otimismo do presidente Lula, arranhado pela sucessão de palpites equivocados para tentar esconder os rombos que a crise na economia mundial abriram na frágil improvisação da equipe econômica, já não têm a mesma credibilidade dos bons tempos de ontem.

Nem as medidas de emergência, como o corte na taxa básica de juros de 1,5 ponto, para 1,25% ao ano, promovido pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), contentaram os empresários e trabalhadores, que reclamam a timidez do governo.

Mas é na área política que os reflexos da crise não apenas agravam os embaraços crônicos, com destaque para a sucessão de escândalos que encurralam o Congresso no beco sem saída das desculpas esfarrapadas. Em cada canto, uma nova denúncia. No Senado, o pagamento de R$ 6,2 milhões de horas extras aos servidores dos gabinetes durante o período de férias de janeiro detonou uma série de reuniões para encontrar a saída sem prejuízo de um centavo para ninguém.

No movimento que se apresenta como de Anticorrupção, criado no Senado, a preocupação mais urgente busca fórmulas para o financiamento das campanhas, com tendência para o financiamento público, que é uma faca de dois gumes afiados. A campanha eleitoral precipitada pelo presidente Lula para carimbar o lançamento da candidatura da ministra Dilma Rousseff deve entrar num compasso de espera. Não é provável que as viagens semanais a pretexto de fiscalizar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) sejam interrompidas. Mas uma meia trava já foi anunciada com a agenda de compromissos internacionais do presidente para os próximos meses. E, com o presidente ausente, a ministra-candidata não correrá o risco de uma decepção.

Na oposição, a mesma toada da hesitação na surda luta de bastidores dos governadores José Serra, de São Paulo, e o mineiro Aécio Neves pela cabeça da chapa. Sobra tempo para os tucanos optarem por uma das saídas clássicas, da Convenção do partido à prévia que tanto incomoda o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em um mês, o panorama mudou. A crise na economia do mundo é uma dor de cabeça que lateja com o medo do que está a caminho. O governo e a oposição têm uma viga podre na escora da crise moral e ética que respinga nos três poderes, mas inunda como chuva torrencial o mais desmoralizado Congresso, desde o fim da ditadura militar.

DEM pede pressa ao PSDB para 2010

Germano Oliveira
DEU EM O GLOBO


Democratas se reúnem com Serra mas já admitem apoiar Aécio, caso este seja o escolhido

SÃO PAULO. O DEM quer que o PSDB defina, até o meio deste ano, o nome que o partido lançará como candidato a presidente da República, se o governador de São Paulo, José Serra, ou se o de Minas Gerais, Aécio Neves. Num jantar anteontem no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo, a cúpula do DEM - com o prefeito Gilberto Kassab à frente, além de Jorge Bornhausen, presidente de honra do partido, e Rodrigo Maia, presidente nacional, e uma dezena de líderes nacionais do partido - pressionou Serra a assumir o mais rapidamente possível sua candidatura a presidente da República.

Serra disse aos líderes do DEM que não poderia fazer isso agora, pois a população quer que ele se dedique ao estado. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso estava presente e também concordou com a necessidade de entendimento entre Serra e Aécio, por acreditar que a chapa ideal seria Serra para presidente e Aécio de vice. O DEM apoiaria essa chapa, segundo um dos interlocutores da reunião ouvidos pelo GLOBO ontem.

- O DEM apoia quem quer que venha a encabeçar a chapa. Apoiaremos o que o PSDB decidir, inclusive se a chapa for dos dois tucanos. O que precisamos é que esse nome seja lançado o mais rapidamente possível. Afinal, Lula já está com sua candidata na rua, todo dia inaugurando obras, enquanto que nós nem um nome temos ainda - disse um dos integrantes do DEM que participaram do jantar.

O DEM está preocupado com o fato de o presidente Lula, na avaliação do partido, já estar em campanha declarada por sua candidata, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

- Lula está trabalhando imperialmente pela ministra Dilma de forma inequívoca. E nós ainda estamos no dilema se o candidato da nossa aliança será o Serra ou o Aécio. O DEM já definiu que vai apoiar a chapa do PSDB. Temos mais simpatia por Serra, mas se o candidato vier a ser o Aécio, não teremos problema algum - disse o líder do DEM em São Paulo, muito próximo do prefeito Kassab e ligado a Serra.

A maioria dos presentes ao encontro argumentou que as prévias pedidas pelo governador de Minas Gerais poderá ser negativa para a consolidação da aliança da oposição.

Serra mostrou, durante a reunião, que está insatisfeito com a movimentação de Aécio pelas prévias e criticou os que estão antecipando o processo eleitoral.

- Não fui eleito governador para ser candidato a presidente, mas para governar São Paulo - disse Serra aos interlocutores do DEM.

Em reunião, FH e Aécio tentam afinar discurso

Gerson Camarotti
DEU EM O GLOBO


Governador insiste em prévias, rejeitadas pelo ex-presidente

BRASÍLIA, SÃO PAULO E BELO HORIZONTE. Após intensa troca de farpas durante a semana, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador tucano de Minas Gerais, Aécio Neves, almoçaram ontem, em São Paulo, com o objetivo de harmonizar o discurso no PSDB. Segundo tucanos, foi uma espécie de pacto de convivência para não fragilizar as pretensões do partido na sucessão presidencial de 2010.

No encontro, os dois se comprometeram a não expor as diferenças em público, apesar de continuarem a discordar da conveniência de realizar prévias para a escolha do candidato a presidente, defendidas por Aécio.

PSDB aguarda consulta a TSE sobre prévias

O clima entre Fernando Henrique e Aécio ficou ruim esta semana, depois que o ex-presidente disse que os governadores José Serra e Aécio devem priorizar suas administrações, e não viajar pelo Brasil para fazer a campanha das prévias. Numa reação dura, Aécio afirmou que não se constrói um projeto para o país de alguns gabinetes ou da "Avenida Paulista" e que era preciso caminhar pelo país.

Também participou da reunião, que ocorreu no Instituto Fernando Henrique Cardoso, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). Nada ficou decidido sobre prévias ou datas. Segundo Guerra, o partido quer aguardar uma resposta da Justiça Eleitoral à consulta feita pelo PSDB sobre o assunto.

Colaboraram Flávio Freire e Sueli Cotta

O informal e o social!

Cesar Maia
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


A PARTICIPAÇÃO do trabalho informal não é simples de mensurar. Mesmo o IBGE não consegue precisá-lo. A diversidade do trabalho informal é muito grande. Uma coisa é fato: é parte integrante, substantiva e permanente do mercado de trabalho brasileiro.

Nesse sentido, as políticas de governo não podem ignorar o trabalhador informal/subempregado, especialmente numa época de crise. E não se trata de pensar em formalizar apenas, mas de saber como conviver minimizando a ilegalidade. Em 2005, o IBGE afirmou que a menor taxa de desemprego aberto do Rio não o diferenciava de outras capitais quanto à informalidade. Tomaremos essa como referência para essa análise.

O Instituto GPP, em pesquisas no Rio nestes dez anos, ao traçar o perfil dos eleitores, abre os dados além da amostragem tradicional (gênero, idade, instrução, renda).

Busca identificar a ocupação do entrevistado. Aqueles que se dizem desempregados ou que dizem viver "de bico", somados, são incluídos, com certeza, no campo da ocupação informal/subemprego, embora os que digam que "trabalham por conta própria", em parte, também sejam informais.

A população economicamente ativa (PEA) medida por pesquisa de opinião no Rio é pouco menor que 50% da população, o equivalente a três milhões de pessoas. O campo da informalidade (desempregado e bico) oscila com a conjuntura econômica.

Entre novembro de 2007 e de 2008, eram, em média, 22% da PEA -660 mil pessoas. Entre 2002 e 2003 -anos recessivos-, esse número oscilou próximo a 30% e avançou assim até 2004.

Mesmo com o crescimento econômico de 2005 e 2006, o declínio da informalidade foi menor do que o esperado, ficando na média de 27%. Somente a partir do segundo semestre de 2007 o crescimento econômico impactou a informalidade, reduzindo-a para 22% da PEA, chegando em novembro a 20%.

Que impacto terá a recessão de 2009/2010 na informalidade? Comparem-se os números de 2002/03/04 com 2007/08. No Rio, ela deve passar dos 22% para algo como 28%. Esses 6% significam um retorno à informalidade/subemprego de 180 mil pessoas. O saldo da informalidade voltará a ser de 840 mil pessoas.

Num período de crescimento, a repressão à informalidade urbana induz à busca de emprego formal. Num período de recessão, estressa, alimenta os conflitos nas ruas, criminaliza. As políticas públicas devem abordar esta disjuntiva e apontar caminhos de integração, neste período.

Se a informalidade no Rio não difere das demais capitais, apliquem-se às capitais, por regra de três, os números do Rio e avaliem-se os desafios de hoje dos governos, todos.

Cesar Maia escreve aos sábados nesta coluna.

Terror do futuro

Cristovam Buarque
DEU EM O GLOBO


O mundo está assustado com a possibilidade de um futuro de terror, quando os terroristas dispuserem de armas de destruição em massa, mas não percebe o terror do futuro que viveremos adiante, quando as profecias ecológicas e sociais se confirmarem. Mais do que um futuro de terror, precisamos temer o terror do futuro de uma civilização incapaz de reorientar seu destino, que caminha rumo ao seu próprio fim. Um terror do qual seremos as vítimas, embora nos comportemos como os terroristas, preparando nosso suicídio.

Nos últimos anos, o terrorismo tem sido identificado como prática dos muçulmanos. Mas não podemos associar o terror ao islamismo, nem considerá-lo ação exclusiva de muçulmanos. Devemos, sem dúvida, lutar contra todas as formas e dimensões de terror, mas nenhuma civilização tem autoridade moral para identificá-lo com o Islã. Mesmo porque, no passado, muitas pessoas, de outras religiões e ideologias, cometeram atos insanos de terror.

O terrorismo já foi apoiado pelas autoridades do catolicismo, na época das Cruzadas, quando atrocidades foram cometidas contra os povos árabes nos países do Oriente Médio. Terríveis maldades também foram cometidas na própria Europa, pelo terrorismo de Estado e da Igreja, na época da Inquisição. A Inquisição foi uma forma de terror que, em vez de explodir, queimava as vítimas. Como foi terror, em nível de genocídio, o que o europeu Adolf Hitler cometeu contra milhões de judeus. O bombardeio aéreo de cidades inteiras também foi uma forma de terrorismo. Pode haver uma diferença técnica entre o avião pilotado por suicidas, enviado por líder fanático para chocar-se contra um prédio, e o avião que despeja bombas por ordem de um líder eleito, mas a dimensão do terror é a mesma. O terror foi ainda maior quando as bombas liberadas por esses pilotos eram atômicas, mesmo sob o argumento de acabar com a guerra.

Ninguém deve tolerar que um grupo de pessoas, em nome de causas religiosas ou políticas, leve um avião a se chocar contra um prédio, assassinando milhares de pessoas, como aconteceu no histórico 11 de setembro. Mas ninguém pode usar este gesto, cometido por um grupo de terroristas, para condenar todos os que praticam o mesmo credo religioso ou a mesma ideologia política.

O maior de todos os terrorismos foi cometido durante quatro séculos, em campos de concentração flutuantes, que transportaram 10 milhões de africanos, escravizados com a finalidade de dinamizar a economia do continente americano. Nossa civilização democrática, rica, moderna, ocidental, foi construída com base numa covarde forma de terrorismo. E essa mesma civilização nos encaminha, hoje, para um futuro aterrorizante. Estamos caminhando para um desastre de proporções superiores a todos os atos terroristas cometidos no passado. Muito pior do que um futuro de terror, com armas de destruição em massa nas mãos de fanáticos, é o terror do futuro que temos à frente, uma bomba-relógio prestes a explodir, que será detonada pela voracidade do consumo do qual todos participamos, como homens-bomba armados de cartões de crédito.

Vivemos o terror ecológico, que ameaça elevar o nível dos mares, inundar o litoral de todos os países, aquecer todo o planeta, desarticular toda a agricultura, provocar fome generalizada. Existe o terror de que a desigualdade social cresça ao ponto de se transformar em dessemelhança entre seres humanos, criando uma subespécie superior e outra inferior, fazendo desaparecer o próprio conceito de genocídio, pois as massas assassinadas não serão mais vistas como semelhantes. Existe até mesmo o terror assustador - embora invisível - do vazio de ideias e propostas para o futuro, que acirra o individualismo até a destruição do sentimento de solidariedade.

Esse futuro de terror, mais do que um futuro de terrorismo, foi o sentimento comum dos diversos participantes do seminário promovido pela Academia da Latinidade, em Oslo, no final de fevereiro, juntamente com o Instituto Nobel e a Academia de Ciências e Letras da Noruega.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF).

O stalinismo no futebol

Fernando Rodrigues
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Um grande prazer nas manhãs de domingo da minha infância era quando meu pai decidia, de última hora, que iríamos a uma partida de futebol à tarde, no Morumbi. Esse tempo passou. Lula e seu ministro do Esporte, Orlando Silva, anunciaram ontem que só serão admitidos nos estádios em 2010 os torcedores previamente cadastrados e portadores de um documento de identificação específico para eventos esportivos.

A ideia é reduzir a criminalidade nos estádios. Mas, em vez de punir os vândalos, o governo socializou o problema. Pessoas de bem terão de se submeter ao incômodo processo de obter uma carteirinha. Não passou pela cabeça dos formuladores do governo que esse tipo de exigência fere o direito de ir e vir. A história é pródiga em exemplos dessa ordem. Na antiga União Soviética, os cidadãos eram obrigados a ter um passaporte interno. Só mudava de cidade quem tivesse autorização prévia de trabalho e moradia no local de destino.

O ministro Orlando Silva é do PC do B, partido cujo modelo de nação até recentemente era a Albânia. Também foi presidente da UNE, uma espécie de sindicato de ex-estudantes em atividade e berço dos "maníacos da carteirinha".

Há soluções mais simples para combater a criminalidade nos estádios. Por exemplo, cadastrar vândalos (muitos são conhecidíssimos) e obrigá-los a ficar em delegacias nos dias e horários de jogos. Com a carteirinha do governo, já é possível imaginar o diálogo. "Vamos ao futebol hoje?", perguntará um amigo ao outro. E a resposta: "Não dá. Não sou cadastrado no sistema do Lula...". Turistas estrangeiros passeando pelo Rio e interessados em assistir a um Fla-Flu no Maracanã? Sem chances.

É o governo querendo resolver um problema e criando um ainda maior. O consolo é saber que nada disso dará certo. Como sempre.

PSDB escolhe nomes para futura comissão das prévias

Julia Duailibi
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Grupo será formalizado quando TSE tirar dúvidas, diz presidente da sigla

A direção do PSDB decidiu que o partido criará uma comissão interna para implementar as prévias que definirão o candidato à Presidência em 2010. Segundo o presidente nacional da legenda, senador Sérgio Guerra (PE), a comissão deverá ter três integrantes: o deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (ES), presidente do Instituto Teotônio Vilela; o deputado Rodrigo de Castro (MG), secretário-executivo do partido; e Eduardo Jorge, vice-presidente tucano.

A ideia é que, com base na resposta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às questões formuladas pelo partido a respeito das prévias, a comissão defina os critérios para a consulta. As prévias constam do estatuto do PSDB, mas precisam ainda ser regulamentadas - o que os tucanos pretendem fazer assim que o TSE responder às dúvidas.

A consulta está com o ministro Felix Fischer, que acabou de receber respostas da área técnica do TSE sobre financiamento de campanhas. A expectativa é que ele apresente ao plenário seu relatório na próxima semana. Para regulamentar a consulta, o PSDB usará ainda estudo sobre prévias feito pelo sociólogo Antonio Lavareda.

A direção do PSDB avalia que as prévias entre os governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG) só não irão ocorrer se o mineiro desistir da disputa. Tucanos paulistas acham que Aécio deveria abrir mão em prol de Serra, mais bem posicionado nas pesquisas.

Os três integrantes da comissão já vinham trabalhando juntos antes da consulta ao TSE. Rodrigo de Castro é próximo de Aécio, e Vellozo Lucas é ligado a Serra. Eduardo Jorge, próximo a FHC, é apontado como conhecedor da burocracia do partido. Segundo Guerra, a ideia da comissão é criar "regras comuns" para que a consulta seja feita.

FHC

Ontem, Aécio encontrou-se em São Paulo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no Instituto FHC. Aécio estava insatisfeito com notícias, divulgadas no começo da semana, sobre a preferência de FHC pelo nome de Serra em 2010. O objetivo do encontro foi resolver o que o ex-presidente teria chamado de mal-entendido.

Aécio ainda se encontrou com o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ), que anteontem havia reunido em jantar com Serra e FHC no Palácio dos Bandeirantes. Aos tucanos Maia e outros líderes do DEM defenderam a definição do nome do candidato do PSDB, com a ressalva de que a escolha deveria ser feita sem que se causasse um racha no partido. "Não dá para ir à eleição sem Minas", resumiu um dos presentes. Falou-se, então, sobre a hegemonia de São Paulo nas disputas eleitorais recentes, ao que FHC teria ponderado, lembrando os dois anos de gestão do mineiro Itamar Franco na Presidência.

O DEM chegou a cobrar dos tucanos uma postura mais aguerrida de oposição. "Não foi uma cobrança", amenizou Rodrigo Maia. "Falamos que não dá para discutir a eleição a partir do pós-Lula. Temos que discutir esse governo agora."

No encontro, foi abordada a questão dos palanques regionais. Os líderes do DEM reclamaram especificamente das investidas tucanas junto a Paulo Souto, ex-governador da Bahia, que foi cortejado pelos tucanos para mudar de partido. Participaram do jantar ainda o vice-governador, Alberto Goldman, e o secretário da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira.

Leve alento

Panorama Econômico :: Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO

Qualquer número positivo numa crise é alentador, mas não pode ser encarado como tendência. A alta de 1,4% nas vendas do varejo em janeiro para dezembro de 2008, divulgada pelo IBGE, não é, infelizmente, a retomada do consumo e o fim da crise. O economista Luiz Roberto Cunha acha que fevereiro terá nova alta, mas por causa das liquidações, que continuaram no mês passado.

Mas depois de uma semana com um número tão horrível, o do PIB, uma notícia como este pequeno aumento no comércio ajuda a começar o fim de semana. Mas o próprio IBGE, que divulgou a pesquisa, alertou que o crescimento nas vendas do varejo ainda não é uma tendência. O pesquisador da coordenação de Comércio do IBGE, Nilo Lopes, disse ao Alvaro Gribel, do blog, que só a partir dos resultados de fevereiro e março é que será possível dizer se o comércio se recuperou ou se a alta foi impulsionada pelas liquidações.

O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC, acha sim que o crescimento foi motivado pelas liquidações.

- A liquidação foi maior em janeiro, mas continuou em fevereiro. Além disso, o comércio, que é o grande empregador, não demitiu como a indústria. Foram muitas promoções, em vários setores, como o de automóveis, beneficiado com a redução de IPI. E como as liquidações continuaram em fevereiro, devemos ter nova alta.

Os dados da Fecomércio-SP não são os mesmos do IBGE. Na pesquisa feita por eles, as vendas em janeiro tiveram uma queda de 3,8% para janeiro de 2008 - a alta do IBGE foi de 6%. Fábio Pina, economista da Fecomércio-SP, explica que a tendência para fevereiro, no índice da entidade, ainda é de queda nas vendas.

- As promoções têm um efeito positivo, mas não têm força para reverter esta crise. Numa crise de menores proporções, elas até podem ajudar numa retomada. Mas, agora, o que se pode dizer é que ações pontuais, como a redução do IPI nos automóveis, que são como um prêmio para o consumidor que for comprar, ajudaram.

Pina acha que o primeiro semestre ainda vai ser negativo para o varejo, com queda entre 0,5% e 1%. No segundo semestre podem vir números positivos se o cenário de saída da crise estiver se desenhando. Do contrário, o ano deve ser negativo.

- Só nos próximos meses é que vamos saber se há ou não uma tendência de recuperação. Para o consumo voltar, é preciso que as pessoas que perderam o emprego acreditem que vão recuperar a vaga e que quem está empregado não vai perder - conta ele.

O CSFB, em comunicado de ontem, disse que a diminuição da massa salarial, a falta de crédito e o desemprego devem desacelerar as vendas no varejo.

Depois de dois meses de promoções, o varejo vai, agora, repor o estoque. Muitas indústrias ainda estão estocadas, outras não. Certo é que quando chegarem os novos produtos as promoções acabam, porque a indústria, mesmo em crise, tentará corrigir alguns preços. Para Luiz Roberto Cunha, março é o mês em que a indústria pode começar a voltar a produzir e que o comércio vai começar a sentir os efeitos da crise.

- A partir de março e abril o comércio vai sofrer. Acaba o estoque, acabam as liquidações, como a de vestuário, vem um preço que não é de estoque.

O presidente da Abinee, Humberto Barbato, também acha que a recuperação da indústria, e do setor de eletrônicos, começa em março, mas de forma muito tênue.

- Tenho a sensação que a situação vai melhorar, com um ciclo mais positivo. Não que a indústria vá admitir novos funcionários. Isso vai acontecer lá pelo segundo semestre. Mas acho que vai ser o início da retomada.

Segundo Barbato, alguns setores dentro da indústria eletrônica estão bem, como o de infraestrutura, que tem encomendas feitas no ano passado, e o de segurança, com grades, cercas e portões eletrônicos. Já a situação das empresas ligadas a bens de consumo duráveis é a mesma do fim de 2008, com uma demanda menor.

- Março vai ser sintomático. Vai ter reposição e novos pedidos para as empresas ligadas à infraestrutura. Então, poderemos saber se teremos melhora ou se a produção vai ficar estável. Já para os bens de consumo duráveis, tem de ver como ficam os estoques - diz Barbato.

Mesmo com expectativa positiva para a volta da produção, Barbato diz que 2009 não terá crescimento, o que só deve ocorrer em 2010. Neste ano, a indústria eletrônica deve ficar no nível de 2007, o que, para ele, já seria bom para o setor. O presidente da Abit, Agnaldo Diniz Filho, diz que em fevereiro o setor exportou menos e vendeu menos para o mercado interno.

- A retomada do setor têxtil não vem agora, mas há sinais de melhoras em alguns setores, como jeans, o que já é alguma coisa.

A pesquisa da CNI trouxe a informação de que um número maior de indústrias está se dizendo atingida pela crise. Por isso, o dado de ontem deve ser visto com cautela. Luiz Roberto Cunha acha que um bom resultado para o Brasil é ficar no 0 a 0 no fim de 2009, mas isso só se a economia se recuperar no segundo semestre.

- Não quero derrubar o otimismo, mas vai ser difícil. Não acho que o Roubini está certo, que a crise vai durar 36 meses, mas ela vai demorar para acabar - diz ele, referindo-se ao economista americano que previu a crise e continua pessimista sobre a evolução da conjuntura econômica.

Lucro das empresas caiu à metade no final de 2008


Marcelo Rehder
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A crise reduziu à metade o lucro líquido das empresas brasileiras de capital aberto no quarto trimestre de 2008, em comparação com igual período de 2007. A queda do lucro é atribuída ao aumento de 363% nas despesas financeiras.

Lucro das empresas brasileiras cai 50%

A crise global reduziu à metade o lucro líquido das empresas de capital aberto no quarto trimestre de 2008, quando comparado com o de igual período de 2007. A conclusão é de um levantamento da empresa de informações financeiras Economática, com base nos balanços de 85 companhias não financeiras negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). A queda no lucro é atribuída ao impacto do aumento de 363% nas despesas financeiras líquidas das empresas.

"A valorização do dólar ante o real deu uma paulada nas finanças dessas empresas", disse Fernando Exel, presidente da Economática. No último trimestre de 2008, o dólar subiu 22%.

Boa parte das empresas de capital aberto estava endividada em moeda estrangeira, e a alta súbita do dólar, já no terceiro trimestre, fez sua dívida em reais ficar muito maior. Além disso, muitas delas são exportadoras e costumavam especular com derivativos, apostando na manutenção da valorização do real. Como a moeda brasileira se desvalorizou, elas perderam dinheiro com apostas em derivativos "tóxicos".

A despesa financeira líquida das 85 companhias analisadas somou R$ 9,132 bilhões , ante R$ 1,972 bilhão no último trimestre de 2007. "Elas começaram o ano com uma dívida financeira bruta de R$ 124,457 bilhões que cresceu para R$ 187,780 bilhões no fim de dezembro", diz Exel. A alta foi de 50,9%, sem a inflação do período.

O avanço da despesa financeira corroeu o lucro líquido das empresas, que desabou de R$ 8,701 bilhões, no quarto trimestre de 2007, para R$ 4,294 bilhões no último trimestre do ano passado - queda nominal de 50,6%.

Apesar das turbulências provocadas pela crise de crédito, a receita líquida das empresas teve crescimento médio nominal de 17,3%. Os analistas dizem que esse resultado se deve a uma continuidade da situação favorável no mercado doméstico que existia até o terceiro trimestre. O pior da crise, explicam, aconteceu em dezembro.

Não é à toa que os economistas não contam com uma melhora substancial na evolução do lucro das empresas no primeiro trimestre. "Se consideramos que o pior da crise começou a aparecer de forma intensa em dezembro, os três primeiros meses deste ano também vão ser muito ruins", disse Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.

Segundo ele, algumas indicações indiretas nesse sentido são dadas pelos números da atividade. "Os dados da produção industrial em janeiro sinalizam que, provavelmente, vai acontecer em fevereiro uma nova queda de 10%." Para Vale, "a queda do lucro deve se espalhar e atingir empresas que eventualmente não tenham tido resultado tão ruim no quarto trimestre de 2008".

Para Júlio Sérgio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, as empresas deverão voltar a apresentar queda nos lucros, porém não tão forte quanto no último trimestre de 2008.

Contenção de gastos vai afetar concursos públicos

Cristiane Jungblut
DEU EM O GLOBO

Governo suspenderá testes de seleção para mais de 4 mil vagas na União

Além de cancelar ou adiar reajustes prometidos a servidores para este ano, o governo suspenderá concursos públicos para conter os gastos diante da queda na arrecadação provocada pela crise global. Antes de protelar os reajustes, o governo faz estudos jurídicos para assegurar que não terá problemas na Justiça, apesar de um dispositivo legal permitir a suspensão dos aumentos em caso de queda na arrecadação. Sobre os concursos, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que serão mantidos apenas os considerados prioritários, como os da Educação. O governo já havia feito autorizações para 4.227 vagas.

Tombo do PIB arrasta concursos

Este ano, estava prevista seleção para preencher 4.227 vagas, em oito ministérios


Para conter os gastos diante de uma queda brusca na arrecadação em 2009, e do tombo de 3,6% no PIB do último trimestre de 2008, o governo vai anunciar a suspensão de novos concursos públicos, juntamente com a nova programação financeira, no fim deste mês. Estão previstos concursos este ano para oito ministérios, num total de 4.227 vagas, mas só os da área da Educação serão preservados. Outra medida que deverá ser adotada para enfrentar os efeitos da crise é a suspensão ou o adiamento do pagamento de parcelas futuras do reajuste concedido aos servidores, como publicou ontem O GLOBO e confirmou o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

No caso dos reajustes, no entanto, o governo iniciou uma série de consultas jurídicas para se assegurar de que não terá problemas futuros na Justiça, apesar de haver um dispositivo legal que condiciona os pagamentos ao desempenho da arrecadação.

- Não tomamos essa decisão (sobre reajustes) ainda, mas existe essa possibilidade. Até o mês de maio teremos uma posição, porque o reajuste é para ser concedido no mês de julho. Vamos decidir a tempo de avisar e ouvir todas as partes interessadas. A lei que aprovou estes reajustes prevê que, se houver uma queda muito grande da receita do governo, eles poderão ser postergados - disse Paulo Bernardo, em Curitiba, ao participar de solenidade de inauguração da nova sede do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região.

Maioria das vagas iria para a Fazenda

Com relação aos concursos, o ministro confirmou que serão mantidos apenas aqueles considerados prioritários, como os da Educação:

- Queremos ampliar as escolas técnicas e universidades.

O senador Delcídio Amaral (PT-MS), que foi relator do Orçamento da União para 2009, reconheceu que será difícil manter o ritmo de contratações diante dos efeitos da crise no Brasil.

- Quando cortei o Orçamento, fui muito criticado. Mas acho que, em função da queda na arrecadação, existem várias maneiras para se remanejar o Orçamento, como corte nas despesas de custeio. Uma delas poderia ser a de os concursos serem sobrestados ou se alongar o prazo da contratação - disse Delcídio, que já havia defendido a possibilidade de não se pagar os reajustes salariais.

Das 4.227 vagas já autorizadas pelo governo, 290 vão para a Educação, para substituir terceirizados, e a maior parte, 2.020, para o Ministério da Fazenda, entre outros. Além disso, está autorizada a nomeação de 900 pessoas no Ministério da Saúde, referente a concurso já realizado.

No caso dos reajustes, uma das preocupações agora é evitar problemas judiciais futuros. Apesar da resistência do presidente Lula em mexer com os servidores, os técnicos informaram ao Planalto que é grande a preocupação com a brusca queda na arrecadação em 2009 - que poderá chegar a R$50 bilhões.

O dispositivo que permite suspender os reajustes já é lei - foi aprovado na medida provisória 441, a última das quatro MPs editadas sobre os reajustes de civis e militares e foi convertida na lei 11.907, em outubro. Mas a análise que se faz na área jurídica é que não basta apenas suspender o pagamento em julho, mas também os seus efeitos, porque, senão, a Justiça poderá, se provocada, decidir que o reajuste deve ser retroativo.

MP pode mudar datas de reajuste

Para escapar da difícil tarefa de provar que falta dinheiro para os servidores, mas há verba para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e para fazer superávit nas contas públicas, por exemplo, está em estudo uma alternativa: não usar o mecanismo de suspensão do pagamento e, simplesmente, enviar ao Congresso medida provisória ou projeto de lei mudando as datas dos reajustes, antes que as tabelas entrem em vigor. Será, no final, uma decisão eminentemente política, segundo uma fonte do Planalto.

A oposição acusa o governo de ter aprovado um pacote de despesas para seu sucessor. O impacto em 2010 será de R$40,1 bilhões; em 2011 será de R$47,3 bilhões e, em 2012, será de R$47,8 bilhões, quando cessam os efeitos do reajuste.

- Se ele mantiver o custeio da máquina alto, vai ter que cortar no investimento. Não há mágica. Se isso acontecer, o PAC, que já está mal das pernas, vai ficar pior ainda - disse o deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP).

O líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), insiste:

- Temos compromissos com os aumentos que foram negociados e que estão sendo concedidos, e serão.

O impacto dos reajustes foi de R$11,2 bilhões em 2008 e será de R$29 bilhões este ano, segundo as contas do próprio governo. O artigo da lei diz que o cumprimento dos reajustes previstos para 2009, 2010 e 2011 "fica condicionado à existência de disponibilidade orçamentária e financeira para a realização da despesa", devendo o governo informar a inexistência de recursos até 60 dias antes da entrada em vigor das novas tabelas salariais.

Concursos que estavam previstos

Este ano, o governo federal já tinha autorizado a realização de concursos em oito ministérios, para preencher 4.227 vagas:

VAGAS NOS MINISTÉRIOS

AGRICULTURA: 279 vagas.

EDUCAÇÃO: 290 vagas, sendo 265 de agentes administrativos.

FAZENDA: 2.020 vagas, sendo 2.000 mil para o ministério e 20 para o Banco Central.

INTEGRAÇÃO NACIONAL: 293 vagas.

JUSTIÇA: 450 vagas, sendo 300 de analistas técnico-administrativos.

MEIO AMBIENTE: 200 vagas, sendo 125 para o Ibama e 75 para o Instituto Chico Mendes.

DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR: 263 vagas.

PLANEJAMENTO: 432 vagas, sendo 287 para o quadro de pessoal do ministério.

VAGAS TEMPORÁRIAS AUTORIZADAS: 280 vagas, sendo 50 na Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, da Presidência.

METAS NO ORÇAMENTO

CRIAÇÃO DE CARGOS NO PODER EXECUTIVO: 15.076 cargos.

PREENCHIMENTO DE CARGOS EM ABERTO NO PODER EXECUTIVO: 50.302, sendo 19.423 para substituição de pessoal terceirizado.

CUSTO TOTAL: R$1,2 bilhão.

TOTAL DA FOLHA EM 2009: R$168,7 bilhões.

Fonte: Ministério do Planejamento e Comissão Mista de Orçamento