sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Reflexão do dia - Luiz Sérgio Henriques

“Há aspectos ultrapassados e aspectos atualíssimos no pensamento de Gramsci, de modo que estudar este pensador é necessariamente um desafio para além de qualquer ortodoxia. O ponto de partida devem ser os problemas da democracia brasileira, admitindo-se que existe uma distância de tempo histórico, que não se pode desconhecer, entre Gramsci e o Brasil. Ainda que o estudioso deve estar atento a isso, se estiver de fato preocupado em utilizar o pensamento gramsciano como recurso para fazer avançar a democracia brasileira.”


Luiz Sérgio Henriques, editor de Gramsci e o Brasil, em Rural Semanal (UFRRJ), nº37 de novembro de 2009)

Merval Pereira:: Próximos e distantes

DEU EM O GLOBO

Toda a estratégia do governador de Minas Gerais, Aécio Neves, na árdua negociação política para se transformar em uma opção viável do PSDB para a eleição de presidente da República no ano que vem está baseada na sua capacidade de dialogar com adversários e de agregar apoios, como destacou na mensagem publicada na coluna de ontem. O objetivo seria construir um ambiente propício ao convívio de contrários, especialmente PT e PSDB, que há 20 anos polarizam a política nacional. A preocupação de Aécio é que o pós-Lula seja vivido num clima de radicalização entre os dois partidos, cuja origem paulista explicaria, em grande parte, esse embate e caracterizaria uma visão provinciana da política.

O próximo presidente, seja qual for, pode ter muita dificuldade de governar se não for ultrapassado esse obstáculo, e, sendo o governador paulista José Serra, a dificuldade seria maior ainda, justamente por representar o grupo tucano que domina a política paulista, em contraponto aos petistas, adversários que vêm sendo permanentemente batidos no estado.

Juntando-se a isso, há o que o cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC do Rio, define como “a frustração dos mineiros”, que ajudaram a tirar os paulistas do poder em 1930 e os recolocaram de volta em 1994.

Ele ressalta que São Paulo, o principal estado brasileiro, ficou fora do comando da federação por 64 anos: de 1930 a 1994, tirando os nove meses de Jânio Quadros e o período dos militares, “isso porque mineiros e gaúchos se uniram contra os paulistas”.

O candidato do ex-presidente Itamar Franco à sua sucessão era o deputado federal Antonio Britto, político gaúcho, revivendo a velha aliança de Minas com o Rio Grande do Sul. E, como Britto não quis, ele apoiou Fernando Henrique, esperando voltar à política do “café com leite”, e se sentiu traído pela reeleição.

“Fernando Henrique fez com Itamar a mesma coisa que Washington Luiz em 1929, quando não apoiou Antonio Carlos, presidente de Minas”, relembra Romero Jacob, para concluir: “É claro que existe em Minas uma certa decepção”.

Para ele, é possível que, ao escolher a ministra Dilma Rousseff para candidata oficial à sua sucessão, o presidente Lula tenha levado em conta não apenas suas qualidades de gestão, ou o fato de ser uma mulher.

A questão regional também deve ter pesado, diz Jacob: Dilma é uma política do Rio Grande do Sul, e, para sorte do projeto político governista, nasceu em Minas Gerais.

Com sua indicação, Lula quebrou a hegemonia paulista dos últimos 16 anos, onde ele e Fernando Henrique, dois políticos paulistas, exerceram a Presidência da República.

E é o que Aécio Neves tenta fazer dentro do PSDB.

O apoio do deputado Ciro Gomes deve ser entendido dentro dessa lógica, mas continuo considerando que foi um erro estratégico, pois Ciro transformou o grupo paulista do PSDB no inimigo a ser batido, e Aécio, mesmo sem a intenção, associou-se a ele.

As semelhanças entre PT e PSDB estão explicitadas no programa econômico do governo Lula, que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acaba de definir, em entrevista ao jornal espanhol “El País”, como uma política social-democrata, e pelos programas sociais, que tiveram início no governo tucano e foram ampliadas na gestão Lula, com a união de todos eles sob o guardachuva do Bolsa Família.

Continuidade destacada pela revista inglesa “The Economist”, na reportagem de capa sobre o Brasil, que lembra que o governo Fernando Henrique, com a implantação do Plano Real, estabilizou a economia, controlou a inflação e deu condições a que o governo Lula pudesse fazer uma política de crescimento econômico com distribuição de renda, aproveitando-se dos anos dourados da economia mundial.

Mas o decorrer do governo Lula também mostrou diferenças acentuadas entre a maneira de ver o Estado do PT e do PSDB, reforçando as separações para além da simples disputa eleitoral.

Uma das diferenças fundamentais é que o PSDB acha que programa social bom é aquele que diminui a cada ano. Reduzir o número de famílias atendidas pelo Bolsa Família significaria que elas teriam sido incluídas no mercado de trabalho, o que demonstraria o sucesso do programa.

O governo Lula, ao contrário, festeja o aumento para 11 milhões dos bolsistas, numa visão assistencialista.

O aumento da máquina estatal, e seu aparelhamento pelos sindicalistas e militantes petistas, é outro ponto de discordância entre os dois grupos políticos.

O PT diz que fortalece a máquina estatal, desmontada pela visão neoliberal do PSDB, e os tucanos acusam os petistas de usarem politicamente o Estado, abrindo mão da eficiência e não evitando desperdícios do dinheiro público.

Ao dizer que não tem condições intelectuais para redigir a decisão do Supremo sobre o caso Cesare Battisti, o relator, ministro Cezar Peluso, procura, pela ironia, ressaltar a incongruência da decisão de extraditar o italiano, mas permitir que o presidente da República não cumpra os acordos internacionais firmados pelo país.

A destacar o fato de que essa dicotomia foi uma estratégia da defesa que, perdida a causa central, “inventou” a polêmica. Todos os ministros que votaram a favor de Battisti votaram também por dar a decisão final ao presidente.

O único incoerente foi o ministro Ayres Britto, que votou pela extradição, mas abriu a brecha para que Cesare Battisti possa ficar no Brasil.

Difícil vai ser o presidente Lula encontrar um jeito de ficar bem com a esquerda e, ao mesmo tempo, com o governo italiano.

Dora Kramer:: Presente de grego

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para quem não gosta de arbitrar, tem horror a críticas e cultiva o hábito de ficar longe de qualquer coisa que lhe possa render danos à imagem, a atribuição de decidir sobre o destino do italiano Cesare Battisti é dos males talvez o maior - e mais desnecessário - já enfrentado pelo presidente Luiz Inácio da Silva.

Um legítimo presente de grego entregue por quem compartilha da tese, já defendida anteriormente pelo presidente, de que o ex-ativista corre risco de ser morto na Itália e, portanto, por razões humanitárias deve permanecer no Brasil: o ministro da Justiça, Tarso Genro, os ministros do Supremo Tribunal Federal que votaram contra o pedido de extradição e o ministro Ayres Britto, que se juntou a eles na segunda parte da questão.

O titular da pasta da Justiça, cuja motivação humanística não alcançou os dois esportistas cubanos mandados de volta à ditadura de Fidel Castro por causa das boas relações dos atuais ocupantes do poder com o ditador, imbuiu-se do espírito de herói da resistência e resolveu contrariar a decisão do órgão que decide essas questões tecnicamente em seu ministério.

Contrariou também decisões anteriores da Justiça italiana, que condenou Battisti por quatro homicídios; da Justiça francesa, que aprovou sua extradição no período em que esteve escondido por lá; contrariou também decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos, que não enxergou em Battisti o que Tarso Genro viu nele, mas não viu nos pugilistas cubanos: a figura de um perseguido a ser protegido da crueldade do regime em seu país de origem.

Tarso Genro bancou a concessão do refúgio, depois considerado ilegal pela Justiça brasileira, que também decidiu que os crimes não estavam prescritos e que a motivação política não servia de justificativa para assassinatos.

Muita gente no governo que outrora foi partidária da luta armada entende diferente.

Encaminhado assim de maneira torta o assunto, ficou subentendido que "progressistas" torcem pela permanência de Battisti e "conservadores" - ou, como se tornou convencional dizer, "golpistas" - acham que o governo italiano está sem seu pleno direito no exercício das normas do Estado de Direito, onde forças de todos os matizes apelam pela extradição.

Visto sob essa ótica pseudoideológica, o desfecho do caso teria representado uma vitória para o ministro da Justiça, que desde o primeiro momento manifestava opinião de que a última palavra deveria ser do presidente Lula.

Mas, do ponto de vista do presidente, a situação é de puro enrosco. Uma tarefa que lhe cai nas mãos sem que tenha hipótese de se desincumbir dela sem perdas.

Não é verdade que a decisão de não decidir de forma terminativa tenha transformado o STF numa entidade figurativa. O julgamento do pedido de extradição permitiu que todos tomassem conhecimento das variantes envolvidas e não se ficasse apenas na base da palavra do ministro contra as alegações do governo italiano.

Ficou patente, pela sentença favorável à extradição, que Battisti não se enquadrava no perfil do refugiado, até porque estava clandestino no Brasil, onde entrou com documentos falsos e não mediante um pedido formal de abrigo. Sua condição é de fugitivo da Justiça.

Tanto que responde a processo por falsidade ideológica, um dos argumentos do ministro da Justiça para que se estenda a permanência dele e que a extradição só seja resolvida após o fim da ação.

Tal dilema de dimensão internacional foi posto justamente no colo de um presidente que não investiu em reformas internas - previdenciária, tributária, política, sindical e trabalhista - para não despertar conflitos nem amealhar inimigos para poder transitar como generosa unanimidade ao longo de dois mandatos.

Ao fim do último se vê numa encruzilhada: ou segue a orientação do Supremo ou se confronta com uma questão diplomática que pode resultar em denúncia perante cortes internacionais.

Os italianos

Reunidos ontem para avaliar a decisão do Supremo, os advogados contratados pelo governo da Itália decidiram aguardar a publicação do acórdão. Depois disso, aguardarão o prazo legal de 20 dias prorrogáveis por mais 20, durante o qual o presidente Lula deverá se pronunciar.

Se o presidente optar por manter Battisti no Brasil terá de justificar juridicamente a decisão nos termos do acordo bilateral de extradição, mas, segundo os advogados, terá de obter a aceitação da Itália. Caso isso não aconteça, como é provável, o governo italiano poderá denunciar o tratado e acusar o Brasil de ferir a Convenção de Bruxelas.

A partir daí, se houver insistência, o Brasil pode sofrer penalidades e, internamente, o presidente é passível da acusação por crime de responsabilidade, pois o tratado de extradição foi aprovado pelo Congresso, sancionado pelo então presidente Itamar Franco e tem força de lei federal.

Eliane Cantanhêde:: Zé Eduardo x Zé Eduardo

DEU EM NA FOLHA DE S. PAULO

A coincidência entre os dois nomes mais fortes para presidir o PT, no domingo, não fica só no nome. Um se chama José Eduardo Dutra, e o outro, José Eduardo Cardozo. A tendência é Dutra ganhar em primeiro turno ou disputar um segundo com Cardozo, seguido de perto por Geraldo Magela. Ao todo, são seis candidatos.

Os dois Zé Eduardo eram do Campo Majoritário, corrente que precedeu a eleição de Lula e era moderada, pragmática, decidida a ganhar a qualquer custo. Liderada por José Dirceu, defendeu o maior leque possível de alianças para Lula e abraçou vigorosamente o empresário José Alencar para vice.

Dutra, 52, vem do movimento sindical, como Lula. Geólogo mineiro, fez carreira política em Sergipe e na Petrobras. No primeiro mandato de Lula, presidiu a própria empresa. No segundo, a BR Distribuidora, sua subsidiária. Foi assim que ele se aproximou de Dilma Rousseff, ministra de Minas e Energia e membro do conselho da Petrobras até virar gerentona do governo. Dez entre dez petistas dão de barato que Dutra tem apoio de Dilma e do próprio Lula.

O outro Zé Eduardo, o Cardozo, 50, vem do movimento estudantil. Paulista, professor de direito constitucional da PUC-SP, onde estudou, ele defende algo como menos militantes fugazes e mais compromissos sólidos. Pode-se ler: menos sindicalismo, mais ideologia.Tem apoio, por exemplo, do ministro Tarso Genro.

Pergunte-se aos dois o que os separa. Dutra ri: "He, he. Essa é uma questão difícil de responder".
No fundo, eles são bons caras e parecidos. Isolando-se a barafunda de tendência e siglas internas que nem o PT entende mais, todos querem: recuperar a imagem (inclusive a autoimagem) do partido, eleger Dilma e manter os rumos do governo Lula e os imensos espaços na máquina pública. Ah. E meter o "mensalão" no fundo do baú. Até Lula reescrever a história.

Fernando de Barros e Silva:: Filme C

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Como "2 Filhos de Francisco", "Lula, o Filho do Brasil" é um filme sobre a superação. Ambos os enredos têm origem em histórias verídicas de brasileiros que, nascidos na miséria e sem perspectivas pela frente, conseguem contornar as adversidades para ascender socialmente, até atingir os píncaros da glória individual e o ápice do reconhecimento público.

A trajetória que vai da miséria ao estrelato é parecida, mas, no primeiro caso, os personagens são uma dupla sertaneja e, no segundo, o presidente da República, o que muda as coisas de figura. O pai deste Lula da Silva não é "Francisco", mas "o Brasil".

Se a expressão "filme B" designa as produções rudimentares, o cinema menor destinado ao consumo ligeiro, parece que agora estamos diante de um novo fenômeno: o "filme C". Com "Lula, o Filho do Brasil", o melodrama épico da vitória pessoal sobre a pobreza se converte em ideologia de uma época.

Esse gênero de entretenimento com mensagem social e intenção edificante já está presente em "2 Filhos de Francisco", mas ganhou agora sua versão oficial com o carimbo do Planalto.

A oportunidade vislumbrada pelo clã Barreto para lavar a égua e o estímulo de Lula a tudo o que possa resultar no culto à sua personalidade estão associados numa obra que vai alimentar a confusão entre a sorte de um indivíduo e o destino de um povo.

Em 1982, em sua primeira campanha eleitoral, quando disputou o governo de São Paulo, Lula dizia ser "um brasileiro igualzinho a você". Anos depois, diria, em tom de ironia:

"Ninguém queria ser um brasileiro igual a mim".

Hoje as coisas mudaram. É provável que a classe C emergente, a quem o filme parece ser didaticamente dirigido, se reconheça e se emocione diante da tela.

O Brasil continua a ser o país em que a desigualdade ainda imensa convive com infinitas formas de mobilidade social. Mas estamos avançando. Quem nos diz é esse filme simplesmente horroroso.

Vinicius Torres Freire:: Desigualdades, de FHC a Lula

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Desigualdade econômica regional caiu mais sob FHC, mas mudança não é efeito direto de ações de governo

A DESIGUALDADE econômica entre Estados e regiões diminuiu mais nos anos FHC do que nos anos Lula, segundo dados divulgados nesta semana pelo IBGE.

Decerto não foi intenção de nenhum dos dois puxar a sardinha econômica para esta ou aquela região. Nem a mudança é efeito direto da ação de governos. Políticas públicas têm efeito lento e retardado na alteração das diferenças econômicas regionais, se tanto, quando não têm consequências inesperadas. Além do mais, certos fatores que influenciam o destino de regiões estão fora do alcance de governos, como as andanças da economia mundial.

Nos anos Lula, houve grande alarido sobre o progresso econômico do Nordeste. Mas, a julgar pelos dados do PIB, a região andou apenas um tico mais rápido que o "Sul rico" entre 2003 e 2007. Os dados recentes e o recálculo do PIB desde 1995 reforçam a impressão de que algumas mudanças ocorridas entre 1990 e 1995 é que deram origem a alguns deslocamentos produtivos no país ao longo da década seguinte.

O PIB per capita no Nordeste equivalia a 42,3% do PIB per capita nacional em 1995, 46,44% em 2002 e ainda estava quase por aí em 2007 (46,66%). O do Sul foi de 108,6% em 1995 para 114,76% em 2002 e também quase estacionou: equivalia a 114,51% da média nacional em 2007.

De 1995 a 2002 foi a região Sudeste que "cedeu" participação no PIB. As mudanças maiores, essas e outras, ocorreram entre meados dos 90 até os anos da retomada do crescimento do país, no governo Lula.

A abertura comercial de 1990 (Collor) a 1994 (Itamar & FHC) e o real forte de FHC 1 avariaram alguns setores industriais e obrigaram outros a partir de centros como São Paulo.

Sujeitas à competição do importado de melhor qualidade e/ou mais barato, as empresas tiveram de se mexer. Algumas se mudavam à procura de salários menores, sindicatos fracos ou inexistentes, subsídios estaduais, impostos menores ("guerra fiscal") e de outras reduções de custo -em alguns setores, a confusão metropolitana é um custo.

Outras empresas procuravam ficar mais próximas de centros de fornecimento de matérias-primas ou se mudaram com seus fornecedores, caso de indústrias de alimentos que migraram para o Centro-Oeste.

Trata-se aqui da indústria de transformação ("fábricas") e não da indústria total, que inclui a indústria extrativa (como petróleo). Costuma-se ouvir que a indústria paulista perdeu bastante participação na produção nacional. Nem tanto. Na indústria total, São Paulo tinha 44,5% do valor da produção em 1995; em 2007, 35,4%. Mas, no caso da indústria de transformação, a "queda" foi de 48,7% para 44,4%.

"Queda", entre aspas, pois na verdade houve um grande crescimento da indústria extrativa, em especial no Rio de Janeiro (petróleo).

O Nordeste ganhou uma fatia magra da indústria -foi de 7,94% para 8,84% do total nacional. Mas 95% desse incremento ficou na Bahia, que tem sua petroquímica e implantou uma indústria de automóveis.

Claro que não é só de indústria que se faz um país. O Centro-Oeste, por exemplo, no período cresceu quase o dobro do Sudeste -enriquece com a agropecuária. Mas é preciso achar um norte para o Nordeste.

PSDB e DEM tentam aproximar Serra e Maia

DEU EM O GLOBO

Cúpula dos dois partidos quer evitar desgaste da aliança

Gerson Camarotti

BRASÍLIA. Preocupados com o acirramento da briga entre o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), e o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), tucanos e democratas passaram a atuar como bombeiros para refazer a relação entre os dois. Já há uma tentativa de reaproximação, como ficou claro numa conversa reservada entre Serra e o deputado ACM Neto (DEM-BA), no apartamento do presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), na noite de quarta-feira.

O jantar foi em homenagem a Guerra, e Serra estava de passagem por Brasília para encontros com integrantes da cúpula do Judiciário. Segundo relatos de presentes, ACM Neto manifestou preocupação em reaproximar Serra de Maia.

— Foi um encontro casual com o Serra. Agora, não trato pela imprensa de conversas que são privadas — desconversou ACM Neto, amigo de Maia, que disse ter sido levado ao jantar pelo deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA), amigo de Serra.

Na cúpula dos dois partidos o entendimento é que, se a briga for mantida, haverá grande prejuízo nas eleições de 2010. Tanto, que na próxima semana, Guerra e Maia devem almoçar, com ampla publicidade, para demonstrar unidade.

Nas últimas semanas, o clima de beligerância aumentou com a declaração do ex-prefeito do Rio Cesar Maia de que Serra lembrava os piores caudilhos.

Tucano vai alçar voo em janeiro

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Após intensa pressão de aliados e setores do próprio partido, o PSDB deve definir daqui a dois meses o nome que disputará a Presidência da República em 2010. Sonho da cúpula da legenda era compor chapa puro-sangue entre Serra e Aécio, mas hipótese está descartada

Daniela Lima


Ganha corpo dentro do PSDB a tese de que até janeiro o partido apresentará um nome para concorrer ao Palácio do Planalto nas próximas eleições. A legenda hoje sofre com a pressão interna e de siglas aliadas pela indicação de um candidato. Falta convencer os principais envolvidos no assunto, os governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), de que essa é uma boa estratégia.

A vontade de que o partido defina logo seu candidato tem apoio de 20 dos 22 dirigentes regionais do PSDB que participaram do encontro na última quarta-feira, na sede da sigla em Brasília. Eles externaram preocupação com os palanques estaduais. Os tucanos se preocupam muito, por exemplo, com o Rio de Janeiro, onde a demora no apontamento do nome está fazendo com que adversários políticos ganhem espaço nas negociações com possíveis aliados.

Para que janeiro seja o mês da revelação tucana, há um trabalho muito forte na cúpula do partido pela recomposição das relações entre Serra e Aécio. Ambos são pré-candidatos à Presidência em 2010. O sonho de dirigentes nacionais do PSDB é que Serra e Aécio componham uma chapa puro-sangue nas eleições. O anseio foi o propulsor dos seminários em que os dois pré-candidatos dividiram espaço. Mas esse trabalho de aproximação sofreu grande desgaste nos últimos meses.

Em outubro, líderes do Democratas — partido aliado — foram a público pedir ao PSDB que apresentasse o nome do candidato o mais cedo possível. Esbarraram na vontade de José Serra, que lidera as pesquisas de intenção de voto no país. O governador paulista quer estender ao máximo a apresentação de um nome. Com isso, ganha mais tempo como gestor de um dos estados mais importantes do país, e adia o confronto — e eventuais desgastes — no embate com a candidata do PT, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Aécio, que divide o apoio de Serra com o DEM mas conta com aliados em partidos como PTB e PP, por exemplo, iniciou conversas com representantes de outras legendas. A capacidade de aglutinação do governador mineiro é um de seus pontos mais fortes no jogo eleitoral. O mais polêmico desses encontros, com o pré-candidato do PSB, o deputado federal Ciro Gomes (CE), rendeu muito dentro do partido. Aécio amenizou a repercussão. Disse que não pode deixar de receber políticos de outras legendas por conta da proximidade do processo eleitoral e descartou qualquer tentativa de fragilizar ou pressionar o governador José Serra com isso. “Faço política conversando”, destacou.

Os que defendem a apresentação de um nome até janeiro se esmeram na reconstrução das relações entre Serra e Aécio, e avaliam a postura do governador mineiro como um avanço nesse sentido. Torcem para que, até dezembro, as conversas entre os dois estejam mais azeitadas. Se não for possível fechar um palanque puro-sangue, querem evitar que um trabalhe contra o outro após a escolha do partido. “Eles terão que se acertar. Com os dois juntos, ganhamos as eleições. Se concorrerem separados, teremos um processo muito difícil”, avaliou um dos nomes mais influentes do partido.

Serra e Aécio ainda divergem sobre quando anunciar nome

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Em resposta aos diretórios estaduais do PSDB, que querem antecipar a escolha do candidato a presidente para janeiro de 2010, o governador de São Paulo, José Serra, afirmou ontem que não vai se envolver em campanha até as vésperas do prazo de desincompatibilização, que será em abril do ano que vem. Na contramão de Serra, o outro presidenciável do partido, o governador mineiro, Aécio Neves, aproveitou a cobrança dos dirigentes para voltar a pedir a antecipação do processo.

Reunidos em Brasília anteontem, os presidentes de diretórios regionais cobraram uma definição rápida sobre o candidato a presidente. A cúpula do PSDB não é contra a escolha ocorrer no máximo até janeiro, mas conta com a resistência de Serra, que não quer antecipar o debate eleitoral. Para os diretórios estaduais, a definição ajudaria a articular alianças para montar palanque dos candidatos a governador nos Estados.

"Não há necessidade de estarmos discutindo uma data", disse Serra, em Curitiba. Segundo ele, neste ano houve antecipação muito grande da campanha. "No que se refere a mim, particularmente, estou concentrado na minha ação como governador, que é um trabalho bastante complexo."

Aécio, por sua vez, aproveitou a cobrança dos diretórios para afirmar que percebe "certa ansiedade" entre os aliados nas viagens que tem feito pelo País. Para ele, a questão deve ser resolvida até janeiro. "Os entendimentos regionais, estaduais, dependem de alguma forma de uma palavra do eventual futuro presidente da República, pelo menos na expectativa dos companheiros. E, portanto, isso tem feito falta", declarou o governador de Minas, em Juiz de Fora, onde visitou o ex-presidente Itamar Franco (PPS).

O tucano mineiro não considerou vitória pessoal a avaliação dos dirigentes regionais. Frisou que respeita a decisão de Serra, mas voltou a afirmar que, após o prazo que estabeleceu, caso não consiga se viabilizar como candidato, se dedicará "muito e profundamente" à sua sucessão em Minas.

"Não sou um ser isolado na política. Eu represento um conjunto de forças. Tenho buscado apresentar alternativas ao meu partido. Alternativas de uma candidatura que pode, eventualmente, acoplar algumas outras forças políticas para o embate que não será fácil", ressaltou.

Nesta semana, Aécio cumpriu agenda em Belo Horizonte com o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), também pré-candidato ao Planalto e desafeto declarado de Serra. Esse encontro gerou muito descontentamento em setores do PSDB.

Questionado ontem sobre o encontro com Ciro, que disse abrir mão de sua candidatura para apoiar Aécio, Serra afirmou não ver problema. "A questão fundamental é que nós estamos unidos, nossa relação é de amizade, é de paz e de unidade."

CONVÊNIO

Serra esteve em Curitiba para assinar um convênio de cooperação para troca de informações técnicas em programas habitacionais e participou do lançamento de um programa de atendimento à saúde da mulher. Saudado pelo prefeito de Curitiba, Beto Richa (PSDB), como "o melhor ministro da Saúde do mundo", Serra discursou para aproximadamente 2 mil pessoas, falando do que fez quando presidiu a pasta.

Richa negou que fosse um evento de campanha. "Serra esteve várias vezes em Curitiba, esteve com o governador do Estado há uns dois meses e agora está conosco, sempre neste tratado de cooperação, anunciando parcerias, trazendo boas novas para Curitiba e o Paraná."

Informe JB :: Leandro Mazzini

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Submersa

A cúpula do PPS visitou Denise Frossard no Rio há 20 dias. Disse que ela é candidata ao que desejar. Voltaram para casa, e não entendem até agora o silêncio da ex-deputada.

Insônia

José Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência da República, disse a um amigo que está muito preocupado com o partido sem candidato no Rio.

Carlos Lessa:: Não há racismo no Brasil

DEU EM O DIA /RJ

Professor e economista

Rio - Não entendo um Dia Nacional da Consciência Negra. Creio que seria mais correto Dia de Repúdio à Escravidão, ou Dia de Afirmação do Exercício da Liberdade. Porque, senão, seria necessário também um Dia da Consciência Branca, da Consciência Nissei e tantos outros diante dos inúmeros grupos étnicos que formam o País. Não podemos copiar os Estados Unidos, que são uma sociedade toda segmentada.

O Dia Nacional da Consciência Negra limita a importância de Zumbi, que deve ser cultuado como herói nacional da defesa da liberdade, no mesmo patamar de outros exemplos da nacionalidade, como José Bonifácio e Tiradentes, por exemplo.

Afinal, o Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, não reproduzia uma estrutura africana e não era refúgio apenas para negros fugindo da escravidão. Era território que abrigava também mestiços, índios e brancos que buscavam a liberdade de viver e trabalhar por conta própria fora de uma estrutura, a colonial, em que trabalhador não tinha direitos.

É claro que a escravidão negra é a dimensão mais trágica da história social e econômica do Brasil, e suas consequências podem ser sentidas ainda hoje. Mas a profundidade das relações sociais no Brasil não pode ser reduzida à condição de raça.

Convivemos, por exemplo, com o ‘complexo de sinhazinha’ em que um segmento da sociedade, mesmo com escolaridade e boa renda, joga lixo no chão, na convicção de que recolhê-lo é obrigação de uma classe mais baixa.

O Dia da Consciência Negra não se justifica. Melhor seria dar a Zumbi o papel que merece na história do Brasil: de herói que trabalhou pela liberdade e que, como líder, acolheu gente de todas as cores, unidos pelo desejo de se libertar dos grilhões impostos por uma estrutura social perversa.

PMDB dissidente propõe Requião como candidato à Presidência

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Vandson Lima De São Paulo

Descontentes com o acordo selado no plano nacional com o PT, setores do PMDB contrários à aliança organizam-se para lançar, amanhã, em Curitiba, o nome do governador do Paraná, Roberto Requião, à disputa presidencial.

Mais do que viabilizar uma candidatura própria, o evento enuncia a insatisfação de uma parcela do PMDB, não conformada em apoiar a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT).

Para o senador Pedro Simon (RS), que confIrmou presença no encontro, lançar o nome de Requião é também uma maneira de forçar o partido a cravar apoios apenas na convenção nacional, em 2010: "Sou um defensor da candidatura própria. Mas, mesmo que apoiemos um candidato, isso precisa passar por uma ampla consulta às bases, o que não está ocorrendo. Essa candidatura é também um ato de contraposição a uma minoria, que está tentando decidir pelo todo, sem o consultar". O encontro não deve contar com pemedebistas que ocupam, hoje, cargos em ministérios e na Executiva.

Sem disputar a Presidência desde 1994, quando o ex-governador paulista Orestes Quércia foi o quarto colocado na disputa, o PMDB tem desde então oferecido o apoio de sua bancada, a maior do Congresso Nacional, a quem estiver no governo. Em 2002, o ex-presidente e então governador de Minas Gerais Itamar Franco, hoje no PPS, tentou lançar-se à disputa, afIrmando, à época, que sua candidatura tinha como objetivo unir o PMDB para mantê-Io longe das "manobras ardilosas" do presidente Fernando Henrique Cardoso, que estaria tentando influir nas decisões partidárias, mantendo o PMDB subordinado. Não conseguiu convencer o partido, deixando a cargo do então presidente do partido, senador Maguito Vilela (GO), a missão de ler, em plenário, uma correspondência sua, onde abdicava da disputa.

Pedro Simon alega que, apesar da hipótese de repetição daquele episódio, a candidatura de Requião poderia movimentar a disputa e a relação de forças quanto a apoios: "O PMDB deve ter candidato no primeiro turno e depois discutir quem apoiará no segundo, é nisso que acredito. O Requião é um nome que esquentaria a campanha. Ele é fã do Lula e argumenta que pode ser o candidato do presidente se for para o segundo turno".

Nove presidentes regionais já confirmaram presença no encontro. Além deles, o ex-ministro Mangabeira Unger, outro defensor da candidatura própria, também estará presente.

Lideranças regionais do PSDB cobram definição de nome

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Cristiane Agostine, de Brasília

Os dirigentes estaduais do PSDB reuniram-se, em Brasília, com o presidente do partido, senador Sérgio Guerra (PE), na quarta-feira, e cobraram o lançamento do candidato à Presidência da República o mais rápido possível. Nem José Serra nem Aécio Neves, governadores de São Paulo e Minas Gerais e pré-candidatos, participaram do encontro em Brasília. O governador de São Paulo, no entanto, estava em Brasília e encontrou-se, depois da reunião, com Guerra, deputados e senadores do PSDB.

Em jantar na casa do presidente do partido, os tucanos conversaram com Serra sobre a eleição presidencial, o lançamento do candidato e a manutenção da aliança com o DEM.

"O desejo do partido é que o entendimento venha de uma conversa entre Serra e Aécio", disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que participou do jantar e acompanhou o governador paulista em viagem ao Paraná. "Há muita ansiedade do partido para definir logo quem será o candidato e quando será lançado. Mas o prazo será definido por eles", disse Dias.

Ontem estava previsto um almoço entre lideranças do PSDB e DEM, para minimizar divergências geradas com críticas feitas pelo presidente do DEM, Rodrigo Maia, e seu pai, Cesar Maia, ex-prefeito do Rio. O encontro foi adiado para a próxima semana, porque o presidente do PSDB retornou a Pernambuco. "Estamos unidos", disse Guerra.

Aécio, que vem aumentando a pressão pela definição até dezembro, voltou a falar ontem do assunto para destacar que tem a mesma opinião dos dirigentes estaduais, mas mesmo após a reunião, as divergências continuam. Serra mantém a data do fim do prazo de desincompatibilização, em março de 2010, para anunciar sua candidatura.

"O argumento dos dirigentes estaduais é que o governo já lançou sua candidata e precisamos combatê-la. Mas não vamos apressar a escolha", disse ontem Sérgio Guerra.

Aécio Neves reafirmou, também ontem, seu desejo de definir logo o candidato. Ele disse sentir a pressão nos Estados pela indicação do nome para a construção de alianças regionais.

"Os entendimentos regionais, estaduais dependem de alguma forma de uma palavra do eventual futuro presidente da República, pelo menos na expectativa dos nossos companheiros. E, portanto, isso tem feito falta.", disse o governador ontem, em Juiz de Fora, Minas Gerais.

PSDB quer Serra

DEU EM O GLOBO
Panorama Político :: Ilimar Franco

O governador José Serra (PSDB-SP) tem a preferência de seu partido para ser o candidato à Presidência.

Foi o que disse a maioria dos presidentes de diretórios regionais, reunidos anteontem em Brasília.

Eles explicaram que essa não era uma manifestação de vontade, mas uma constatação. “O nome do Serra está na boca dos eleitores”, resumiu um dos integrantes da executiva tucana.

PT vai às urnas na tentativa de sobreviver a Lula

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Caio Junqueira, de São Paulo

Os filiados que o PT convoca para a eleição interna neste domingo vão, mais do que escolher a direção que conduzirá o partido na disputa de 2010, dar início à retomada do protagonismo petista num horizonte em que, pela primeira vez, Luiz Inácio Lula da Silva não é presidente ou candidato. A tentativa do PT é agregar a popularidade lulista e retomar a autonomia na relação com o Palácio do Planalto, que o partido pretende continuar ocupando a partir de 2011.

Sob o governo Lula, o partido cresceu. Passou de 828,7 mil filiados em 2002 para 1,35 milhão no Processo de Eleições Diretas (PED) deste domingo. No Executivo, passou de 174 prefeitos para 545 e de 3 governadores para 5. No Senado, de 7 para 10, mas minguou na Câmara Federal. Elegeu em 2006 seis deputados a menos do que em 2002.

O desafio de imediato é, a partir da candidatura da ministra Dilma Rousseff, impor a hegemonia do partido frente à aliança partidária que lhe dará sustentação.

A aliança com o PMDB e com outros partidos que não os históricos aliados à esquerda (PCdoB, PSB e PDT) é amplamente defendida pelos candidatos no PED, em diferentes escalas de maior ou menor simpatia. Nenhum deles, porém, abre mão das rédeas da elaboração do programa de governo de Dilma.

A mais do que provável eleição já em primeiro turno do ex-presidente da Petrobras e da BR Distribuidora José Eduardo Dutra é o retrato mais acabado desse momento do partido. Carioca de nascimento, foi senador por Sergipe entre 1995 e 2002, mas nunca teve grande atuação na máquina partidária petista. Os cargos que desempenhou no governo o aproximaram de Dilma e o PT conta com isso para que sua relação com ela difira da relação submissa que tem com Lula.

"Não adianta querer ser protagonista se não tiver voto, por isso a prioridade também é aumentar as bancadas", afirma Dutra, que não acredita em grandes alterações na relação do partido com o Planalto no pós-Lula. "Será um governo de coalizão, assim como este".

A ausência de Lula, porém, tem sido ventilada pelas hostes petistas. "É um cenário novo porque coloca em prova o que sempre defendemos: ter várias lideranças. Todo partido quer sempre ter mais presença, mas não há uma obsessão em crescer no governo", afirma o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini.

O fato de a eleição ser dada como certa em 1º turno - a primeira desde José Dirceu em 2001 - explica-se por uma reaproximação de forças que não se compunham desde o mensalão, em 2005, e deixou em alerta as correntes adversárias.

O que ficou conhecido como Campo Majoritário, cujo núcleo de poder esteve na cúpula do governo e do partido no primeiro mandato de Lula - Antonio Palocci, Luiz Gushiken, José Genoino, Delúbio Soares e Dirceu -, hoje está rebatizado de Construindo um Novo Brasil (CNB) e lança Dutra presidente com o apoio de antigos integrantes: a corrente Novo Rumo, de Marta Suplicy, e a PT de Lutas e de Massas, de Jilmar Tatto. Juntos, os mais otimistas falam que o grupo pode chegar a 60% dos votos.

Para esses grupos, a aliança pró-Dutra é uma convergência em nome do projeto Dilma. Para as outras candidaturas, é mais uma tática eleitoral para manter a maioria que sempre deu as cartas no partido no momento em que se configura um futuro incerto sem a presença de Lula.

"Ninguém sabe qual será o impacto de Dilma presidente sobre a vida interna do PT. É evidente que os ex-integrantes do Campo Majoritário pensaram nisto quando buscaram montar uma chapa única para o PED: querem se fortalecer para atuar num ambiente desconhecido", afirma o secretário de Relações Internacionais do PT, Valter Pomar.

Para ele, a melhor mostra de que se trata de uma tática eleitoral, e não de unidade, é a diferença entre os partidários de Dutra quanto a apoiar ou não a candidatura do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) ao governo paulista. Pomar integra a corrente Articulação de Esquerda, cuja candidata a presidente é a deputada Iriny Lopes (ES). A previsão é de que ela tenha 15% dos votos.

A vitória no 1º turno dependerá da mobilização dos filiados nos principais colégios eleitorais: SP, RJ, MG, BA, RS e BA. São nesses locais que a CNB tem mais força. Em se mantendo o patamar de votação de 30% das últimas eleições, a vitória é tida como certa. Mas o otimismo em demasia preocupa dirigentes. Muitos filiados, por acreditarem nisso, não vão votar.

Candidato pela segunda vez, o deputado José Eduardo Martins Cardozo (SP), da corrente Mensagem ao Partido -uma dissidência do antigo Campo Majoritário- avalia que há chances reais de 2º turno. "Estamos confiantes. E se houver, pode ter mudanças profundas no quadro", diz.

Ao lado do deputado federal pelo DF e candidato pela corrente Movimento PT, Geraldo Magela, Cardoso concentra-se na crítica à forma como a CNB conduz o partido. As duas correntes avaliam que, em geral, a hegemonia do ex-Campo permanece, embora com "cara e jeito diferentes". Integrantes do Movimento acreditam na possibilidade de chegar a 14% dos votos.

Havendo segundo turno, as chances de as correntes minoritárias terem maior participação interna aumentaria, embora a atual direção garanta que isso já ocorra. A candidata da AE, deputada Iriny Lopes (ES), aposta que o PT, qualquer que seja o resultado de sua disputa interna, deve focar a busca pelo protagonismo não apenas pelo poder, mas para comandar uma efetiva discussão programática.

"A importância do PT não será medida pelos ministérios, mas na articulação no Congresso e sobretudo na condução do programa de governo. O PT será fortalecido na medida em que tiver participação na construção do projeto vencedor numa terceira etapa", diz.

Berzoini garante que essa terceira etapa terá a participação de todas as correntes. "É pouco relevante fazer mais de 50% dos votos. O que importa é valorizar todas as chapas". Pode ser o prenúncio de uma nova fase do PT. Se Dilma vencer as eleições.

Minas e Rio terão as disputas mais decisivas da legenda

DEU NO VALOR ECONÔMICO

César Felício e Paola de Moura, de Belo Horizonte e do Rio

É em Minas Gerais e no Rio que o PT terá as disputas mais decisivas do Processo de Eleições Diretas deste domingo. A divisão entre os cerca de 40 mil filiados do PT mineiro aptos a votar é menor do que aparenta a inscrição de cinco candidatos a presidente do diretório estadual e 12 chapas locais. Em maior ou menor grau, todas as alas do partido defendem a candidatura própria ao governo estadual nas eleições do próximo ano e não há dissidência em relação ao apoio à candidatura presidencial da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. A única disputa real é entre as candidaturas ao governo estadual do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel e do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias. Os aliados de Pimentel são os favoritos para vencer as eleições de domingo.

Pimentel já conta com o apoio do deputado federal Reginaldo Lopes, presidente do diretório estadual, e do dirigente Aluisio Marques, presidente do diretório municipal. Lopes deve ser reeleito e o vice-prefeito de Belo Horizonte, Roberto de Carvalho, um aliado de Pimentel, deve ganhar a eleição municipal. A vitória dos aliados do ex-prefeito é tão provável que sua estratégia é tentar converter a eleição de domingo em uma prévia da escolha do futuro candidato ao governo.

Em todos os últimos embates internos, ficou nítido que Patrus e seus principais aliados, como o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, contam com mais sustentação na cúpula nacional petista, enquanto Pimentel é hegemônico em Minas.

A eleição direta do PT em Minas não deverá impedir a realização de prévias no próximo ano. Os aliados de Patrus já sinalizaram que o ministro permanecerá candidato independente do resultado da disputa interna. "Os colégios eleitorais da eleição interna e da primária não são idênticos", afirmou o secretário nacional de Comunicação do PT, Gleber Naime, que concorre com o apoio de Patrus à presidência estadual da sigla. Um trunfo do ministro é o maior apoio entre os detentores de cargo eletivos, em movimentos sociais e em partidos aliados.

Patrus e Dulci estão em um grupo que conta ainda com o ex-secretário nacional de Direitos Humanos Nilmário Miranda, dois deputados federais, cinco estaduais e os prefeitos de Betim, Governador Valadares e Teófilo Otoni. Patrus ainda conta com a CUT regional. O ministro participa da mesma chapa nacional dos ex-deputados federais José Dirceu e Marta Suplicy, do secretário particular da Presidência, Gilberto Carvalho, e do deputado federal José Genoino.

O ministro tem a simpatia de lideranças de todos os possíveis aliados em 2010 em Minas, com a exceção do PSB, que prefere Pimentel. Mas o ex-prefeito tem cerca do dobro das intenções de voto a Patrus nas pesquisas. E conta com quatro deputados federais e três estaduais, entre eles Cecília Ferramenta que ao lado do marido Chico, comanda as bases de Ipatinga, cidade com o maior número de petistas.

No Rio, o PED reedita disputas históricas com a direção nacional. Parte do PT do Rio tenta novamente se insurgir e lançar candidatura própria ao governo do Estado. O prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Farias, lançou-se como um dos concorrentes do atual governador Sérgio Cabral e é apoiado por Vladimir Palmeira e pelo deputado Carlos Santanna. No entanto, o destino é quase certo: "Se a direção do PT não concordar, acabou", afirma o líder do PT na Câmara, o deputado Cândido Vaccarezza (SP), que acrescenta que não existe PT do Rio ou de São Paulo, "só existe o PT nacional".

No PED do domingo, dos cinco candidatos a presidente estadual, dois apoiam a proposta de Lindberg e um a da aliança com Garotinho. O prefeito alega que, para Dilma, uma candidatura independente seria o melhor dos mundos, já que, teoricamente, ela teria três palanques no Estado: PT, PMDB e PR de Garotinho. Com entusiasmo, Lindberg diz já ter o apoio do PDT, do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) e do PSC. "O PT está muito submisso, mendigando no pé do PMDB", afirmou o prefeito.

Lindberg garante que ainda não foi pressionado pela direção nacional. "Lula até hoje não falou nada". Mas admite já ter tido conversas com o deputado federal Ricardo Berzoini (SP) e com o ex-ministro José Dirceu. "Mas eles não me pressionam porque sabem que não adianta". Aliado do prefeito na luta pela candidatura, Vladimir Palmeira, que, em 1998, após vencer a candidatura regional para governador, teve que abandonar o projeto e engolir uma aliança com o PDT de Brizola e Garotinho, acredita no projeto de Lindberg. "O Cabral não cumpriu nenhuma das cinco promessas que nos fez", reclama Palmeira. Entre elas a de dar acesso ao núcleo do poder e de não fazer indicações na secretaria dada ao partido. Palmeira também acredita que o PT nacional desta vez não vai se intrometer. "Eles vão ter que brigar com o PT de Minas, do Rio Grande do Sul e da Bahia".

Carlos Santanna, deputado federal mais antigo do PT no Rio, com cinco mandatos é mais radical: "O PT do Rio é um partido de cartório, que não participa da luta da sociedade. Temos que ter posição". Santanna está otimista quanto à vitória do grupo que apoia Lindberg. "Nós vencemos duas vezes nas eleições para o tempo de TV", referindo-se às votações na executiva e no diretório que deu ao prefeito direito a 30 das 40 inserções que o PT do Rio terá na programação dos canais abertos de TV a partir de quarta-feira.

Há, no entanto, quem discorde de Lindberg. O deputado federal Antonio Carlos Biscaia é a favor da aliança com o governador Cabral. "Vejo aspectos positivos no governo, mas não gosto do lado impositivo que não negocia a candidatura e diz que a chapa será Cabral, Pesão e Picciani". No entanto, o deputado acredita que a aliança é melhor para o partido. Biscaia ainda levanta dúvidas sobre o projeto de Lindberg. "Mesmo que o grupo dele vença, temos que ver qual a real intenção. Pode ser que depois, queira negociar", questionou. Biscaia, no entanto, afirma que a decisão do PT do Rio deve ser respeitada - "Não admito intervenção nacional".

Vaccarezza, acredita que esta intevenção não vai ser necessária . "É apenas uma vontade do Lindberg. Tenho a sensação de que a aliança com Cabral sairá vitoriosa no domingo", diz o deputado.

Luiz Carlos Mendonça de Barros:: Real forte chega à exportação de primários

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Certamente os associados da Fiesp e da CNI vão ganhar novos companheiros na luta para enfraquecer o real

A ATENÇÃO quanto aos efeitos negativos da valorização do real estava até agora restrita ao setor industrial, principalmente nos segmentos voltados para a exportação. Não por outra razão são os órgãos representativos da indústria os que mais reclamam e pedem uma ação mais decisiva do governo.

Os exportadores de produtos primários estavam -até agora- protegidos da taxa de câmbio valorizada por uma nova lógica de mercado: os preços em dólar desses produtos subiam na proporção da valorização do real e de outras moedas emergentes. Durante vários meses, os índices que medem os preços das principais commodities, quando calculados em real, apresentavam uma estabilidade monótona, apesar das grandes oscilações do câmbio.

Com a aceleração recente da desvalorização do dólar em razão da percepção de que os juros nos Estados Unidos devem continuar muito baixos em 2010, essa mágica se desfez. Com isso, o valor em real dos produtos primários exportados pelo Brasil começou a ser afetado.

Nesta última semana, o jornal "Valor" trouxe extensa reportagem sobre os preços da carne bovina no Brasil e em outros países exportadores que competem conosco.

A arroba do boi custa hoje US$ 44,50 para os frigoríficos brasileiros, valor equivalente ao que vigora nos Estados Unidos. Na Argentina -grande concorrente do Brasil nos mercados internacionais-, os frigoríficos pagam menos de US$ 30 pela mesma arroba. O mesmo ocorre no Uruguai (US$ 34,60) e na Austrália (US$ 38,60). Mesmo com os preços em dólar mais baixos, os criadores nesses países continuam a receber o mesmo valor em moeda local e estão felizes da vida. No Brasil, os criadores terão de aceitar menos reais por arroba para viabilizar as exportações de carne.

O mesmo fenômeno -perda expressiva de competitividade- está ocorrendo no setor de carne de frango por conta da taxa de câmbio. Nesse segmento, as empresas americanas -que são mais eficientes do que as brasileiras- têm escala de produção que permite aumentar sua presença nos principais mercados consumidores. Da mesma forma, produtos como soja e seus derivados e café também têm seus preços em real deprimidos em razão da moeda brasileira cada vez mais forte. Certamente os associados da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e da CNI (Confederação Nacional da Indústria) vão ganhar novos companheiros na luta para enfraquecer o real nos próximos meses.

Em todos os setores exportadores e nos segmentos mais sujeitos à concorrência das importações, estamos assistindo a uma transferência de renda das empresas para os consumidores, por meio dos preços mais baixos de produtos industriais e alimentícios. Os índices medidos no atacado nos últimos meses mostram esse fenômeno de forma clara, tanto na cadeia industrial como na maioria dos produtos agrícolas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aconselhou os exportadores mais prejudicados a ganharem competitividade para enfrentar a realidade de uma moeda nacional forte.

Esquece ele que, para que isso ocorra, o governo precisa mudar sua forma de organizar o gasto orçamentário. Somente com investimentos em infraestrutura, principalmente na cadeia logística de exportação e importação, e mudanças profundas na estrutura tributária do setor exportador será possível esse movimento por maior eficiência. Está mais do que na hora de uma melhor execução da política fiscal, com menores gastos de custeio e mais investimentos.

Luiz Carlos Mendonça de Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

Miriam Leitão:: Ciência e tempo

DEU EM O GLOBO

O ministro inglês do Meio Ambiente, Hilary Benn, está convencido de que a reunião de Copenhague será bem-sucedida. “A ciência é clara, e o tempo é curto.” Benn passou esta semana no Brasil e fez elogios ao país e ao presidente Lula, que mostrou “liderança” ao anunciar compromissos de corte de gases de efeito estufa. Ele disse que haverá financiamento dos países ricos

Ele me disse que não entendeu o comunicado da Apec, Cooperação Econômica Ásia e Pacífico, como um sinal de que China e Estados Unidos querem adiar o acordo do clima: — Não creio que eles queiram adiar. Eles discutiram até que ponto é possível se resolver as questões em Copenhague para se chegar a um acordo legalmente obrigatório. O que está claro é que precisamos de um acordo forte, e o que foi discutido na Apec não muda isso, porque a ciência é clara, e o tempo é curto.

Entrevistei o ministro num programa que foi ontem ao ar na Globonews e repete hoje às 8h30m e 16h30m. Ele disse que na reunião de cúpula do clima os países precisarão dizer claramente que compromissos estão dispostos a aceitar.

Explicou que a Europa já disse que vai chegar a 2020 emitindo 20% menos do que em 1990. A Inglaterra foi além, propôs 34% e promete chegar a 2050 emitindo 80% menos do que em 1990: — É essencial termos a contribuição dos Estados Unidos. As pessoas precisam colocar os números na mesa. Para fazer um tratado válido, um país vai olhar para o outro e dizer: “o que você vai dar? O que vai oferecer?” Quando somarmos todas as ofertas feitas, poderemos ver se é o bastante para evitar uma perigosa mudança climática.

Não faz sentido que os líderes digam assim: “vou prometer ao meu povo que faremos isso, mas estou relutante em assinar um acordo internacional.” Hilary Benn vem acompanhando essa negociação há algum tempo como parlamentar ligado à causa ambiental, antes de ser ministro, e por isso tem uma visão concreta de quanto se avançou.

Lembrou que nos EUA, anos atrás, o governo até negava a existência da mudança climática e hoje está disposto a negociar. Entre os avanços dos últimos anos, ele inclui o Brasil: — O Brasil mostrou um grande progresso. O índice de desmatamento hoje é um quarto do que era há cinco anos. Foi muito bem recebido o comunicado do presidente Lula em nome do Brasil, semana passada, porque mostra liderança de verdade, que é o que queremos em Copenhague.

Lembrei a ele que o desmatamento caiu, mas 7.000 km2 é uma área equivalente a 4.4 vezes o tamanho da área metropolitana de Londres: — É uma área imensa, mas se há 10 anos alguém dissesse que seria possível reduzir a um quarto a área desmatada em cinco anos, ninguém acreditaria. É muito importante na nossa missão reconhecer quanto é feito de progresso. Ainda falta muito? Falta. Já demonstramos que temos capacidade de fazer as mudanças necessárias? Acho que sim.

Acha que hoje há progressos em proteção de florestas, em uso de energia, em posição política, em compreensão científica, em decisão de agir dos governos.

O governo inglês — ressaltou — foi o primeiro a ter uma lei climática, a ter um orçamento de carbono para a própria administração pública. Funciona assim: cada órgão do governo tem que cumprir uma meta de redução das emissões em suas atividades.

O ministro admite que se uma parte do acordo de Copenhague será o esforço de cada país, a segunda parte envolverá financiamento para que países em desenvolvimento possam fazer sua transição: — As economias emergentes e em desenvolvimento perguntam, e com razão: como pagaremos pela baixa emissão de carbono, pelas novas tecnologias e mudanças necessárias? Sem dúvida, isso tem que fazer parte do acordo. Na última cúpula, o primeiroministro Gordon Brown disse que até 2020 o apoio financeiro tem que ser de US$ 100 bilhões por ano e viria de fontes públicas e de fontes privadas através do mercado de carbono.

Ele acha que não faz sentido que os grandes emergentes, que são também grande emissores de gases estufa, não tenham que cumprir meta, e que países como China, Brasil e Índia sejam tratados da mesma forma que os países pobres: — A China e o Mali são países inteiramente diferentes, com um grau de responsabilidade diferente.

Londres vai sediar as Olimpíadas em 2012, e eu perguntei como ele vai assegurar a Olimpíada sustentável.

Ele disse que isso tem que ser pensado desde o começo. Contou, por exemplo, que em vez de usar caminhões para levar material de construção para Vila Olímpica, eles usaram barcos e foram pelo Rio Tâmisa.

E que só isso já reduziu muito o volume das emissões. O segredo de uma Olimpíada verde é pensar desde o início do projeto.

Antes de começar a entrevista, eu disse que o número dos céticos, os que não acreditam em mudança climática, está diminuindo a tal ponto que eles já são uma espécie em extinção.

Ele deu uma boa gargalhada e admitiu: — Eu me preocupo em proteger as espécies, mas sobre essa, em particular, acho que não devo me preocupar.

Com Alvaro Gribel

Mauro Santayana:: Aldo Moro, Battisti e o “compromisso histórico”

DEU NO JORNAL DO BRASIL

O caso Battisti evoca trágica experiência política do século passado. Os episódios de 1978, que causaram a morte de Aldo Moro, ocorreram diante da insanidade dos extremos e da incapacidade de as elites se reunirem no centro político, que Berliguer e Moro propunham com o seu Compromisso Histórico.

Moro era um católico que estava à esquerda de De Gasperi e de Giulio Andreotti, próximo de pensadores franceses identificados na esquerda, como Jacques Maritain – que provavelmente conhecera, quando o filósofo tomista fora embaixador junto ao Vaticano, entre 1945 e 1948. Ele temia que o confronto ideológico, no movimento católico, impedisse o governo de centro na jovem República italiana. Como líder de sua corrente – a dos “doroteanos” – que dispunha de ponderável votação, Moro participou dos governos democrata-cristãos até 1976, quando a ala direita se impôs com a entrega do governo a Giulio Andreotti, seu principal adversário. Entre 1976 e 1978, Moro articulou a retomada do entendimento entre os comunistas e os democrata-cristãos em busca de uma saída histórica, proposta por Enrico Berlinguer em 1973. O entendimento era combatido com vigor por Andreotti, pelo Vaticano, pela Máfia e pelos Estados Unidos.

Havia 12 anos que, com a criação da República, e o confronto entre as duas correntes partidárias, sob a influência das duas superpotências, a Itália estivera à margem da guerra civil. Em 1978 – com a reabilitação do pensamento de Gramsci, e dez anos depois da invasão de Praga, que eles combateram – os comunistas italianos já estavam muito mais distantes dos soviéticos na construção do diálogo com os cristãos e do eurocomunismo. A situação estava madura para que a Itália se livrasse dos efeitos da Guerra Fria e buscasse um projeto nacional de desenvolvimento e de presença mais forte na Comunidade Europeia que se formava. Nos meses que antecedem o sequestro e a morte de Aldo Moro surge o estranho movimento das Brigadas Vermelhas. O grupo, conforme voz corrente, era liderado pela chefia misteriosa de um Gran Vecchio. Embora, na época, Andreotti não tivesse ainda 60 anos (nascera em 1919), seu porte encurvado dava-lhe aparência bem mais idosa. Há indícios de que as Brigadas teriam sido criadas por Andreotti, com a ajuda da Máfia, da CIA e dos serviços secretos italianos a fim de impedir, com atos de terrorismo, o “Compromesso Storico”, de centro-esquerda. Dele foi aliado intransigente Francesco Cossiga, hoje irado defensor da extradição de Battisti.

A quem, realmente, serviam as Brigadas Vermelhas, que seguiam, na retórica política, a Rote Armee Fraktion, do grupo Baaden-Meinhof da Alemanha? Sabe-se, pelo relato dos sequestradores de Moro, que os dois grupos se encontraram algumas vezes em Paris, mas os italianos tinham meta precisa: combater o entendimento entre comunistas e os democrata-cristãos de Moro. Qualquer amador em política poderia deduzir que o sequestro de Moro, por um grupo que se apresentava como de esquerda, seria um grande trunfo para a direita. É sempre bom lembrar o exemplo do agente cabo Anselmo, aqui no Brasil. Os brigadistas queriam a liberdade de 13 dos seus, em troca da vida de Moro. Cossiga e Andreotti a isso se opuseram, apesar dos apelos dramáticos do ex-primeiro-ministro ao governo e até do papa Paulo VI, de quem era amigo pessoal.

Battisti pertencia a um grupo à margem das Brigadas Vermelhas, mas a serviço do mesmo objetivo. É provável que esse grupo fosse constituído de fanáticos, que agiam sem outras ligações, ou de simples inocentes úteis, recrutados pelos seguidores de Gran Vecchio. Em qualquer caso, foi instrumento de interesses muito maiores do que ele, muito maiores do que os do pequeno bando de alucinados de que fazia parte. Com seus vagos ideais aos 22 anos, ou cooptado pelos agentes da direita, dissimulados como de esquerda, o que é comum, é um homem acabado, condenado à prisão perpétua e à privação do sol. É provável que o presidente Lula esteja informado dessas circunstâncias históricas, na hora de decidir o destino de Battisti.

Em tempo: Andreotti foi condenado, em 2002, a 24 anos de prisão por ter, em associação com a Máfia, mandado matar o jornalista Mino Pecorelli, que iria publicar documentos provando seu envolvimento no assassinato de Moro. Tendo em vista sua idade, a Suprema Corte livrou-o da cadeia.

NAZIM HIKMET (20/11/1901 - 30/6/1963)

O governo turco aboliu dia 5 de janeiro, deste ano, por decreto, a decisão que, em 1951, retirou a nacionalidade turca ao poeta Nazim Hikmet, nascido em 20/11/1901 e falecido em Moscou em 30/6/1963. A iniciativa equivale na prática a "devolver" a nacionalidade ao poeta depois de morto.

Hikmet é considerado o mais famoso dos poetas turcos e um dos mais destacados do século XX. Além de poeta, foi também dramaturgo, novelista e biógrafo. Ativista político, pertenceu ao Partido Comunista Turco, passou no exílio ou na prisão muito tempo da sua vida adulta.

Leiam um dos seus poemas:

NOSTALGIA

Cem anos se passaram sem ver teu rosto
enlaçar tua cintura
deter-me em teus olhos
perguntar à tua clarividência
ou aproximar-me do calor de teu ventre.

Faz 100 anos que em uma cidade

uma mulher me espera.

Estávamos na mesma rama, na mesma rama.
Caímos da mesma rama, nos separamos.
Cem anos nos separam
cem anos de caminho.

Faz cem anos que na penumbra
corro atrás dela.

STF não consegue explicar decisão sobre caso Battisti

DEU EM O GLOBO

Ministro Tarso Genro diz que há um "fascismo galopante" na Itália

Depois da polêmica decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de aprovar a extradição do italiano Cesare Battisti mas decidir que a palavra final caberá ao presidente Lula, o relator do caso, ministro Cezar Peluso, deixou clara sua irritação com o resultado do julgamento. Peluso disse que não tem condição de redigir o texto do acórdão que resumirá a decisão final. "Não tenho condições intelectuais de sequer resumir com inteira fidelidade o douto raciocínio da maioria", reclamou. Para esclarecer dúvidas sobre as consequências práticas do julgamento, a defesa do governo da Itália anunciou que entrará com embargos de declaração no STF. Também no Senado o resultado foi criticado: "O Supremo lavou as mãos, se desmoralizou", disse Demóstenes Torres (DEM-GO). Juristas divergiram sobre o caso. O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse que a decisãode Lula deve demorar, e denunciou que há "um fascismo galopante" na Itália.

Julgamento e discórdia no STF

Depois de Gilmar, Peluso reclama da decisão de dar a Lula palavra final sobre extradição

Carolina Brígido BRASÍLIA

Um dia após o julgamento do processo de extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti, o Supremo Tribunal Federal deu demonstrações de que ainda não tinha digerido a polêmica sessão de anteontem. Integrantes do grupo derrotado na votação que garantiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o direito de dar a última palavra sobre o destino do italiano deram explícitas demonstrações de insatisfação.

No início da sessão, o relator do caso, ministro Cezar Peluso, mostrou irritação com o resultado do julgamento. Peluso disse que não tinha condição de redigir o texto do acórdão que resumirá a parte final dos votos dos colegas, em que eles deixam a decisão final com Lula.

— Não tenho condições intelectuais sequer se resumir com inteira fidelidade o douto raciocínio da maioria — protestou o relator.

Na primeira parte do julgamento, a Corte decidiu que era ilegal a condição de refugiado dada a Battisti pelo governo brasileiro. Depois, os ministros resolveram autorizar a extradição do italiano. No terceiro momento, ficou decidido que a palavra final sobre a extradição cabe ao presidente.

Nos dois primeiros aspectos, prevaleceu a vontade do relator. No terceiro item, Peluso foi derrotado. Ele defendeu que fosse obrigatório ao presidente seguir a determinação do STF. A votação terminou em cinco votos a quatro nas três etapas.

O ministro Marco Aurélio Mello, um dos que defenderam a permanência de Battisti no país como refugiado, sugeriu ontem que Carlos Ayres Britto redigisse o acórdão. Ayres Britto foi dos mais ferrenhos defensores de que Lula deve decidir sobre a extradição.

Por fim, Cármen Lúcia se ofereceu para ajudar Peluso a elaborar o texto.

Anteontem à noite, o presidente do STF, Gilmar Mendes, também manifestou contrariedade ao dizer que o julgamento — em que saiu derrotado — não tinha encerrado a polêmica.

Advogado reclama de contradições

Para esclarecer dúvidas sobre as consequências práticas do julgamento, a defesa do governo da Itália anunciou que entrará com embargos de declaração no Supremo. O advogado Nabor Bulhões quer que o STF entre em detalhes sobre todos os possíveis desdobramentos do caso Battisti. Essa medida será tomada após a publicação do acórdão da decisão, que não tem data prevista.

— Com relação àquele último incidente, foi uma questão muito mal discutida, confusamente tratada.

Houve incontornável obscuridade por parte de alguns ministros. Vários ministros fizeram manifestações contraditórias. As notas taquigráficas vão revelar isso com toda clareza.

Foram contradições sucessivas em espaço de minutos — disse.

Para Bulhões, o STF quis dizer com a decisão que Lula só pode se recusar a extraditar o réu se houver previsão específica em lei: — Não há de se entender que o Supremo tenha dito que o presidente pode descumprir a lei, a Constituição e o tratado bilateral. A Itália confia que o presidente cumpra o tratado.

O advogado de Battisti, Luís Roberto Barroso, disse confiar que seu cliente não será extraditado. No momento, ele reúne documentos e argumentos para apresentar ao presidente Lula a fim de influenciá-lo na decisão.

— Não tenho nenhuma razão para supor que o presidente da República vá tomar uma decisão política diversa daquela que já tomou. Minha expectativa é que o presidente ratifique a posição dele — afirmou.

Barroso ponderou que o tratado de extradição firmado entre Brasil e Itália prevê que o presidente deixe de extraditar um réu por motivo político: — É incorreto dizer que a decisão do presidente de não extraditar viola o tratado. Pelo contrário: há fundamento no tratado para que o presidente faça uma valoração sobre a entrega ou não do extraditando.