quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Reflexão do dia – Tibério Canuto

A julgar pela entrevista de Marco Aurélio Garcia – assessor internacional da presidência da República - à Folha de S. Paulo, as mudanças na política externa no governo Dilma serão apenas residuais. Garcia deu pistas de que continuará dando as cartas nesta área. Ou seja, continuará a dualidade de poder entre ele e o Ministério de Relações Exteriores em matéria de política externa. Pelas suas palavras, tire o cavalo da chuva quem pensou que a defesa dos Direitos Humanos estará no centro da política exterior de Dilma Rousseff.

CANUTO, Tibério. Blog Pitacos, 24/1/2011.

Há 19 anos atrás é formado o PPS, sucessor do PCB

Manifesto do PPS*

" Aos seres humanos que, por nascimento ou opção, habitam terras brasileiras,o PPS dedica seus 70 anos de lutas, e todas as lutas futuras "

Há uma crise, no mundo e no Brasil, e todos podemos senti-la. Uma crise que solapa a esperança, que chega ao fundo dos corações, gerando frustrações, descrença e cinismo. Frente aos desafios destes novos tempos, seu compromisso de luta por uma sociedade mais justa e mais humana, o X Congresso do PCB oferece à sociedade brasileira um novo instrumento de luta, o Partido Popular Socialista - PPS.

Um Partido que, desde sua formação, é plural, aberto à participação de todos os que acreditam que é possível, a todos os seres humanos, viverem iguais e livres. Um Partido que, num mundo de mudanças, assume o compromisso central com a vida, entendendo-a como indissociável da natureza e da cultura. Um Partido, que quer contribuir para a construção de uma nova ética, em que o ser humano, sem nenhuma discriminação, seja protagonista e beneficiário das transformações sociais.

Um Partido novo, democrático, socialista, que se inspire na herança humanista, libertária e solidária dos movimentos sociais e das lutas dos trabalhadores em nosso país e em todo o mundo, prolongando hoje a luta que travamos desde 1922. Um Partido que não use o povo, mas seja um instrumento para que cada cidadão seja sujeito de sua própria história. Um Partido socialista, humanista e libertário, que tenha como prática a radicalidade democrática, que permita a cada ser humano exercer sua plena cidadania, na área em que reside e no planeta em que habita.

Um Partido que tem como metodologia de ação política, a não violência ativa, e que repudia toda e qualquer forma de violência (econômica, racial, religiosa, física, psicológica etc). Um Partido que faz da eliminação da miséria a questão primeira de sua política. Porque enquanto houver um ser humano sem comida, sem moradia, sem educação ou sem as mínimas condições de acesso à saúde, nossa luta tem e terá razão de continuar.

Um Partido que defende que a propriedade dos meios de produção e de comunicação deve ser social, com propostas autogestivas, cogestivas e cooperativistas, contrapondo-se aos modelos neoliberais.Um Partido que se empenhará para que o desenvolvimento científico e tecnológico seja considerado prioridade nacional, pois como não haverá progresso social sem o amplo desenvolvimento científico e tecnológico.

Um Partido que tem como objetivo a reforma democrática do Estado para que ele não tutele, mas que seja controlado pelos cidadãos e pela sociedade.

Um Partido que luta por um programa radical de desenvolvimento que tenha o ser humano como sujeito e que seja capaz de eliminar a injusta distribuição de renda, acabando com a brutal concentração hoje existente. A consolidação da democracia política e a retomada do desenvolvimento, pondo fim à recessão e ao desemprego, são claras prioridades para a construção da cidadania.

Um Partido que lutará pela implantação do parlamentarismo, pelas reformas estruturais de que o país necessita e pela preservação dos direitos consagrados constitucionalmente. Um Partido que se dispõe a repensar tudo, 'mas que não abre, de forma alguma, seu compromisso de luta por uma sociedade mais justa e mais humana.

Um Partido que é e será um espaço aberto à participação de todos os que têm aspiração de construir essa sociedade. Um Partido que assume sem medo compromissos com o presente e o futuro, recusando a infalibilidade e o dogma, mas tendo em conta a experiência do passado.

Um Partido que não tem fórmulas prontas e acabadas, e que se propõe a discutir e formular um Projeto para a Nação Brasileira, com a colaboração de todas as forças do campo democrático. Esse é o desafio lançado a todos os militantes deste novo Partido e o convite a todos os que queiram nele se integrar.
* Manifesto de fundação do PPS. São Paulo/SP, 26 de janeiro de 1992.

Agricultura em xeque:: Merval Pereira

O Fórum Econômico Mundial começa hoje em Davos, na Suíça, tendo como um dos temas principais o apoio à agenda do G-20 - grupo que reúne as principais economias do mundo, entre as quais a do Brasil -, e como principal orador o presidente da França, Nicolas Sarkozy, que também preside o G-20. Ele apresentou na segunda-feira, em Paris, uma agenda de discussão que nos interessa diretamente, pois tem como objetivo central a regulação do mercado internacional de commodities, especialmente os produtos agrícolas.

A economia brasileira tem apresentado bons resultados principalmente devido ao apetite da China por commodities, o que tem feito os preços subirem.

Além do mais, o Brasil é dos maiores exportadores de produtos agrícolas, e teria seus interesses atingidos por uma regulação mundial de preços. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já afirmou que o país não aceita nenhuma regulação que vise a controlar os preços.

O presidente francês está centrando seu programa de ação no G-20 no apoio dos países europeus, e designou três líderes para coordenarem os trabalhos.

O presidente da Rússia, Dmitri Medvedev - que seria o orador da abertura do Fórum e cancelou sua viagem devido ao atentado no aeroporto de Moscou -, vai coordenar o grupo de trabalho sobre o mercado de matéria-prima, com especial atenção aos produtos agrícolas.

Um dos objetivos seria organizar uma estatística mais transparente sobre os estoques e o consumo, a fim de evitar especulações que elevam os preços.

Essa tarefa ficaria a cargo da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação). A Índia e a China resistem a divulgar informações que consideram "estratégicas", ao mesmo tempo em que Brasil e Estados Unidos se preocupam com movimentos que podem produzir críticas à produção dos biocombustíveis, acusada de ocupar terras que poderiam ser usadas para produção destinada à alimentação.

O primeiro-ministro da Inglaterra, James Cameron, será o coordenador do grupo que vai analisar a governança internacional e o papel do G-20, e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, vai coordenar o grupo que estudará a reforma do sistema monetário internacional.

O Fórum de Davos tem este ano o tema genérico de "Normas compartilhadas para uma nova realidade", que procura refletir a preocupação da maioria dos líderes de um mundo cada vez mais interconectado - e por isso mais complexo - e que, ao mesmo tempo, experimenta a erosão de valores e princípios, o que, na visão dos organizadores do Fórum, reduz a confiança da opinião pública nas lideranças, provocando instabilidade econômica e social.

O tema central foi dividido em quatro subtemas relacionados entre si - entre eles "Respondendo a uma nova realidade"; "Definição de políticas para um crescimento inclusivo"; "Criar uma rede de respostas a riscos" -; e o apoio à agenda do G-20, que é o que interessa mais de perto ao Brasil neste momento.

Para organizadores do Fórum, a importância do G-20 dependerá da habilidade para criar bases para um crescimento sustentável, equilibrado e inclusivo, depois que a recuperação da crise financeira estiver garantida, com um sistema financeiro mais resistente a crises. Já há uma concordância sobre o papel do G-20, hoje considerado o instrumento mais promissor para definir a nova governança num modelo multinacional de liderança, mesmo que sua legitimidade ainda seja questionada por alguns países.

A agenda do G-20, segundo o Fórum, inclui ainda a necessidade de uma maior interdependência entre os negócios e os governos, considerada fundamental para que os negócios continuem inovadores e ajudem a criar mais empregos, permitindo que os governos não se vejam tão sobrecarregados com os problemas internos e possam se dedicar mais às tarefas políticas de liderança nesse novo mundo multipolar.

Essa foi uma maneira sutil que os organizadores do Fórum Econômico encontraram para colocar em discussão a intervenção dos governos nas economias, o que provocou um problema fiscal na maior parte dos países, e o aumento da inflação mundial.

Fundamental para enfrentar essa nova realidade mundial será a busca de normas compartilhadas que possam ser utilizadas num mundo multipolar tanto por governos quanto por corporações multinacionais, permitindo que comportamentos inaceitáveis sejam vistos como tal em todos os mercados.

Essa seria a base para uma discussão mais ampla sobre a reforma do sistema monetário, que a chanceler alemã Angela Merkel vai coordenar a pedido de Sarkozy. Já está sendo organizado um seminário internacional que será realizado, não por acaso, na China.

O Fórum Econômico pretende ser o catalisador das discussões que dominarão o G-20 com relação à agenda do presidente francês para seu mandato na presidência do organismo, e estarão presentes nos debates de Davos todos os líderes europeus nela envolvidos, antecipando as posições que estarão em análise nos próximos meses, inclusive a regulação do mercado internacional de commodities.

A representação brasileira não terá a presença nem do ministro da Fazenda, Guido Mantega, nem do ministro da Agricultura, Wagner Rossi. Deverá caber ao chanceler Antonio Patriota a discussão política sobre o papel do G-20.

Também o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, e o do BNDES, Luciano Coutinho, terão papel importante na definição das posições brasileira com relação à exportação de matérias-primas.

Nesse contexto, ganhará maior importância a candidatura, já oficializada pelo Itamaraty, de José Graziano para a direção-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO).

Graziano, que já representa o Brasil na FAO, é homem de confiança do PT, tendo sido ministro responsável pelo programa Fome Zero, que acabou sendo substituído, no início do governo Lula, pelo Bolsa Família.

Diante da tentativa dos países desenvolvidos de controlar o mercado internacional de commodities, especialmente os produtos agrícolas, o cargo na FAO será um posto estratégico.

O governo brasileiro tem um histórico de insucessos na tentativa de ocupar cargos relevantes nos organismos internacionais, e é provável que mais uma vez se veja diante de uma reação à sua pretensão.

FONTE: O GLOBO

Tensão necessária:: Dora Kramer

Nota-se um evidente desconforto. No caso das centrais sindicais é mais do que isso: o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva, com a grosseria que o notabiliza, desafiou a presidente da República.

Fez advertências públicas a Dilma Rousseff ("cuidado, Fernando Henrique começou assim"), reclamou do tratamento considerado "distante" por parte dela aos companheiros sindicalistas e considerou "nefasta" a proposta do governo de reajustar a tabela do Imposto de Renda em troca de um salário mínimo de R$ 545 ou, no máximo, R$ 550.

Em outras entidades representativas do movimento social, como MST e UNE, para citar as mais visíveis, há uma inquietação para saber como Dilma vai se relacionar com um pessoal a quem o antecessor abriu as portas e, sobretudo, os cofres do governo.

Querem se articular com os sindicatos para organizar uma agenda com a qual possam influenciar nas decisões de governo.

Dizem auxiliares da presidente que a relação vai mudar bastante. Não informam como, quando nem em qual direção será a mudança. Mas as organizações já dão sinais claros de que não estão confortáveis com o gestual do início, expresso nas negociações do novo salário mínimo.

Para lidar com eles Dilma escalou o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Anteriormente essa interlocução também era feita na secretaria, mas por um chefe com muito menos prestígio e força política: Luiz Dulci, o redator dos discursos nunca lidos por Lula.

Resultado, o interlocutor era o próprio presidente. Agora não. Já se nota que o reforço no anteparo significa que será a secretaria-geral e não o gabinete da Presidência, a instância máxima de recurso.

Durante a campanha, sempre que lhe perguntavam o que achava da jornada de trabalho de 40 horas e outras reivindicações trabalhistas, Dilma respondia que essas eram questões importantes, mas não eram assuntos de governo.

Ou seja: deixou claros os limites e avisou aos navegantes que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Governos cuidam dos interesses gerais da sociedade e os segmentos, aí incluídas categorias profissionais, cuidam de suas respectivas reivindicações.

No governo anterior é que ocorreu a distorção: movimentos todos cooptados por meio de doação de verbas federais de diferentes maneiras e, por isso, usados na política como tropas de defesa do governo. Além dos partidos aliados, havia os movimentos coligados. E sustentados. Na nova administração, têm receio de perder espaço ou de precisar ocupá-lo da maneira adequada: do outro lado do balcão.

Afinal de contas movimentos de reivindicação não existem para atuar como tropas de defesa governista, mas para cobrar melhores ações de governos.

Uma tensão natural e até necessária para o bem de uma sociedade pluralista.

Cenografia. Pode falar o presidente da Itália, pode se manifestar o Parlamento europeu, podem os italianos ameaçar ir à Corte de Haia, mas nada disso tem o condão de fazer a presidente Dilma Rousseff mudar a decisão do antecessor de negar extradição a Cesare Battisti.

Seria admitir que Lula e parte dos atuais ministros - como o da Justiça - se equivocam ao considerar a permanência do italiano no Brasil uma questão de "soberania nacional". Seria, sobretudo, uma briga interna muito mais difícil de administrar que quaisquer protestos internacionais.

É possível que Battisti saiba muito bem disso pelas declarações que, da prisão, tem dado recentemente. Na última disse que quem se opõe à sua presença no País se opõe também ao ex-presidente Lula.

Correção. O ex-governador de Minas Aécio Neves pede para ser excluído da lista dos beneficiários de aposentadorias estaduais. "Nunca requeri nem vou requerer", informa.

Feita a justa correção, uma indagação: por que não usar sua força política no Estado para ajudar a revogar a lei que proíbe a divulgação dos nomes dos pensionistas em Minas?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Os paradoxos da política paulista:: Cristian Klein

São Paulo produz as maiores contradições

Há 16 anos, o confronto entre PT e PSDB molda e polariza a disputa presidencial de maneira que podemos dizer que à estabilidade econômica do país seguiu-se uma estabilidade do mercado eleitoral.

A estrutura de oportunidades consolidou-se e fechou-se para "outsiders" e partidos nanicos. Se é difícil para uma terceira via potente como o PMDB, que dirá para uma repetição de novos Collors ou PRNs, sintomas de desequilíbrios do sistema. Como era a hiperinflação para a economia.

A competição política brasileira é regida por essa lógica. Uma lógica paulista, criticada por políticos de outros Estados, mas que deu - mais rápido do que se imaginava - clareza para as decisões do eleitor, numa democracia recente e com quadro partidário fragmentado.

Há um paradoxo, porém: é justamente São Paulo que tem produzido algumas das maiores contradições do cenário político brasileiro, com um facciosismo capaz de dar nó nos neurônios de qualquer cidadão. Há uma reunião de práticas nada exemplares e sem hora para terminar. O jogo municipal para 2012 pôs o moinho a girar novamente, completando uma volta de intrigas e complicados cálculos políticos.

Três personagens principais - o prefeito, o atual governador e o ex, ambos correligionários - lideram o elenco de coadjuvantes que atuam num enredo cheio de surpresas e tramoias. O conteúdo dramático é rico, mas o significado político é pobre.

O prefeito quer trocar de legenda e já fez de sua transferência uma novela. E o partido que ajudou a dar estabilidade econômica e política no plano nacional se comporta como um estranho corpo com duas cabeças, ora comandado por uma, ora por outra. Um autêntico filme B.

Não há um PSDB. Mas uma legenda com dois caciques que travam conflito aberto, apesar das tentativas de aparentar civilidade. Se a sigla vencer em 2012, a informação só será completa se vier acompanhada de uma resposta à pergunta: serrista ou alckmista?

Em seu terceiro mandato como governador, Geraldo Alckmin dá as cartas de novo, depois de duas derrotas seguidas - para a Presidência, em 2006, e para a Prefeitura de São Paulo, em 2008. José Serra, depois de duas vitórias consecutivas - para a prefeitura, em 2004, e para o governo paulista, em 2006 -, volta ao limbo de não ter qualquer máquina sob seu comando, após perder a competição ao Planalto.

São fases opostas que refletem uma gangorra pela manutenção do espaço seguro de sobrevivência política, que é o Estado. E que tem como pano de fundo o salto ambicioso para Brasília. A origem da disputa entre Serra e Alckmin está aí.

Enquanto os longos bicos dos maiores tucanos paulistas estiveram virados para direções diferentes, não houve divergência. Mas o início da era Lula acabou por confinar os dois no mesmo ambiente.

Serra, desde os tempos da UNE, construiu uma carreira de orientação tipicamente nacional - própria (deputado federal, senador) e depois atrelada aos anos FHC (ministro) até 2002, quando perde a eleição para Lula. A partir de então, se vê obrigado a se voltar para o plano regional e se acotovelar com Alckmin. Ex-prefeito de Pindamonhangaba, Alckmin, por sua vez, cresceu como político de caráter regional. Mas seu avanço para a esfera nacional foi quase inevitável após governar o maior Estado do país. Ambição política natural, mas que colidiu com a de Serra.

O partido ficou pequeno para os dois desde que, numa noite de dezembro de 2005, em entrevista ao programa "Roda Viva" (TV Cultura), Alckmin pôs o pé na porta e se proclamou pré-candidato do PSDB à Presidência, atrapalhando os planos do correligionário.

A retaliação de Serra, que veio na eleição seguinte, municipal, marca o início da construção ilógica em que se transformou a política de São Paulo. A derrota de Alckmin para Gilberto Kassab (DEM) - reeleito com o apoio de Serra, de quem havia sido vice - criou a clivagem inusitada. Um PSDB alckmista e um PSDB serrista aliado a Kassab, cujo partido também se esfacela.

A troca de sinais é contínua. No fim do ano passado, na eleição para a presidência da Câmara, Kassab (DEM) apoiou o vereador José Police Neto (PSDB), contra o candidato de seu partido, Milton Leite (DEM), em reação à colaboração do parlamentar com a banda de Alckmin. Ou seja, as demarcações partidárias são nebulosas e o cenário incerto.

A confusão entre os donos do poder aumenta a imprevisibilidade da eleição de 2012, cheia de opções vindas de PT (Marta Suplicy e Aloizio Mercadante), PSB (Gabriel Chalita e Paulo Skaf), PP (Celso Russomano) e PV (Guilherme Leal). Sem direito à reeleição, Kassab insufla nomes de sua órbita, como Rodrigo Garcia, eleito deputado federal. Mas, com o imbróglio de sua ida para o PMDB, é provável que a legenda (ou seu grupo) não tenha força para lançar candidato competitivo. Sua pretensão de se eleger governador em 2014 passará inevitavelmente pelo colega tucano.

Serra até pode se lançar candidato para melhor abrigar seu grupo. Mas é improvável, depois da promessa feita na eleição de 2004, e não cumprida, de que não largaria o posto para concorrer a um cargo mais alto. Pesam também as movimentações de Alckmin, que procura dominar os diretórios estadual e municipal. A aposta maior é o senador eleito Aloysio Ferreira. Já o governador investe em secretários, como Bruno Covas (Meio Ambiente) e José Aníbal (Energia).

A medição de força entre dois grandes caciques políticos de um mesmo partido no mesmo Estado não é rara. Mas geralmente tem outras soluções. Por exemplo, a coexistência razoavelmente pacífica, como a que fez o PMDB paulista se dividir entre a atuação nacional de Michel Temer e a regional de Orestes Quércia. Ou a saída de um deles da legenda, como no PMDB fluminense, no qual Garotinho ficou sem espaço, com a eleição de Sérgio Cabral.

O esdrúxulo da situação paulista é a convivência forçada e turbulenta dos caciques e suas consequências. Curiosamente, há um paradoxo dentro do paradoxo que mostra o limite do personalismo. Serra e Alckmin enfrentam restrições. O custo de se mudar de partido, ainda mais de uma legenda como o PSDB, em seu comando central, pode ser alto demais.

Cristian Klein é repórter de Política. A titular da coluna, Rosângela Bittar, está em férias

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A busca do atrito zero: Fernando Rodrigues

Dilma Rousseff esteve ontem em São Paulo. Na sua breve passagem pela cidade, afagou dois líderes dos principais partidos de oposição, Geraldo Alckmin (PSDB) e Gilberto Kassab (DEM).

A presidente participou de uma homenagem a José Alencar, o ex-vice-presidente. Poderia ter ficado nas declarações protocolares ao citar quem estava presente. Preferiu optar por saudar Kassab "com muito carinho". Alckmin recebeu "um cumprimento especial".

Dilma foi explícita ao prometer "continuar" o "processo de investimentos" na cidade de São Paulo, quando se dirigia ao prefeito paulistano, Kassab. Ao governador Alckmin falou sobre "a parceria feita entre o governo federal e o governo do Estado".

Não custa lembrar que até agora só um governador foi recebido com pompa e circunstância por Dilma no Planalto, com direito a foto e outras deferências. Poderia ter sido alguém do PT ou do PMDB, mas o escolhido foi o mineiro Antonio Anastasia, do PSDB.

Tudo considerado, a presidente nessas suas primeiras semanas no cargo fez poucos gestos políticos públicos. Quando os fez, tratou de enviar afagos a líderes de partidos de oposição. Essa busca de atrito zero ou a aversão à fricção com seus adversários passa a ser uma marca do início da administração Dilma. Aliás, o noticiário tem sido mais farto sobre descontentes dilmistas do que oposicionistas.

Essa aliança entre o Planalto e os governadores pode ser útil para Dilma. Temas espinhosos como o aumento do salário mínimo desembocarão no Congresso. A solução pode ser mais suave se os Estados ajudarem a frear um aumento incompatível com as contas públicas.

Só será possível julgar a eficácia do estilo político de Dilma ao longo dos próximos meses. Por enquanto, só se nota uma grande diferença entre ela e seu antecessor, cujas menções recentes eram sobre "extirpar" partidos de oposição.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Por dentro do déficit:: Míriam Leitão

O Brasil fechou 2010 com um déficit em transações correntes que, em valor, é recorde, mas que poderia ser até pior. O superávit comercial reduziu o déficit, porque ficou acima do esperado, em US$20 bilhões. Olhando por dentro, no comércio brasileiro há muitas surpresas. Uma delas: o saldo comercial de uma única empresa, a Vale, foi de US$23 bilhões, maior do que o do Brasil.

Antigamente, qualquer déficit na conta corrente levava, depois de alguns anos, a uma crise cambial. Desta vez, o Brasil tem reservas enormes, uma dívida externa pequena, e a situação é bem diferente. Mas o país depende demais de alguns produtos e a alta das exportações aconteceu muito mais pelo aumento dos preços do que pelo volume exportado.

O país exportou US$201 bilhões em 2010. Em valor, foi um crescimento de 31%. Mas em volume, a alta foi de 14,2%. A exportação de açúcar subiu 50%, de US$8,6 bilhões para US$13 bilhões. Mas os preços foram negociados com alta de 31% e o volume cresceu 15%. A venda externa de carne teve alta de 15%, mas os preços subiram 13,9% e o volume, apenas 1,66%.

Nos principais produtos da pauta brasileira, o valor subiu mais que o volume. No minério de ferro, que sozinho representou 16,35% de nossas exportações, os preços subiram 75%, em média, enquanto o volume cresceu 18,16%.

O Brasil depende muito das matérias-primas e elas dependem da China. Do que a Vale produz, 87% são exportados, e desse total, 45% vão para a China. E o salto dos últimos anos foi dado basicamente pela elevação dos preços puxados pelos chineses. Nossas exportações ainda se concentram em matérias-primas para os países mais ricos e bens de capital para os latino-americanos. Da pauta de exportações, apenas 10% foram de bens de capital, e dos US$19,7 bilhões exportados nessa categoria, 46,8% foram para a América Latina. A China sozinha comprou US$30 bilhões de produtos brasileiros (13,72% do total), principalmente minério de ferro, petróleo e derivados, e soja.

O peso do minério de ferro fica mais evidente quando se olha para os resultados da Vale, que foi a empresa que mais exportou em 2010, à frente da Petrobras.

O diretor-executivo de finanças e RI da Vale, Guilherme Cavalcanti, diz que as exportações de matéria-prima são importantes para o financiamento do déficit em conta corrente, até para cobrir o rombo da necessidade de importação de máquinas e equipamentos.

- A Vale importa pouco e exporta muito. Então nosso superávit é importante para o país. A indústria brasileira precisa de tempo para aumentar a competitividade, com importação de bens de capital. O pré-sal também terá um período de forte importação de equipamentos até conseguir exportar. Então, o superávit que o minério de ferro está promovendo dará fôlego a esse processo. Não fosse o minério, teríamos déficit na balança comercial e um déficit em conta corrente maior. Não podemos desprezar a exportação de matéria-prima, mas também não podemos esquecer de investir numa indústria forte. Para que esse processo aconteça, o superávit do minério de ferro é fundamental - disse Cavalcanti.

O problema é que quando o país depende muito do preço em alta dos seus produtos fica mais vulnerável. Qualquer crise, o preço despenca. Vejam no gráfico abaixo.

Cláudio Alves, diretor de estratégia da Vale, acha que a demanda asiática por minério continuará forte nos próximos anos, com o crescimento de outros países, como Vietnã, Camboja e Indonésia:

- Todo o sudeste asiático tem um potencial de consumo muito forte nesta década. Países como Vietnã, Indonésia, Camboja estão começando um processo de industrialização que vai consumir muito minério de ferro. Além disso, eles também investem em infraestrutura, vão passar pelo mesmo processo que hoje vive a China. Estamos falando de países com população somada de mais de 500 milhões de pessoas. Nossa maior preocupação não é a queda de preços, mas sim conseguir aumentar a produção para atender essa demanda - explicou.

O déficit em transações correntes dobrou de um ano para o outro, em valor, e saiu de 1,5% do PIB para 2,3%. Para 2011, o Banco Central está prevendo outro aumento do déficit, dos atuais US$47,5 bilhões para US$64 bilhões. No mercado financeiro, a convicção é que o déficit pode ser maior.

O risco aumenta porque o crescimento econômico fará crescer as importações. A própria Vale foi obrigada a encomendar 23 navios de estaleiros chineses e coreanos para conseguir aumentar sua carga exportada. Isso porque a indústria naval do país já está no limite de produção.

O déficit, para ser financiado, precisa de mais investimento externo e preços altos de matéria-prima. Não há crise à vista, mas é melhor monitorar os dados, porque o Brasil é gato escaldado.

FONTE: O GLOBO

O rombo aumenta:: Celso Ming

As Contas Externas de 2010 ontem divulgadas pelo Banco Central apresentaram resultados contraditórios e crescimento do risco de descontrole.

O rombo (déficit em transações correntes) está crescendo e as projeções do Banco Central apontam um aumento de 25% em 2011. A maior preocupação não é com o tamanho do déficit, mas com a velocidade do aumento. Antes de seguir, vamos aos conceitos.

As Contas Correntes (ou Transações Correntes) englobam três subcontas do fluxo geral de pagamentos e recebimentos para/do exterior: balança comercial (exportações e importações); balança de serviços (juros, transporte, turismo, royalties, aluguéis, lucros e dividendos); e as transferências unilaterais (o dinheiro remetido para os familiares que estudam lá fora ou os recursos que os brasileiros que trabalham no exterior mandam para suas famílias).

Esse rombo saltou de US$ 24,4 bilhões (1,52% do PIB) em 2009 para US$ 47,5 bilhões (2,28% do PIB) em 2010. Para 2011, o Banco Central prevê um rombo de US$ 64,0 bilhões (2,84% do PIB). Como as reservas estão crescendo, o déficit está sendo mais do que compensado com a entrada de capitais. Os Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) surpreenderam. Cresceram US$ 15,4 bilhões apenas em dezembro, acumulando uma entrada líquida no ano de US$ 48,5 bilhões, aumento de 86,8%. Como se trata de produção futura, a chegada desses recursos é bem-vinda, embora concorra para achatar as cotações do dólar aqui dentro (valorização do real) e, em certa medida, tire competitividade do setor produtivo.

Mas, afinal, o forte aumento do déficit externo é ou não preocupante e por quê? A principal fonte de preocupações está nas causas desse rombo. Quase sempre, como agora, é resultado de uma disparada do consumo. E a disparada do consumo tem a ver tanto com a valorização do real (que eleva o salário em dólares) e com o avanço das despesas públicas, que aumenta as importações (mais 41,7% em 2010) e os gastos nas viagens internacionais (mais 87,7%).

Enquanto for coberto com entrada de capitais de boa qualidade (especialmente investimentos), o rombo nas Contas Correntes até ajuda a puxar o crescimento e o emprego. As altas reservas internacionais (perto de US$ 300 bilhões) ajudam a manter o clima de confiança. No entanto, o grande risco é o de que o déficit aumente tanto e tão rapidamente que as reservas comecem a baixar e se levantem dúvidas quanto à capacidade futura de pagamento do Brasil.

Se e quando isso acontecer, em pouco tempo a entrada de capitais pode estancar, o que seria desastroso se ocorrer no momento em que o País mais precisa de investimentos estrangeiros para dar conta dos projetos de desenvolvimento do PAC, do pré-sal, das obras para a Olimpíada e a Copa do Mundo.

É por isso que, apesar das críticas daqueles que pedem maior valor agregado aos produtos brasileiros, o forte aumento das exportações de commodities (especialmente alimentos e minério de ferro) ajuda a manter o clima externo de confiança. Mas é claro que alguma coisa tem de ser feita para segurar o excesso de despesas públicas e a disparada do consumo.

CONFIRA

Hablas guarani?

O leitor Alberto Martinet criticou a pretensão do Paraguai de adotar o guarani como língua oficial do Mercosul. Ele lembra que o excesso de respeito pelas etnias conduziu a União Europeia ao colapso burocrático. Emplacou 23 línguas oficiais, todas com direito a documentos oficiais e traduções simultâneas.

Estoniano e maltês

"Como não existem intérpretes capazes de traduzir diretamente, por exemplo, do estoniano para o maltês, a translação tem de ser feita em duas etapas: do estoniano para o inglês, em seguida do inglês para o maltês. Com toda a perda de qualidade que isso implica."

Quíchua e aimará

Se o guarani for aceito como língua oficial estará criado um precedente. Quando o Peru e a Bolívia entrarem no Mercosul, vão exigir que o quíchua e o aimará tenham o mesmo tratamento. Afora isso, os etnólogos catalogam 180 línguas indígenas faladas apenas no Brasil. Vão todas para o Mercosul?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Minha Casa, teu subsídio:: Elio Gaspari

Falta o governo botar na rua os atravessadores do programa Minha Casa Minha Vida

Se há um novo estilo de governo em Brasília, na semana passada ele mostrou sua capacidade de dar pronta resposta a um problema. Os repórteres Edna Simão e Tiago Décimo revelaram que apartamentos do programa Minha Casa Minha Vida, de um conjunto residencial de Feira de Santana, na Bahia, haviam sido negociados no mercado negro. Além disso, cerca de 10% das famílias beneficiadas atrasavam o pagamento de suas prestações de pelo menos R$50. No dia seguinte, cumprindo determinação da doutora Dilma, os ministérios do Planejamento, das Cidades e a Caixa Econômica informaram que o governo retomará as unidades vendidas irregularmente e correrá atrás dos inadimplentes. Falta botar os atravessadores para fora, se possível em cena pública. Um deles não passará por dificuldades, pois já mostrou que tem uma caminhonete Nissan Frontier, para a qual construiu um discreto abrigo.

O conjunto residencial de Feira de Santana foi o primeiro da safra do Minha Casa Minha Vida. Visitado duas vezes pelo presidente da República e exposto na campanha eleitoral de sua candidata, tem tudo para ser uma joia da coroa da política social petista. São imóveis de dois quartos e sala, subsidiados. Se forem revendidos e se a inadimplência prevalecer, o programa naufragará nas mesmas águas do falecido Banco Nacional de Habitação, criado em 1964 e fechado em 1986, corroído pela inflação e pela demagogia, deixando para trás um rastro de escândalos.

Das 440 unidades de Feira de Santana, 50 já foram passadas adiante. Houve quem trocasse o imóvel por R$500, antes mesmo de receber as chaves. Quem vendeu ganhou um dinheirinho fácil, e quem comprou fez um excelente negócio, levando a preço de banana um apartamento que vale no mínimo R$15 mil. A exposição pública do despejo dos espertalhões será um desestímulo à propagação do golpe. A expulsão dos atravessadores é uma medida de justiça social, pois preserva o Minha Casa, Minha Vida. Por enquanto, a revenda está na casa dos 15%. Se a Caixa e o governo federal ficarem apenas na conversa, até o fim do ano esse percentual dobra.

Os marqueteiros de Brasília repetem um truque de seus similares durante a ditadura. O Minha Casa Minha Vida é apresentado como uma dádiva D"El Rey aos súditos desafortunados. Quando uma família paga em dia as prestações de seu apartamento, a maior parte do esforço é dela, mas disso não se fala. Resultado: se o governo mostra minha casa como um presente, por que devo pagar o que ele diz que devo? Foi assim que se criou, no século passado, a categoria social dos "inadimplentes do BNH". (Com uma diferença, o BNH beneficiou preferencialmente a classe média, cevando "inadimplentes" no Leblon e no Jardim Paulista.) Seria mais honesto se o governo dissesse que o Minha Casa Minha Vida é uma obra da patuleia que paga os impostos e dos moradores que quitam suas prestações.

Atravessadores de programas sociais não são "sem" seja lá o que fôr. São apenas malandros. Há assentados rurais que vendem seus lotes. Num caso mais radical, em São Paulo já houve invasor de conjunto habitacional que vendeu a posse na noite de sua chegada ao imóvel, sabendo que a tropa de choque da PM poderia aparecer ao amanhecer, como efetivamente apareceu.

Elio Gaspari é jornalista.

FONTE: O GLOBO

São Paulo, mais do que uma “terra da garoa”:: J. R. Guedes de Oliveira*

Esses jesuítas que fundaram o Colégio de São Paulo, nos idos de 1554, há 457 anos atrás, merecem a nossa reverência, com as pompas e festividades que lhes são de direito.

Ah, São Paulo. Terra da Garoa, gente brava, batalhadora, de todos os rincões deste imenso povoal que se chama Brasil. E, ainda, esses imigrantes que se mesclaram, tornaram-se miscigenação, fundiram-se no aço e na têmpera dessa orbe paulistana.

Cantar... cantar... sempre cantar os seus feitos, as suas grandezas, os seus Bandeirantes, desbravando a mata, construindo o progresso, vivenciando o presente, rememorando o passado.

São Paulo, das manifestações sociais, das conquistas científicas, do corre-corre em busca de um não sei o quê; mas, apressado, tangida pela modernidade, com os seus arranhas-céus buscando o Onipotente.

É lembrar que um riacho, o mais famoso do país, até hoje é cantado em versos, pela sua experiência de presenciar o Grito da Independência.

O seu Tietê passado, fétido hoje, mas a história das expedições. E parece que a consciência exige reverter o descaso a que se sujeitou, na ação de trazê-lo de volta: límpido, piscoso, navegável.

As suas avenidas. A Paulista, por exemplo, palco das principais manifestações festivas ou reivindicatórias, onde sempre se misturam sindicalistas, anarquistas, comunistas, capitalistas e outros “istas”. Um formidável e extenso corredor, de bancos, comércio, negócios e tudo o mais. Vê-se, na imponência do edifício, a FIESP.

A avenida São João, que grandeza espiritual encerra em suas calçadas, em suas construções. Quanto viu, quanto sentiu, quanto foi palco.

E neste espírito de avivar a sua memória, recordo os versos do poeta “da tristeza e resignação” Rodrigues de Abreu, quando, na década de 20, ele dizia em seu poema São Paulo: “Longe, nesta estação de cura,/ é que a cidade de São Paulo vive em mim./ Porque ela está em mim, edificada/ na colina nevoenta da minha saudade... / Mas, que linda cidade para o olhar!... / São Paulo edificado em mim!/ A minha alma é um bonde vazio/ descendo a Ladeira do Carmo da minha saudade,/ envolto no véu da garoa noturna...”

São Paulo é assim: uma espécie de orbe, em ritmo acelerado, que chega aos seus 450 anos na sua audácia de cidade. Ou, talvez, de uma metrópole? Ou, ainda, quem sabe, de uma megalópole?

Seus “times”, que tal? São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Portuguesa, etc... Seus símbolos, patrimônios, edificações rasgando o tempo, o viso, a forma, o desejo. Hotéis surpreendentes, vida noturna agitada. Bares, cafés, lanchonetes, clubes, pizzarias, repastos por todos os cantos.

Lembrar a cultura: MAM, MASP, Pinacoteca, Memorial da América Latina, um cem número de editoras, um raio enorme de Centros Literários, a grandeza da Academia Paulista de Letras, museu do Ipiranga (que colossal!), os consertos do Teatro Municipal, o saudoso Mappin, os sebos da Itapetininga, hoje nas imediações da Praça da Sé. E a Praça da República?

Ah! Os cultos religiosos, a forma e vivência entre “gregos e troianos”. Exemplo para o mundo que se vê entre contrastes e guerras. Fundem-se maometanos, budistas, católicos, presbiterianos, luteranos,...

Mas São Paulo da educação: a USP de renomados cientistas, de professores gabaritados, a Faculdade do Largo de São Francisco, os colégios, os SENAIs, a grande e respeitada rede de ensino municipal, a enorme corrente de ensino da educação fundamental, do ensino médio.

São Paulo dos lampiões de gás, das serestas, do chorinho, de Inezita Barroso! Ah! mulher que lembra São Paulo e se mistura com as suas tradições... Dos Demônios da Garoa.

São Paulo não é estático e nem se queda. É o subúrbio agitado, tendo em seu entorno a grandeza do espírito paulista. É como acentuou o poeta Paulo Bomfim: “o suave encanto de uma Paulicéia que nos pede um momento de saudade!”.

Esta terra de gente cativa, altaneira, que abre os braços, produz o progresso...locomotiva deste imenso Brasil.

Não é São Paulo um fruto isolado de uma árvore amiga. É o complexo de seus bairros, de sua vida agitada, do seu destino maior: um mundo de maravilhas e surpresas.

Ao viajor que chega, os braços abertos, as luzes, ou, ainda, uma ilusão perdida, mas, da sorte, o compromisso de dar as ferramentas, capacitar para o trabalho, encher de entusiasmo e de futuros promissores.

São Paulo é assim: os contrastes de toda sorte. Mas, contudo, o berço aconchegante dos filhos da Pátria Gentil.

Cantam-se as suas façanhas, as suas proezas, naquela sua Estação da Luz. E, ao mesmo tempo, não longe, choram-se as suas tristezas nas masmorras de um tempo que a memória não apaga, mas, hoje, transformado em museu que conta a repressão tão recente.

Os seus cinemas. O São João, por exemplo. Que encanto, que saudade. E o seu Teatro Santana? Que fugidas, para as sessões das 12 às 24:00 horas. Milonguitas safadas!

Cidade erguida por mãos de irmãos: do norte, do sul. Mãos calejadas do cimento, da areia, da pedra. Concreto armado, que rasga o espaço, buscando o etério.

São Paulo de inúmeros problemas, de tantas soluções, de centenas de milhares de canteiros, de obras miraculosas, de chão pilado, de nobreza, de pobreza, mas São Paulo!

Há tanto para se cantar, para se falar, para se sentir, ao visualizar a São Bento, o Brás, o Cambucí, a Lapa, Santana, a marginal Tietê. O Pinheiros, com as suas variantes, o seu olhar para o interior e para o litoral. Que estupenda via de acesso, que colossal empreendimento de arrojada idéia.

É lembrar que o Parque Ibirapuera tem algo de extraordinário, assim como o Aeroporto de Congonhas e, mesmo perto, o seu Jardim Zoológico. Tudo entrelaçado, tudo num mundo de opções. Sem falar, ainda, da Represa Billings, Edifício Martinelli, Instituto Butantã, Horto Florestal e por aí adiante.

Ah! Que maravilha: o famoso Viaduto do Chá, o Santa Efigência, olhando de cima para baixo, contemplando o Vale do Anhangabaú. A febre intermitente de seus carros, que rasgam as avenidas, de suas pessoas apressadas.

E a grandeza de seus tribunais da João Mendes? Os homens, impecavelmente trajados, cheios de idéias em suas pastas recheadas; as mulheres (Oh! Deus!), produzidas para os embates das audiências.

E seus homens das indústrias, do comércio, dos escritórios? Essa gente que apanha o Metrô, dá sinal para ônibus e essas jovens formosas que encantam as suas ruas, São Paulo.

E, ainda, essa gente do trabalho informal: camelôs, catadores de papel, vasculhadores do lixo, da pobreza, da busca de melhores dias. É tudo complexo.

Mas São Paulo é assim. É o fervilhar deste formigueiro gigante que mais parece refletir uma imensa “Paulicéia Desvairada”, como escreveu o Mário de Andrade.

Rendam-se aos seus pioneiros – seus jesuítas, como o Padre Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, a notável decisão de construir aquele barraco, para a catequese dos índios. E culminou, entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, o histórico Colégio de São Paulo. E o tempo cuidou de desenvolver, com a febre incontrolável da expansão e da riqueza, esta cidade de encantos, de belezas, de tradições.

São Paulo está em nosso coração, vive no seu pulsar, mora em nosso peito varonil. Terra de gente de trabalho, de dimensão, de história, de lutas, de decência, de grandeza, de acendrado amor ao BRASIL.

Ó cidade santa, como é o seu nome, SÃO PAULO!

*J.R. Guedes de Oliveira, ensaísta, biógrafo e historiador.

FHC pede descriminalização

Em encontro na Suíça, ex-presidente volta a defender que se evite punir o usuário e é apoiado por ex-chefes de Estado da Colômbia e do México

Diego Abreu

Líder da Comissão Global de Políticas sobre Drogas, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso manifestou-se ontem favorável a descriminalização, durante um ciclo de dois dias de debates realizados em Genebra, na Suíça. “É preciso descriminalizar o uso de todas as drogas”, afirmou Fernando Henrique.

A comissão que discute o tema é formada por personalidades internacionais, como os ex-chefes de Estado da Colômbia César Gaviria (1990-1994) e do México Ernesto Zedillo (1994-2000), que, ao lado do ex-presidente brasileiro, defenderam, durante os debates, a descriminalização das drogas como a forma mais eficaz para o combate ao crime organizado. “Temos que abandonar essa ideia de que os consumidores de drogas são criminosos”, afirmou Gaviria, que também foi secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), de 1994 a 2004.

Ao fim do encontro, a comissão chegou ao consenso de que os países estão fracassando em relação às políticas repressivas. Na opinião de Fernando Henrique, a solução é que o usuário seja considerado “um doente” para quem é preciso oferecer saúde. Para o tucano, nenhuma política de combate às drogas será eficiente sem que haja “informação e educação”, para que a população seja alertada sobre os danos causados pelas drogas.

“Não é preciso mais dinheiro, e sim usar melhor o dinheiro. O utilizado na chamada guerra contra as drogas dos americanos é enorme, mas é um dinheiro mal usado porque não tem resultado efetivo. Se fosse utilizado para a saúde, para tratamentos médicos, educação, para campanhas de publicidade, seria muito melhor”, avaliou Fernando Henrique.

Essa não é a primeira vez que o ex-presidente se manifesta em defesa da descriminalização das drogas. Em fevereiro do ano passado, ao comentar um relatório da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia, que defendia que os usuários de maconha não fossem punidos, ele criticou a política de combate aos entorpecentes e sugeriu que não apenas a maconha, mas todas as drogas fossem descriminalizadas. Na ocasião, o político brasileiro disse que a guerra atual travada contra os entorpecentes “não está funcionando”.

Em entrevista à rádio CBN, no começo de dezembro, Fernando Henrique afirmou que são os usuários que estimulam o tráfico de drogas. Em seguida, ele sugeriu a promoção de campanhas que possam desencorajar o uso, como as realizadas contra o cigarro. O tucano citou o exemplo de Portugal, que descriminalizou as drogas. O ex-presidente observou, porém, que descriminalizar não significa legalizar, mas evitar punição ao usuário.

Durante os dois mandatos na Presidência do Brasil, de 1995 a 2002, FHC tratava o assunto com cautela. Chegou a criar planos de combate às drogas, mas, ao longo dos oito anos em que comandou o país, nunca sugeriu a descriminalização.

Declaração polêmica

O ex-secretário nacional de Justiça Pedro Abramovay defendeu, no começo da semana passada, o projeto que estabelece o fim da prisão para pequenos traficantes. A polêmica declaração causou desgaste no governo da presidente Dilma, que tem como uma de suas principais metas o combate ao tráfico, e levou Abramovay a pedir demissão do cargo na última sexta-feira. Ele também recusou o convite do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para assumir a Secretaria Nacional de Política Sobre Drogas (Senad).

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Um resto a pagar bilionário

Dívida do governo com municípios chega a R$ 27,8 bilhões. Prefeitos temem que o corte no orçamento comprometa o repasse do dinheiro

Igor Silveira

Passada a lua de mel entre os prefeitos e a presidente Dilma Rousseff, vem a cobrança da fatura. As gestões municipais estão preocupadas com as despesas correntes e com os investimentos previstos para as cidades que deixaram de ser repassados pelo governo federal, especialmente, com a proximidade de ajustes fiscais para equilibrar as contas da União. De acordo com um levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM), divulgado ontem, o débito é de R$ 27,8 bilhões e os ministérios da Cidades e da Saúde são as pastas que mais devem: R$ 6,9 bilhões e 6,3 bilhões, respectivamente.

Em todas as esferas — municipal, estadual e federal —, essas dívidas, classificadas como restos a pagar, postergadas para 2011, somam R$ 128 bilhões, entre despesas correntes — custeios de, por exemplo, remédios, agentes comunitários de saúde e programas do governo federal que são executados pelas prefeituras —, investimentos e demais débitos, o que inclui inversões financeiras. Desse montante, 21% são referentes a transferências empenhadas às prefeituras.

A preocupação maior dos prefeitos que têm dinheiro a receber da União é com as despesas não processadas, ou seja, quando o projeto ou a obra não teve qualquer etapa iniciada e, portanto, o pagamento não foi efetuado. Nas conversas com os principais interlocutores do governo, a presidente Dilma tem ressaltado a necessidade de enxugar os gastos no Orçamento 2011. Assim, quando Dilma for analisar todas as planilhas de gastos, os empenhos originados de emendas parlamentares e os restos a pagar não processados tendem a ser as primeiras opções de cortes.

“O problema é que muitos dos débitos considerados restos a pagar não processados estão nessa situação há mais de um ano. São despesas empenhadas entre 2007 e 2009 que até hoje não foram realizadas”, explica o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. Ainda de acordo com ele, o crescimento dos restos a pagar aumentou significativamente nos últimos anos. Outro levantamento da CNM aponta que, em 2003, essas despesas totalizavam R$ 14,5 bilhões — R$ 4 bilhões em investimentos. “Acumular e represar esses recursos é duplamente negativo porque, além de criar uma falsa expectativa na população, atrasa os projetos que estão sendo executados pelas prefeituras”, completa Ziulkoski.

O Ministério da Saúde foi contatado pela reportagem e reconheceu os débitos, mas classificou esses processos como naturais. Segundo resposta da assessoria, a maior parte dos valores é relativa a projetos que estão em execução, e os pagamentos serão feitos à medida que esses forem sendo concluídos. Além disso, o ministério avisou que não existe nada de concreto em relação ao cancelamento de projetos e lembrou que há um decreto que determina a prorrogação e a validade dos restos a pagar não processados. O Ministério das Cidades comunicou que não há a intenção de retirar recursos dos municípios e que, para dar maior celeridade aos processos, oferece cursos para que os gestores possam elaborar projetos de acordo com os critérios exigidos pelo governo.

Falta desembolsar

Confira a transferência de recursos da União para municípios que já foram empenhados e aguardam efetivação:

Restos a pagar processados

Correntes: R$ 411.508.627
Investimentos: R$ 4.446.034.327

Restos a pagar não processados inscritos pela primeira vez
Correntes: R$ 5.155.300.815
Investimentos: R$ 8.587.959.086

Restos a pagar não processados reinscritos

Correntes: R$ 378.507.993
Investimentos: R$ 8.848.698.063

Total: R$ 27.778.324.480

Fonte: Confederação Nacional de Municípios (CNM)

Cálculos com novo mínimo

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, também comentou as alternativas para o reajuste do salário mínimo — assunto que tem pautado as principais discussões políticas nas últimas semanas. Ele pediu uma interação maior entre o governo federal e os municípios e criticou a maneira como esse diálogo tem acontecido nos últimos tempos. Em meio ao cabo de guerra entre o governo, que pretende fixar o valor do mínimo em R$ 545, e as centrais sindicais, que pedem R$ 580, prefeitos de todo o Brasil fazem cálculos para manter as contas equilibradas.

“Os acordos são fechados entre eles, mas ninguém pergunta como os prefeitos farão nos municípios. Para se ter uma ideia do impacto, quase 40% dos servidores municipais ganham até um salário mínimo e, com o aumento, várias prefeituras vão extrapolar o limite de 54% (do orçamento com gastos com pessoal), não vão conseguir se recuperar no prazo de oito meses e serão punidas. Os repasses não vão chegar às cidades”, destaca o presidente da CNM. “O Poder Executivo e o Congresso olham apenas para o próprio umbigo”, complementa.

Segundo cálculos da CNM, cada real de aumento no salário mínimo representa um deficit de R$ 1,5 milhão na folha de pagamento das prefeituras. Ainda de acordo com o levantamento, de 2003 a 2010, os reajustes salariais representaram um impacto de R$ 10,8 bilhões nas folhas municipais. Se o valor estipulado pelo governo for mantido e o trabalhador passar a receber um salário mínimo de R$ 545, o aumento representará R$ 1,3 bilhão na soma de todas as folhas municipais.

“É importante ressaltar que nós, da CNM, não somos contra o aumento do salário mínimo. Ao contrário. Eu defendo uma recuperação de acordo com a inflação, até porque os impostos não crescem mais que isso. Se eu pudesse, daria o salário de R$ 2,5 mil, que é o indicado pelo Departamento Intersindical de Estudos Econômicos, Sociais e Estatísticos (Dieese). No entanto, isso não é possível sem que haja o abandono de outras áreas, como a saúde, por exemplo”, conclui Ziulkoski. (IS)

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Governo deve ser firme com centrais sindicais

A área econômica orientou o Planalto a adotar postura firme com as centrais sindicais, no encontro de hoje. Para ministros da área, o governo não pede correr o risco de corrigir a tabela do Imposto de Renda e não conseguir aprovar o mínimo de R$ 545.

Área econômica pede firmeza com centrais

Planalto tentará vincular a correção da tabela do IR ao mínimo de R$545


BRASÍLIA. A área econômica aconselhou o Palácio do Planalto a ter uma postura mais firme, hoje, no encontro com as centrais sindicais: correção da tabela do Imposto de Renda só com a garantia de que o salário mínimo será de R$545. Mas o discurso duro da área técnica esbarra na necessidade política de o governo Dilma Rousseff chegar a um acordo com as centrais. O secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, reúne-se com os presidentes das seis principais centrais sindicais do país sabendo que o governo terá que melhorar sua proposta.

Aliados políticos apostam que, apesar do discurso duro, o limite nas negociações seria um mínimo de R$550, o que exigiria mais cerca de R$3 bilhões além do já previsto para os R$540 fixados pela medida provisória 516, editada ainda em dezembro. Já as tabelas do Imposto de Renda das Pessoas Físicas seriam reajustadas em 6,46%.

Apesar de a presidente Dilma Rousseff ter mandado a Fazenda fazer simulações com o salário mínimo até R$580, a posição da área econômica é que o governo não pode correr o risco de concordar em corrigir a tabela do Imposto de Renda e depois não conseguir aprovar o mínimo de de R$545 no Congresso.

As simulações já foram feitas para uma eventual correção das tabelas em 6,46%, que representaria uma renúncia fiscal superior a R$2,5 bilhões por ano. Esse seria o valor da renúncia considerando a base de declarantes que existia em 2006, quando o governo fez a última negociação sobre a correção da tabela. Mas desde então, o número de pessoas físicas que prestam contas ao Leão subiu graças ao aumento da renda e da formalização no mercado de trabalho.

A maior preocupação dos técnicos do governo é mesmo com o salário mínimo, especialmente num momento em que a economia está fortemente aquecida e que é preciso segurar a demanda que pressiona a inflação. Isso sem contar com o impacto fiscal. Cada real de correção no mínimo representa uma despesa de cerca de R$286,4 milhões, sendo que a equipe econômica está estudando fazer um corte no Orçamento que pode chegar a R$40 bilhões.

Força não acredita em acordo no encontro de hoje com Gilberto Carvalho

O presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), disse ontem que as negociações dos três pontos - salário mínimo, Imposto de Renda e reajuste para os aposentados que ganham acima do mínimo - têm que ser simultâneas, e não um ponto antes do outro, como quer a Fazenda.

O sindicalista não acredita em acordo já no encontro de hoje, mas considerou positivo o pedido da presidente Dilma à Fazenda de novas simulações sobre o impacto de diferentes valores para o salário mínimo, bem como da correção pela inflação da tabela do IR.

- Isso é uma coisa boa. Significa que a Fazenda não está tão forte. Nosso medo era de que a área econômica ditasse as regras, mas está cumprindo ordens da presidente. É uma boa notícia - disse Paulo Pereira da Silva, acrescentando: - As negociações das três questões têm que ser juntas, e a gente não vai fechar nenhum acordo sem a concordância de todas as centrais.

Para Vaccarezza, o importante é manter o valor de R$545

Já o vice-líder do governo no Congresso e representante do governo na Comissão Mista de Orçamento, deputado Gilmar Machado (PT-MG), disse que o Orçamento aprovado tem margem para comportar a correção da tabela do IR e ainda uma negociação sobre o mínimo. E defendeu a atual regra de reajuste do salário mínimo:

- Há uma necessidade de se fazer a correção da tabela e não precisamos mudar a política do salário mínimo. Os acordos ocorrerão com as negociações, que é uma conquista das centrais.

- O importante é manter a atual política, os R$545, o acordo - reforçou o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP).

FONTE: O GLOBO

Jogo pesado para forçar negociação de cargos

Base aliada de Dilma estimula lançamento de dois candidatos contra Marco Maia na Câmara
Isabel Braga e Gerson Camarotti

BRASÍLIA. Faltando menos de uma semana para a eleição do presidente da Câmara, o Palácio do Planalto foi surpreendido ontem com duas candidaturas avulsas, alimentadas por setores da base aliada. Após sufocar três pré-candidaturas para assegurar a reeleição do deputado Marco Maia (PT-RS), o governo foi avisado de manhã da confirmação da candidatura do deputado Sandro Mabel (PR-GO). À noite, foi a vez de o PTB ameaçar com o lançamento da candidatura do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP).

Três candidaturas aumentam a possibilidade de a eleição ser decidida só em segundo turno, o que o Planalto quer evitar.

Apesar de o PR ter desautorizado a candidatura de Mabel, houve forte movimentação nos bastidores de setores de praticamente todos os partidos governistas insatisfeitos com o loteamento de cargos para o segundo escalão. A candidatura Mabel seria uma forma de vender mais caro o apoio a Maia.

Apesar do favoritismo de Maia, atual presidente da Câmara, o governo não quer correr riscos. Para que as candidaturas avulsas sejam retiradas, o governo daria garantias para a composição futura do segundo escalão. Ao lançar sua candidatura, ontem, Mabel disse ter o apoio de 130 deputados e que trabalhará para conseguir mais:

- A partir de hoje entro na luta e vou ser o próximo presidente dessa Casa com muita fé em Deus. Gosto muito do Marco Maia, mas a candidatura dele é bancada pelo Executivo e é difícil ser independente assim.

À noite, Maia ouviu de Marquezelli que ele também deve entrar na disputa.

Dilma já trata Kassab como aliado e faz críticas indiretas a tucanos de SP

Sentados lado a lado durante cerimônia em São Paulo, prefeito e ex-presidente Lula conversaram bastante

Julia Duailibi

A iminente ida de Gilberto Kassab para o PMDB, partido da base governista, levou a presidente da República, Dilma Rousseff, a elogiar o prefeito paulistano e a destacar investimentos na capital, ao mesmo tempo em que criticou, de maneira indireta, o PSDB.

A presidente cumprimentou Kassab (DEM) "com muito carinho" e disse estar "honrada" com o convite feito por ele para participar nesta terça, 25, da cerimônia em comemoração ao 457.º aniversário de São Paulo, na sede da Prefeitura, na qual foi entregue a Medalha 25 de Janeiro ao ex-vice-presidente José Alencar, que luta contra um câncer há 13 anos.

Além de Dilma e Alencar, estavam com Kassab no palco montado na Prefeitura o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), e o vice-presidente, Michel Temer (PMDB), com quem o prefeito mantém conversas sobre a troca de partido. Ontem, os dois conversaram rapidamente na presença de Alckmin.

Sentados lado a lado, Kassab e Lula falaram bastante durante a cerimônia. O prefeito concedera a mesma medalha ao ex-presidente em 2010 - à ocasião, também fez a homenagem ao ex-governador José Serra (PSDB).

Tanto Dilma como Lula são entusiastas da ida de Kassab, que está na oposição, para o PMDB. Ambos avaliam que a troca de partido enfraqueceria o PSDB em São Paulo, principal bastião oposicionista no maior colégio eleitoral do País. Nas últimas cinco eleições, o PT não quebrou a hegemonia tucana no Estado.

Kassab pediu aos peemedebistas discrição nas negociações. Quer tonar pública a decisão apenas depois de 15 de março, quando ocorrerá convenção nacional do DEM para a escolha da nova direção. Caso não consiga emplacar a troca de comando no partido, Kassab terá um argumento forte para abandonar a legenda.

O prefeito disse às lideranças tucanas que pretende mesmo mudar para o PMDB, legenda que lhe daria fôlego para projetos políticos maiores, como a disputa pelo governo paulista em 2014. Aos aliados afirmou que, mesmo no novo partido, pretende manter a aliança com o PSDB.

Na cerimônia, a presidente Dilma afirmou ainda que "junto" com Kassab vai "continuar esse processo de investimentos" feitos pelo governo federal na capital paulista. Sem citar os tucanos, que governam São Paulo há 16 anos, Dilma disse que o Estado ainda tem "desafios" a enfrentar com a população de mais baixa renda.

"Fico extremamente feliz de estar aqui em São Paulo e de que seja aqui que esta medalha esteja sendo entregue a José Alencar, porque justamente aqui temos um dos Estados mais desenvolvidos do nosso País. Mas, ao mesmo tempo, temos tantos desafios em relação à situação do nosso povo mais pobre", disse.

A presidente ainda destacou que o País está no "rumo certo" e que essa trajetória teria sido "construída" por Lula e Alencar. Não mencionou o nome do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que também foi um dos homenageados com a medalha ontem - o tucano não compareceu à cerimônia porque estava em viagem fora do País.

"Os dois presidentes (Lula e José Alencar) que não tinham diploma universitário mostraram um compromisso com a educação, como diz o nosso querido presidente Lula, ‘nunca dantes visto na história deste país’", completou Dilma.

No final de seu discurso, a presidente dirigiu-se brevemente a Alckmin: "Queria dizer ao governador que estamos prontos para continuar a parceria entre o governo federal e o governo do Estado." Pouco antes, o tucano disse receber com Dilma com "alegria" e desejar a ela um "ótimo mandato". "Contem com São Paulo", completou Alckmin.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Planalto quer prefeito na base aliada, mas desvinculado de Serra

Marcelo de Moraes

Desde o fim de 2010, o governo federal tem mandado recados para o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), avisando que sua entrada num partido da base aliada, como o PMDB, seria recebida com entusiasmo. Tanto a presidente Dilma Rousseff como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sabem que a adesão de Kassab traz para o lado do Palácio do Planalto a maior prefeitura do País.

Mais: consolida uma pré-candidatura competitiva para o governo de São Paulo, em 2014, capaz de interromper a hegemonia tucana no Estado, algo que nem a imensa popularidade de Lula foi capaz de fazer nos seus oito anos de mandato.

Mas o ponto central para que essa parceria se consolide está na relação que Kassab manterá com o tucano José Serra. Candidato do PSDB derrotado por Dilma na última eleição presidencial, Serra é o padrinho político de Kassab e seu aliado direto.

Dentro do governo federal, a decisão está tomada. Kassab será extremamente bem vindo e receberá todo o apoio desde que não faça o jogo de manter um pé em cada canoa.

Dilma espera ter o prefeito como aliado integral, incluindo numa eventual campanha por sua reeleição presidencial daqui a quatro anos.

Seria a primeira vez, desde a chegada de Lula ao poder, que o PT teria um candidato presidencial com um palanque muito forte no maior Estado do País e dono do maior colégio eleitoral.

O que o governo teme é que Kassab entre agora no PMDB, se alie ao governo federal, aproveite parcerias e programas oficiais, e em 2014 se alinhe com uma possível candidatura presidencial do amigo José Serra.

Como presidente licenciado do PMDB, o vice-presidente Michel Temer ficou responsável por consolidar a ponte de ligação entre Kassab e o governo federal.

Dilma quer que seu vice convença o prefeito de São Paulo a repetir seu gesto - de quando abriu mão do apoio nacional aos tucanos em troca de uma aliança estratégica com o PT.

Temer apoiou Serra na eleição presidencial de 2002 e ficou ao lado de Geraldo Alckmin em 2006. Nada que o impedisse de se tornar o candidato a vice-presidente na chapa encabeçada por Dilma em 2010. Para o Planalto, a parceria com Kassab tem que ser feita nos mesmos termos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Batalhas de 2012 e 2014 definem líderes

Escolha de nomes que vão representar os partidos na Câmara e no Senado no mandato de Dilma Rousseff já antecipam luta por votos

João Domingos

A batalha pela liderança dos partidos no Congresso disfarça uma outra luta, travada no terreno da ocupação de espaços políticos com vistas às eleições municipais de 2012 e presidencial de 2014, além de cargos no próprio Senado e Câmara dos Deputados.

No PSB, a disputa entre o presidente do partido e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e os irmãos Ciro e Cid Gomes (governador do Ceará), resultou na escolha da deputada Ana Arraes (PE) para líder do partido. Mãe de Eduardo Campos, Ana foi levada à liderança para evitar que os irmãos Gomes aumentassem sua influência entre os socialistas.

O governador de Pernambuco é um potencial candidato à Presidência em 2014, se o PSB abandonar a aliança com o PT ou se ele ganhar força a ponto de suplantar as pretensões de reeleição de Dilma Rousseff. Caso isso não ocorra, pode aguardar 2018, quando estará com 52 anos.

No PSDB sucede algo semelhante, embora sem envolver familiares. O deputado Duarte Nogueira (SP), ligado a Geraldo Alckmin, deverá ser referendado hoje líder do partido na Câmara. Ele é também o preferido do senador Aécio Neves (MG), que no momento tem uma aliança silenciosa com Alckmin, contra pretensões de José Serra de concorrer novamente à Presidência.

No PT o líder escolhido é o deputado Paulo Teixeira (SP). Nesse caso, a luta pela demarcação de terreno é das tendências internas do partido e não para assegurar espaço nas eleições presidenciais. Teixeira pertence à ala "Mensagem ao Partido", a mesma do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Com raras exceções, a liderança do PT é sempre dada a um integrante da corrente majoritária, a "Construindo um Novo Brasil", à qual pertencem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro José Dirceu.

No PMDB da Câmara o atual líder Henrique Eduardo Alves (RN) deverá ser reconduzido pela quarta vez à liderança do partido. Ele acredita que terá o voto de todos os deputados de sua bancada. No caso de Henrique Alves, a ocupação do terreno tornou-se importante porque ele terá dois anos de prazo para construir sua candidatura à presidência da Câmara.

Pelo acordo com o PT, o próximo presidente da Casa será do PMDB. E ninguém se torna mais forte para disputar o cargo do que quem ocupa a liderança partidária. Cabe ao líder escolher presidente e relator de CPIs, nomear os integrantes de todas as comissões e os relatores dos projetos mais importantes. Isso o qualifica a agradar a todo mundo e o torna quase imbatível em caso de disputa.

Sem disputa. No Senado o quadro é semelhante. No PMDB deverá haver a recondução de Renan Calheiros (AL) ao cargo de líder. Ele é potencial candidato para substituir José Sarney (AP) em 2013. De acordo com informação de políticos, há um acordo entre o governo e o PMDB para que Renan seja eleito presidente da Casa daqui a dois anos.

O PT escolheu Humberto Costa (PE) para líder do partido. Trata-se, também, de uma forma de dar maior força ao senador para as disputas ao governo de Pernambuco em 2014. Aliado de Eduardo Campos, Costa espera receber do atual governador o apoio para se candidatar ao governo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

FHC apoia abrir arquivos, mas não crê em descobertas

Ex-presidente diz que documentos da ditadura foram destruídos e que Comissão da Verdade já deveria ter sido criada

Jamil Chade

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem ao Estado ser a favor da abertura de todos os arquivos da época do regime militar, mas adiantou que a dificuldade será encontrar os documentos. "Eu mesmo falei com eles (os militares) quando presidente e eles insistem que não há documentos", afirmou. Ele disse também ser contra a ideia de prolongar por mais 50 anos o sigilo sobre os arquivos militares, definida no decreto 4.554/02. "Eu fui acusado de ter proibido a abertura de arquivo por 50 anos. Aquilo ocorreu no meu último dia (no governo) e alguém colocou um papel para assinar lá", justificou-se. "Eu sou contra isso. Temos sim de abrir os arquivos", disse.

Sobre a dificuldade de encontrar novos documentos, acredita que o Exército diz a verdade. "Claro que havia, como não haveria. Mas foram jogados fora. Os responsáveis tiraram. Essa é que é a questão mais grave. Pode ser que descubram documentos. Mas, oficialmente, pode abrir à vontade que não vão achar nada", alertou FHC.

Ele se declarou favorável à criação de uma Comissão da Verdade, como sugere a presidente Dilma Rousseff - mas questiona a eficiência dessa iniciativa, quase 20 anos após o fim da ditadura. "Talvez fosse mais eficiente se tivéssemos criado isso tudo mais lá atrás. Muitas pessoas já morreram. E morreram dos dois lados. Hoje, seria mais um trabalho de memória."

O ex-presidente defende que essa memória seja respeitada e que as verdades sejam reveladas: "Acho que ainda vale a pena a ideia da Comissão."

O que acontece com o PPS do Rio de Janeiro?:: Tibério Canuto

Não queremos meter o bedelho em questões domésticas do partido de Roberto Freire, mas estranhamos muito uma nota divulgada pelo blog Democracia Política e Novo Reformismo, dando conta do imbróglio ocorrido na seção do PPS do Rio de Janeiro, a partir do convite feito por Sérgio Cabral para que o deputado André Correa seja o líder do seu governo na Assembleia Legislativa. O deputado é do mesmo partido de Roberto Freire e, o PPS, por quatro anos, fez oposição a Sérgio Cabral, tendo participado da coligação oposicionista nas últimas eleições, na disputa do governo do Estado.

André Correa manifestou disposição de aceitar o convite, mas não há consenso no interior do PPS. Quadros históricos que vêm da militância do antigo partidão, não concordam com esta opção e divulgaram uma nota intitulada “ Confusão e pressa política”, na qual alertam para a necessidade de a Direção Nacional acompanhar de perto o que vem acontecendo no PPS do Rio, para o que se evite “o que pode ser uma perversa manobra contra o partido,”

Quando da campanha de Roberto Freire a presidente, tive a honra de conviver e militar politicamente com três dos quatro signatários deste documento: Raulino Oliveira, Luiz Antônio Marrins (Gato), que teve uma militância conjunta com Antônio Sérgio e contribuiu com Pitacos, durante a última campanha presidencial. Também conheci de perto Roberto Percinoto, que teve um papel de destaque na campanha presidencial de Roberto Freire, em 1989. O outro signatário dispensa apresentação. Ele é Gilvan Cavalcante de Melo, autor do blog Democracia Política e Novo Reformismo. Gilvan está na luta democrática desde o meado dos anos 50. Atualmente ele é da direção nacional do PPS e militou no antigo partidão por décadas.

A história dos quatro signatários aconselha à direção nacional do PPS a levar em consideração seus argumentos. Certamente eles não são movidos por uma luta interna mesquinha, pois são inquestionáveis seus valores éticos.

FONTE: BLOG PITACOS

Taxa aos supérfluos

Governo estuda tarifa de 35% para "importações desnecessárias", como bebidas, tabaco e perfumes

Eliane Oliveira

Na busca de instrumentos mais efetivos para evitar a volta de déficits à balança comercial brasileira, o governo estuda aumentar, em até 35%, as tarifas de importação de produtos tidos como supérfluos, com destaque para bens de consumo manufaturados com similares no Brasil e no próprio Mercosul. Essas "importações desnecessárias", classificou uma fonte, correspondem a apenas 1% da pauta importadora brasileira, ou algo em torno de US$1,8 bilhão. São exemplos bebidas, tabaco, móveis e perfumaria. A imposição de restrições demonstraria a disposição brasileira de passar do discurso contra a guerra cambial global e o comércio anticoncorrencial à prática.

Apesar do pequeno alcance em relação ao que o país vem gastando no exterior (1% do total), graças ao dólar barato em relação ao real, seria uma forma de proteger, mesmo que temporariamente, os setores mais afetados pela guerra cambial.

De maneira geral, esses segmentos são fabricantes de produtos industrializados que, ao contrário das commodities agrícolas e minerais, estão com os preços deprimidos, por causa do aumento da oferta chinesa, que ainda tem como agravante o fato de o yuan estar desvalorizado artificialmente em relação à moeda americana.

"A Argentina adora uma proteçãozinha"

Além disso, indiretamente, a medida ajudaria os sócios do Mercosul, especialmente a Argentina, país que vem passando, desde 2002, por um intenso processo de desindustrialização. Isso porque esse tipo de restrição, embora permitido pela Organização Mundial do Comércio (OMC) - desde que a tarifa seja de até 35%, para manufaturados -, não pode ser adotado para os membros de uma união aduaneira.

- A Argentina vai gostar. Eles adoram uma proteçãozinha - comentou o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

Ele disse, porém, que vê com preocupação essa ideia. Em sua opinião, é uma ação protecionista e ineficiente:

- A tarifa de 35% é anulada pelo câmbio. Enquanto o real está 30% acima do dólar, o yuan está 40% abaixo do valor da moeda americana, sem contar o custo Brasil.

Em outra vertente, como O GLOBO antecipou, o governo será mais rigoroso na aplicação de medidas antidumping (preços artificialmente fixados abaixo da média de mercado) e compensatórias, conferindo, com redução de ritos e prazos, mais agilidade ao sistema de defesa comercial. O Brasil é, hoje, o segundo país que mais recorre a sobretaxas antidumping, só perdendo para a Índia. Por outro lado, a China é a nação que mais recebe esse tipo de penalidade, à frente de EUA, Índia e União Europeia.

- O problema é que chegará um momento em que as contas podem não fechar. As exportações estão reagindo, mas até quando? - perguntou um alto funcionário do governo brasileiro.

EUA foram principais fornecedores do país

A avaliação é que o que tem salvado a balança são as commodities, como carnes, soja, açúcar e minério de ferro. São justamente os itens sobre os quais o governo não tem controle algum, pois as cotações são fixadas em bolsas internacionais.

Ano passado, as exportações atingiram US$201,9 bilhões, valor 31,4% acima das vendas de 2009. As importações, que chegaram a US$181,6 bilhões, subiram bem mais: 41,7%.

Como O GLOBO revelou no domingo, projeções internas de setores do governo consideram que o Brasil terá um superávit comercial inferior a US$1 bilhão em 2011, podendo até ser um déficit - seria o primeiro saldo negativo desde os US$12,765 bilhões de 2002. O aquecimento da economia e o real forte, que estimulam importações, respondem pela ameaça.

O Brasil importa cerca de oito mil itens. A maior parte dos produtos são matérias-primas e produtos intermediários, que correspondem a 46,18% da pauta, seguidas de bens de capital, que equivalem a 22,57% do total.

Em 2010, os EUA foram os principais fornecedores de bens ao Brasil, com US$27,039 bilhões, seguidos pela China, com US$25,5 bilhões. A diferença é que, no intercâmbio com os EUA, a maioria das operações é feita entre empresas do mesmo grupo, com itens complementares às cadeias produtivas.

A China está na mira do Brasil. O governo estuda a criação de um grupo interministerial para monitorar as relações entre os dois países e propor políticas compensatórias, como acordos de investimentos e, eventualmente, sanções.

FONTE: O GLOBO

Déficit externo foi recorde em 2010: US$47,5 bi

Remessas de lucros e viagens internacionais de brasileiros fizeram rombo dobrar. Investimento estrangeiro soma US$48 bi

Patrícia Duarte

BRASÍLIA. Salvas no último minuto do segundo tempo. Foi assim que as contas externas do Brasil conseguiram ser financiadas em 2010 pelos investimentos estrangeiros produtivos - que foram robustos e surpreendentes especialmente em dezembro -, mantendo uma tradição que já dura quase uma década. De acordo com o Banco Central (BC), o saldo em transações correntes do Brasil - operações comerciais e de serviços com o exterior - fechou 2010 negativo em US$47,518 bilhões, o pior resultado da série iniciada em 1947, equivalente a 2,28% do Produto Interno Bruto (PIB), e quase o dobro do déficit de US$24,302 bilhões registrado no ano passado. O rombo foi totalmente compensado pelos Investimentos Estrangeiros Diretos (IED, para o setor produtivo), que somaram US$48,462 bilhões, também recordes.

O número veio muito acima da expectativa do próprio BC, de US$38 bilhões para o ano. Foi puxado pelo resultado de dezembro, de US$15,364 bilhões. Trata-se do melhor resultado mensal da História, inflado pela compra de 40% da Repsol Brasil pela chinesa Sinopec, que trouxe para o país US$7,1 bilhões no último mês de 2010, segundo o BC.

Esse cenário de compensação, no entanto, não deve se repetir em 2011 segundo especialistas. Ainda assim, não chega a tirar o sono, porque o país continua credor externo e recebendo investimentos de fora, tanto diretos quanto de portfólio.

- Ter déficit em conta corrente de 2,5% a 3% do PIB não é elevado. É altamente financiável - afirmou o economista-chefe da corretora Prosper, Eduardo Velho.

O chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, também concorda que o quadro das contas externas brasileiras é benigno e sustentável. No ano passado, ainda segundo o BC, o mau resultado da conta corrente foi puxado pelas remessas de lucros e dividendos, que somaram no ano US$30,375 bilhões, e também pelos gastos líquidos de brasileiros com viagens internacionais, que atingiram a cifra recorde de US$10,503 bilhões no período. Os brasileiros estão viajando muito para o exterior, aproveitando o dólar abaixo de R$1,70 e a melhora da renda. Em janeiro, até ontem, já eram mais US$869 mihões.

Para 2011, BC prevê rombo de US$69 bilhões

Já as despesas com juros somaram US$9,682 bilhões no ano passado, também aumentando o rombo nas contas externas. De positivo, mas nem tanto, veio o superávit da balança comercial em 2010, com US$20,267 bilhões, acima da estimativa do BC de um saldo positivo de US$17 bilhões, mas abaixo dos resultados de anos anteriores.

Com o dólar baixo e a economia aquecida, a tendência é que o saldo comercial seja ainda menor em 2011, com as importações mais fortes. Como O GLOBO revelou no domingo passado, setores do governo já trabalham com superávit inferior a US$1 bilhão e até mesmo um déficit.

Eduardo Velho lembra que essa situação vem se intensificando por causa do dólar desvalorizado e acredita que, por causa disso, o governo terá de agir com mais força para segurar mais valorizações do real. Vai precisar, porém, de fôlego.

- O déficit em conta corrente está crescendo com o câmbio desse jeito - afirmou ele.

Em 2011, o BC prevê que as transações correntes do país vão registrar déficit de US$69 bilhões, sendo US$5,5 bilhões só em janeiro, enquanto o IED deve ficar em US$45 bilhões. A saída para uma compensação serão os investimentos estrangeiros em portfólio (aplicações em Bolsa, renda fixa, títulos públicos, entre outros). Estes, em 2010, somaram US$52,272 bilhões e, neste ano, devem ficar em US$40 bilhões.

A equipe de economistas do Bradesco, em relatório, também espera mais saldos negativos na conta corrente, chegando perto de 3%. Mas igualmente não acredita que o país terá problemas para financiá-lo, "principalmente diante das perspectivas ainda favoráveis ao crescimento doméstico e da liquidez abundante que tem caracterizado o cenário internacional".

O time citou as perspectivas de mais fluxos privados para países emergentes neste ano, de US$960 bilhões. Só em IED, segundo a Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), o Brasil respondeu por 4,32% do total no mundo em 2010, um salto de 232% sobre 2006, quando a fatia do país era de 1,30%.

BC comprou US$3,9 bi no mercado à vista em janeiro

E o investidor estrangeiro voltou a acelerar a remessa de recursos para o Brasil, a despeito das medidas do governo para tentar brecar esse movimento. De acordo com o BC, só na semana passada, a conta financeira - por onde passam os investimentos produtivos e em portfólio - apresentou superávit de US$4,980 bilhões, acumulando em janeiro US$8,948 bilhões. As compras somaram US$29,808 bilhões e as vendas, US$20,860 bilhões.

Segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, trata-se de uma ação estimulada pelo bom quadro econômico do país.

- Ainda tem maior liquidez internacional - disse Lopes.

Ele se referia ao fato de haver muitos recursos disponíveis no mercado externo por causa das ações tomadas sobretudo por economias desenvolvidas, como os Estados Unidos, para estimular o consumo e melhorar a atividade econômica local. Como essa recuperação ainda é lenta, esses aplicadores acabam buscando alternativas de investimento mais rentáveis, como o Brasil.

Neste caso, além de haver expectativas de forte crescimento da economia brasileira - acima de 4,5% -, também há a atração pela Selic, que é a taxa básica de juros do país, hoje em 11,25% anuais, uma das mais elevadas do mundo e que remunera os títulos públicos.

Com o resultado da conta financeira, o fluxo cambial geral - entrada e saída de moeda estrangeira do país - está positivo em US$9,205 bilhões entre os dias 1º e 21, já o melhor resultado desde setembro passado todo, quando houve superávit de US$13,726 bilhões por causa da capitalização da Petrobras.

A conta comercial, por sua vez, acumula superávit de apenas US$257 milhões no mês, número afetado por causa do déficit de US$960 milhões verificado na semana passada.

O BC também informou que a posição vendida dos bancos - quando as apostas são de mais quedas do dólar - recuou de US$16,784 bilhões em dezembro para US$13,026 bilhões no dia 21 passado. Isso ocorreu, segundo Lopes, por causa das recentes medidas do BC para reduzir essas operações por meio de mais compulsórios bancários.

Também houve menos compras de dólares no mercado à vista pela autoridade monetária: US$3,927 bilhões entre os dias 1º e 21, menos da metade do fluxo cambial do período. Em 2010, o BC comprou US$41,417 bilhões, muito acima do superávit de US$24,354 bilhões no fluxo cambial.

FONTE: O GLOBO

Fundo: Brasil crescerá 4,5%

FMI alerta para inflação e sugere alta de juros

JOHANESBURGO. O Fundo Monetário Internacional (FMI) reviu para cima o crescimento dos países emergentes, inclusive o do Brasil, mas alertou para o risco de pressões inflacionárias nessas nações. De acordo com o relatório Panorama Econômico Mundial, divulgado ontem, o Brasil verá seu Produto Interno Bruto (PIB) crescer este ano 4,5%, 0,4 ponto percentual acima da previsão anterior, feita em outubro de 2010.

O relatório reforça que o mundo está se recuperando da crise global. Segundo o FMI, em 2011 haverá expansão de 4,5%, um pouco acima da previsão anterior. Entre os países ricos, o crescimento será de 2,5%, contra um prognóstico anterior de 3%.

Quanto aos países emergentes, o FMI recomenda a adoção de medidas de aperto monetário, para conter as pressões inflacionárias, oriundas do superaquecimento econômico. "Aumentos recentes nas políticas de juros em muitos países são bem-vindos. Esse aperto pode, no entanto, exacerbar o forte fluxo de capitais que muitas dessas economias registram no momento", diz o documento.

FONTE: O GLOBO

Descobrimento:: Mario de Andrade

Abancado à escrivaninha em São Paulo
Na minha casa da rua Lopes Chaves
De supetão senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.

Não vê que me lembrei que lá no Norte, meu Deus!
muito longe de mim
Na escuridão ativa da noite que caiu
Um homem pálido magro de cabelo escorrendo nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Faz pouco se deitou, está dormindo.

Esse homem é brasileiro que nem eu.