sexta-feira, 17 de agosto de 2012

OPINIÃO DO DIA – Roberto Gurgel: ‘o mensalão maculou a República’ (XIII)

O que resta (aos advogados) dizer? Que não há prova suficiente, que a denúncia é mal elaborada. É a técnica de defesa, é a ladainha esperada das defesas.

Se isso se operou efetivamente, se aconteceu ou não, é irrelevante para configurar crime. O ato não precisa se consumar.

Desde o primeiro momento esta foi a tese básica da defesa. Primeiro se afirma que não houve nada, que foi um delírio. Seria o delírio mais bem fundamentado da história. Mas, se houve (crime), se afirma que foi caixa dois.

Quando em algum processo alguém morre, coincidentemente as culpas recaem, são transferidas para quem morreu e não pode se defender.

Tenho a mais plena confiança no STF e estou certo de que fará justiça. E justiça é a condenação dos réus.

Roberto Gurgel, Procurador Geral da República, em O Globo, 16/8/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Relator pede condenação de Valério e João Paulo
Caos em estradas e aeroportos
Desde 2008, obras empacadas
Seca - Conta a pagar

FOLHA DE S. PAULO
Relator declara culpados por corrupção Valério e João Paulo
Roteiro muda e 1ª sentença pode sair semana que vem
Justiça impede operação-padrão de policiais federais
Novos indicadores sinalizam retomada da economia do país
Geraldo Alckmin fala em voltar a disputar a Presidência em 2014
Das 21 concessões anunciadas, só duas têm estudo concluído

O ESTADO DE S. PAULO
Relator vota pela condenação de João Paulo e Marcos Valério
Russomanno empata com Serra; Haddad sobe para 3º
Redução de IPI, juros mais baixos e crédito elevam vendas
Estados terão mais recursos
Governo reserva R$ 14 bi para reajuste

VALOR ECONÔMICO
Economia dá primeiros sinais de recuperação
TCU suspende licitação de térmica no AM
O quinteto de Dilma para a infraestrutura
Investimento de R$ 3 bi no porto do Rio
Desavença no mensalão acirra ânimo entre ministros do STF

BRASIL ECONÔMICO
Estados têm mais R$ 42 bilhões para investir em infraestrutura
Pedágios ficarão mais caros nas rodovias federais
Vendas no varejo crescem 6,1% graças aos carros
Conveniência de postos se sofistica e muda comércio
Embraer entrega primeiro avião feito em parceria com a Índia
Vale prevê aumento no preço do ferro

CORREIO BRAZILIENSE
Governo abre cofre em dia de caos aéreo
Privatização: Pedágio chega às BRs até 2014
Mensalão: relator pede condenação de petista
Médicos apoiam proposta sobre eutanásia lega

ESTADO DE MINAS
A batalha dos salários
Operação-padrão da PF gera transtornos em Confins e outros aeroportos
Greve nas universidades federais completa três meses sem data para acabar
Relator pede condenação de acusados

ZERO HORA (RS)
Relator pede condenação de Valério e deputado
Dilma x Sindicatos
Renasce ideia de transporte ferroviário de passageiros

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
União tenta estancar conflitos em refinaria
Voto pela condenação de quatro no mensalão
Governo espera queda de 30% no valor do frete
Procon vai fiscalizar postos de combustível

Relator pede condenação de Valério e João Paulo

No 11º dia do julgamento do mensalão, o relator, ministro Joaquim Barbosa, votou ontem pela condenação do ex-presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha (PT-SP), por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Votou também pela condenação de Marcos Valério, operador do mensalão, e de Cristiano Mello Paz e Ramon Hollerbach, sócios de Valério na agência SMP&B, por corrupção ativa e peculato. Mais uma vez o plenário foi palco do embate entre Barbosa e o revisor do caso, ministro Ricardo Lewandowski. Barbosa queria que a votação fosse por blocos, e Lewandowski, por réus. A proposta de Barbosa saiu vitoriosa.

O 1º voto do relator do mensalão

Barbosa pede a condenação de João Paulo Cunha, Marcos Valério e sócios da SMP&B

Carolina Brígido, André de Souza

BRASÍLIA O relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, votou ontem pela condenação do ex-presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha (PT-SP), por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Votou também pela condenação de Marcos Valério, operador do mensalão, e de Cristiano Mello Paz e Ramon Hollerbach, sócios de Valério na agência de publicidade SMP&B, por corrupção ativa e peculato. A SMP&B prestava serviços à Câmara dos Deputados. Apenas ontem, 11º dia de julgamento, o Supremo Tribunal Federal começou a tratar do destino dos réus. A votação continua segunda-feira, com os votos dos demais ministros sobre essa parte da denúncia. Em seguida, o relator lerá a segunda parte de seu voto.

Segundo Barbosa, João Paulo recebeu R$ 50 mil da agência e, em troca, direcionou licitação da Câmara para que a SMP&B fosse vitoriosa. João Paulo também teria autorizado subcontratações: a agência repassava o serviço a terceiros e ficava com a maior parte dos honorários. Ao todo, a SMP&B teria recebido R$ 10,9 milhões dos cofres públicos, mas os serviços prestados diretamente por ela foram de apenas R$ 17 mil. A troca de favores configura corrupção ativa para os sócios da SMP&B, que efetuaram o pagamento, e corrupção passiva para João Paulo, que recebeu o dinheiro, segundo o relator. Como a quantia foi paga de forma velada, sem registros formais, o deputado petista também foi enquadrado na prática de lavagem de dinheiro.

- O pagamento dos R$ 50 mil foi um claro favorecimento privado, em benefício próprio de João Paulo Cunha, uma vez que lhe cabia, no exercício do cargo, constituir a comissão de licitação, autorizar licitação e autorizar gastos com terceiros. A agência prestou serviços ínfimos em comparação ao montante recebido. Restam caracterizados os crimes de corrupção ativa, atribuído a Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach e de corrupção passiva, atribuído a João Paulo Cunha - afirmou Barbosa.

O peculato - quando alguém se vale de cargo público em benefício próprio ou de outros - ocorreu, segundo o relator, em duas situações: a primeira nas subcontratações, que representaram desvios milionários dos cofres públicos em benefício da SMP&B. A segunda, quando a agência de publicidade subcontratou a empresa IFT para prestar assessoria pessoal ao petista.

Barbosa começou o voto com a gênese do suposto esquema, os desvios de recursos públicos da Câmara dos Deputados. Segundo o ministro, os empresários se aproximaram do petista porque tinham interesse em firmar contratos com órgãos públicos federais. O relacionamento da SMP&B com Cunha começou no fim de 2002. A empresa cuidou da campanha do deputado à presidência da Câmara e, no ano seguinte, os encontros continuaram acontecendo.

Segundo o voto de Barbosa, em 4 de setembro de 2003, a mulher de Cunha, Márcia Regina, foi até uma agência do Banco Rural para receber R$ 50 mil em espécie, valor oriundo da SMP&B. Onze dias depois, João Paulo autorizou a instalação de uma comissão para preparar a licitação. A empresa venceu a concorrência e foi contratada pela Câmara em 31 de dezembro de 2003. A partir de janeiro de 2004, o presidente da Câmara teria autorizado a contratação de terceiros por meio da SMP&B, dando à empresa honorários sobre essas operações.

- Vejam a natureza fraudulenta da licitação que levou à contratação da empresa SMP&B. Ela foi contratada após o pagamento de R$ 50 mil a João Paulo Cunha. Contratada a agência, João Paulo autorizou gastos com terceiros por meio da agência. A despesa alcançou R$ 10,9 milhões. Sobre esse montante, a agência retirava honorários que garantiram a remuneração dos sócios por um ano sem nenhuma contrapartida - afirmou Barbosa.

Os advogados do parlamentar alegam que o dinheiro foi enviado pelo então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, para custear a pré-campanha do partido em Osasco, na Grande São Paulo. Barbosa refutou a tese. Argumentou que a mulher de Cunha assinou um recibo no Banco Rural. O documento informava que o dinheiro vinha da SMP&B. O relator sustentou que, se Delúbio quisesse mandar dinheiro para o PT em Osasco, não teria recorrido a uma agência bancária em Brasília nem teria feito isso um ano antes do período eleitoral:

- Não havia dúvida de que o dinheiro não era do PT nem de Delúbio Soares, mas que vinha de agências de Marcos Valério. As provas conduzem ao entendimento de que o réu sabia da origem dos R$ 50 mil e aceitou a vantagem ilícita.

Barbosa contou que, por dois anos, o nome do sacador do dinheiro foi mantido em sigilo pelo Banco Rural. A instituição apresentou recibo em nome da SMP&B. Dois anos depois, quando foi pedida a busca e apreensão de documentos no banco, o nome do beneficiário foi revelado.

- Está demonstrado que o réu dolosamente utilizou sofisticado serviço de lavagem de dinheiro, operacionalizado através das contas bancárias das empresas de Marcos Valério, para receber os R$ 50 mil. Tudo permaneceu na maior clandestinidade até que as medidas de busca e apreensão revelassem os atos. Dessa forma, tenho como caracterizado o crime de lavagem imputado ao réu João Paulo Cunha.

O relator disse que ficou comprovado que a empresa da qual Valério é sócio teve lucro milionário com as subcontratações. A praxe era o recebimento de 5% dos valores terceirizados. Por conta disso, a SMPB costumava superfaturar os preços pagos às demais empresas.

O ministro deu exemplos de empresas subcontratadas e destacou a IFT, do jornalista Luiz Costa Pinto. Segundo Barbosa, ele prestava assessoria a João Paulo e não à Casa, como alegou o réu.

- Houve dolo na subcontratação por parte de João Paulo Cunha? A resposta para mim é positiva. Não há como afastar benefício pessoal resultante da contratação de Luiz Costa Pinto, sem precisar pagar o alto preço cobrado pelo assessor, R$ 21 mil por mês em 2003 - afirmou o relator.

FONTE: O GLOBO

Roteiro muda e 1ª sentença pode sair semana que vem

Depois de intenso bate- boca, o STF decidiu que o julgamento seguirá um roteiro diferente, com a leitura dos votos segundo os blocos de acusações do Ministério Público, e não réu a réu.

Lewandowski, que foi vencido no debate, chegou a ameaçar deixar o posto de revisor do processo. Com a mudança, a primeira sentença pode ser conhecida já na semana que vem.

STF muda método e 1ª decisão já pode sair semana que vem

Lewandowski resistiu, mas acabou aceitando proposta de votação fatiada

Pressão para mudança partiu do relator, Joaquim Barbosa, e acabou sendo apoiada por outros ministros

Felipe Seligman, Rubens Valente, Flávio Ferreira, Márcio Falcão e Nádia Guerlenda

BRASÍLIA - Inconformado ao saber que o relator da ação do mensalão, Joaquim Barbosa, votaria em blocos, o ministro Ricardo Lewandowski ameaçou abandonar a revisão do caso, segundo a Folha apurou. Isso inviabilizaria a continuidade do julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal).

No início da noite de ontem, porém, ele anunciou que seguirá a metodologia do colega, mesmo acreditando que a forma escolhida "ofende o devido processo legal".

A polêmica está na forma como irão votar os ministros. Barbosa defendeu o modelo usado quando a corte abriu a ação penal: fatiando o julgamento em base nos itens da denúncia. Depois de ler e dar seu voto para determinadas pessoas e grupos, vota o revisor Lewandowski e, em seguida, cada ministro até esgotar o capítulo. Assim, é possível que algumas sentenças saiam já na semana que vem.

Ontem, por exemplo, Barbosa votou apenas na questão do envolvimento do ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT), com Marcos Valério e seus sócios.

Lewandowski discordou de Barbosa dizendo que essa forma seria um pré-julgamento e sinalizava concordância do relator com a denúncia.

Citando o regimento, Lewandowski queria ouvir todo o voto do relator e só depois dar seu voto réu por réu. Disse que ficou meses estudando o processo e seu voto tinha uma sequência lógica. Por isso, não queria fatiá-lo.

Convencido pelos colegas Marco Aurélio Mello e Celso de Mello, ele cedeu ao final da sessão, depois de protagonizar um bate-boca com Barbosa, e o presidente do tribunal, Carlos Ayres Britto.

Ameaça. A ameaça de deixar a função de revisor ocorreu minutos antes de começar os trabalhos, no cafezinho, quando Carlos Ayres Britto chamou Lewandowski e Barbosa para conversarem sobre a formatação do voto.

Ao ser informado do fatiamento, Lewandowski ficou inconformado. Barbosa disse que nos últimos seis anos nunca foi procurado pelo colega para tratar do assunto. Ouviu que a recíproca era verdadeira. Foi diante desse impasse que o revisor disse que não "tinha mais condição" de seguir com a revisão.

Se o Supremo substituísse o revisor agora, o julgamento ficaria comprometido para este ano e o ministro Cezar Peluso, prestes a se aposentar, não daria seu voto.

Diante da ameaça, Britto respondeu que a intenção do colega era a de não permitir que a análise fosse feita agora. Ele relatou que Lewandowski o procurou duas vezes no semestre passado pedindo que o julgamento não fosse marcado neste ano. Oficialmente, o Supremo nega.

Lewandowski reagiu. Disse que nunca disse isso. Segundo relatos, afirmou que foi "exposto" por Britto e estaria "fragilizado".

O embate entre os dois não é de hoje. No fim de 2011, Barbosa afirmou que seu trabalho estava pronto, passando a responsabilidade para Lewandowski. Desde então, Lewandowski passou a reclamar da pressão. No fim do semestre passado, Britto enviou um ofício citando uma data limite para a conclusão do voto revisor, o que o contrariou ainda mais.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Réu no processo insiste em manter candidatura a prefeito e divide o PT

Fábio Zambeli

A manutenção da candidatura de João Paulo Cunha à Prefeitura de Osasco em caso de condenação no STF (Supremo Tribunal Federal) divide o PT e deve ensejar nova batalha jurídica.

Legalmente, o petista não ficaria automaticamente inelegível, pois, no momento do registro, sua ficha era reconhecidamente limpa. Contudo, juristas e procuradores consultados pela Folha consideram que o deputado, em hipótese de vitória nas urnas, terá seu diploma contestado nos tribunais, podendo nem mesmo assumir o cargo.

A análise se baseia no precedente aberto pelo TSE que admite "inelegibilidade superveniente" (que ocorre após o registro e antes da eleição). Ainda assim, João Paulo tem dito que enfrentará todos os recursos e mostra disposição de seguir no páreo.

Na noite de ontem ele participou de inauguração de um comitê de sua campanha.

De outro lado, a ala do PT mais próxima do prefeito reeleito Emídio de Souza defende, reservadamente, que o atual candidato a vice, Jorge Lapas, ex-secretário de Governo, seja promovido à cabeça de chapa se o titular for condenado pelo mensalão.

Diante do iminente impasse, petistas já cogitam acionar a direção nacional do partido e até o ex-presidente Lula para o veredicto. Osasco é o sexto maior colégio eleitoral do Estado, com 540 mil aptos a votar.

O principal adversário de João Paulo é o ex-prefeito e atual deputado estadual Celso Giglio (PSDB), que aparece à frente das pesquisas locais de intenção de voto.

Outros acusados
A Folha tentou contato com os advogados de Cristiano Paz, mas o escritório de advocacia Castellar Guimarães Advogados Associados não informou o celular dos advogados. Eles também não responderam por e-mail. O advogado de Ramon Hollerbach, Hermes Vilchez Guerrero, não atendeu as ligações.

Voto do relator. O ministro Joaquim Barbosa afasta mais uma questão preliminar e anuncia que dividiu seu voto em itens. Após uma discussão sobre a ordem de votação, fica decidido que cada ministro apresentará o seu voto da maneira que achar melhor.

Segunda voto do revisor. O ministro revisor Ricardo Lewandowski apresentará seu voto sobre as questões do processo abordadas pelo ministro relator Joaquim Barbosa e, se houver tempo, os demais ministros começarão a votar

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Decisão de 'fatiar' julgamento cria polêmica na Corte

Ideia do relator é dar seu voto por grupos de denunciados e depois ouvir os votos dos colegas; decisão sobre assunto será tomada na segunda-feira

Felipe Recondo

BRASÍLIA - O relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, apresentou ontem sua proposta de "fatiar" o julgamento do mensalão, dividindo a votação em itens, seguindo a lógica da denúncia da Procuradoria-Geral da República. O ministro quer dar seus votos sobre parte dos 37 réus, ouvir o voto dos colegas e só então, depois disso, voltar a dar seu voto sobre os restantes.

O revisor do processo, ministro Ricardo Lewandowski, rechaçou a proposta de Barbosa e disse que não aceitaria votar o relatório item por item. Assim, o clima tenso entre os ministros voltou a tomar o tribunal. O tema foi colocado em votação pelo presidente Ayres Britto, o plenário se dividiu e a decisão gerou novas dúvidas. Permaneceu a incerteza sobre a participação na condenação ou absolvição dos réus de Cezar Peluso, que se aposenta compulsoriamente em 3 de setembro ao completar 70 anos de idade - o ministro é considerado "linha dura". A questão deve ser revolvida na segunda-feira, quando os trabalhos do tribunal serão retomados.

Depois da discussão entre Barbosa e Lewandowski, os ministros concordaram que cada um votaria como quisesse. Ainda assim, não ficou definido se o relator leria todo o seu voto, de mais de mil páginas, antes de passar a palavra para o ministro revisor ou se leria apenas um item e o submeteria em seguida ao crivo dos colegas. Conforme explicou Ayres Britto, Barbosa poderia dar suas sentenças sobre os réus do seu primeiro item, que abarcava o deputado federal João Paulo Cunha e membros do "núcleo operacional" do mensalão. O revisor Lewandowski poderia então ler integralmente seu voto, antecipando-se ao relator. A confusão foi resumida assim por Britto: "É heterodoxo, mas não é ilícito".

Discussão. Ontem, assim que a sessão foi iniciada, Barbosa propôs um itinerário a ser cumprido por todos os colegas. "Vou seguir a mesma metodologia de julgar por itens de acordo com o formulado na denúncia", disse. Começaria pelas acusações contra João Paulo, o empresário Marcos Valério e seus sócios Cristiano Melo Paz e Ramon Hollerbach.

Lewandowski reagiu. "Me oponho à metodologia. Estaremos adotando a ótica do Ministério Público e admitindo que existem núcleos", disse. O revisor evidenciou que divergirá do relator ao indicar que o colega tem visão próxima à avaliação da procuradoria. Barbosa rebateu. "Isso é uma ofensa. Acho que houve uma compreensão errada do revisor. Eu não falei que votarei por núcleos. Disse que vou votar itens, item por item. Só isso", disse.

O ministro Marco Aurélio Mello defendeu a leitura integral dos votos interiors dos ministros, um de cada vez. "O que poderá ocorrer se tivermos a abordagem apenas de certas imputações? Teremos um acórdão capenga", afirmou. "Não compareci à Corte para me pronunciar em doses homeopáticas." Sem entender, os advogados dos réus disseram que vão pedir esclarecimentos sobre o modelo de votação.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Joaquim Barbosa abre caminho para condenar por lavagem de dinheiro

Réus que receberam verba de Marcos Valério podem ser punidos

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA A primeira parte do voto do relator Joaquim Barbosa defendendo a condenação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) por lavagem de dinheiro abre caminho para a punição de todos os outros parlamentares e ex-parlamentares acusados de cometer o mesmo tipo de crime no processo do mensalão.

Para Barbosa, João Paulo deve ser condenado porque tentou esconder das autoridades financeiras o recebimento de R$ 50 mil da SMP&B, de Marcos Valério, apontado como operador do mensalão. O dinheiro foi sacado pela mulher de João Paulo, Márcia Cunha, mas não foi devidamente informado ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) pelo Banco Rural.

A estrutura do voto indica que Barbosa deverá votar pela condenação dos deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) e dos ex-deputados Roberto Jefferson (PTB-RJ) Paulo Rocha (PT-PA), João Magno (PT-MG), Professor Luizinho (PT-SP), Bispo Rodrigues (PR-RJ), Pedro Corrêa (PP-PE), José Borba (PMDB-PR) e Romeu Queiroz (PTB-MG) e do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto.

O ex-ministro, os deputados e os ex-parlamentares receberam dinheiro de Marcos Valério por intermédio de terceiros e os repasses não foram declarados ao Coaf e à Receita Federal. Valério repassou R$ 8,8 milhões para Valdemar, R$ 800 mil para Paulo Rocha, R$ 360 mil para João Magno, R$ 20 mil para o Professor Luizinho, R$ 150 mil para o Bispo Rodrigues, R$ 950 mil para Anderson Adauto, R$ 200 mil para José Borba e R$ 352,8 mil para Romeu Queiroz.

Roberto Jefferson, o delator do mensalão, recebeu R$ 4,5 milhões. Os ex-deputados e o ex-ministro usaram assessores para sacar o dinheiro. Ao analisar o caso específico de João Paulo Cunha, Joaquim Barbosa disse que o ex-presidente da Câmara recorreu à mulher para fazer o saque de R$ 50 mil, mas a identidade dela como sacadora só foi revelada depois das investigações da CPI dos Correios e da Polícia Federal. O Banco Rural anotou o nome de Márcia Cunha, mas creditou os saques à SMP&B, a mesma empresa que fez o pagamento. Era como se a empresa estivesse sacando um dinheiro da própria conta para pagar eventuais fornecedores. João Paulo e Márcia Cunha não eram fornecedores da empresa de Marcos Valério.

- Está demonstrado que o réu (João Paulo Cunha) dolosamente utilizou sofisticado serviço de lavagem de dinheiro operacionalizado através das contas bancárias das empresas de Marcos Valério para receber os R$ 50 mil. Tudo permaneceu na maior clandestinidade até que as medidas de busca e apreensão revelassem os atos. Dessa forma, tenho como caracterizado o crime de lavagem imputado ao réu João Paulo Cunha - declarou Joaquim Barbosa.

O voto indica também que a tendência do ministro é responsabilizar o Banco Rural pelo esquema de lavagem de dinheiro. Mas ainda não é possível saber se Joaquim Barbosa está convencido de que os dirigentes da instituição financeira citados como réus podem ser responsabilizados. Os dirigentes são acusados de ajudar Valério a simular empréstimos para o PT e, com isso, facilitar a movimentação ilegal de dinheiro pelo empresário e pela antiga cúpula do partido.

FONTE: O GLOBO

Procuradores fazem desagravo a Gurgel em congresso no Rio

Proposta que limita poderes de investigação do MP é criticada

Vera Arajújo

O I Congresso Internacional do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público Brasileiro teve início ontem com um ato de desagravo ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, atacado pela defesa dos réus do julgamento do mensalão. O presidente do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais, Claudio Soares Lopes, considerou os ataques "inaceitáveis" para uma plateia de procuradores de outros estados e de países da Europa e da América do Sul, além de representantes do Departamento de Justiça americano. Também estiveram presentes o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o governador Sérgio Cabral. Gurgel adiou a sua vinda para a tarde de hoje, último dia do evento, quando será homenageado com uma medalha, junto com o presidente do STF, ministro Ayres Britto.

- São inaceitáveis e intoleráveis os ataques recebidos pelo procurador. Por isso manifesto este apoio ao doutor Gurgel, que merece o nosso respeito. Creio também que o momento em que realizamos esta reunião, por coincidência, é oportuno para firmarmos nossa posição intransigível e inegociável quanto a poder de investigação do Ministério Público - afirmou Lopes, referindo-se à Proposta de Emenda Constitucional 37, que limita a atuação dos Ministérios Públicos no poder de investigar.

Cláudio Lopes declarou que considera um retrocesso e uma afronta à democracia do país tal limitação.

- Repudiamos com veemência uma proposta de emenda constitucional que constitui uma verdadeira afronta à democracia. Se aprovada, a famigerada PEC 37, a PEC da Impunidade, impedirá o Ministério Público de investigar e proteger a sociedade de eventuais desmandos e omissões policiais. Temos, no entanto, esperança que o bom senso prevalecerá no Congresso, que rejeitará esta proposta.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, presente à abertura do congresso, também reiterou a importância do trabalho de investigação do Ministério Público.

- É necessário que o MP tenha unidade e posições institucionais, agindo de forma coesa contra quadrilhas e organizações criminosas que se aprimoram - disse o ministro.

Ficou evidente também no encontro a importância de as procuradorias se unirem contra o crime organizado. O governador Sérgio Cabral lembrou que a colaboração internacional no mundo globalizado é necessária:

- Quanto maior a integração, maior o resultado beneficiando os países reciprocamente. Assim, o fato criminal deixa de ter proteção naquele país A, B ou C em função da colaboração entre MPs.

Dois convênios serão assinados hoje. Durante o evento, que termina hoje, serão firmados dois convênios. O primeiro será entre a Rede Judiciária Europeia e o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais, visando agilizar informações entre autoridades para facilitar as investigações. Já a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, assinará um convênio com cada um dos MPs para agilizar o encaminhamento de denúncias feitas ao Disque 100 para os promotores da infância.

A promotora do Departamento de Justiça norte-americano, diretora associada e coordenadora para América do Sul do Escritório de Assuntos Internacionais, Magdalena Boynton, ressaltou a importância de os Estados Unidos e o Brasil trocarem informações sobre atividades criminosas.

Segundo ela, o fluxo de dados entre os dois países é intenso. Ela destacou a importância da agilidade para a atuação dos promotores, especialmente na cooperação internacional.

- Os dois países são grandes parceiros no que diz respeito à ajuda mútua no combate ao crime: são mais de duzentas solicitações anuais. Isso é muito importante, pois os criminosos não respeitam leis nem fronteiras, e como promotores, precisamos de informações rapidamente - disse Magdalena.

FONTE: O GLOBO

A Babel - Eliane Cantanhêde

Cumpre-se a profecia: o relator Joaquim Barbosa, que vem do Ministério Público e tem a cultura (ou vícios) do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, não perdoa. Em seu primeiro voto, pediu a condenação do deputado João Paulo Cunha por corrupção passiva e do publicitário Marcos Valério e dois sócios por corrupção ativa.

João Paulo é um réu muito especial. Foi presidente da Câmara dos Deputados à época do mensalão, é um dos três com mandato parlamentar e o único candidato em outubro -à Prefeitura de Osasco (SP).

Além de corrupção passiva, Joaquim votou também pela condenação de João Paulo por peculato e lavagem de dinheiro. Em resumo, considerou que o réu usou o cargo na Câmara para favorecer Valério e tirar vantagens pessoais.

Esse primeiro voto de Joaquim Barbosa confirma a expectativa de que ele será um relator duro, implacável. Os demais réus devem estar profundamente abalados, com exceção dos dois para os quais Roberto Gurgel já pediu absolvição, Luiz Gushiken e Antônio Lamas.

Quem também parece abalado é o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, que começou a carreira como advogado, evoluiu para magistrado e que, mesmo antes do início do julgamento, já dera sinais (e declarações) de que iria criar problemas e confrontar o relator Joaquim. Há o temor, inclusive, de que um dos dois não suporte a pressão e renuncie.

O novo bate-boca é em torno de metodologia. O relator seguiu o roteiro de Gurgel, votando os oito itens originais da denúncia. Já o revisor -que era a favor do desmembramento- preparou o seu voto considerando o contrário: "um todo único".

Como alertou Marco Aurélio, se os votos do relator forem "fatiados" e ministros votarem "no todo", vão votar em alguns casos antes da manifestação do próprio relator. "Será a Babel", disse, equivocando-se. Não "será" uma confusão. Já é e está.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Supremo desentendimento - Merval Pereira

O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão, demonstrou grandeza de espírito ao aceitar mudar a estrutura de seu voto para se adequar à decisão do ministro-relator, Joaquim Barbosa, de dividir seu voto por itens. Se os ministros do Supremo Tribunal Federal não chegassem a consenso sobre a forma de votação, o julgamento corria o risco de ser contestado pela defesa dos réus.

Oadvogado José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça, já aventou ontem a possibilidade de o devido processo legal estar sendo violado caso a votação seja fatiada, como propôs o relator. O ministro revisor, Ricardo Lewandowski, leu o regimento interno e afirmou que, se a ordem definida nele não fosse seguida rigorosamente, o Supremo estará decidindo de maneira irregular. Mas recuou de sua posição à noite.

O plenário do STF em certos momentos mais parecia uma Torre de Babel, pois muitas vezes ministros que estão defendendo posições semelhantes se desentendiam porque um não fala a língua do outro. Ou, o mais grave, defendiam posições divergentes e não se mostravam dispostos a encontrar uma solução que pudesse ser aceita por todos.

A primeira indagação a ser feita é por que os ministros não discutiram internamente o procedimento de votação, deixando que as divergências aflorassem em pleno julgamento, em frente às câmeras de televisão? Não é possível que não conseguissem chegar a um resultado majoritário que seja respeitado por todos, como aconteceu na montagem do calendário do julgamento. Mesmo nesse caso, quando se pensava que era ponto pacífico a intenção de fazer o julgamento no menor prazo possível, tanto para chegar-se mais rápido a uma definição como também para permitir que o ministro Cezar Peluso pudesse votar antes de sua aposentadoria compulsória a 3 de setembro, veem-se a cada dia atitudes procrastinatórias, tanto por parte dos advogados de defesa - o que é natural, já que desconfiam que Peluso tenda a votar pela condenação dos réus - quanto de alguns ministros.

Com relação à maneira de votar, o desentendimento começou assim que o relator Joaquim Barbosa anunciou que adotaria em seu voto a mesma sistemática já adotada quando das alegações finais.

Ele dividiu o processo em oito itens, e o revisor Ricardo Lewandowski viu nesse ato uma demonstração de que Barbosa aderira de antemão à estrutura da acusação, o que já indicaria sua posição.

Acontece que a Procuradoria Geral da República dividiu o processo em três núcleos - o político, o operacional e o financeiro - e não em itens.

Esclarecido o mal-entendido, continuou-se num impasse, pois, se o relator queria que se votasse item por item, o revisor Lewandowski dizia que seu voto segue um raciocínio unitário e tinha que ser lido de uma vez.

Na tentativa de chegar a uma decisão majoritária sem imposição, o presidente da Corte, Ayres Britto, colocou a questão em votação, e a maioria decidiu que cada um votaria como quisesse.

Mas essa solução não resolveu o impasse do Supremo.

O ministro Joaquim Barbosa acabou de votar seu primeiro item, pedindo a condenação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha - candidato a prefeito de Osasco nestas eleições municipais -, por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, e do lobista Marcos Valério e de seus sócios por corrupção ativa e peculato.

Nesse processo imaginado por Barbosa, na segunda-feira seria a vez de o ministro revisor dar seu voto sobre os envolvidos nesse primeiro item, para em seguida os ministros votarem.

Acontece que, se Lewandowski decidisse ler seu voto na integralidade, não apenas ocuparia as próximas três ou quatro sessões como, mais grave, falaria sobre temas e personagens que ainda não teriam sido abordados pelo voto do relator.

Seria o caos, como definiu o ministro Marco Aurélio Mello. Por isso, a necessidade de um dos dois recuar de sua posição, e coube a Lewandowski se curvar diante da tendência da maioria.

Há ainda o risco de que, na metodologia de Barbosa, o ministro Cezar Peluso vote em alguns casos e não tenha tempo de votar em outros, o que poderá ser também objeto de contestação.

FONTE: O GLOBO

Dos embargos auriculares - Maria Cristina Fernandes

Este recurso não está em nenhum manual de direito e não consta dos currículos das universidades mas seu uso faz fama e fortuna de muitos advogados. À conversa ao pé do ouvido, obtida por acesso privilegiado a magistrados, cunhou-se a gíria do embargo auricular.

O recurso tem contribuído para a prosperidade de gerações de advogados na mesma velocidade com que levou 60% dos brasileiros a descrer dos seus juízes (Índice de Confiança na Justiça, FGV, 2012).

Um senador recentemente cassado fazia frequente uso deles junto a um ministro do Supremo Tribunal Federal. Um ex-candidato à Presidência da República e até mesmo um ex-presidente já foram flagrados em embargos auriculares junto ao mesmo ministro.

Julgar à luz dos autos numa nação que espera ser redimida

Tal foi a pressão que os ministros passaram a gravar as audiências concedidas aos advogados do mensalão.

Nos cinco dias a que a defesa teve direito no processo assistiu-se, finalmente, ao contraditório que, ao longo dos últimos sete anos, foi sonegado à opinião pública.

Desiguais na consistência dos argumentos e no anedotário, a banca de advogados foi capaz de abalar convicções sedimentadas como a de que parlamentares que pagam dízimo para integrar um partido seriam remunerados para segui-lo ou a de que o escoadouro de recursos públicos do mensalão tucano em Minas Gerais não guarda relação com aquele que os petistas colocariam em curso anos depois.

Depois de uma sucessão de advogados terem se empenhado em apelar para que os juízes se atenham aos autos, um dos derradeiros da banca foi à tribuna protestar contra o que acredita ser o cerceamento de sua atividade. Reclamou de não poder lanchar ao lado dos ministros do Supremo no intervalo das sessões, a exemplo do que o faz o procurador-geral da República.

O acesso do Ministério Público à magistratura é uma velha queixa da advocacia em nome do direito de defesa.

O reclamo passaria como uma nota dissonante de pé de página não tivesse sido verbalizada pelo defensor de presidentes da República, governadores, ministros, empreiteiros, banqueiros e advogado-sócio do restaurante que tem a maior concentração de embargos auriculares da capital federal.

A confissão pública de inconformismo parte de quem se vê obstruído no acesso ao poder.

Mas o Supremo já ofereceu sinalizações. Das muitas tentativas da defesa de desmembrar o processo e devolver os réus sem foro para a primeira instância, apenas aquela levantada pelo único defensor público do processo foi acatada pela Corte.

Em benefício do Estado de Direito, a causa que os advogados defendem hoje oferece contraditório a uma denúncia que ainda está por ser julgada verdadeira.

Mas o amplo aparato mobilizado pela defesa, de advogados a bem relacionados assessores de imprensa, confronta a tese de que, desde a denúncia, o conjunto de réus formado por políticos, publicitários, banqueiros e empresários foram desprovidos de poder e influência.

A indústria da defesa posta em curso nos últimos meses também colide com a tese que ganhou ampla divulgação, a despeito de ferir o bom senso, de que o governo Dilma Rousseff nada tem a ver com a turma do banco dos réus.

De fato, parece outro o país que, desde a eclosão do mensalão, passou a disputar o noticiário com seu julgamento: ampla greve do funcionalismo público, aprovação da cota de 50% das vagas de universidades federais para alunos egressos de escolas públicas e a divulgação dos piores balanços dos últimos tempos de grandes empresas.

São fatos que margeiam os autos mas apontam no mesmo rumo. O mensalão traz os ecos de um momento em que o país, acalentado por conjuntura econômica favorável contemplou de alto a baixo amplos setores da sociedade. Foi esse país para todos, como dizia o slogan, que ajudou a segurar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no cargo.

O Brasil do julgamento depara-se com escolhas mais prementes. A classe média tradicional pode estar ligada ou completamente desinteressada no julgamento, mas não há como ficar indiferente ao fato de que uma universidade pública para seus filhos é uma possibilidade cada vez mais remota.

A mudança nas regras da poupança ou o histórico discurso em que, vaiada pelo funcionalismo, a presidente disse que mais importante para o país é assegurar empregos para a população mais frágil e sem direito à estabilidade dificilmente poderiam ter sido iniciativas de um governo que estivesse com a corda no pescoço.

Nesses enfrentamentos, Dilma Rousseff pode se beneficiar do sentimento difuso de que se busca justiça. Mais difícil é avaliar o movimento na mão inversa. Como fazer justiça se sobre esse caso acumulam-se expectativas de uma nação a ser redimida?

As expectativas de justiçamento se dão em parte porque muitas das paradas postergadas pelo Executivo e pelo Congresso acabaram, nos últimos anos, resolvidas pelo Supremo - foi o caso da validação das cotas raciais, o aborto dos anencéfalos e o reconhecimento do casamento gay.

É disso que fala o ativismo judicial. O PT que hoje se vê às voltas com o risco desse ativismo ser levado às últimas consequências num julgamento pautado pela opinião pública, colhe o que plantou por ter trocado portas de fábricas por aquelas do Ministério Público.

Mas o ativismo judicial não tem um único pai. A paternidade legítima deve ser buscada junto à Constituição de 1988. Como guardião das ambições da Carta - aquelas de que falam os slogans de campanha - o Supremo acabou sobrepujando o Legislativo. Talvez esta seja uma das razões por que hoje pareça mais fácil lembrar o nome dos ministros do Supremo do que do deputado em que se votou nas últimas eleições.

A proeminência adquirida pelo Judiciário, aliada à transmissão das sessões enfatizou personalidades em detrimento do colegiado e são uma explicação para seus desentendimentos.

Mas ao contrário dos parlamentares que têm de prestar contas de quatro em quatro anos, os ministros retiram legitimidade de decisões juridicamente justificadas. É, portanto, sob esta pressão que os votos se debruçarão sobre os autos.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Bendita tensão - Dora Kramer

"O Supremo não é uma agremiação de iguais nem um julgamento deve necessariamente transcorrer em clima de afinidades."

A qualquer divergência tornada explícita entre os ministros do Supremo Tribunal Federal seguem-se avaliações de que o julgamento será, por isso, tumultuado, "tenso" no mau sentido do termo.

Os temperamentos mais eloquentes colaboram para essas interpretações: a irritabilidade do relator Joaquim Barbosa, a autonomia irônica de Marco Aurélio Mello, a assertividade algo ríspida de Cezar Peluso ou o contundente "aplomb" acadêmico de Gilmar Mendes.

São componentes do perfil de um colegiado que decide por maioria, mas se expressa na individualidade do voto elaborado a partir da convicção de cada um dos magistrados diante do conjunto de fatos em exame. Do embate de ideias, do cotejo de argumentos, não apenas natural como desejável e produtivo que surjam as divergências.

Inadequado seria que os magistrados se comportassem com a camaradagem que deles é cobrada de modo subjacente nas críticas feitas sempre que se expõe a fricção.

O Supremo não é uma agremiação de iguais nem um julgamento deve necessariamente transcorrer em clima de afinidades jurídicas e/ou pessoais. Não se trata de uma ação entre amigos – aliás, é justamente do que não se trata -, mas do exercício de uma função cuja essência está na independência de cada um.

No primeiro dia de julgamento do mensalão o tema surgiu e logo foi classificado como sinal de tempestade à vista. Joaquim Barbosa contestou a posição do revisor Ricardo Lewandowski sobre o desmembramento do processo proposto em questão de ordem apresentada pela defesa. Cumprindo o seu papel de servir como contraponto ao revisor.

Poderia ter concordado, mas discordou. E daí? Nada. A maioria acompanhou o relator, da mesma forma como se opôs a ele na proposta de representar à OAB contra advogados da defesa e na exclusão de um dos réus do processo.

Assim será durante todo o julgamento – como ocorreu ontem em relação à metodologia dos votos – em apreço ao bom embate, admitidas até eventuais nervosias.

Método confuso. O PSDB é um partido de oposição muito esquisito Não defende seu legado, não capitaliza o projeto de governo que executou quando na Presidência, mas o faz na forma de cumprimentos à atual presidente por ter "aderido ao programa de privatizações há anos desenvolvido pelo partido".

Se a ideia era ironizar o conteúdo do pacote de concessões de ferrovias e rodovias, o PSDB usou um recurso oblíquo que poder ser bom no debate elaborado, mas não surte efeito algum no público com quem políticos devem falar de maneira a serem entendidos.

No anúncio publicado pelos tucanos nos jornais ontem para saudar a iniciativa e lamentar seu "atraso", está expressa a diferença entre o diálogo direto de Lula e as sinuosidades de uma oposição mais preocupada em elaborar raciocínios do que em construir pontes com a sociedade.

A impressão que dá é que o PSDB resolveu disputar Dilma com Lula e o PT, no lugar de cuidar da própria vida, arrumar candidato, discurso, gestos e propostas que o tornem competitivo junto ao eleitor.

A popularidade de Dilma Rousseff e toda a aceitação que ela consegue agregar positivamente na comparação com Lula são capital político pertencente ao PT e adjacências. Ao governo, portanto. Não à oposição.

Guarda volume. Embora considere a ex-mulher de Carlinhos Cachoeira mais distinta que a atual, a CPI não tem dúvida: Andréia Aprígio é laranja do bicheiro.

A transferência de bens para o nome dela no valor total de R$ 5 311.795,29, segundo a comissão, nada teve a ver com partilha decorrente da separação consensual.

A conclusão é a de que Andréia foi posta na "guarda" do patrimônio e em contrapartida contraiu uma dívida de cerca de R$ 2 milhões com o bicheiro que seria uma espécie de caução.

Daí o silêncio dela quando foi à CPI, recusando-se a explicar a razão daquele "empréstimo".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A trupe togada apresenta: hoje tem marmelada! - Natanael Sarmento*

Nem as fantásticas narrativas de Gabriel Garcia Marques, nem o absurdo teatral de Eugène Ionesco cogitaram produziram cenas mais estapafúrdias e burlescas que as produzidas na pantomima do mensalão.

No palco suntuoso, sob suas capas pretas, os pretores vaticinam lições de direito e de ética, entre sonoridades de roncos e flatulências, na encenação do “maior julgamento da história do país”. Em julgamento, autoridades e personalidades públicas, ex-ministros, deputados, gente do colarinho branco influente no entorno da Presidência da República da era Lula, acusados de crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, fraude e evasão fiscal, estelionato, falsificação de documentos e tantos outros.

O Supremo Tribunal Federal é a corte guardiã da Constituição, órgão máximo da organização judiciária nacional, composto por 11 Ministros, nomeados todos pelo Presidente da República. O concurso é político, sem provas ou títulos, dependente de nomeação livre à investidura vitalícia. Portanto, a marmelada começa na própria estruturação do SFT.

No rabo preso do Tribunal, o acesso é mis em cène cujo enredo é escrito na Carta Constitucional. O Presidente da República tem a atribuição de nomear o escolhido. O enredo prevê uma sabatina no senado federal, a nacionalidade de brasileira; ter mais de 35 anos, reputação ilibada e vasto saber jurídico. Onde se lê tal ladainha, leia-se, “ser amigo do rei”.

Carapeba, velho pescador do Canto do Mangue, identifica da praia os cardumes e as espécies de peixes mesmo à distância e nas águas turvas. Nem o jaboti sobe sozinho no, telhado,nem o peixe vai prá panela, se encontramos um jaboti no telhado ou um peixe na frigideira, alguém o colocou lá.

Pela lógica do pescador, deve haver jaboti demais no telhado do STF. Haja vista o empurrão presidencial à nomeação e o beija-mão sanatorial que os especialistas na mímica da corrupção traduzem como “uma mão lava a outra”.

Obviamente, os especialistas em sofismas e retórica do mundo jurídico, podem contestar a afirmativa com centenas de jurisprudências firmadas nos pretórios, na sólida e tradicional doutrina jurídica e na própria lei, pois o ato atacado “consiste em atribuição constitucional do Presidente, devidamente previsto na Carta Magna”.

O Carapeba não concluiu o ensino fundamental, nem entende a linguagem do direito. Mas aprendeu no mar e na vida o sentido de rabo preso e de marmelada. De imoralidade. De falta de independência, quando sobram razões e motivos para acreditar em relações ou pendências econômicas, políticas, afetivas, ou meras dívidas de gratidão.

Afinal, o triste episódio do mensalão serve para expor as células cancerígenas do Estado e ressaltar as debilidades do arremedo de democracia à brasileira. A mídia bem que poderia aproveitar o ensejo para desencadear um debate sério sobre a reforma do Judiciário, a reforma política, a reforma tributária, o pacto federativo, entre outras.

Salve a liberdade de imprensa, mas a grande mídia que a tudo acompanha ufana-se com o escândalo em si, na obtenção da audiência a qualquer custo, a ver o circo pegar fogo, e divulgar detalhes bizarros dos ardis da trupe e gafes na função jurídica mambembe.

Na ênfase dos aspectos secundários da trama, a mídia não informa e não forma. As questões essenciais são encobertas pelas gafes do espetáculo. Espetáculo de quinta categoria com produção onerosa para o bolso do contribuinte.

Na peça acusatória do espetáculo, no papel de Arlequim de Pirandello, servo de dois amos, o senhor Procurador Geral da República. O Sr. Roberto Gurgel foi nomeado e empossado pelo então Presidente da república Luís Inácio Lula da Silva. Esse fato explica a peça processual na qual sobra farofa e falta carne. Milhares de páginas, uma denúncia gigantesca como um Zepellin, mas cheia de ar, pífia. Prato cheio para as defesas regiamente pagas. Da montanha de papel da denúncia sairão ratos. Insubsistências e prescrições. Quem responderá pela prescrição dos crimes? No final, culpados não cumprirão pena alguma. Mas o espetáculo deve continuar. Alguém deve receber uma condenação, talvez até exemplar.

Um boi de piranha para manter as aparências e preservar aura de seriedade da companhia artística. No fim da opereta bufa, a manada dos corruptos escapará incólume e o Cláudio Valério no papel do boi escolhido para o sacrifício das piranhas. Por Valério ninguém chorará. Mas, o Valério já foi boi gordo e influente, amigo do rei. Lula jura de pés junto não ter qualquer relação com a quadrilha e emotivo como ele é, decerto chorou por ver pessoas amigas e colaboradores no caminho da perdição. Porém, as circunstâncias mudam, e em política nada é o que aparenta, qual leciona o florentino. Assim, são lágrimas na chuva, como dizíamos na Moscou que não acreditava em lágrimas, e, portanto, não espere o boi de piranha por lágrimas nem dos polvos, nem das lulas.

O ministro Joaquim Barbosa com empáfia de pretor rejeitou, en passant, no seu relatório, a preliminar de inclusão do ex-presidente Lula no processo. Seria cômico, não fosse trágico. O ministro Barbosa excluindo da lide, sem maiores fundamentações, a pessoa que o nomeou o respeitável cargo de ministro do STF.

O ministro José Antônio Dias Toffoli também foi nomeado pelo Lula. Com agravante. Ele foi assessor e amigo do réu Zé Dirceu, o ex-comissário todo poderoso da era Lula. Mais. A mulher do ministro foi advogada do réu. No vasto saber jurídico do Tofolli, lamentavelmente, não contam as noção elemntares sobre impedimento e supeição.

O ministro Toffolli não se declarou suspeito ou impedo, como devia. O chefe da Procuradoria, o Gurgel, idem, e não suscitou o incidente: “ para não atrasar o andamento da sessão”. Tão célere o Gurgel, deve ter pressa para ver os acusados presos e por isso permite que juízes supeitos julguem o caso. A sessão “histórica” atrasou em cinco horas, motivada por bate boca entre os ministros. Nem o palco luxuoso, nem as capas pretas esconderam a nudez dos reis, deselegantes, sem respeito a liturgia do cargo.

“Nunca na história desse país” um Presidente nomeou tantos ministros. A caneta do Lula escreveu os nomes de Carlos Ayres Britto ( 2003), Joaquim Barbosa ( 2003), Ricardo Lewandowski (2006), Cármen Lúcia Antunes Rocha (2006), José Antônio Dias Toffoli (2009) e Antonio Cezar Peluso (2010).

Dizer que a nomeação pelo Presidente Lula não interfere na imparcialidade e na idoneidade do julgamento no qual Lula tem interesse direto é sofisma. O julgamento da quadrilha que atuava no governo do PT não é apenas jurídico, é político. Porém, sobrepujar, grotescamente, as regras básicas da legalidade democrática, do devido processo legal, da ética social é um gravíssimo precedente.

O estado de direito não comporta marmelada para salvar a pele do benfeitor, um simulacro de julgamento. Se o STF safar os sequazes, colocará a última pá de cal na credibilidade em estado de decomposição desse tribunal que é gigante pela força do poder, mas, mirrado em matéria de direito e de justiça.

Aprendizes dos primeiros anos de direito sabem a distinção entre suspeição e impedimento. Diferença que se perfaz pelo grau de comprometimento do juiz na causa. O escopo dos institutos é possibilitar o afastamento do juiz suspeito ou impedido a fim de assegurar a impessoalidade e a imparcialidade das decisões judiciais.

No impedimento, presume-se, absolutamente, a parcialidade do juiz. Na suspeição, presume-se, relativamente, o comprometimento. As causas de impedimento e de suspeição estão previstas, respectivamente, nos artigos 134 e 135 do Código processual civil.

Parte da doutrina civilista leciona que o rol não é numerus clausus, porquanto não se restringe aos casos taxativamente previstos, e alberga todas as situações de incompatibilidade lógica da função de julgar do juiz. É matéria de ordem pública, por essa razão, pode a suspeição ou o impedimento ser suscitado a qualquer tempo.

O dever legal e moral do magistrado é declarar-se impedido ou suspeito, por motivo de foro íntimo. Segredo de Polichinelo para a sociedade brasileira é por que os ministros apadrinhados na nomeação no governo Lula não se declaram suspeitos ou impedidos.

*Professor Dr. Titular do Departamento de Ciências Jurídicas/UNICAP e pesquisador do núcleo de História do Direito do grupo de história social do Departamento de história da mesma instituição

O Brasil depois do mensalão - Fernando Gabeira

O que é que vai dar tudo isso? Essa é a pergunta mais comum na rua. Poucos se interessam pelos bastidores do julgamento e suas filigranas jurídicas.

Não é possível responder com rigor sobre o veredicto e suas repercussões. O futuro é uma emboscada. José Dirceu previu a grande batalha política de sua geração. Os estudantes que ouviram seu discurso ficaram em casa ou nos bares.

O tédio não é o clima adequado para a mãe a de todas as batalhas. A foto dos ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa dormindo, na primeira página de jornal, em tempos de Olimpíada parecia sugerir que ganharam ouro em sono sincronizado.

Um dirigente da CUT previu a mobilização dos trabalhadores durante o julgamento. E os funcionários públicos mobilizaram-se... por melhores salários e planos de carreira. O PT pode censurá-los por perturbarem a vida das pessoas comuns que precisam de serviços públicos. Mas não pode condenar a tese de que melhores condições materiais de vida justificam o abandono de outros critérios. Como ressuscitar numa greve trabalhista a política lentamente assassinada numa década?

Segundo o antropólogo Roberto DaMatta, que estudou o comportamento dos brasileiros no trânsito e os observou nas filas de banco, temos uma certa resistência à igualdade. A desigualdade é a sensação mais comum e confortável, pois indica que o Brasil é sempre o mesmo e todos conhecem o seu lugar.

Uma condenação pode significar que pessoas poderosas, capazes de contratar advogados cujo trabalho, no conjunto, custou R$ 60 milhões, também estão sujeitas à derrota na Justiça. Já a absolvição pode significar que o velho Brasil está ali, firme, sobrevivendo a todas as marés. O acesso à Justiça é um privilégio da minoria com dinheiro e influentes relações pessoais.

É também impossível prever o impacto negativo sobre partidos políticos de uma condenação. Os marqueteiros concentram-se apenas nas eleições em curso. Muitos grandes partidos sobreviveram a escândalos no mundo. A condenação por uma Corte Suprema alivia um pouco a aura de onipotência que alguns dirigentes partidários transmitem, até se lixando para a legislação eleitoral. Eles passam a ser controlados pela lei.

Outro fator que reduz o impacto negativo, pelo que vejo na rua, é a sensação de ineficácia da oposição. Ela parece descoordenada, ausente nos grandes temas, incapaz de iniciativa, avessa à criatividade.

As pessoas que não se dedicam à política nem se preocupam em construir novas alternativas, limitam-se a escolher entre as opções reais. Dizem os historiadores que uma expectativa social, não achando canais na oposição, inexistente ou apática, tende a se manifestar no interior das forças governistas. Não há como afirmar que isso ocorrerá no Brasil. Mas quando essa expectativa se associa a uma visão de racionalidade econômica, aumentam suas chances de irromper no próprio governo.

Um indício desse processo está sendo vivido pela Petrobrás, que ao longo dos últimos anos viveu sob forte influência política, que se manifestou de diversas maneiras, desde a ocupação de dezenas de cargos por aliados que não são profissionais do ramo até a decisão sobre o preço da gasolina, ditada pelas conveniências do governo, e não pelo movimento do mercado.

Na mesma direção parece mover-se a matéria de capa da Veja, anunciando um choque de capitalismo no governo Dilma Rousseff, com a existência de seis programas voltados para a modernização da máquina administrativa e econômica do governo. Quando algumas mudanças são realizadas sem a pressão direta dos adversários, é muito maior a margem de manobra do governo. Ele dosa o ritmo e nada garante que seu esforço tenha continuidade e possa vencer a resistência política dentro da própria base aliada.

Uma luta sindical típica no lugar de interesse pelo júri do mensalão, a ligeira inflexão do governo diante da ausência da oposição: os fatos parecem indicar um esquecimento da política. O Congresso Nacional está semideserto e ninguém sente falta dele. Grandes temas polêmicos foram resolvidos pelo Supremo: cotas raciais, aborto em caso de anencefalia, legalidade das marchas pró-maconha.

Tudo isso configura um momento transitório. Para onde nos conduz? No livro de ensaios de intelectuais brasileiros intitulado O Futuro Não é Mais o que Era, o coordenador Adauto Novaes cita Ludwig Wittgenstein: "Quem conhece as leis segundo as quais a sociedade se desenvolve? Estou convencido de que o espírito mais inteligente não tem a mínima ideia. Se você combate, você combate. Se você espera, você espera. Pode se combater, esperar e mesmo crer, sem crer cientificamente".

Os intelectuais que discutiram o tema tratam do futuro como uma novidade séria, mais profunda e extensa do que alguém como eu tentando explicar no meio da rua as possíveis consequências do julgamento do mensalão. Aliás, alguns advogados queriam proibir esse nome, mensalão, trocando-o por Ação Penal 470. Se com esse nome não empolga, imagine Ação Penal 470. Uma outra hipótese: o processo seria chamado de "proibidão", ganharia funk na internet e talvez falássemos dele com a naturalidade com que cantamos "assim você me mata" ou "eu quero tchu, eu quero tcha".

A grande qualidade do julgamento, embora não se possa prever o seu desfecho, é exatamente nos trazer alguma curiosidade sobre o futuro imediato, sobre algo que ainda não aconteceu. Menos que influenciar o processo eleitoral em que a perspectiva das cidades brasileiras estará em jogo, o júri do mensalão vai moldar a nossa ideia do País: até que ponto somos iguais perante a lei, até que ponto esse tema da igualdade pode realmente irromper em nossa consciência de brasileiros desconfiados de sua validade, ou confortáveis com sua ausência.

Que venham os votos. Num júri histórico dessa dimensão, dezenas de outras análises vão surgir do veredicto. A minha é apenas das ruas, mesmo assim, só daquelas por onde tenho andado.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Suas eminências - Míriam Leitão

Este é um momento magnífico da democracia brasileira. O Supremo Tribunal Federal (STF) está na parte final de um longo processo, em que todo o direito de defesa foi respeitado, e 37 réus estão sendo julgados. Alguns eram integrantes da linha de frente do mais popular governo que a República já teve. É lamentável que a tensão e os desentendimentos pessoais ocupem a cena.

Não se sabe o que o STF vai decidir. E essa é a melhor notícia. Suas eminências, os ministros e ministras, não votarão de acordo com o desejo de quem os nomeou. Dos 11 ministros da Corte, oito foram nomeados nos últimos dez anos, em governos do PT. Se o Brasil fosse a Venezuela, já se saberia o resultado. Na verdade, não haveria o julgamento.

Não será a sentença que definirá o valor do momento. Ele tem valor em si. A condenação ou absolvição dos réus será uma decisão dos juízes. Cada brasileiro pode torcer pelo resultado que pense ser o mais adequado, mas o mais relevante é entender a informação que o próprio processo carrega.

Todas as instituições que nos trouxeram até aqui já viveram piores momentos. O Congresso já foi fechado, o Supremo teve ministros aposentados por ato institucional, o Ministério Público não tinha independência, a Polícia Federal era braço da repressão política.

Neste caso, todas essas instituições exerceram papéis corretos. Não houve perfeição. A Polícia Federal acha que o procurador ignorou certas partes da investigação, a CPI recolheu depoimentos em ambiente exacerbado pela disputa política, o Supremo vive cenas desconcertantes. Um dos ministros tem um óbvio impedimento porque terá que julgar aquilo que defendeu não existir. Alguns advogados foram muito além do razoável na defesa dos seus clientes, ofendendo relator e procurador. Um deles esteve mais dedicado às exibições de sua proximidade do poder.

Com tudo isso, o desempenho das instituições tem sido notável nos sete anos entre o conhecimento dos fatos e o julgamento. A nota fora do tom tem sido o clima de atrito entre os ministros relator e revisor. Debates regimentais e processuais eram de se esperar. Animosidades, não. O país não espera que ministros do Supremo sejam amigos, mas aguarda que sejam capazes de superar eventuais antipatias de natureza estritamente pessoal. Um provoca, o outro se deixa aprisionar na rede da provocação, quando ambos deveriam estar concentrados em exercer cada um o seu papel.

O relator tem um destaque central; o revisor tem o segundo papel. Já se sabe que os dois divergem, e isso é ótimo. Poderemos ver o mesmo fato por ângulos diferentes. Mas só o relator é relator. Por cinco anos o processo foi a ele entregue. O revisor preparou nos últimos seis meses o seu contraponto. Na hora do voto, serão todos iguais. Não há voto com peso maior.

Não está em questão a biografia dos ministros, mas sim a capacidade de as instituições passarem por um teste extremo. O ex-presidente Lula foi o mais popular dos chefes de governo. JK foi popular a posteriori, Getúlio teve grandes momentos nos braços do povo, mas sua história de ditador e presidente eleito é única. FH teve forte apoio no auge do Plano Real. Ninguém, no entanto, teve a popularidade de Lula.

A despeito disso, alguns dos seus principais auxiliares no primeiro mandato estão sendo julgados. Está lá o seu ex-chefe da Casa Civil. Está lá o responsável por sua propaganda eleitoral. É o fato de estarem no banco dos réus que mostra a solidez das instituições. A democracia brasileira se fortalece quando demonstra que não existem cidadãos acima das leis.

FONTE: O GLOBO

Eleições 2012

Pesquisa Ibope: 

Em S. Paulo, Serra e Russomanno empatam em 26%

No Rio, Paes mantém liderança com 47% e venceria hoje em primeiro turno; Freixo sobe de 8% para 12%

Amanda Almeida, Cristina Tardáguila e Gustavo Uribe

SÃO PAULO, RIO e BELO HORIZONTE A mais recente pesquisa Ibope sobre a sucessão da prefeitura de São Paulo, divulgada ontem e encomendada pela Rede Globo e pelo jornal "O Estado de S. Paulo", mostra que os candidatos José Serra, do PSDB, e Celso Russomanno, do PRB, estão empatados com 26% das intenções de voto. Na comparação com a pesquisa anterior, divulgada em 3 de agosto, Russomanno oscilou um ponto percentual para cima e o tucano se manteve no mesmo patamar. A margem de erro é de três pontos para mais ou menos. Numa simulação de segundo turno, o candidato do PRB venceria se a eleição fosse hoje: teria 42% e Serra, 35%.

No cenário de primeiro turno, o candidato do PT, Fernando Haddad, que na pesquisa anterior tinha 6%, subiu para 9%. Na sequência, aparecem empatados os candidatos Soninha Francine (PPS), Gabriel Chalita (PMDB) e Paulinho da Força (PDT), com 5%. Os candidatos Ana Luiza (PSTU) e Carlos Gianazzi (PSOL) tiveram 1%. José Maria Eymael (PSDC), Levy Fidélix (PRTB), Anaí Caproni (PCO) e Miguel Manso (PPL) não pontuaram. O percentual de eleitores que pretendem votar em branco ou nulo é de 12%, e 10% não sabem ou não opinaram.

A pesquisa do Ibope também mostra que o candidato do PSDB é o que apresenta o maior índice de rejeição: Serra não seria votado por 37% dos eleitores. Levy aparece na sequência, com 16%, seguido por Haddad, Paulinho, Soninha e Eymael, com 14%. Russomanno conta com rejeição de 11%. A pesquisa foi feita de 13 a 15 de agosto e ouviu 805 pessoas; está registrada no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) sob o protocolo número 00311/2012.

Em BH, Lacerda (PSB) lidera com 46%

No Rio, o prefeito Eduardo Paes (PMDB), que tenta a reeleição, caiu dois pontos, mas manteve a liderança isolada com 47%, segundo a pesquisa do Ibope divulgada pela TV Globo. Candidato do PSOL, Marcelo Freixo subiu quatro pontos: passou de 8% para 12%, diminuindo em seis pontos percentuais a diferença que o separa de Paes, agora de 35 pontos. O prefeito seria reeleito hoje no primeiro turno.

Rodrigo Maia (DEM) se manteve em terceiro, com 5%. Otavio Leite (PSDB) aparece com os mesmos 3% do início do mês; Aspásia Camargo (PV) caiu de 2% para 1% e foi ultrapassada por Cyro Garcia (PSTU), que cresceu de 1% para 2%. Fernando Siqueira (PPL) manteve-se com 1%, e Antônio Carlos (PCO) não registrou pontos.

O Ibope ouviu 805 pessoas entre 13 e 15 deste mês; a margem de erro é de três pontos. O levantamento foi registrado no Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) sob o número 00043/2012. Segundo a pesquisa, 15% dos entrevistados disseram que votariam em branco ou nulo, e 15% não souberam ou não quiseram responder.

Segundo a pesquisa, Maia é o mais rejeitado, com 32%. Paes vem em seguida, com 23%; Freixo é rejeitado por 8% dos entrevistados.

Em Belo Horizonte, a diferença entre Patrus Ananias (PT) e o prefeito Márcio Lacerda (PSB) se manteve estável, segundo o Ibope. O prefeito subiu três pontos e segue na liderança, com 46%. Patrus ganhou dois pontos e está com 23%.

Na pesquisa, em que foram ouvidas 805 pessoas e que foi registrada no Tribunal Regional Eleitoral de Minas sob o número 00235/2021, 13% dos eleitores disseram que votariam em branco ou anulariam, e 15% não souberam ou não quiseram responder.

No quesito rejeição, Lacerda foi de 13% para 19%. Patrus passou de 12% para 18%.

Na mesma pesquisa, o Ibope também pesquisou o possível resultado de um segundo turno entre Lacerda e Patrus. O prefeito venceria com 48% dos votos. Patrus obteria 28%; votos em brancos e nulos somariam 9%.

Em Recife, DEM e PSB acirram disputa pelo segundo lugar

Em Manaus, tucano sai na frente; em Campo Grande, peemedebista é líder


Na terceira rodada de pesquisas de intenção de voto feita pelo Ibope em Recife (PE), o senador Humberto Costa (PT) continua na frente, com 32% das menções, apesar de ter perdido três pontos percentuais. Esquenta a disputa pelo segundo lugar, onde empatam com 16% Mendonça (DEM), que caiu quatro pontos, e Geraldo Júlio (PSB), que subiu quatro.

Realizada entre os dias 13 e 15, a pesquisa mostra o tucano Daniel Coelho em terceiro, com 10%. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. Votos em branco e nulos somaram 15%, e 8% dos entrevistados não souberam ou não quiseram responder à pesquisa registrada no Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco sob o número 00068/ 2012.

Em Manaus (AM), o candidato Artur Neto (PSDB) está na frente, com 29% das intenções, seguido de Vanessa Grazziotin (PCdoB), com 19%. A disputa se acirra no terceiro lugar, onde empatam com 11% Sabino Castelo Branco (PSB) e Serafim Correa (PR). A margem de erro é de quatro pontos. Os votos em branco e nulos somaram 8%. E 9% não souberam ou não quiseram responderam à pesquisa registrada no TRE-AM sob o número 00013/2012.

Em Campo Grande (MS), o peemedebista Edson Giroto tem 37%, seguido por Alcides Bernal (PP), com 30%. A margem de erro é de quatro pontos. O petista Vander Loubet tem 7%. Votos em branco ou nulos somaram 7%, e 11% não souberam ou quiseram responder. A pesquisa está registrada sob o número nº 00080/2012.

FONTE: O GLOBO

Apagão gerencial e concessões - Rogério L. F. Werneck

Afinal, prevaleceu o pragmatismo. O governo caiu em si. Percebeu que não vai conseguir superar em tempo hábil o apagão gerencial que vem emperrando os programas de investimento na área federal. E decidiu que, nessas circunstâncias, o melhor que poderia fazer era reprimir preconceitos arraigados e repassar ao setor privado boa parte dos projetos de expansão de infraestrutura que não vinha conseguindo viabilizar. A grande dúvida é se o apagão gerencial que paralisa o PAC não vai acabar comprometendo também o próprio programa de concessões que acaba de ser anunciado.

A primeira leva de concessões envolve projetos rodoviários e ferroviários. As próximas, a ser anunciadas em breve, deverão incluir portos e aeroportos. Por sorte, o governo adiou mais uma vez o anúncio do estapafúrdio projeto do trem-bala. Foi noticiado que a presidente ainda estaria insegura com a "maturidade" do projeto. Será muito bom para o País se essa insegurança persistir.

Até que os investimentos saiam do papel, há pela frente longo cronograma, que o próprio governo, com toda razão, considera "ambicioso". Finalização dos estudos até dezembro. Audiências públicas em janeiro. Editais em março. Licitações em abril. E assinaturas de contratos entre maio e julho. Mesmo que não haja contratempos de qualquer tipo, o que é improvável, as primeiras obras só terão início no segundo semestre de 2013, a menos de um ano e meio do fim do atual mandato presidencial. Antes tarde do que nunca.

Na concepção das regras e incentivos que deverão pautar as novas concessões, o governo terá de levar em conta extensa lista de erros passados a evitar. Em 2007, o Planalto cantou em prosa e verso as tarifas módicas que havia conseguido impor em licitações de concessões rodoviárias. Constatou agora que os investimentos das concessionárias que venceram as licitações também acabaram sendo especialmente módicos. Não mais que 10% do que se comprometeram a fazer.

É fundamental que as concessões sejam capazes de atrair recursos efetivamente privados em grande escala. E que repliquem o que se observou, por exemplo, na licitação da Usina de Belo Monte, no Pará, quando tarifas módicas foram impostas a ferro e fogo. Em face do desinteresse dos investidores, o governo viu-se obrigado a montar consórcios "privados", com participação majoritária de empresas do Grupo Eletrobrás e de fundos de pensão de empresas estatais. E, ainda assim, foi necessário despejar um volume gigantesco de recursos públicos para fechar as contas. Ao fim e ao cabo, o esforço de investimento que vem sendo feito em Belo Monte - e em outros grandes projetos hidrelétricos na Amazônia - tem sido quase todo bancado com recursos do Tesouro, repassados pelo BNDES. Será lamentável se as concessões agora anunciadas acabarem dando lugar a arranjos similares, em que tudo é movido a dinheiro público, como, por estranho que possa parecer, o governo parece preferir.

A experiência recente de concessões de aeroportos também encerra lições importantes. O governo acabou percebendo que não havia dado o peso correto à experiência prévia dos licitantes. E não teve como evitar que alguns dos principais aeroportos do País acabassem em mãos de concessionárias de terceira linha no plano mundial.

Na gestão das novas concessões, o governo terá de evitar incorrer mais uma vez nos excessos de voluntarismo, centralização, aparelhamento e loteamento de cargos que redundaram na paralisia dos programas de investimento público. Regras bem concebidas e um aparato regulatório competente, confiável e independente são ingredientes fundamentais. No caso das concessões já anunciadas, é difícil que tudo isso possa ser assegurado sem mudança drástica na forma com que o governo tem tratado a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que há meses vem funcionando de forma precária, com diretoria interina. É difícil que, com tal descaso, as concessões possam ter o sucesso que o governo espera.

Economista, professor da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

As voltas que Dilma dá - Monica Baumgarten de Bolle

Foram muitas as reviravoltas da presidente desde que assumiu o cargo máximo da República em 2011. Um governo que começou sob forte suspeita de que um intervencionismo desenfreado seria deslanchado, de que as mudanças nas políticas macroeconômicas seriam todas para o mal e de que os problemas estruturais da economia brasileira não seriam enfrentados, sobretudo porque à presidente eleita faltava o molejo político. Pelo visto, se reinventou. Quem diria. Quem te viu, ou viu mal, quem te vê, Dilma Rousseff...

Nem tudo tem sido bom, evidentemente. Medidas protecionistas, como as regras de conteúdo local e o aumento dos impostos sobre determinados produtos importados, além das intervenções agressivas nos mercados de câmbio, algumas desfeitas devido aos seus efeitos perversos sobre a alocação de recursos, abundaram. No início de 2011, quando a inflação subia e a economia dava claros sinais de sobreaquecimento, criou-se uma confusão desnecessária em torno da política monetária. Medidas macroprudenciais \\- ações para reprimir o crédito e o fluxo de recursos financeiros - foram usadas sem parcimônia ou timidez, gerando muitas especulações de que o regime de metas de inflação fora abandonado ou de que o Banco Central perdera, de vez, a sua autonomia. O regime de metas de inflação de fato mudou - está mais para um regime que segue, informalmente, uma meta de PIB nominal, que soma à inflação o crescimento, do que para o que tínhamos até meados de 2010.

Plano de concessões na infraestrutura prioriza a eficiência do setor privado e reconhece a ineficiência do governo

Por outro lado, há, hoje, um reconhecimento maior de que o Banco Central não perdeu, necessariamente, a autonomia. Apenas está mais alinhado com o pensamento da presidente, que é economista, e, que, portanto, tem lá as suas próprias ideias sobre como a política econômica deve ser conduzida.

Depois desses embaraços e da confusão gerada pela má comunicação do governo e do Banco Central, a instituição saiu-se bem. Com o aval da presidente, fez um movimento ousado de queda de juros, apostando numa virada perversa do ambiente internacional que favoreceria a inflação brasileira. Acertou. Ainda que tenha contribuído para o mau desempenho da economia em 2011 e no início deste ano, com o uso desenfreado de medidas quantitativas que, por sua própria força bruta natural, afetam mais rapidamente as quantidades - a atividade, o PIB - do que os preços. Constatados os danos da experiência, elas foram deixadas de lado e o instrumento tradicional da política monetária foi resgatado. Afinal, era hora de reduzi-lo.

Para que fosse possível baixar os juros, promovendo a convergência almejada pela presidente, veio uma mudança importante e muito bem arquitetada: a alteração nas regras da caderneta de poupança. Tão bem pensada foi essa mudança, antes vista como politicamente inviável, que passou praticamente despercebida, especialmente pela imprensa. Eliminou-se, assim, um resquício perverso dos tempos de inflação alta que travava alguns canais de transmissão importantes da política monetária.

Mas eis que, mesmo com a reviravolta nos juros, a atividade continuou a desacelerar, provocando surtos de ansiedade na equipe econômica. A guerra aos spreads bancários foi declarada e o arsenal dos bancos públicos foi engajado, pacotes e mais pacotes foram anunciados, a desconfiança quanto à intensidade do viés intervencionista do governo voltou. Diante do crescente desconforto, as medidas anticíclicas promovidas pelo governo para impulsionar o consumo e reanimar certos setores foram recebidas com um enorme mau humor. Um mau humor tão arraigado que conseguiu criar da própria retórica rarefeita um prognóstico ominoso para a economia brasileira. O consumo havia se esgotado. As famílias, afogadas em dívidas, não reagiriam aos incentivos do governo. Como sabemos, a profecia não tem se materializado exatamente da forma como imaginavam seus proponentes.

Contudo, esses mesmos proponentes tinham outro ponto, esse, sim, de extrema relevância. Era preciso que o governo mudasse o foco da política econômica. Era necessário impulsionar o investimento, sem o qual não seríamos capazes de sustentar taxas de crescimento mais elevadas sem gerar inflação. A produtividade e a competitividade passaram a ser o cerne das críticas, sobretudo daqueles que insistiam que a competitividade não era uma mera questão cambial. Tratava-se do mais abrangente custo Brasil - a falta de infraestrutura adequada, a carga tributária onerosa, a má qualificação da mão de obra.

O governo tardou, mas ouviu. A presidente, em nova reviravolta, anunciou um plano ambicioso de concessões nas áreas de transporte e logística. Um plano que, a despeito das declarações de que não se trata de privatização, prioriza a eficiência do setor privado e reconhece a ineficiência do setor público. Ainda é muito cedo para dizer algo sobre os efeitos na economia, a não ser o óbvio: o impacto de curto prazo é mínimo. Entretanto, na mais recente virada aprendemos algo de novo sobre o raciocínio da presidente. Ela é intervencionista, sim. Mas é também pragmática. E o pragmatismo impõe limites aos seus impulsos intervencionistas.

Economista, professora da PUC-Rio e diretora do IEPE/Casa das Garças.

FONTE: VALOR ECONÔMICO