segunda-feira, 20 de agosto de 2012

OPINIÃO DO DIA – Roberto Gurgel: ‘o mensalão maculou a República’ (XVI)

"As defesas, especialmente dos acusados que integram o núcleo político, tentaram desqualificar a acusação afirmando que o dinheiro foi usado exclusivamente para financiamento de campanhas e pagamento de dívidas partidárias, como ajustado pelo Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, e que, assim, quando muito, teríamos caixa dois de campanha eleitoral.

No entanto, não explicaram porque os acordos e a obtenção do dinheiro foram feitos por intermédio de empresário vinculado a esquema de desvio de dinheiro e, também, porque procedeu-se à distribuição do dinheiro aos beneficiários mediante técnicas próprias de lavagem de capitais. Não explicaram, igualmente, a coincidência entre os pagamentos e as votações de questões relevantes para o governo, pagamentos sempre vinculados a um acordo político referente à atuação do parlamentar beneficiário em prol do governo, sem qualquer relação com o processo eleitoral.

Assinale-se, ainda, que o crime de quadrilha existe independentemente de um ajuste específico para esse fim. Não exige a lei, evidentemente, que os agentes se reúnam e decidam, formal e solenemente, constituir uma quadrilha, bastando a organização de fato, de modo permanente e estável, para o cometimento de crimes, podendo até acontecer de alguns agentes sequer se conhecerem.

O ciclo de formação da base aliada do governo federal começava com José Dirceu e terminava com Marcos Valério, responsável pela entrega da propina.

Roberto Gurgel, Procurador Geral da República, em memorial ao STF. O Estado de S. Paulo, 19/8/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Greve já custou R$ 1,2 bilhão em 7 anos
Supremo decide se houve uso de recursos públicos no mensalão
Educação: Os extremos do Ideb pelo país

FOLHA DE S. PAULO
PF ultrapassa fronteiras para combater o tráfico
Ministros do STF temem prejuízo à imagem da corte

O ESTADO DE S. PAULO
Defesa de réus do mensalão se une contra julgamento fatiado
Sindicatos se mobilizam por aumento real de até 10%
Condenação à vista
Kassab libera alvarás e atrai evangélicos
Estudo aponta ‘alerta’ em 30% das escolas após Ideb
União paga mais que município por remédio popular

VALOR ECONÔMICO
'Invasão' chinesa inflaciona mercado de pedras preciosas
Petrobras e fundos na mira da CVM
Banco público conquista devedor com juro menor
Burocracia 'desperdiça' dragagens
Penhora chega aos recebíveis de cartões
Risco de atrasos em Belo Monte

BRASIL ECONÔMICO
Até o fim do ano, governo licitará 30 mil quilômetros de rodovias

CORREIO BRAZILIENSE
Professores vão discutir validade de assembleia
O primeiro veredicto sai nesta semana

ESTADO DE MINAS
Convocados Para Copa
Luta desigual pelo voto dos religiosos
Congresso

ZERO HORA (RS)
Detran promete fechar depósito onde veículos são depenados na Capital
Duplicação da BR-116 começa a sair do papel
Confusão marca retomada de votos
Fundador do WikiLeaks rompe silêncio e desafia EUA

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Documentos complicam vida de José Dirceu
Dengue recua no Estado
Servidores lançam hoje a contraproposta
PT X PSB
Benefício
Vento promissor

Supremo decide se houve uso de recursos públicos no mensalão

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estão prestes a analisar uma questão crucial no julgamento do mensalão: decidir se dinheiro público abasteceu o esquema de corrupção de parlamentares. Esse debate deve ocorrer esta semana, quando entrarem em pauta os próximos itens do julgamento, que tratam da denúncia de desvio de recursos do Banco do Brasil no fundo Visanet para a agência DNA, de Marcos Valério. Em 2007, quando aceitaram a denúncia, três ministros — Ayres Britto, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa — afirmaram no plenário da Corte que há indícios fortes de uso de verba pública. A defesa nega

STF chega a ponto crucial

Ministros estão prestes a julgar se foi usado dinheiro público para corromper parlamentares

Flávio Tabak

BRASÍLIA O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma hoje o julgamento do mensalão já se preparando para um embate que envolve uma das questões centrais da acusação do Ministério Público: atestar se o esquema operado por Marcos Valério desviou recursos públicos para corromper parlamentares. O tema vai à votação logo após o plenário decidir se confirma a condenação do deputado João Paulo Cunha (PT), ex-presidente da Câmara, por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, como defendeu o relator, ministro Joaquim Barbosa.

A acusação contra Cunha está no item 3.1 da denúncia. Os itens 3.2 e 3.3 serão os próximos a serem submetidos à Corte pelo relator, que prometeu seguir a ordem do recebimento da denúncia pelo STF em 2007. Nos dois itens, estão as denúncias de desvio de recursos do Banco do Brasil no fundo Visanet para a agência DNA Propaganda, de Valério. Em agosto de 2007, quando aceitaram a denúncia, alguns ministros disseram, em plenário, que havia indícios fortes sobre o uso de dinheiro público. A defesa dos réus sustenta, porém, que o dinheiro é privado. Alega que o fundo Visanet é integrado por várias instituições financeiras, entre elas o BB.

O ministro Carlos Ayres Britto, hoje presidente do STF, disse à época que o dinheiro da Visanet era público. Cinco anos depois, com o decorrer da ação penal, Britto pode mudar de opinião, como qualquer ministro. Mas sua argumentação era clara: "Do que se trata aqui? De uma aplicação do Banco do Brasil no fundo Visanet. (...) Esse dinheiro, para fins penais, oriundo de uma economia mista, é público, inclusive para efeito de controle. E o dinheiro público não se despubliciza, não se metamorfoseia em privado pelo fato de ser injetado numa pessoa jurídica totalmente privada, como é a Visanet. O dinheiro continua público a despeito de sua movimentação por uma empresa privada".

Relator perguntou sobre origem da verba

Britto terminou sua fala com um comentário sobre o mau uso do dinheiro público: "Concluo, sem querer adiantar juízo de mérito, absolutamente, mas impressionado com a facilidade com que são movimentados, aqui no Brasil, tantos recursos públicos e sem contrato, sem comprovação".

Não à toa, o assunto foi o único escolhido por Barbosa para questionar um advogado durante as sustentações orais da defesa na primeira parte do julgamento este mês. Marthius Sávio Cavalcanti Lobato, defensor de Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, teve que responder, surpreso, sobre a origem dos recursos do Visanet destinados à DNA e depois repassados a políticos ligados ao governo.

Em seu voto, ao receber a denúncia há cinco anos, Barbosa disse que os recursos do Visanet têm raiz pública: "Provinham do Banco do Brasil, que tem natureza de sociedade de economia mista, a qual, não obstante seja pessoa jurídica de direito privado, integra a administração indireta, opera com dinheiro público e está submetida ao controle do Tribunal de Contas da União".

Gilmar Mendes foi outro ministro que, antes da instrução processual, disse crer que os recursos eram públicos. Ao votar sobre o recebimento do item 3.2, disse: "Tive dúvidas porque, na defesa, falava-se inicialmente sobre os recursos da Visanet e o seu caráter estritamente privado. Mas, ainda e, nessa condição, seriam recursos públicos. Acompanho o relator".

MP pediu absolvição de Luiz Gushiken

Além de Pizzolato, os réus dos itens 3.2 e 3.3 são Valério e seus sócios Ramon Hollerbach e Cristiano de Mello Paz. O envolvimento do ex-ministro Luiz Gushiken também é tratado nesse trecho. Mas o Ministério Público pediu sua absolvição e os ministros devem confirmar isso. O advogado de Pizzolato espera que a votação dos itens seja baseada nas provas que vieram após 2007 e sustenta que era dinheiro privado:

- O Visanet respondeu que é um fundo privado. Pareceres da consultoria jurídica do BB nos autos dizem que o fundo não é do banco e não é dinheiro público. No regulamento do Visanet há um dispositivo que fala que os recursos são de exclusividade do fundo - diz Lobato. - No recebimento da denúncia, há meros indícios e não todas as perícias da instrução, as provas, os depoimentos. Não houve essa resposta toda.

Para o advogado Marcelo Leonardo, que defende Valério, as perícias feitas durante a instrução contrariam a tese de uso de verba pública:

- A perícia feita pela Polícia Federal afirmou que o fundo Visanet é privado e que pertence à Companhia Brasileira de Meios de Pagamento, pessoa jurídica com nome fantasia Visanet. Os recursos eram administrados pelo comitê gestor do Visanet e jamais transitaram por contas do Banco do Brasil. O dinheiro saiu de conta do Visanet para conta da DNA. Peritos afirmaram em audiência que não existe prova de transferência de recurso do BB para o Visanet.

FONTE: O GLOBO

Ministros do STF temem prejuízo à imagem da corte

Para membros do Supremo Tribunal Federal, o relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, e o revisor, Ricardo Lewandowski, transmitem imagem de desequilíbrio emocional. Seus pares na corte temem prejuízo à credibilidade do resultado do julgamento, que recomeça hoje

Ministros passam imagem de desequilíbrio, dizem colegas

Valdo Cruz, Matheus Leitão

BRASÍLIA - Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) dizem reservadamente que o relator Joaquim Barbosa e o revisor Ricardo Lewandowski estão passando uma imagem de "desequilíbrio emocional" que pode prejudicar a credibilidade do resultado do julgamento do mensalão.

Os ministros ouvidos pela Folha defenderam que o presidente do STF, Carlos Ayres Brito, converse com os dois para evitar a repetição do "clima de duelo" entre eles, que pode consolidar uma visão de que o tribunal está dividido em duas alas: uma pró e outra contra os réus.

"Esse ambiente só beneficia a defesa e pode pesar negativamente na avaliação final que será feita do julgamento", disse reservadamente um ministro, acrescentando que relator e revisor parecem estar desequilibrados emocionalmente.

Outro ministro comentou que, se fosse um júri popular, os bate-bocas protagonizados nas últimas sessões do STF já seriam motivo para um "pedido de dissolução".

Em conversas reservadas, Ayres Britto tem dito que a situação está, aos poucos, se normalizando e que vai atuar para apaziguar os ânimos no Supremo.

O julgamento recomeça hoje, com a previsão de que o revisor Lewandowski apresente seu voto sobre o primeiro item do capítulo 3 da ação penal, que já foi apresentado por Joaquim Barbosa.

Na sessão da última quinta-feira, o relator votou pela condenação do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), do empresário Marcos Valério e de seus dois ex-sócios no caso envolvendo a contratação de agência SMPB pela Câmara dos Deputados.

Depois do revisor, votam os demais nove ministros, por ordem inversa de antiguidade no STF.

Mas havia ainda dúvidas sobre o roteiro a ser seguido.Ontem à noite Ayres Britto conversaria com o relator. Havia a possibilidade de Barbosa optar por encerrar a análise de todo o capítulo 3, que tem mais dois itens sobre contratos de agências de Valério e o Banco do Brasil.

Agressão

A animosidade entre relator e revisor atingiu o ápice momentos antes do início da sessão de quinta, no cafezinho do Supremo.

Barbosa e Lewandowski discutiram por causa da decisão do relator de fatiar seu voto, ou seja, votar em blocos, e não de uma vez só. O revisor chegou a ameaçar renunciar ao cargo.

O tom da conversa foi tão agressivo que, segundo quem presenciou a cena, eles quase se agrediram fisicamente.

O embate se manteve no início da sessão, quando o revisor manifestou publicamente sua discordância.

Barbosa chegou a dizer que, se não seguisse aquele formato, havia o risco de o julgamento terminar sem sua presença -por conta de seus problemas na coluna, que tornariam difícil ele apresentar seu voto na totalidade.

Ao final da sessão, Lewandowski foi convencido pelos colegas a aceitar o formato.

Segundo os advogados da defesa, o relator é um voto certo pela condenação da maior parte dos réus e estaria querendo "ganhar no grito" as principais questões formais do julgamento.

Já o revisor tem assumido posição de "contraponto" a Barbosa. Um interlocutor de Lewandowski disse, porém, que ele vai "surpreender".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Defesa de réus do mensalão se une contra julgamento fatiado

Em manobra inédita, advogados subscrevem petição do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos

Advogados dos réus do mensalão protocolam hoje petição conjunta contra o fatiamento do julgamento no Supremo Tribunal Federal. Numa ofensiva sem paralelo na história do STF, eles alegam que a proposta do relator Joaquim Barbosa, de fragmentar a ação de acordo com os crimes e personagens envolvidos, configura "julgamento de exceção" e "verdadeira aberração". Redigido pelo ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, o texto é subscrito por alguns dos mais famosos advogados do País, como Arnaldo Malheiros Filho e Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Além do peso da mobilização, a petição deve provocar impacto na cúpula do STF porque coincide com críticas internas à proposta de Barbosa. "Eu nem sei quando vou poder votar", afirma o ministro Marco Aurélio Mello.

Advogados se queixam de julgamento "fatiado" e lançam ofensiva no Supremo

Contra-ataque. Capitaneados por Thomaz Bastos, cerca de 20 defensores de réus do mensalão levam petição a ministros para que Corte reconsidere decisão do processo por partes, como proposto pelo relator do caso, e classificam metodologia de "aberração"

Fausto Macedo, Felipe Recondo

BRASÍLIA - Os advogados dos réus do mensalão insurgiram-se contra o fatiamento do julgamento no Supremo Tribunal Federal. Em petição que será protocolada hoje no gabinete do presidente da Corte, Ayres Britto, os principais criminalistas constituídos pela defesa sustentam que a fragmentação - proposta pelo ministro relator, Joaquim Barbosa - seria uma "aberração" e configuraria "julgamento de exceção".

É a mais pesada reação dos bacharéis contra a decisão do Supremo de dividir o julgamento da ação por capítulos, personagens e crimes, em vez de cada ministro ler seu voto sobre o processo de uma só vez. Os advogados chamam de "obscura" a ordem estabelecida, "que afronta o postulado do devido processo legal, bem como os dispositivos do Regimento Interno do STF".

Os advogados reivindicam esclarecimentos sobre o rito a ser adotado nas próximas sessões plenárias, o roteiro de votação e o cálculo de penas, no caso de condenações. "Reiterando sua preocupação com a realização de um julgamento de exceção, pedem deferimento", diz o texto.

A ofensiva dos advogados, sem paralelo na história da Corte, vai provocar impacto na cúpula do Supremo, pois coincide com a posição de parte dos ministros. A exemplo dos defensores, esses integrantes do STF se declaram confusos com os rumos do julgamento. "Nem sei quando vou poder votar", admitiu o ministro Marco Aurélio Mello.

Cópias da petição também serão entregues a alguns ministros, além do protocolo no gabinete de Ayres Britto. A estratégia é que um dos magistrados se manifeste na sessão de hoje sobre a manifestação dos advogados.

Autoria. A petição foi pensada e redigida pelo criminalista Márcio Thomaz Bastos, ex-ministro da Justiça no governo Lula, defensor do executivo José Roberto Salgado, do Banco Rural. Com 53 anos de experiência, Thomaz Bastos declara "respeito e apreço" a todos os ministros. O texto contém argumentos técnicos e trata a Corte com reverência.

Subscrevem o manifesto cerca de 20 advogados, como José Luís Oliveira Lima (que defende o ex-ministro José Dirceu), Luiz Fernando Pacheco (José Genoino, ex-presidente do PT), Arnaldo Malheiros Filho (Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT) e Antônio Cláudio Mariz de Oliveira (Ayanna Tenório, ex-dirigente do Rural).

A banca de advogados sustenta que o fatiamento sugerido por Barbosa toma por princípio a versão acusatória, da Procuradoria-Geral da República, ao seguir a ordem da denúncia, método "ao qual se opôs de imediato" o revisor Ricardo Lewandowski.

Os advogados temem que, se prevalecer essa fórmula, ficará configurado fato excepcional na história judiciária do País. "Pior do que aquilo que o ministro Marco Aurélio denominou de "voto capenga", por decidir, num mesmo julgamento, sobre uma imputação e não outra, teremos aqui um voto amputado, em que o ministro dá o veredito, mas não profere a sentença, numa segmentação alienígena."

Na quinta-feira, Barbosa votou pela condenação do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), do empresário Marcos Valério e de seus ex-sócios, mas não aplicou pena. "Nenhum magistrado brasileiro diz "condeno" sem dizer a quê e a quanto", protestam os criminalistas.

Para os defensores, a metodologia que separa o julgamento em muitas partes caracteriza distinção excepcional entre veredito e sentença. "A prevalecer o fatiamento, haverá um juiz apto a proferir o primeiro (veredito), mas não a segunda (sentença), o que, para nossa cultura jurídica, é verdadeira aberração."

Os advogados pedem "acesso aos votos parciais do relator durante as sessões e em momento precedente à sua leitura, nas mesmas condições em que os recebe o procurador-geral da República" e mostram preocupação com a situação de Cezar Peluso. "Não bastasse essa situação de exceção, que desnatura a constitucionalidade do julgamento, temos a dificuldade da conhecida proximidade da aposentadoria compulsória do ministro Cezar Peluso (no dia 3), já que é inexorável a marcha do tempo."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Modelo de votação é o mais racional, diz Celso de Mello

Rubens Valente

BRASÍLIA - O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Celso de Mello apoiou o voto em fatias adotado pelo relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa.

Pelo método, apresentado aos demais ministros na quinta-feira, no plenário do STF, os votos serão dados em blocos, e não de uma vez só.

O relator descreveu primeiro as acusações contra o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP), o publicitário Marcos Valério e dois de seus ex-sócios, e votou pela condenação dos quatro. O julgamento será retomado hoje.

Com o fatiamento, o processo "ficou mais racional, penso que organiza melhor cada caso", disse o ministro à Folha, na saída de uma livraria em Brasília, na noite de anteontem.

Mello disse ainda que o tribunal deve discutir se um eventual empate leva à absolvição, pelo princípio "in dubio pro reo" (na dúvida, em favor do réu), ou se considera um voto de desempate, do presidente Ayres Britto.

Nos casos de habeas corpus, o STF tem entendido que o empate favorece o réu. Mas o caso do mensalão pode gerar um cenário inédito.

"Nunca o Supremo registrou empate em caso de ação penal", disse Mello, que preferiu não manifestar sua opinião. O ministro, que participou do julgamento da denúncia contra o ex-presidente Fernando Collor, nos anos 1990, lembra que no plenário também havia ministros em número par, mas a decisão ficou em cinco votos a três.

O risco de empates aumenta com a decisão de julgar o mensalão em fatias. O ministro Cezar Peluso se aposenta obrigatoriamente no dia 3. Até lá, ele deverá participar de, no máximo, seis sessões no julgamento. O Supremo deverá julgar inúmeros réus do mensalão com apenas dez ministros.

Celso de Mello, que será sempre o penúltimo a votar, antecipou que lerá apenas um resumo de seu voto. A íntegra será anexada posteriormente, quando da publicação do acórdão, a exemplo do que o ministro costuma fazer em diversas votações.

Cansaço

"Quando for a minha vez de votar, estará todo mundo esgotado de cansaço", disse o ministro. "Vou ser breve."

Mais antigo membro do STF em atividade, Mello contou que o julgamento tem provocado jornadas estafantes de trabalho. Durante o recesso do Judiciário, que acabou pouco antes do início do julgamento, cerca de 60 processos à espera de medidas liminares se acumularam apenas em seu gabinete.

Agora ele tem que decidir sobre esse estoque ao mesmo tempo que julga o mensalão. Por isso, disse que tem ficado no Supremo até às 3h durante a semana. Mello tem fama no Supremo de trabalhar de madrugada. Ele faz questão de escrever pessoalmente seus votos, não delegando a tarefa aos auxiliares.

Há dois anos, contudo, o ministro reduziu sua carga horária, depois que um médico lhe fez uma advertência ao detectar sério risco à sua saúde, e passou a sair mais cedo do tribunal. A antiga rotina, contudo, foi retomada com o julgamento.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Condenação à vista

Pelo menos 3 ministros do STF dão como certa condenação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha por peculato e corrupção.

Expectativa no STF é por condenar petista

Pelo menos 3 ministros veem "provas suficientes" para punir João Paulo Cunha por corrupção passiva e peculato

Felipe Recondo, Fausto Macedo

BRASÍLIA - São pequenas as chances de o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) livrar-se da condenação no Supremo Tribunal Federal (STF). Três ministros já anteciparam, reservadamente, que há provas suficientes para condená-lo pelos crimes de corrupção passiva e peculato e avaliaram que a maioria da Corte adotará o mesmo entendimento.

Os três se juntariam ao relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, que votou pela condenação do deputado. No entanto, dois desses ministros que ainda não votaram mostram-se reticentes com a acusação de que o deputado teria lavado dinheiro ao mandar a mulher sacar R$ 50 mil numa agência do Banco Rural. Conforme o Ministério Público, quando presidia a Câmara, João Paulo recebeu o dinheiro para garantir contratação, pela Casa, da SMPB, empresa de Marcos Valério.

Barbosa argumenta, em seu voto, que o saque dos recursos não foi registrado em nome do deputado ou de sua esposa - que foi ao banco pegar o dinheiro. De acordo com as investigações, os saques eram registrados em nome da SMPB. Para o ministro, isso configuraria lavagem.

Com base nesse argumento, Barbosa poderia condenar todos os 34 réus suspeitos de lavagem, avaliam os advogados que atuam no processo. Os saques feitos por parlamentares ou por seus assessores nas agências do Banco Rural não eram registrados no nome do sacador ou do beneficiário. Esse ponto do voto deve gerar debates. Um dos ministros afirmou que punir o deputado pela corrupção e por lavagem seria puni-lo duplamente por uma prática apenas. Portanto, deverá condená-lo pela corrupção, mas não por lavagem.

Outro ministro disse não ter identificado a tentativa de João Paulo de dissimular a origem do recurso. Se não tentou esconder a origem do dinheiro, o deputado não poderia ser condenado pelo crime de lavagem .
A Corte terá questões importantes a debater sobre o crime de lavagem. Por exemplo, decidir se o mero recebimento de recursos por um deputado que desconheça a origem criminosa do dinheiro configura lavagem. Outra dúvida é se a acusação precisa demonstrar o crime cometido antes da prática da lavagem de dinheiro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Corte ainda tem dúvidas sobre sessão de hoje

Presidente Ayres Britto conversará com relator para definir se ele segue votando ou se o revisor dá o voto sobre João Paulo

Mariângela Gallucci, Ricardo Brito

BRASÍLIA - Os ministros do Supremo Tribunal Federal devem ir hoje à sessão de julgamento do mensalão sem saber ao certo a programação do dia. Integrantes e assessores da Corte confidenciaram ontem não ter ideia sobre o ritual a ser seguido - se o relator Joaquim Barbosa continuará votando ou se caberá ao revisor, Ricardo Lewandowski, se posicionar sobre a acusação contra o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), o empresário Marcos Valério e seus ex-sócios.

Barbosa defendeu o fatiamento da votação, seguindo a divisão adotada pela denúncia pelo Ministério Público. Depois de ter defendido na quinta-feira a condenação de João Paulo por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, Barbosa poderá apresentar a parte de seu voto sobre as acusações que pesam contra o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, completando, assim o item referente a desvio de recursos públicos da denúncia.

Pizzolato é suspeito de supostas irregularidades em contratos da instituição com a DNA Propaganda e de desvio envolvendo verbas de publicidade do BB oriundas do Fundo Visanet.

Reunião. O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, deve reunir-se antes da sessão com Barbosa para definir o rito. A equipe de Lewandowski, por sua vez, passou o fim de semana no Supremo para reorganizar o voto do ministro de acordo com a ordem estabelecida por Barbosa, na expectativa de que o revisor apresente seu voto sobre a situação de João Paulo Cunha.

A falta de previsão sobre o que ocorrerá esta tarde é mais uma demonstração de que não existe diálogo entre os ministros do STF. Os problemas entre eles ficaram claros com uma série de troca de farpas nas últimas sessões.

O ministro Marco Aurélio Mello se disse surpreendido pelo novo rito de votação - ele se preparava para votar só no fim de setembro. Sua aposta é que o colegiado julgará João Paulo para, depois, entrar na análise de Pizzolato. "Espero que a paz reine no plenário, porque o revisor deverá ter a palavra, não pode ser interrompido", afirmou.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O primeiro veredicto sai nesta semana

Quase um mês após o início do julgamento, o Supremo Tribunal Federal deve proferir nos próximos dias a sentença de um dos réus, o deputado federal João Paulo Cunha. O relator, ministro Joaquim Barbosa, já o condenou por corrupção passiva e peculato

Veredicto a caminho

Supremo retoma hoje a análise da denúncia de corrupção passiva e peculato contra o deputado João Paulo Cunha, com previsão de sentença ainda nesta semana

Helena Mader

Depois de três semanas dedicadas ao julgamento do mensalão, o Supremo Tribunal Federal caminha para proferir o primeiro veredicto sobre o caso. Com a decisão de fatiar a análise em itens, os ministros farão rodadas de votação para cada capítulo da denúncia e o primeiro a saber seu destino será o deputado federal João Paulo Cunha. Hoje, o ministro revisor da ação penal 470, Ricardo Lewandowski, vai apresentar o seu voto e, nas próximas sessões, os outros nove ministros também vão anunciar se condenam ou absolvem o parlamentar. O relator, ministro Joaquim Barbosa, já condenou o réu por corrupção passiva e peculato. Como o primeiro capítulo do modelo adotado pelos ministros trata das suspeitas de uso de dinheiro público no esquema, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato deve ser o segundo a saber o desfecho da ação. Joaquim Barbosa vai apresentar seu voto sobre o envolvimento de Pizzolato logo depois que o STF proferir a decisão definitiva sobre Cunha.

Lewandowski terá que adaptar o seu voto depois que o Supremo optou pelo fatiamento do julgamento. O revisor reclamou muito desse método em plenário e sugeriu que a análise por núcleos poderia passar a impressão de que os ministros acataram a tese da denúncia da Procuradoria Geral da República. Mas Lewandowski cedeu e aceitou mudar seu voto.

Além de Cunha, Joaquim Barbosa condenou o empresário Marcos Valério e dois sócios por corrupção ativa e peculato, e a decisão definitiva a respeito deles também pode sair esta semana. Mas o trio ainda será julgado por várias outras acusações ao longo do julgamento. João Paulo Cunha, que além de deputado federal é candidato à prefeitura de Osasco, foi acusado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de receber R$ 50 mil para beneficiar a agência SMP&B, do empresário Marcos Valério, em uma licitação da Câmara dos Deputados. À época, Cunha era presidente da Casa. Ele também é acusado de peculato porque teria permitido que a agência recebesse R$ 1 milhão em honorários, mesmo tendo subcontratado mais de 99% dos serviços de publicidade.

O advogado de João Paulo Cunha, Alberto Zacharias Toron, não arrisca um prognóstico a respeito de quando sairá a decisão. "É muito difícil dizer, a gente não sabe como vai ser o voto do ministro Lewandowski", justifica o advogado. "Mas com base nos meus 30 anos de experiência na advocacia, se o voto do ministro revisor for na linha do relator, o julgamento tende a ser menos demorado. Quando relator e revisor estão acordes em um sentido, a discussão normalmente é bem mais rápida", explica Toron.

Expectativa

Depois de João Paulo Cunha, o Supremo vai analisar a conduta do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Segundo a denúncia, ele teria recebido R$ 326 mil de Marcos Valério. A defesa garantiu que o ex-diretor da instituição recebeu o dinheiro em um pacote fechado, sem saber seu conteúdo, e o entregou a um representante do PT. A Procuradoria Geral da República apontou na denúncia Pizzolato como o responsável pela liberação de R$ 73 milhões da empresa Visanet, ligada ao Banco do Brasil, à DNA Propaganda, de Marcos Valério. O advogado de Pizzolato garantiu no Supremo que todas as decisões do Banco do Brasil são colegiadas e que o ex-diretor não teria autonomia para ordenar pagamentos sem consultar a cúpula. O grande debate desse capítulo da denúncia é se o dinheiro que circulou entre a Visanet e a DNA Propaganda era público. A defesa alega que a Visanet é uma empresa estritamente privada. O MP assegura que o dinheiro é público.

Representante de Pizzolato, o advogado Marthius Sávio Lobato está na expectativa de que seu cliente seja o segundo a ser julgado pelo Supremo. "Só não sei se vai ser ainda esta semana ou só na semana que vem", comenta Lobato. Assim como outros advogados de réus do mensalão, ele critica o método do julgamento acatado pelo STF. "Essa forma de analisar a questão confirma a denúncia e não leva em consideração o que foi apresentado pelas defesas", argumentou Lobato.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

À espera do pior - Ricardo Noblat

"Querem correr atrás de quem grita "pega ladrão" ao invés de pegar o ladrão" - Miro Teixeira (PDT-RJ), em defesa da imprensa

A se confirmar o que adiantam ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em conversas reservadas com jornalistas, a maioria dos réus do processo do mensalão está simplesmente... Como é mesmo que diria o ministro Dias Toffoli, dono de uma linguagem desabrida? A maioria está enrascada. Advogados dos réus pensam da mesma forma. Haverá condenações pesadas, segundo eles. E nomes conhecidos acabarão presos. José Dirceu? Não sei. Mas ele anda pessimista.

Acontecerá de fato o que os ministros segredam? Não sei. Desconfio que nem eles não sabem. Os ministros andam muito salientes. Aprenderam a projetar o que lhes interessa — atitude de verdadeiros pop stars. Mas o que projetam muitas vezes serve para esconder suas intenções.

Mais de mil decisões de peso ou não serão tomadas até o último dia do julgamento. Têm-se uma vaga ideia de que o último dia cairá em meados de outubro. Ou de novembro. O ministro Marco Aurélio não descarta a hipótese de o julgamento terminar apenas no próximo ano.

Espera-se que uma vez que começou termine. Afinal, na semana passada, em dado momento, pareciam inconciliáveis as posições de Joaquim Barbosa, ministro-relator, e de Ricardo Lewandowski, ministro-revisor. Joaquim queria fatiar a leitura do seu voto. E queria que cada fatia fosse imediatamente votada por seus pares.

Lewandowski foi contra. Por ele, Joaquim leria as mil páginas do seu voto. Lewandowski leria as 1.400 páginas do seu — o que prometeu fazer bem devagar. Chegaria a vez de os demais ministros. "Será o caos" decretou Joaquim, que ameaçou renunciar à relatoria. Lewandowski ameaçou renunciar à revisão.

O impasse foi contornado com o aparente recuo de Lewandowski. Ayres Britto, presidente do STF, anunciou que Lewandowski concordara com a forma de votação proposta por Joaquim. De passagem pelo Rio, Lewandowski deu a entender que não foi bem assim.

Há dois ou três meses a direção do STF definiu o número de cadeiras reservadas para jornalistas, advogados e cidadãos comuns. Acertou como seria o formidável esquema de segurança jamais montado dentro e fora do prédio do STF. Reforçou a segurança de cada ministro. E formatou o calendário de sessões.

Esqueceu ou não quis reunir os ministros para estabelecer o roteiro das votações. E a maneira de fazê-las. Os ministros são conscientes e orgulhosos dos seus poderes. Nenhum vale mais do que o outro. A presidência é rotativa. As mordomias são iguais. Não cultivam o hábito de se consultar sobre seus votos.

Ayres Britto perguntou a um ministro: "Quantas páginas terá o voto de Vossa Excelência?" A pergunta causou espanto. Que ousadia! O ministro não respondeu. Os votos dos 11 ministros estão prontos ou quase. Mas eles podem mudá-los em cima da hora, até mesmo de improviso.

No passado, os tribunais eram patronais e governistas. Estão deixando de ser por causa da mídia, do debate travado nas redes sociais e da cobrança da sociedade por maior transparência. Conservadores receiam uma Justiça populista. Seus contrários aplaudem uma Justiça menos vinculada aos donos do poder.

Há 30 anos, uma denúncia como essa do mensalão jamais teria sido aceita pelo STF. Há 20 anos, talvez, mas ao cabo do julgamento não haveria culpados. Agora? O melhor é aguardarmos.

FONTE: O GLOBO

Além e aquém do horizonte - Wilson Figueiredo

Dos três problemas humanos à espera de solução, dois deles foram resolvidos no Século 20, sem recorrer ao sobrenatural: o advento das pesquisas de opinião livrou os eleitores da incerteza das eleições, e a ciência aboliu a expectativa incerta sobre o sexo do nascituro, de que se ocupavam o pai e a mãe nos nove meses de gestação. Sobrou para o Século 21 equacionar e resolver o terceiro mistério, qual seja, a incógnita que se aninha na cabeça dos juízes na hora das decisões. No caso específico do mensalão, não poderia ser diferente e, por isso, o problema recai sobre os cidadãos que pagam impostos e se contentam em eleger candidatos menos ruins, com base na oferta de predicados que nada têm a ver com eles.

Está aí o mensalão, que não disse tudo que está implícito no seu efeito político e moral, nem como ficará o cidadão que custeia os espetáculos de indignidade Um dia, alguém seguirá a recomendação de refazer o trajeto do dinheiro que o mensalão movimentou e chegará aos beneficiários, e só então os mortos conhecerão a paz.

Ninguém parece se lembrar do que foi a interminável arrecadação e distribuição do dinheiro que saia de bancos e passava de mão em mão até ancorar, em solo nacional ou em território exterior, em contas bancárias até que seus beneficiários se sentissem libertos do medo inevitável a quem se apropria de dinheiro alheio. O hiato de sete anos, entre o escândalo e o julgamento dos envolvidos em flagrantes de corrupção, foi preenchido com outros procedimentos igualmente indignos de respeito.

O que se passou desde então na esfera política está mais para farsa. O dinheiro da corrupção dá voltas e voltas em torno de simulações vazias de convicção. Caixa 2 está para um político de carreira como batedor de carteira para o capitalismo. Faltou o levantamento de lucros e perdas dos dois mandatos do governo Lula, para se chegar ao cálculo final do prejuízo político nada republicano, como vem mostrando o julgamento do mensalão. O que se vê é o que sobrou de um lixão histórico acumulado, uma avenida sem fim por onde trafegam carreiras parlamentares e carreiristas de qualquer procedência. O critério político excluiu o ex-presidente Lula e deixou o chefe da Casa Civil do seu governo sozinho em cena.

Nenhum partido com algum significado para existir propôs, ao menos, um debate parlamentar sobre o mecanismo do mensalão, em consideração pelo eleitor que volta periodicamente às urnas, com menos convicção de que seja possível separar o passado e o futuro por cima de divergências negociáveis politicamente.

A responsabilidade política pelo que aconteceu à margem da lei recaiu nas duas figuras que respondiam pelo governo e pelo PT quando, antes de ser questão nacional, o mensalão se destinava a sustentar o exercício do poder por vinte anos declarados. Mas, o pacote cresceu e desautorizou a versão oficial de Caixa 2 como salvação da República. O Palácio do Planalto ficaria em situação menos desconfortável se tivesse reconhecido estar a par do que se passava e das conseqüências que não o poupariam. A Casa Civil não poderia se responsabilizar sozinha por um risco incalculável. Ao Presidente da República cabia a última palavra. Ou mesmo o silencia significativo, um mover de olhos ou um gesto de desagrado.

A responsabilidade política prevalecerá sobre o saldo social de Lula e respingará na conta política de José Dirceu, mesmo que os dois se vistam de branco como em Roma faziam os candidatos quando saiam às ruas para pedir o voto dos cidadãos. O julgamento político não depende da justiça, mas da cidadania. E prevalecerá. É uma questão de consciência.

Wilson Figueiredo é jornalista

FONTE: JORNAL DO BRASIL

Duas épocas da corrupção - Renato Janine Ribeiro

O tema mais frequente nas discussões sobre o poder no Brasil, pelo menos no período republicano, é a corrupção. Mas não é um grande tema político, por uma simples razão: esse assunto, ao substituir a política, degrada-a. Em vez de se debater quais rumos nosso País deve tomar, acusa-se o outro lado de praticar crimes comuns. Ou seja, nossa sociedade se porta como se não houvesse rumos a escolher para o Brasil - apenas, crimes dos quais escapar. Não discutimos a política, mas o crime. Não procuramos construir um futuro para nossa casa comum. Limitamo-nos a reclamar dos homens maus que nos enganam. No fundo, nem sei se pensamos em futuro. Queixamo-nos do presente e do passado. Para uma sociedade ter futuro, ela precisa projetar o destino que quer construir. Isso é bem mais do que reclamar da sina que se abateu sobre nós, do que falar mal da gente má que nos faz mal.

Mas quero me ater a duas épocas da República, as mais recentes. Não falarei do Império ou da República Velha, com sua enorme fraude eleitoral, mas dos últimos cinquenta anos. A ditadura militar abafou a crítica, na fase que começa com o Ato Institucional nº 5, em dezembro de 1968. Contudo, no fim da década de 1970, jornalistas corajosos começam a investigar casos graves de corrupção. Começa aí uma época que duraria quase duas décadas. Ainda sob o regime militar, a imprensa denuncia a corrupção. Já no governo civil, Jânio de Freitas revela o caso da Ferrovia Norte-Sul. Sarney era presidente. Seu sucessor, Fernando Collor, não completa o mandato - porque ele mesmo é denunciado e julgado. Em dezembro de 1992, ele se torna o único presidente do Brasil a perder o cargo por impeachment. No ano seguinte, há mais acusações, das quais a principal é a dos deputados chamados de "anões do orçamento".

Essa foi uma fase heroica da história da imprensa brasileira e, por que não dizer, do Brasil também. Começa com jornalistas valentes, enfrentando um regime no qual grassavam a tortura, a censura, a ditadura. Prossegue, no início da frustrante Nova República, com profissionais da imprensa e parlamentares se empenhando em apurar casos graves, isso enquanto ainda se teme a volta do regime de força. Esses jornalistas e deputados atuam como verdadeiros heróis (insisto na ideia), lutando pela decência e por um país melhor. Nessa época, está claro qual é o lado do bem, qual o do mal. Aliás, as denúncias de corrupção são didáticas. Os fatos parecem óbvios. A oposição entre "nós" e "eles" não é maniqueísmo. É real - ou assim parece.

No passado era claro onde estava a corrupção

Infelizmente, esse tempo passou. Veja-se o posfácio que Mario Sergio Conti escreveu para a nova edição de seu "Notícias do Planalto", o apaixonado relato das apurações jornalísticas e parlamentares que levaram à destituição de Collor. Pois os jornalistas audazes de vinte anos atrás estão hoje, quase todos, fora da imprensa. Uns trabalham em atividades que, no passado, eles próprios não admirariam. É o que impressiona na leitura dessa atualização de currículos. Um sonho, uma esperança se desfez. Lembremos que um dos deputados mais ativos na apuração dos fatos foi José Dirceu, cuja imagem pública também mudou.

Porque, desde que a "Folha de S. Paulo" começa a publicar, em meados da década de 1990, matérias sobre suposta corrupção no governo tucano, a divisão entre bem e mal se perde. Principia a segunda época da corrupção. Daí em diante, tudo se embaralha. Há um racha entre os que combateram a ditadura e os maus costumes políticos. O governo Fernando Henrique não quer apurar as denúncias de compra de votos para a reeleição (assunto recordado por Jânio de Freitas no "Roda Viva" este mês), nem as de irregularidade na privatização das teles. Depois disso, o governo Lula também não desejará aprofundar as denúncias que vierem. Não há mais um lado do bem - ou, se há, ficou com os nanicos. Será por acaso que quem pediu a cassação do então senador Demóstenes foi um senador do PSOL, que tem a menor bancada dentre os partidos sobre os quais lemos com alguma frequência?

Este é um dia de Arnaldo Jabor - eu me refiro ao que mais admiro nesse escritor poderoso, que é quando ele evoca com certa nostalgia os tempos em que tudo era preto ou branco, em que o bem estava de um lado e o mal, de outro: os tempos da ditadura. É verdade que hoje ele defende um dos lados em que o país se dividiu na política, mas a força de sua escrita vai além disso. Ela é um pranto por um país que poderia ter existido, mas não existe - pelo menos, por enquanto. Um país que não existe porque o PSDB e o PT desistiram de construí-lo.

Porque era fácil acompanhar o caso Delfin, Collor, os anões. Hoje, não é nada fácil. Pessoalmente, desde o escândalo da compra de votos para aprovar a emenda da reeleição, denunciado em 1997, não consigo entender os casos. Não têm a limpidez que havia nos processos da era heroica. Temos gente decente jurando que houve compra de votos, e gente boa assegurando que não. Idem, para o mensalão. Os casos viraram cipoais. Geralmente, quem tem certezas a respeito é quadro de partido. Sabendo que a forma fácil de fazer campanha política é acusar o outro lado de desonesto, e que a desonestidade óbvia é a corrupção, muitos atribuem corrupção ao antagonista só para ter votos. Vá-se ver o caso Collor, em 1992, e compare-se o caso do mensalão - lendo sempre os dois lados, acusação e defesa - e se verá como é difícil se orientar em meio ao caos atual. Mas creio que esta desorientação é fruto da perda da nossa inocência, e que a perdemos devido à Realpolitik em que se meteram os melhores partidos, primeiro o PSDB, depois o PT.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Horário eleitoral gratuito é mais determinante na disputa municipal

Cristian Klein

SÃO PAULO - Na última eleição municipal, em 2008, os pouco conhecidos candidatos a prefeito Marcio Lacerda (PSB), em Belo Horizonte, e João da Costa (PT), no Recife, subiram em média nove pontos percentuais nas pesquisas de opinião em apenas oito dias depois de iniciada a campanha eleitoral no rádio e na TV.

A disparada, aponta o cientista político Antonio Lavareda, mostra o quanto é determinante para a vitória de um candidato a propaganda no rádio e, sobretudo, na TV, cujos custos de produção chegam a consumir mais de 70% dos orçamentos de campanha.

A propaganda neste ano nas emissoras começará na terça-feira, quando se iniciam as exibições do chamado horário eleitoral gratuito, com blocos de 30 minutos, e as inserções (ou "spots"), de 30 segundos, veiculados em meio aos anúncios comerciais.

Para Lavareda, a propaganda na TV é ainda mais importante nas eleições a prefeito do que para presidente da República e governador, devido ao que considera uma distorção na legislação. Enquanto os demais candidatos majoritários dividem o total de 2,7 mil inserções com os concorrentes a deputado federal, estadual e senador, os postulantes a prefeito tem um "latifúndio", pois não precisam compartilhar os spots com os candidatos a vereador.

"Na eleição para prefeito, com poucos dias de campanha, as curvas de intenção de voto sofrem mudanças imediatamente. É uma avalanche de propaganda capaz de tornar um desconhecido em celebridade em apenas uma semana", afirma Lavareda, um dos organizadores do livro "Como o eleitor escolhe seu prefeito" (Editora FGV).

Sua opinião é compartilhada pelo professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), Felipe Borba. "A atenção do eleitor, numa disputa presidencial, é dividida com uma série de outros candidatos. Na municipal, ela se concentra muito na corrida pela prefeitura, que monopoliza as inserções", diz Borba, também ligado ao Doxa, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp/Uerj).

O pesquisador faz uma comparação: enquanto na última eleição presidencial a então candidata Dilma Rousseff teve 229 inserções e seu principal adversário, o tucano José Serra, contou com 158 anúncios de 30 segundos; agora na corrida para a Prefeitura de São Paulo, por exemplo, Serra e o ex-ministro Fernando Haddad (PT) terão 689 anúncios cada um. Ou seja, quase três vezes mais que Dilma em 2010.

Tal monopólio seria o principal responsável pela rápida difusão da imagem dos candidatos a prefeito com maior número de inserções. O maior volume de propaganda se juntaria à maior eficácia dos spots em relação ao tradicional horário eleitoral.

"Quando digo TV, é spot. O bloco contínuo de propaganda é uma obsolescência, cujas raízes estão no regime militar. São tijolaços, dos quais a maioria foge. Atraem apenas os muito interessados em política e que as pesquisas apontam como os que menos alteram suas preferências de voto", afirma Lavareda.

Felipe Borba ressalta que a audiência hoje está mais dispersa na TV a cabo e na internet e que os spots é que atingem o eleitor, ao pegá-lo de surpresa. Para o pesquisador, o maior volume de propaganda disponível aos candidatos a prefeito ajudaria os concorrentes mal posicionados na disputa. "Quem está atrás tem mais chance. O [Marcelo] Freixo [candidato do PSOL, no Rio], por exemplo, terá 123 [inserções]. Pouco, perto do [prefeito Eduardo] Paes [que tem 1.467], mas parece suficiente para mandar a sua mensagem. Compare com a Marina [Silva, candidata à Presidência em 2010]. Ela teve apenas 29 [spots]", defende Borba.

Lavareda não acredita que a maior quantidade de spots favoreça os desafiantes em relação aos líderes, mas, quanto à Marina, especula que ela teria chegado muito mais longe em 2010 caso tivesse mais do que 1min23s no horário eleitoral.

"Se com esse pouquíssimo tempo, ela alcançou 20% dos votos, imagine com três ou cinco minutos, o que corresponderia a mais spots?", pergunta o cientista político.

Para provar o impacto da propaganda no rádio e na TV, Lavareda lembra que 77% dos prefeitos eleitos nas capitais em 2008 tiveram o maior programa no horário gratuito e 12% contaram com o segundo maior tempo.javascript:void(0)

"Só dois candidatos, em Belém e Manaus, se elegeram tendo o quarto maior tempo de TV", afirma.

É o desafio a ser enfrentado, por exemplo, pelo candidato do PSOL, em Belém, Edmilson Rodrigues, que vem liderando as pesquisas há um ano e meio, com mais de 40% das preferências, mas terá apenas 1min39s, o sétimo maior tempo de TV. Rodrigues é deputado estadual e foi prefeito por dois mandatos, quando ainda era filiado ao PT. "Espero que o meu caso não confirme esta hipótese. As pesquisas mostram que entre 65% e 70% da minha votação está consolidada, são eleitores que dizem que não mudarão de voto", afirma Edmilson.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Candidatos apostam em estreia na TV

Vandson Lima e Raphael Di Cunto

SÃO PAULO - A poucos dias do início da propaganda eleitoral gratuita, que começa na terça-feira, os candidatos à Prefeitura de São Paulo buscam melhor discurso para seus primeiros dias nas telas e adotam diferentes estratégias para ganhar a atenção do eleitor. Enquanto os estreantes em disputas majoritárias Fernando Haddad (PT) e Gabriel Chalita (PMDB) gastarão seus minutos apresentando-se ao eleitorado, o candidato do PRB, Celso Russomanno, apostará na boa acolhida que tem nas ruas junto a quem já o vê há tempos no televisor.

Na campanha do tucano José Serra não se fornecem informações sobre o horário eleitoral. Pela rejeição em alta do candidato, que no Ibope divulgado ontem, chega a 37%, é previsível que a estreia do programa se destine a combatê-la. O governador Geraldo Alckmin, com popularidade em alta, pode ser um cabo eleitoral a ser explorado na TV.

Com um candidato bastante conhecido da população, mas desprovidos de padrinhos políticos e tempo de televisão comparável aos concorrentes, o publicitário Ricardo Bergamo, coordenador da campanha de Russomanno, diz que não fará "poesia". "Russomanno é disparado a figura mais popular dessa eleição. Então nos primeiros programas vou focar no personagem, com muita imagem dele com o povo nas ruas", avalia.

Para Bergamo, Russomanno começa a disputa televisiva com evidentes vantagens. "Não gastarei tempo apresentando o cara, tentando vender alguém que tem seis pontos na pesquisa ou que defende a atual gestão. Enquanto os outros vão se estapear discutindo a questão nacional, a gente vai direto nos problemas da cidade. A eleição é local, por isso é a cara do Celso", acredita. Por enquanto, a campanha de Russomanno finalizou três programas.

O publicitário se diz ciente de que Russomanno tem amealhado votos em regiões onde o PT colhe bons resultados, mas não pretende focar a atuação em áreas específicas da cidade. "Privilegiar uma região agora é burrice. O discurso do Celso é genérico, voltado para a cidade num todo. Se focar agora em uma região, os concorrentes se consolidam em outras. Compromete o 2º turno".

Bergamo desdenha das previsões de especialistas que preveem a queda do candidato do PRB com o início da propaganda de TV. "Temos feito pesquisas com o Instituto Informa, o mesmo que faz a campanha do prefeito Eduardo Paes (PMDB) no Rio. A gente sabia, por exemplo, que com a saída do Netinho de Paula (PCdoB) boa parte dos votos dele migrariam pro Russomanno. Os "especialistas" todos erraram nesse ponto".

Menos conhecidos, Chalita e Haddad utilizarão pelo menos os três primeiros programas para apresentarem suas biografias aos eleitores. A ideia do marqueteiro João Santana, segundo petistas ouvidos pelo Valor, é mostrar a família de Haddad, sua trajetória acadêmica e sua relação com os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, de quem foi ministro da Educação. O ex-presidente Lula deve aparecer em todos os programas para vincular sua imagem à do candidato do PT.

A previsão é que Haddad também apareça no horário eleitoral destinado aos candidatos a vereador - às terças-feiras, quintas e sábados - para pedir votos para a legenda e reforçar seu nome junto aos eleitores. A expectativa maior da coordenação de campanha é tornar o petista conhecido através das inserções no meio da programação normal.

Já Chalita não deve, pelo menos nos primeiros programas, usar seu maior cabo eleitoral, o vice-presidente Michel Temer (PMDB). A estratégia visa reforçar a imagem do próprio candidato, que seria independente de padrinhos políticos, e evitar a entrada da presidente Dilma na campanha em favor de Haddad - ela quer se manter afastada enquanto os partidos de sua base tiverem mais de uma candidatura em São Paulo, mas teria a desculpa para aparecer na campanha se seu vice fizesse o mesmo. Também pesa na decisão do PMDB o fato de Temer não ser grande puxador de votos.

O pemedebista levará para a televisão o tom crítico à atual administração, do prefeito Gilberto Kassab (PSD) e de seu aliado Serra. Segundo integrantes da campanha, Chalita apontará os problemas da cidade e os atribuirá nominalmente à gestão Serra / Kassab.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Candidatos clonam programas federais

Fábio Guibu, Daniel Carvalho

RECIFE, SÃO PAULO - Candidatos a prefeito estão buscando em programas e ações do governo federal inspiração para suas propostas para as eleições de outubro.

É possível encontrar grifes do governo Dilma Rousseff em versões genéricas nos programas da base aliada e até mesmo da oposição.

Ao menos sete planos ou programas federais foram adaptados para figurar nas propostas de governo de pelo menos oito candidatos em seis capitais do país.

O ProUni (programa de bolsas em universidades privadas) e o Brasil Sem Miséria (combate à miséria extrema) são os modelos mais comuns nas capitais analisadas.

Para o cientista político e marqueteiro Antonio Lavareda, a incorporação de programas federais é positiva para governistas e oposicionistas.

"No Brasil, com 30 partidos, todo mundo já imitou todo mundo. O que é quase proibido no Brasil é a originalidade", disse.

Aliados no plano federal e adversários em Recife, o PT e o PSB pretendem criar versões municipais do ProUni.

Humberto Costa (PT) e Geraldo Julio (PSB) prometem bolsas de estudos em instituições privadas a estudantes de baixa renda que concluírem o ensino fundamental na rede pública municipal.

A proposta é conceder descontos em impostos municipais ou em eventuais débitos das instituições de ensino com a prefeitura.

Geraldo Julio anunciou ainda a construção de 20 "Upinhas", versão das UPAs, unidades de saúde 24 horas para urgência e emergência.

"É um sinal de que os programas federais são um sucesso", disse Costa à Folha.

Exemplos

O candidato do PT em Belo Horizonte, Patrus Ananias, promete renda mínima de R$ 50 para 55 mil famílias, em uma espécie de Bolsa Família, programa que ajudou a criar como ministro de Lula.

Na linha do plano Brasil Sem Miséria, Pauderley Avelino (DEM) promete lançar o Manaus Sem Miséria.

Em Fortaleza, é Elmano de Freitas (PT) quem estabelece a erradicação da pobreza extrema como meta.

Já Inácio Arruda (PC do B) promete criar Centros de Habilitação e Reabilitação "nos moldes" da Política Nacional de Atenção à Saúde das Pessoas com Deficiência.

Em Porto Alegre, Manuela D"Ávila (PC do B) diz que vai criar Academias da Saúde, remetendo à ação federal que implanta polos para a orientação de prática de exercícios. O coordenador de marketing da campanha, Juliano Corbellini, diz que o programa traz projetos inspirados em ações de outras prefeituras.

Em Curitiba, Ratinho Junior (PSC) incluiu no programa o combate à desindustrialização, numa ação que remete ao plano Brasil Maior.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Atrás do glamour perdido

Políticos de expressão nacional no passado agora se ebruçam sobre temas municipais

Paulo de Tarso Lyra, João Valadares

As eleições municipais, pródigas em revelar novos nomes na política, também podem ser a única oportunidade para alguns que já tiveram destaque nacional recuperarem o prestígio e o glamour que desfrutavam tempos atrás. Acostumados a debater políticas macroeconômicas e projetos de envergadura nacional e internacional, terão que discutir agora buracos nas ruas, filas nos postos de saúde e ausência de postes em algumas quadras esportivas.

Arthur Virgílio (PSDB-AM), que teve uma carreira fulminante no Congresso, é um exemplo. Líder do governo Fernando Henrique Cardoso, desfrutou de gabinete no Palácio do Planalto: secretário-geral da Presidência. Quando Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente, Arthur chegou ao Congresso como senador. Transformou-se numa das principais vozes da oposição, tendo sido preponderante para a maior derrota de Lula na Casa — o fim da CPMF.

Rancoroso, Lula trabalhou junto ao governo Eduardo Braga (PMDB-AM) para a composição de uma chapa capaz de alijar o tucano do parlamento. Conseguiu. Virgílio lidera as pesquisas eleitorais para a prefeitura de Manaus, com 29% das intenções de voto na chapa "A esperança é agora". Curiosamente, demorou a decolar no cenário local — nas eleições para o governo do Amazonas, em 2006, teve apenas 5,5% dos votos — por espremer-se entre um debate nacional e uma questão paroquial: parte do PSDB, principalmente a ala paulista liderada por José Serra, era contra a prorrogação dos subsídios da Zona Franca de Manaus, o que só aconteceu durante o governo Lula.

César Maia (DEM-RJ) foi prefeito fluminense por três vezes. Na primeira delas, em 1996, quando não havia ainda o instituto da reeleição, conseguiu emplacar seu sucessor Luiz Paulo Conde. Teórico econômico do partido, herdeiro dileto do brizolismo, Maia reconheceu que perdeu projeção política nacional. E não se constrange em ter de pedir votos para vereador, seu novo objetivo nas disputas de outubro. "Até eu fico impressionado. Afinal, um ciclo de administrações a nível municipal me deu informações sobre a cidade e sobre a prefeitura que tornam a campanha muito prazerosa", declarou ele, ao Correio.

Uma confluência de fatores impede planos mais ambiciosos para César Maia. O DEM entrou em um inferno astral e definha a olhos vistos, com lideranças consideradas importantes, como o ex-senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), pilhadas em escândalos de corrupção e parlamentares migrando para o recém-criado PSD. Maia acredita que o estrago político só poderá ser medido em 2014. Já no Rio de Janeiro, a política passou a ser dominada pelo PMDB do governador Sérgio Cabral e do prefeito Eduardo Paes. Fato que levou o ex-prefeito a patrocinar uma aliança com um dos seus grandes desafetos, o deputado Anthony Garotinho, para lançar a chapa Rodrigo Maia—Clarissa Garotinho para a prefeitura do Rio.

De ministro a vereador

Raul Jungmann já foi ministro do governo Fernando Henrique Cardoso, deputado federal por duas vezes consecutivas, candidato a senador e a prefeito. "Pense grande" continua sendo o slogan de campanha, mas o pernambucano de 60 anos, agora, tenta uma modesta vaga na Câmara de Vereadores do Recife. Ele explica: "Sou um animal político e preciso de uma tribuna. Ficar quatro anos fora do debate é fatal", resume.

A candidatura para vereador foi emulada por uma carta assinada por um grupo de intelectuais — dentre eles Fernando Henrique Cardoso e o poeta Ferreira Goulart. Ele diz que percebe o estranhamento de parte do eleitorado. "Alguns amigos estranharam. Um deles disse que eu não cabia na Câmara de Vereadores. A verdade é que sempre fui um quadro nacional, mas sou um parlamentar de opinião. Distribuo ideia e preciso da tribuna", admitiu.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

David Pinheiro (PPS-Rio), na coluna do Ancelmo Gois

'Voteio-o!’

David Pinheiro, o Sambarilove da “Escolinha” de Chico Anysio, é candidato a vereador no Rio. Sugestão de um gaiato sobre sua fala na TV:

- Por que votar?... Por que não votar?... Por que votar?... Por que não votar?... Voteio-o!!!

FONTE: O GLOBO

Tudo embolado na disputa em Curitiba

Ducci tenta a reeleição e conta com o apoio do governador Beto Richa, mas Gustavo Fruet e Ratinho Junior aparecem como adversários de peso

Adriana Caitano

Em um cenário em que não há favoritos e nenhum dos candidatos tem a certeza de que irá para o segundo turno, a campanha pela prefeitura de Curitiba (PR) promete ganhar fôlego a partir de amanhã, quando entra no ar a propaganda eleitoral na tevê e no rádio. As últimas pesquisas de intenção de voto apontam que os curitibanos estão indecisos e, apesar de conhecerem bem os principais candidatos, ainda não foram totalmente conquistados por nenhum.

Apesar do empate técnico entre três candidatos ao cargo, há uma certa desvantagem para o atual prefeito, Luciano Ducci (PSB). Por tentar a reeleição e ter a seu lado tanto a máquina municipal como a estadual, com o apoio do governador Beto Richa (PSDB), esperava-se que o socialista disparasse na liderança. Mas mesmo um pouco à frente do ex-deputado federal Gustavo Fruet (PDT) e do deputado federal Ratinho Junior (PSC), Ducci encara também um alto índice de rejeição dos eleitores.

Em desfavor do prefeito pesa ainda um recente escândalo envolvendo um aliado, o vereador João Cláudio Derosso, ex-presidente da Câmara Municipal de Curitiba. Acusado de envolvimento em irregularidades na Casa, ele renunciou à presidência e se desfiliou do PSDB. O caso é utilizado pelos adversários, mas Ducci garante que a história não afeta sua candidatura. "A Câmara é o Poder Legislativo da cidade, cabia à Justiça tomar providências, não ao prefeito, as pessoas estão tentando confundir as coisas, mas a população sabe separar isso bem", argumenta.

Mensalão

A carta na manga de Ducci para sair do empate técnico deve ser apontar as contradições dos concorrentes, com destaque para Fruet. "É a população que vai decidir o que é importante, quem tem coerência, quem mudou de lado, pois uma coisa é mudar de partido, outra é buscar apoio de quem já se combateu", ressalta. Ex-tucano com forte oposição ao governo Lula, Fruet integrou a CPI dos Correios, que apurou o esquema do mensalão, e, após divergências com o PSDB, migrou para o PDT e tem uma petista como vice em sua chapa.

Em sua defesa, Gustavo Fruet destaca que os cenários nacional e municipal se distanciam. "A eleição aqui não é ideológica, cada um é dono de sua história e eu não mudei", comenta. O pedetista rebate as críticas também apontando erros na gestão atual, como a perda da qualidade nas áreas de saúde, segurança e transporte. "Curitiba já foi referência em mobilidade urbana, mas essa área está em queda e ainda há poucos investimentos em educação", cita.

O cientista político e sociólogo da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Ricardo Costa de Oliveira confirma que todos os principais candidatos ainda têm espaço para ascensão ou queda. "Todas as campanhas têm seus esqueletos no armário, por isso o que vai pesar é o perfil do candidato, o tempo na TV e as máquinas de apoio", comenta.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Em BH, críticas geram alfinetadas

Marcio Lacerda, que tenta a reeleição para a PBH, rebate acusações feitas pela equipe de Patrus Ananias de que seu governo é autoritário

Geórgea Choucair

"Eu tenho muitas qualidades, mas tenho um defeito. Às vezes, apareço de cara amarrada, pouco sorridente. Mas o que importa são os resultados, é a avaliação que a população faz do governo", afirmou ontem o prefeito de Belo Horizonte e candidato à reeleição pela coligação BH Segue em Frente, Marcio Lacerda (PSB). Em caminhada no Aglomerado da Serra pela manhã, ele rebateu as críticas de que seu governo é autoritário, feitas desde a semana passada pela equipe do candidato do PT à prefeitura da capital mineira, Patrus Ananias.

"Como chamar de autoritário um programa de governo que foi debatido na eleição de 2008 e apresentado à população com 176 ações e obras e depois foi transformado em programa de quatro anos, o chamado BH Metas e Resultados, que cobriu todas as áreas da cidade com 40 projetos?", indagou. Tudo isso, disse, foi feito de forma democrática. Ele destacou que a nova lei de uso e ocupação do solo, o novo Plano Diretor, Código de Posturas, Código de Obras foram discutidos na Conferência Municipal de Políticas Urbanas de 2009, em que mais de 3 mil delegados escolhidos em todas as cidades elegeram 300 delegados para discutir os planos. "Como chamar de autocrático um governo desse?", voltou a questionar.

Durante a caminhada, o candidato afirmou ainda que as políticas sociais que o país tem hoje foram definidas na Constituição Cidadã de 1988. "Elas não são privilégio da mente de um partido ou de um ministro, por mais dedicado que ele possa ter sido. E eu não estou fazendo aqui julgamento", disse.

O candidato afirmou que o fato de Minas Gerais ter recebido R$ 4 bilhões para programas sociais durante o governo Aécio Neves não habilita ninguém a ser prefeito de Belo Horizonte. "Se habilitasse, a ministra Tereza Campello deveria ser candidata, porque ela mandou mais dinheiro em menos tempo", argumentou.

Nos últimos dias, o senador Aécio Neves (PSDB) fez severas críticas ao ex-ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e candidato do PT, Patrus Ananias. Aécio disse que o projeto petista para BH é de interesse particular. O senador tucano ainda citou problemas na gestão de Patrus como ministro. "Quando ministro, o repasse de R$ 4 bilhões para o governo de Minas era uma obrigação constitucional e não um favor", afirmou.

PROJETOS -  Durante a caminhada, Lacerda destacou também as ações do Vila Viva, programa de urbanização de vilas e aglomerados. "Concluímos ou estamos concluindo cinco projetos que estavam em andamento e iniciamos outros três, na Vila São Tomaz, na Vila Cemig e nas vilas da Barragem Santa Lúcia", afirmou. O prefeito fez questão de ressaltar também que o trabalho realizado nas comunidades vai além da realização de obras. "A intervenção que se faz em aglomerados inclui urbanização, ações de saúde e educação, infraestrutura de apoio social, esporte, saneamento, titulação, segurança e, principalmente, cidadania", disse.

O candidato Lacerda enfatizou que o mais importante para Belo Horizonte são os resultados gerados pelas ações executadas e a aprovação que a população faz do governo municipal. "A demonstração de que nosso governo é popular é a aprovação que ele tem hoje. Todos os setores são bem tratados pela prefeitura e tratar bem as pessoas não é apenas dizer sim a todas as demandas, mas saber ouvir, dialogar. É ouvir e dizer não com tranquilidade e carinho, sem jogo político", explicou o prefeito.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Em Minas, PSDB reforça embate

Bertha Maakaroun

O PSDB de Minas reagiu ontem às declarações de Patrus Ananias (PT), candidato à PBH, de que tenha repassado R$ 4 bilhões a Minas na condição de ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no governo Lula. Em nota oficial assinada pelo presidente estadual do PSDB, deputado federal Marcus Pestana, e pelo presidente municipal, deputado estadual João Leite, as afirmações são consideradas "não verdadeiras". "Infelizmente, o ex-ministro confunde o que é política de Estado com iniciativa pessoal. Esses recursos referem-se ao Bolsa-Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), previstos na Constituição, cujos valores são repassados à população, independentemente da ação de qualquer governo ou ministro. São recursos transferidos diretamente às pessoas beneficiadas", apontaram Pestana e João Leite.

"No que diz respeito aos convênios realizados em sua gestão no ministério, observa-se que, quando levada em conta a referência per capita, Minas, infelizmente, permaneceu apenas na 12ª colocação, sendo que outros 11 estados receberam, proporcionalmente, mais recursos", diz a nota. O documento acrescenta que ao sugerir que as políticas sociais em Minas teriam sido viabilizadas com recursos do governo federal, Patrus teria demonstrado "desconhecimento" da realidade do estado.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Em Recife, PT X PSB

Partidos estão em rota de colisão e crise deve ir além das eleições deste ano.

“PT joga Lula contra o Estado”, acusa PSB

Com a eleição cada vez mais “nacionalizada”, e em meio aos rumores sobre suposta mágoa de Lula com Eduardo, partidos vivem clima de tensão e PSB procura reagir

Sheila Borges

A campanha do Recife foi definitivamente nacionalizada. Está tomando uma dimensão maior a cada dia que passa, deixando evidente que o PT e o PSB estão em rota de colisão e que esse cenário não deve ficar restrito às eleições municipais deste ano. O PSB negava até agora que o fato de o governador Eduardo Campos ter lançado candidato próprio sem o apoio do PT tivesse abalado a relação que Eduardo sempre manteve com o ex-presidente Lula. O PT é que estaria alimentando uma mágoa, que não existiria. Mas declarações dadas ontem pelo presidente estadual do PSB, Sileno Guedes, revelam, contudo, que a crise é concreta e está incomodando, e muito, os socialistas. Para eles, esses comentários, apesar de falsos, podem estremecer a relação institucional entre os governos estadual e federal.

Sem meias palavras, Sileno afirmou que o discurso de Humberto – de que há um estranhamento e um distanciamento entre as duas legendas – não tem fundamento, mas pode terminar prejudicando Pernambuco, já debitando ao PT qualquer tipo de problema futuro. Ao tentar acertar Eduardo, o PT estaria atingindo, consequentemente, o Estado, na visão do PSB. “A ansiedade de Humberto em ser candidato a todo custo está levando a se pagar um preço que a gente está vendo. Ele coloca Pernambuco contra a presidente Dilma e Lula. É um comportamento que a gente estranha porque esse rame-rame de ficar discutindo que Lula está com raiva de Eduardo não é verdadeiro”, argumentou.

Indagado quem mais estaria por trás desses comentários, além de Humberto, Sileno não detalhou e ainda tentou minimizar as declarações anteriores contra o petista. “Não digo que é Humberto que está fomentando, mas setores do partido estão fazendo isso. O PT paga um preço alto por isso. Agora se alimenta uma falsa ideia, colocando em risco a relação de Pernambuco com Dilma e Lula”.

Em nível nacional, as informações são de que o presidente nacional do PT, Rui Falcão, e o ex-ministro José Dirceu desaprovam a postura de Eduardo não só no Recife, mas em outros locais, como em Belo Horizonte, nos quais o PSB se descolou do PT para que o governador de Pernambuco possa começar a pavimentar o seu projeto de chegar à Presidência da República.

Candidato a vice-prefeito na chapa de Humberto, o petista João Paulo reconheceu ontem que a crise que começou no Recife se ampliou. “Tomou uma dimensão maior em função da nova conjuntura. a disputa local foi nacionalizada. Lula tem um projeto. Não acredito, contudo, que isso atinja Pernambuco. No máximo pode atingir a relação política e pessoal de Lula com Eduardo”, falou. Humberto também tentou desconstruir esse discurso do PSB. “De foram alguma haverá prejuízo para Pernambuco. Lula fez parcerias com os maiores adversários”.

Ainda dentro desse enfrentamento PT X PSB, Humberto acusou o adversário Geraldo Julio (PSB) de fazer uma campanha abastada, que configuraria abuso do poder econômico. Mesmo tentando evitar qualquer confronto político, o próprio Geraldo Julio não resistiu a rebater ontem o petista. “Estou tranquilo. Não há nada irregular e nossas contas estão divulgadas na internet. Inclusive, entre os limites de gastos divulgados, o meu não foi o maior”, revidou. Pelos dados levados ao TSE, a maior previsão de custos pertence a Humberto, que estipulou um teto de R$ 15 milhões. O socialista estimou R$ 8 milhões.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Linha intermunicipal - Melchiades Filho

Exagera quem trata a eleição de prefeitos como preliminar da corrida presidencial. Mas erra quem subestima o impacto nacional do resultado nas cidades.

As chapas não são montadas somente para atender demandas imediatas dos municípios. Elas visam, também, catapultar nomes, testar discursos, ensaiar alianças.

José Serra só foi o adversário de Dilma Rousseff em 2010 porque ganhou a eleição para prefeito de São Paulo em 2004. Ele vinha de três derrotas majoritárias (1988 e 1996, na cidade, e 2002, à Presidência). Seria difícil sobreviver a outra.

Não fosse aquela vitória serrista, a cara do PSDB hoje seria outra. A fila teria andado, e Aécio Neves, se firmado como liderança nacional.

Ainda em 2004: se Marta Suplicy tivesse sido reeleita, talvez o PT não estivesse de joelhos diante de Dilma. Lula teria opção que não a de inventar uma candidata "do nada".

O PSD só existe por causa de uma eleição municipal. Não houvesse renovado o mandato em 2008, Gilberto Kassab não teria adquirido musculatura para fundar do zero o quarto maior partido do Congresso.

No Rio, Sérgio Cabral, se vitorioso no segundo turno em 1996, teria motivo para ficar no PSDB, em vez de virar o mais entusiasmado cabo eleitoral de Lula no Sudeste.

Foi como vice-prefeito de Belo Horizonte que o tucano Eduardo Azeredo despontou, em 1989. Sua ascensão política correspondeu à formação de uma máquina poderosa de arrecadação ilegal, tão eficiente que chamou a atenção do rival PT e, anos mais tarde, foi convidada a se instalar no governo Lula. Talvez o valerioduto tivesse se expandido de toda maneira, mas, sem a gênese mineira, não haveria o mensalão ora em julgamento no STF.

A campanha dos candidatos a prefeito pega fogo a partir de amanhã, com a propaganda na TV e rádio. Uma certeza: muitos envolvidos já (só) pensam no passo seguinte.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Candidaturas pobres - José Roberto de Toledo

O julgamento do chamado mensalão afetou a eleição de prefeito, mas não como se imaginava. Somado ao escândalo de Cachoeira, o efeito de horas e horas de programação televisiva sobre o mensalão acabou sendo maior entre os financiadores do que entre os eleitores. Está faltando dinheiro para a campanha eleitoral.

Basta ver a penúria da primeira parcial das prestações de contas dos candidatos a prefeito nas capitais. Os valores previstos em dezenas de milhões estão sendo contados aos milhares. Os poucos que gastaram mais do que isso o fizeram por conta. Ou seja, fazem campanha na base do fiado.

Contraditoriamente, os tetos de gasto de campanha apresentados pelos comitês à Justiça Eleitoral nunca foram tão altos. Em São Paulo, projeções de receitas triplicaram em comparação ao pleito de quatro anos atrás. Obviamente a correção aplicada não foi apenas a da inflação. Os tesoureiros abriram espaço em suas planilhas para abrigar os antigos "recursos não contabilizados".

Por enquanto, porém, o dinheiro não está sendo contabilizado nem pelo caixa 2 nem pelo 1. Potenciais doadores têm muito frescas na memória as cenas de advogados de banqueiros e empresários apresentando a defesa de seus clientes no Supremo Tribunal Federal. Ou o exemplo da Delta, uma ex-rica doadora eleitoral que foi da prosperidade à bancarrota em apenas uma CPI.

Os céticos dirão que, mais cedo ou mais tarde, os interessados de sempre pingarão suas contribuições salvadoras nos cofres partidários. É bem provável. Até porque a gratidão pelas doações tardias será ainda maior do que de hábito. Mas o estrago já estará feito. A campanha foi encurtada para 50 ou 60 dias. Neófitos que precisavam se tornar conhecidos terão menos tempo para chegar aos olhos, ouvidos e dedos dos eleitores.

Tempestade perfeita. Desde 2002, a campanha eleitoral petista tacha José Serra (PSDB) de o candidato do medo. Por essa definição, vota no tucano quem teme ver hordas bárbaras invadirem o centro próspero. Mas a última década produziu uma invasão às avessas, uma onda de prosperidade consumista a banhar a periferia. Ermelino Matarazzo ficou mais parecido com a Mooca, não o contrário.

No começo da atual campanha eleitoral paulistana, a questão a ser respondida em 2012 parecia ser: o eleitor de Ermelino vai votar mais parecido com o da Mooca, ou o da Mooca com o de Ermelino? Na primeira hipótese daria Serra; na segunda, Fernando Haddad (PT). Mas aí Celso Russomanno (PRB) cresceu, apareceu, e o binômio PT-PSDB ficou insuficiente para resumir a eleição.

De onde apareceu Russomanno? Uma explicação é que Haddad é desconhecido, e o candidato do PRB ocupou o vácuo no eleitorado petista. Outra é que o paulistano está cansado das mesmas caras. Uma terceira, que há eleitores antipetistas que acham Serra um bom candidato a presidente, mas não um bom candidato a prefeito. Todas estão corretas.

Russomanno vai se sustentar na liderança? Ele tem um quarto do tempo de TV de Serra e Haddad. Ao contrário dos adversários, não tem as máquinas dos governos federal, estadual e municipal a apoiá-lo. Daqui para frente sua força é inercial. Veio da exposição na TV Record, da Igreja Universal do Reino de Deus e de sua imagem de conciliador e defensor do consumidor. E agora? Depende menos dele do que dos adversários.

Para Russomanno cair, Haddad tem que crescer. A maior superposição do voto no candidato do PRB é com o eleitorado petista. O pequeno crescimento de Haddad no mais recente Ibope já desacelerou Russomanno. Mas, para chegar ao segundo turno contra Serra, Haddad precisaria ao menos trocar os seus 11% de intenção de voto na zona petista pelos 30% de Russomanno. Mesmo assim seria o segundo colocado, e por uma margem muito apertada.

Nem só de votos petistas vive o fenômeno Russomanno, porém. Não está claro qual o tamanho do buraco que ele pode provocar no eleitorado de Serra. Entre maio e julho, fez o tucano perder cinco pontos porcentuais na zona antipetista da cidade. Mas a sangria parou em agosto. Só esperando o efeito do horário eleitoral para saber se a ferida cicatrizou ou não.

O que aconteceria se Haddad chegasse aos 30% na zona petista, a 10% no resto e, ao mesmo tempo, Russomanno equilibrasse a disputa com Serra em todas as regiões da cidade? A definição do segundo turno seria no olho mecânico. Qualquer combinação seria possível: Serra x Haddad, Serra x Russomanno ou até Russomanno x Haddad. A atual eleição paulistana é tudo, menos previsível.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO