Foi no discurso do presidente do Congresso, senador José Sarney, que
apareceu ontem a referência sobre uma impensável, há 20 anos, paisagem política
sem Ulysses Guimarães. Impensável, mas realizou-se, e se tornou, sem dúvida,
uma paisagem mais árida, mais pobre, de um impressionismo descolorido. A sessão
para homenagear a trajetória de Ulysses e os 20 anos de seu desaparecimento foi
uma rápida ressurreição dos grandes momentos da vida parlamentar, daqueles em
que as diferenças e as disputas são postas de lado para realçar algo maior, uma
pessoa ou uma causa. O nome de Ulysses reúne hoje sua figura e sua causa, a da
construção da democracia brasileira.
Na plateia, havia amigos pessoais com largo conhecimento da esfinge Ulysses,
como o "restaurateur" Marco Aurélio Costa, do Piantella, o jornalista
Jorge Bastos Moreno, o ex-secretário particular Oswaldo Manicardi, entre
outros. Mas na mesa, Sarney foi quem mais conheceu Ulysses. Conviveram, como
deputados, desde 1955. Ele na UDN, Ulysses no PSD. Juntaram-se nos anos 1980
para fazer a transição e eleger Tancredo. Divergiram durante o governo de
transição de Sarney, mas, como ele recordou ontem, sempre dentro dos limites do
respeito e da civilidade política.
"Quando tínhamos desencontros, silenciávamos para preservar o respeito,
e nossas conversas cessavam por um tempo, sem qualquer alteração na
convivência, sem elevação de vozes" recordou Sarney.
No governo de Sarney, Ulysses foi chamado de condestável. O senador
peemedebista evitou a palavra, mas confessou a enorme deferência que, como
nenhum outro presidente da República, teve para com o líder partidário e
presidente da Câmara. E, recordando os tempos finais — Ulysses morreu com 76
anos —, recordou aquela frase tão dita e repetida:
"Sou velho, mas não sou velhaco."
Havia outra, de que Ulysses também gostava: "O diabo é sábio não é por
ser diabo, é por ser velho".
Antes de Sarney, falou o vice-presidente Michel Temer, confessando a
reverência que tinha para com a figura sóbria que lhe ensinou a valorizar o
Legislativo. Podendo, Ulysses nunca quis disputar outro cargo, senão o de
deputado. Quantos, hoje, fariam isso?
A chuva caiu e a sessão entrou pela noite, com evocações de Ulysses nos
discursos de Rose de Freitas, Luiz Henrique e outros tantos. Sem ele, a
paisagem ficou mais árida, mas, se estivesse aqui, estaria se batendo pela
valorização da política e da representação popular, que vêm sendo tão
espancadas.
O vice de Dilma. Antes mesmo do segundo turno, a ampulheta já virou e abriu-se a disputa, por
ora dentro do PMDB, pelo lugar de vice na chapa de Dilma à reeleição. Mal o
prefeito reeleito do Rio, Eduardo Paes, lançou o nome do governador Sérgio
Cabral, um arqueiro de Michel Temer, o ex-deputado Geddel Vieira Lima, disparou
a lembrança dos guardanapos na cabeça, naquela foto com o empresário da Delta
em Paris.
Queimou Cabral. Dilma tem dito que a vaga é do PMDB e que não vê motivos para trocar Temer.
Se está dando certo num papel tão delicado, por que trocar? Já teria
perguntado.
Mas tem ainda a ambição do governador Eduardo Campos, do PSB, que, para não
ser candidato em 2014, estaria disposto a pleitear o posto.
Dívidas com o PMDB. Eduardo Campos tem uma grande dívida para com o PMDB: o partido bateu-se com
disposição para garantir a aprovação do nome de sua mãe, Ana Arraes, para
ministra do TCU. Henrique Alves, agora candidato a presidente da Câmara, chegou
a desautorizar deputados do partido que pretendiam votar no candidato Átila
Lins.
Um pagamento da fatura vem agora: o PMDB espera que o governador desautorize
a candidatura avulsa, que estaria em gestação, do deputado pelo PSB mineiro
Júlio Delgado ao mesmo posto. Outra parcela o governador pagaria deixando em
paz o lugar de Michel Temer na chapa de Dilma.
Talvez ele ache caro demais.
Dilema no Maranhão. Em São Luís, a disputa no segundo turno é entre Edivaldo Holanda (PTC),
candidato apoiado pelo presidente da Embratur, Flávio Dino, (PCdoB), e o
candidato do atual prefeito, João Castelo (PSDB). Ambos são adversários da
família Sarney, que, até agora, não anunciou apoio a ninguém. Holanda é da base
governista, mas apoiá-lo será fortalecer a candidatura de Dino à sucessão da
governadora Roseana Sarney em 2014. Apoiarão Castelo? Há quem duvide.
Sem pauta. Os deputados começaram a voltar ontem a Brasília e precisam mostrar trabalho. O
mar não está para peixe na classe política. O líder do governo, Arlindo
Chinaglia, reúne os líderes da base governista hoje para selecionar matérias
que precisam ser logo votadas. Podem começar com a medida provisória que
autoriza a renegociação das dívidas dos estados. Ela precisa ser logo aprovada,
até porque muitas negociações já foram feitas e consumadas.
Fonte: Correio Braziliense