Réus na Ação Penal 470 depositam no julgamento dos embargos infringentes as últimas cartas para tentar alterar as punições. O Tribunal está dividido quanto a aceitar os recursos e deve começar a analisar o caso a partir da quinta-feira
Diego Abreu
Depois de apreciar os recursos de 20 dos 25 condenados no julgamento do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomará a apreciação dos embargos de declaração apresentados pelos réus nesta semana, que promete ser a mais importante da nova fase da Ação Penal 470. A expectativa, depois da análise de mais cinco recursos, prevista para quarta-feira, é que os ministros se debrucem sobre os embargos infringentes, recursos que poderão resultar em novo julgamento para 11 réus, entre os quais o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
Ao contrário dos embargos de declaração — voltados para contestar omissão, contradição ou obscuridade no acórdão do processo —, os infringentes têm poder de modificar as penas nos casos dos crimes em que o réu tenha recebido pelo menos quatro votos pela absolvição. Caberá ao plenário da Suprema Corte definir se este recurso é ou não cabível. Os 11 ministros devem iniciar, na quinta-feira, o debate sobre a admissibilidade desse recurso, uma vez que, embora esteja estabelecido no Regimento Interno do STF, ele não está previsto na Lei 8.038/1990, que regula a competência recursal do STF.
Ministros ouvidos pelo Correio avaliam que a análise vai ser teórica e técnica, e não guardará qualquer relação com a matéria de fundo, que é o julgamento do mensalão. Entre os próprios integrantes da Corte, há dúvidas quanto ao possível resultado da admissibilidade dos embargos infringentes. Relator da Ação Penal 470, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, admitiu a pessoas próximas seu temor de que a maioria considere o recurso cabível.
São considerados votos certos pela não admissibilidade dos infringentes os ministros Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes e Luiz Fux. Marco Aurélio Mello tende a rejeitar também, embora ainda haja dúvidas quanto a seu voto. De outro lado, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli certamente votarão pelo cabimento do recurso. Celso de Mello e Teori Zavascki já deram indicações de que seguirão este entendimento. As incógnitas giram em torno dos votos de Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso.
Ao ser sabatinado pelo Senado, em junho, Barroso observou que o regimento do Supremo prevê os infringentes, mas ponderou que este perdeu força de lei desde a promulgação da Constituição, em 1988. Segundo ele, a Carta acabou com a competência normativa primária do STF, que passou a ter competência limitada. Barroso e Zavascki não participaram do julgamento do mensalão, que se estendeu de agosto a dezembro do ano passado. Ambos indicaram, durante a etapa atual de análise dos recursos, que votariam diferentemente em relação a alguns réus, caso tivessem participado da apreciação do processo.
Na avaliação do constitucionalista Erick Wilson Pereira, o Supremo deverá aceitar os embargos infringentes. Para ele, a possibilidade de análise desses recursos garantirá mais Justiça aos réus. “Para melhor fazer a Justiça, ele deve ser admissível no âmbito do STF, até pela natureza da instância única, que é uma grande desvantagem para quem está sendo julgado originalmente lá”, disse.
O constitucionalista acrescentou que a previsão regimental não esbarra em restrições da lei que regula os recursos do STF. “Não há conflito porque a lei é omissa, não trata de proibição. Trata de uma processualística mínima para quem tem prerrogativa de foro”, analisou Pereira, que é doutor em direito constitucional pela PUC-SP.
Mudança de regime
Entre os réus que terão direito a novo julgamento caso os embargos infringentes sejam aceitos estão os deputados José Genoino (PT-SP), por formação de quadrilha, e João Paulo Cunha (PT-SP), por lavagem de dinheiro (veja quadro). O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares foi o único réu a ter protocolado até então este recurso. Se os ministros considerarem cabível, poderão julgá-lo já na semana que vem em relação ao crime de formação de quadrilha, pelo qual foi condenado a 2 anos e 3 meses. Caso a punição seja extinta, a pena total do petista cairia de 8 anos e 11 meses para 6 anos e 8 meses, o que permitiria a ele cumprir a pena em regime semiaberto, e não mais no fechado.
Os demais réus devem protocolar os embargos infringentes somente após a publicação do acórdão desta fase de julgamento dos primeiros recursos. A defesa de José Dirceu também aposta no cabimento dos infringentes para que a pena dele seja reduzida. Condenado a 10 anos e 10 meses de cadeia em regime fechado, o ex-ministro poderá passar para o semiaberto caso tenha a condenação a 2 anos e 11 meses por formação de quadrilha revisada. Nesse cenário, a pena final de Dirceu ficaria em 7 anos e 11 meses.
A aposta dos condenados
Confira quais réus poderão ter o direito a um novo julgamento, caso os embargos infringentes sejam aceitos pelo STF. O recurso poderá beneficiar somente aqueles condenados que receberam pelo menos quatro votos pela absolvição.
» Pelo crime de formação de quadrilha: Marcos Valério, José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Kátia Rabello e José Roberto Salgado
» Pelo crime de lavagem de dinheiro: João Paulo Cunha, João Cláudio Genu e Breno Fischberg
Fonte: Correio Braziliense