quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

‘Movimentos sociais estão destroçados’, diz Luiz Werneck Vianna

Sociólogo afirma que revolução democrática avança planetariamente

Cleomar Almeida | Política Democrática

“A sociedade não vai abdicar facilmente do que conquistou, mas é preciso que transforme isso em motivação política, afirma o sociólogo Luiz Werneck Vianna em entrevista publicada na quarta edição da revista Política Democrática online. A publicação é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS).

» Acesse aqui a edição de janeiro da revista Política Democrática online

Para o sociólogo, “não há oposição efetiva, os movimentos sociais estão destroçados, o sindicalismo também”. Então, de acordo com ele, por mais que a harmonia na atual coalizão governamental seja difícil, os riscos são pequenos para ela.”

“Há processos reais, inamovíveis, irremovíveis que vêm trabalhando na nossa sociedade; e que isso, no limite, propicia um avanço continuo da democracia”, diz o sociólogo, ao comentar este início do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e a onda à direita que está em curso atualmente no país.

De acordo com Werneck Vianna, a revolução democrática avança planetariamente, mas conhece também obstáculos que não são propriamente os que o campo adversário apresenta. “São, antes, interesses represados que se organizam de forma segmentada, com base em identidades culturais, com perda da ideia de bem comum”, diz ele.

Werneck Vianna também ressalta que a preocupação do lado de lá é refrear, é conter os processos que vêm atuando até agora como forças da natureza, embora com pouca reflexividade. Afinal, segundo ele, não é difícil descobrir, entre os jovens, centelhas brilhantes. “Não há caminho a ensinar para eles; eles têm de aprender por eles mesmos, como nós aprendemos, quando o país, em um certo dia de agosto de 1954, foi dormir de um jeito e, com o suicídio de Vargas, acordou de outro”, lembra.

“Eu e muitos da minha geração mudamos com a difusão da sua carta testamento no rádio, um dia inteiro, produzindo um impacto intelectual, moral, político muito grande sobre cada um de nós”, completa Vianna.

Sobre a possibilidade de Bolsonaro e sua nova ordem nacional pontilhada de projetos antagônicos vier um dia a fazer uso da força para manter o governo, Werneck Viana diz que cabe à sociedade impedi-lo. “O céu de brigadeiro a que alguns arautos do novo governo têm feito referência só existe em razão de os bloqueios políticos ao novo grupo no poder serem ainda muito frágeis.”, completa

Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Ele é autor de, entre outras obras, A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1997); A judicialização da política e das relações sociais no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1999); e Democracia e os três poderes no Brasil (Belo Horizonte: UFMG, 2002).

Sobre seu pensamento, conforme sugere a revista, o público pode ler Uma sociologia indignada. Diálogos com Luiz Werneck Vianna, organizada por Rubem Barboza Filho e Fernando Perlatto (Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2012). Destacamos também seu novo livro (intitulado) Diálogos gramscianos sobre o Brasil atual (FAP e Verbena Editora, 2018), que é composto de uma coletânea de entrevistas (concedidas) que analisam a conjuntura brasileira nos últimos anos.

William Waack: A palavra maldita

- O Estado de S.Paulo

Brumadinho traz severas consequências políticas para o governo Bolsonaro

Todo motorista alemão teme a frase “até que o TÜV” nos separe. Significa que o veículo dele não passou pelo TÜV (“Technischer Überwachungsverein”, a organização privada que vigia, entre milhares de outras coisas, se um carro obedece às normas técnicas para circular nas ruas). O TÜV foi inventado em 1865 no sul da Alemanha para acabar com as frequentes explosões de caldeiras a vapor, especialmente em cervejarias.

Trata-se de uma organização privada que assumiu funções do poder público (vigiar normas técnicas) e deu tão certo nos últimos 150 anos a ponto de se transformar num produto de exportação alemão. “Examinado pelo TÜV” está carimbado na placa de cada veículo, no reator de uma central nuclear ou numa escova de dentes. Funciona como atestado de qualidade e respeito às normas (legais e técnicas) emitido por organização independente e privada.

No Brasil, uma das três grandes “holdings” regionais dessa organização, o TÜV SÜD (24 mil funcionários, US$ 2,6 bilhões de faturamento) em meados do ano passado conferiu à barragem da Vale que se rompeu em Brumadinho um macabro “tudo ok” de trágicas consequências. Como assim aquilo que os alemães apontam com tanto orgulho – o autocontrole exercido pelo próprio setor privado da economia – não funcionou no Brasil?

Advogados já consideram como o TÜV – assim como a Vale – terá de assumir no mínimo responsabilidades cíveis pela tragédia, mas o que as investigações e o noticiário de Brumadinho já parecem sugerir é um contexto de falha coletiva que envolve a grosso modo os dois setores (público e privado). Por exemplo, barragens como a de Brumadinho (rio acima) são proibidas em países de tradicional atividade de mineração, como Peru e Chile, por causa de frequentes terremotos.

Eugênio Bucci*: O centro excêntrico da Opinião Pública

- O Estado de S. Paulo

Vingou a patritotice de que o Brasil estaria ‘acima de tudo’ (como a Alemanha no passado)

“Os retratos dentro das cabeças dos seres humanos, retratos deles mesmo, dos outros, das suas necessidades, propósitos e relacionamentos, são suas opiniões públicas. Aqueles retratos que são adotados por grupos de pessoas, ou por indivíduos agindo em nomes de grupos, são Opinião Pública com letras maiúsculasWalter Lippmann, em Public Opinion

O jornalista americano Walter Lippmann tinha pouco mais de 30 anos, em 1922, quando seu livro Public Opinion chegou às livrarias dos EUA. Foi um marco. O texto ágil e cristalino - bem “jornalístico”, dizem os acadêmicos - dissolve e dessacraliza a aura que se costuma atribuir a essa figura um tanto pomposa que é a Opinião Pública com letras maiúsculas. É bom de ler até hoje. Um clássico. Lippmann olha para a Opinião Pública e se pergunta: ora, mas que bicho é esse? Logo começa a responder. Em sua descrição, a Opinião Pública se resume a um amontoado de retratos mentais que uma sociedade resolve aceitar como fidedignos. Esses retratos nada mais são do que estereótipos.

Não por acaso, Lippmann dedica-se bastante a dissecar a noção de estereótipo: um conceito compactado que condensa uma opinião na forma de pacote de sentidos simplificado, bem fácil de ser exposto, compartilhado, vendido ou comprado. Segundo Lippmann, toda gente pensa por meio de estereótipos. Sem esses rótulos concentrados que são os estereótipos, nós não conseguiríamos conversar e muito menos fazer política. Há exemplos bem óbvios. Padre pedófilo é um estereótipo. Terrorista islâmico, outro.

São bonitas, porque simples e esclarecedoras, as passagens em que Lippmann discorre sobre o que sejam os estereótipos. “As formas estereotipadas emprestadas ao mundo não procedem apenas da arte, no sentido da pintura, da escultura e da literatura”, ele escreve (e eu traduzo), “mas também de nossos códigos morais, das filosofias sociais e das agitações políticas”. Ou: “A americanização, por exemplo, pelo menos superficialmente, é a substituição dos estereótipos europeus pelos norte-americanos”.

Impossível refutar. Acontece que os estereótipos são mutáveis. Um signo positivo se converte em negativo da noite para o dia. E vice-versa. Yasser Arafat, o líder máximo da Organização para a Libertação da Palestina, era o símbolo do mais pérfido terrorismo internacional.
Depois virou um símbolo da boa vontade mais angelical, mais ou menos como uma pombinha branca. A transmutação deu-se em 1983, por força do acordo de paz que ele firmou com o então primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Rabin, sob as bênçãos de braços abertos do presidente Bill Clinton, que os recebeu no gramado da Casa Branca.

O mundo é feito de mudanças e os estereótipos, também. Até outro dia as mineradoras eram um selo de progresso. Hoje são sinônimo de catástrofe. Até outro dia Jair Bolsonaro era um militar indisciplinado e boquirroto. Hoje é o fiador das tais “reformas de que o Brasil precisa”, etc.

Os estereótipos são volúveis e ao sabor deles muda a Opinião Pública, essa senhora sem caráter que se compraz em se deixar carregar nos ombros das massas, que ora são infantis, ora temperamentais, ora estúpidas - ou as três coisas ao mesmo tempo.

Vejamos com mais vagar o que vem acontecendo com a Opinião Pública no Brasil. O seu centro de gravidade se deslocou em velocidade vertiginosa. Velhos estereótipos se metamorfosearam. Já se sabia que o governo Bolsonaro representaria uma alteração tectônica nas mentalidades e na cultura política. Melhor dizendo, a reconfiguração ocasionada pelo bolsonarismo, disso todos sabíamos, não se limitaria a arranjos (ou desarranjos) institucionais no âmbito do governo e do Estado, mas teria ainda mais efetividade nos interstícios da vida social. Pois é isso precisamente o que estamos vendo agora. O dado novo é que a amplitude e a densidade dessa alteração tectônica estão acima das expectativas (as boas e as más).

Bruno Boghossian: O fusível no Planalto

- Folha de S. Paulo

Disputa pode esvaziar papel de Onyx e deixar governo nas mãos de Renan e Maia

O governo corre o risco de queimar seu primeiro fusível na relação com o Congresso. As eleições para as presidências da Câmara e do Senado podem instalar no comando do Legislativo dois personagens que têm relações já desgastadas com os articuladores do Planalto.

Ao ser anunciado por Jair Bolsonaro como chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni foi encarado com ceticismo. O deputado ganhou o cargo por ter sido um aliado fiel, mas sempre foi visto como uma figura pouco experiente, que acumulava anos de convivência conturbada com colegas.

Novo responsável pela articulação política do governo, ele conseguiu a proeza de acumular desavenças tanto com Rodrigo Maia quanto com Renan Calheiros —dois favoritos para comandar o Congresso a partir desta sexta-feira (1º).

Se a vitória da dupla se confirmar, o Planalto pode passar por apuros. Maia e Renan já disseram publicamente que estão alinhados com boa parte da agenda de Bolsonaro, mas Onyx certamente não terá vida fácil.

Matias Spektor*: Senador americano propõe barganha inédita a Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Marco Rubio concentra esforços no Brasil, país que quer ver como aliado

Marco Rubio é chefe de facto da política externa dos Estados Unidos para a América Latina. Como senador do Partido Republicano pelo estado da Flórida, ele tem ascendência sobre a Casa Branca por força do voto latino, capaz de virar resultados numa eleição presidencial.

Rubio não dá ponto sem nó e apostou todas as fichas em virar líder da oposição à ditadura venezuelana. Com persistência ímpar, ele vem conseguindo empurrar o presidente Trump na direção que deseja.

As duas últimas vitórias foram acachapantes. Primeiro, conseguiu fazer com que os EUA liderassem uma coalizão internacional para negar reconhecimento a Nicolás Maduro. Segundo, transformou Juan Guaidó, jovem político desconhecido e sem experiência relevante, em rosto da oposição.

Agora, Rubio está concentrando seu esforço no Brasil, país que quer ver como aliado. O processo começou durante a viagem de Eduardo Bolsonaro a Washington, mas chegou a seu ponto de inflexão na terça (29).

Em artigo de opinião publicado pela CNN, Rubio fez a proposta mais audaciosa já apresentada por um líder político americano em décadas. Se vingar, afetará em cheio a posição do Brasil no mundo.

Roberto Dias: Família Brasil vende tudo

- Folha de S. Paulo

Movimento mostra-se positivo sobretudo após desastroso intervencionismo do governo Dilma

No governo federal, uma lista de 135 empresas —todas as estatais menos Petrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, sendo que da última entram na dança as áreas de loterias, seguros, cartões e gestão de recursos. Mais três novas ferrovias, a rodovia Rio-Santos, asBRs 101 e 470 em Santa Catarina.

Em São Paulo, as linhas de trem da CPTM, a hidrovia Tietê-Paraná, o porto de São Sebastião, a Sabesp, a área do Campo de Marte, 23 aeroportos regionais, o sistema de balsas marítimas, as novas penitenciárias, o ferroanel metropolitano da capital, duas linhas de trem intercidades. Em Minas, a Cemig. No Rio Grande do Sul, Sulgás, Companhia Riograndense de Mineração e Companhia Estadual de Energia Elétrica.

A transferência de tudo isso para mãos privadas foi anunciada pelos novos governos em algum momento deste quase interminável janeiro.

É ótimo que a defesa aberta da força privada na economia tenha tomado a agenda. Especialmente depois de uma década marcada pelo desastroso intervencionismo do governo Dilma, que acreditava ser possível estipular o preço da energia com discurso de 7 de Setembro.

Vinicius Torres Freire: Gasto militar se segura na crise

- Folha de S. Paulo

Despesa geral do governo cresceu em relação aos anos Lula e Dilma; receita vai mal

Os militares ficaram com a maior fatia do que o governo federal gasta em máquinas, equipamentos e obras em 2018. É a primeira vez que isso acontece, pelo menos desde quando há estatísticas públicas comparáveis (2007). Levaram 21,6% do total das chamadas despesas de investimento em 2018.

O número tem interesse, mas não convém exagerar sua importância. As despesas em investimento se limitam agora a apenas 3,9% de tudo o que o governo gasta. Em dinheiro, isso dá uns R$ 54 bilhões de um total de gasto de R$ 1,37 trilhão em 2018 (não estão incluídas aqui as despesas com juros da dívida pública).

O gasto militar superou o dos ministérios dos Transportes (19,2% do total do investimento), da Saúde (12%), das Cidades (10,2%), da Educação (9,3%) e da Integração Nacional (6,4%). Tem havido cortes feios nas obras de estradas e nas Cidades, que cuida do Minha Casa, Minha Vida, programa que foi à míngua. Transportes e Cidades costumavam liderar o ranking.

Para onde foram os R$ 11,6 bilhões de investimento militar? Quase R$ 2,2 bilhões foram capital para a Emgepron, estatal que fabrica navios e equipamentos para a Marinha. Mais R$ 1,3 bilhão foi para os novos caças da Força Aérea. Quase R$ 1,3 bilhão para os submarinos da Marinha. Mais de R$ 600 milhões para os aviões cargueiros KC (aqueles novos, da Embraer) etc.

Luiz Carlos Azedo: A lição de Brumadinho

- Correio Braziliense

“A narrativa de que a legislação e a fiscalização ambientais são um entrave ao desenvolvimento não é somente falsa, é um erro de conceito, assim como achar que o aquecimento global é cascata”

Erros de conceito custam caro para qualquer estratégia empresarial. Costumam causar desastres irreparáveis, como os de Mariana e Brumadinho. O poder da Vale nos estados onde atua, como Minas, Pará, Maranhão e Espírito Santo, além do poderoso lobby que sempre manteve junto ao governo federal, ao Congresso e ao próprio Judiciário, foi exercido de forma permanente para reduzir custos com medidas de segurança e de controle de impacto ambiental. Prefeituras de todas as áreas onde atua vivem perdendo as quedas de braço com a empresa, que prefere fazer políticas compensatórias de caráter social e urbano do que investir mais pesado na redução de danos ambientais. Agora, a casa caiu.

O plano para “descomissionar” todas as suas barragens construídas pelo método de “alteamento” ã montante é uma confissão de culpa e o reconhecimento de que houve erro de conceito na forma como a empresa resolveu tratar os dejetos de suas atividades de mineração, que poderiam ser reaproveitados utilizando tecnologias mais modernas. “Todas as barragens da Vale apresentam laudos de estabilidade emitidos por empresas externas, independentes e conceituadas internacionalmente”, alega a companhia. As represas que desmoronaram, porém, também tinham esses laudos. No caso de Brumadinho, seus responsáveis já estão até presos.

Qual é a razão de tais medidas não terem sido adotadas antes? A própria Vale fornece uma pista. Estima-se que serão gastos R$ 5 bilhões para a desativação das barragens, ao longo dos próximos três anos. A empresa está sendo obrigada, por medida de segurança, a suspender as operações de Abóboras, Vargem Grande, Capitão do Mato e Tamanduá, no complexo Vargem Grande, e as operações de Jangada, Fábrica, Segredo, João Pereira e Alto Bandeira, no complexo Paraopeba, incluindo também a paralisação das plantas de pelotização de Fábrica e Vargem Grande. Deixarão de ser produzidos 40 milhões de toneladas de minério de ferro ao ano, dos quais 11 milhões de toneladas de pelotas.

A Vale pretende redirecionar a produção para outras regiões do país — cada vez mais, as suas atividades de mineração se deslocam de Minas/Espírito para o Pará/Maranhão — e aproveitar todos os trabalhadores da empresa, mas qual será o impacto na economia das cidades mineiras e capixabas, em termos de arrecadação e geração de emprego e renda? Com certeza, será muito negativo. O caso de Brumadinho, nesse aspecto específico, é muito pedagógico, pois reflete um erro de conceito da empresa em relação ao reequilíbrio de suas atividades com o meio ambiente e o entorno social. Há outros erros correlatos, mas o principal talvez seja a subordinação da agenda ambiental aos interesses da produção e da lucratividade financeira da empresa, custe o que custar, embora isso esteja em contradição com a missão definida no planejamento estratégico da própria: “Transformar recursos naturais em prosperidade e desenvolvimento sustentável”.

Cláudio Gonçalves Couto*: O vice à espreita

- Valor Econômico

Desgaste precoce do presidente dá espaço ao vice

Tradicionalmente, a escolha do candidato a vice nas chapas majoritárias é parte da construção da coligação eleitoral. Isso vale nas eleições de prefeito, governador e presidente da República. Assim, é comum que algum partido aliado daquele do cabeça de chapa seja responsável pela indicação do eventual substituto. Frequentemente, escolhe-se também um vice que agregue algo que falta à imagem do candidato principal, ampliando-o em termos regionais, de extração social, gênero ou ideologia.

Desse modo, homens se fazem acompanhar de mulheres; sindicalistas de empresários; sulistas de nordestinos; conservadores de progressistas e assim por diante. É raro optar voluntariamente por uma chapa puro-sangue, já que ela normalmente não amplia a mensagem. Mas sempre há exceções, que inclusive obtêm sucesso eleitoral.

Exemplo disso foi a chapa vitoriosa de Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão. Embora de legendas diferentes, o que menos importava para ambos eram seus respectivos partidos, meros veículos para as candidaturas - apesar de o PSL de Bolsonaro ser muito ajudado pelo entusiasmo com a mensagem do candidato presidencial, elegendo por tabela congressistas, parlamentares estaduais e governadores. Tanto Bolsonaro como o vice eram militares reformados de discurso radical e estilo simples, pouco se distinguindo. O descarte de uma vice mulher, como Janaína Paschoal, ou de um civil de nome aristocrático, como o "príncipe" Luiz Felipe de Orleans e Bragança, mostrava que a intenção era mesmo transmitir uma mensagem sem nuances.

Tal escolha talvez se justificasse pelos tempos radicalizados que vivemos e que marcaram a última campanha eleitoral, com o discurso contra o politicamente correto, contra a moderação e prometendo até mesmo "fuzilar a petralhada". Sendo assim, nada melhor do que um vice que reforçasse a imagem dura de Bolsonaro, tendo inclusive já defendido intervenção militar para resolver crises e sendo, assim como ele, um admirador do torturador Brilhante Ustra.

Bernardo Mello Franco: O 1º de fevereiro de Flávio Bolsonaro

- O Globo

Amanhã deveria ser um dia feliz para Flávio Bolsonaro. Mas o ministro Marco Aurélio Mello deve melar a festa da posse. Ele indica que vai cassar a liminar que blindou o zero-um

O 1º de fevereiro deveria marcar o apogeu político dos Bolsonaro. Depois de se instalar no Planalto, a família esperava celebrar a posse do deputado mais votado do país e do senador mais votado do Rio. O clima de festa foi quebrado pelas investigações que envolvem Flávio, o filho mais velho do presidente.

O zero-um foi aconselhado a desistir do manda topara estancara sangria do clã. Ignorou os apelos, mas vai assumir sob forte pressão. Ontem ele teve uma amostrado que o espera, em breve passagem pelo Congresso.

Flávio ganhou uma recepção típica de políticos envolvidos em grandes escândalos. Assim que pisou no prédio, foi rodeado por um batalhão de repórteres. Ele apressou o passo, mas não conseguiu escapar do cerco.

Ao ouvira primeira pergunta, sacou uma desculpa surrada: “Está todo mundo vendo que eu sou vítima de perseguição ”. Em seguida, tentou desconversar :“Já falei o que tem [sic] que falar. Não tem novidade nenhuma”.

Não é bem assim. A primeira novidade virá amanhã mesmo. O ministro Marco Aurélio Mello deve cassar a liminar do colega Luiz Fux que blindou o senador. “A decisão sai na sexta-feira. As investigações estão paradas, não podem continuar assim”, disse à coluna.

Depois do dia 1º, a situação de Flávio tende a se complicar. Sem a proteção do foro privilegiado, seu caso deverá ser devolvido à primeira instância. Os promotores vão receber novas informações do Coaf. Se quiserem, também poderão avançar na apuração sobre os elos da família presidencial com as milícias.

Ricardo Noblat: Justiça martiriza Lula

- Blog do Noblat | Veja

Toffoli deu com uma mão e tirou com a outra

À parte o sofrimento por ter sido impedido de comparecer ao velório do seu irmão Vavá, nem por encomenda nada teria sido melhor para Lula do que a mistura de perversidade com incompetência que acabou orientando os passos de todas as autoridades policiais e judiciárias que se envolveram no caso.

Lula pediu o que tinha direito. Por mês, entre 2014 e 2016, presídios federais e estaduais expediram algo como 12,8 mil autorizações semelhantes ao pedido feito por Lula, segundo O Estado de S. Paulo. Saídas temporárias não só para velórios, mas também para assistência a parentes gravemente enfermos.

Os devotos de Lula insistem com a farsa de que ele é um preso político, não um político preso. E que foi condenado só para que se evitasse o risco de ele se reeleger presidente. A lambança compartilhada por todas as instâncias da justiça reforça a impressão de que Lula, de fato, não é um preso comum.

Nas últimas 48 horas, o pedido de Lula mobilizou o Ministério da Justiça com o comando de Sérgio Moro, a Polícia Federal, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a primeira instância da justiça em Curitiba, a segunda em Porto Alegre e, por fim, a última, o Supremo Tribunal Federal, em Brasília.

Todos os órgãos e juízes que se pronunciaram foram contrários à saída de Lula para o velório, alegando riscos para ele, para os agentes que o escoltassem e até para a estabilidade política do país. Falou-se que ele poderia ser vítima de um atentado. Ou então que poderia tentar fugir. Ridículo!

O desfecho da encenação de mau gosto teve a digital do ministro Dias Toffoli, presidente da Suprema Corte. A quatro minutos do enterro do corpo de Vavá, Toffoli acatou o pedido de Lula desde que… Desde que o velório ou o encontro de Lula com seus familiares ocorresse dentro de um quartel.

Que preso é esse a quem se subtrai o que se concede aos outros? Que Estado é esse que não tem condições de garantir a segurança de um presidiário e o seu deslocamento para um velório? Que Justiça é essa que dá com uma mão o que lhe pedem e que toma com a outra o que havia concedido?

Era intenção de Toffoli, confessada por ele mais de uma vez, retirar a justiça da boca do palco da política. Ela continua lá, e fazendo um papel feio.

Presidente meia bomba

Guerra nas estrelas
No meio da tarde de ontem, reunido em Brasília com um grupo de prefeitos de grandes cidades, o ministro Paulo Guedes, da Fazenda e de tudo o mais que tenha a ver com a economia, revelou que a reforma da Previdência Social incluirá os militares que gostariam de ficar de fora dela.

Poucas horas depois, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão Filho, confirmou o que Guedes dissera – com um detalhe que pode fazer diferença. Segundo Mourão a reforma para os civis será por meio de uma emenda à Constituição. A dos militares, via projeto de lei.

Maria Clara R. M. do Prado: Trinta dias de governo Bolsonaro

- Valor Econômico

Caberá ao presidente conciliar discrepâncias ideológicas que o cercam no trato das políticas econômicas internas

Não se pode dizer que não tenham sido movimentados os primeiros 30 dias do novo governo. As ações foram poucas, mas sobrou retórica, e muita controvérsia, contradições, discursos desencontrados e declarações que chegaram a beirar as raias do insólito.

Ao contrário das promessas de campanha, não houve ainda avanço no que diz respeito à reforma da previdência social. Mantêm-se a promessa, um tanto confusa. Promessas também predominam na agenda da privatização.

O ministro da Infraestrutura prometeu realizar 23 leilões de privatização nos cem primeiros dias de governo. Praticamente um terço do tempo já foi perdido. Outras questões, que soam como música aos ouvidos do mercado e da classe empresarial, têm sido acenadas pelo governo, como a redução da carga tributária e a desburocratização das normas que afetam os negócios, embora nenhuma medida objetiva tenha sido efetivamente proposta.

Fato é que Bolsonaro compôs um governo que tem nuances diversas e divergentes. Contrastam as ideias tradicionalmente nacionalistas dos militares que ocupam vários gabinetes na Esplanada dos Ministérios com o pensamento liberal do núcleo da área econômica. Caberá ao presidente conciliar as discrepâncias ideológicas que o cercam no trato das políticas econômicas internas.

Na área internacional, porém, não há espaço para protagonistas que apregoam doutrinas nacionalistas em nome de uma crença "antiglobalista", baseada em falsos argumentos e soluções reacionárias. O Itamaraty foi forjado sob o princípio do pragmatismo, do multilateralismo e da não intervenção. Está vinculado politicamente ao governo, mas é um órgão que pertence fundamentalmente ao Estado brasileiro e com os demais Estados soberanos deve se relacionar, independentemente dos governos vigentes.

O discurso discriminatório e preconceituoso que tem marcado neste primeiro mês de governo as falas do ministro das Relações Exteriores em nada se encaixa na forte tradição diplomática brasileira da negociação e do diálogo. O alinhamento com governos de direita ou de esquerda é uma política canhestra, que não serve ao país.

Zeina Latif*: De olho no maestro

- O Estado de S.Paulo

Sabemos ainda pouco sobre a capacidade técnica e política de Onyx Lorenzoni

Os eleitores têm certo “fetiche” com a figura do presidente da República. Não consideram a qualidade do time de ministros e assessores, como se o presidente pudesse tudo. Na melhor das hipóteses, avaliam o titular do Ministério da Fazenda/Economia. Nessa linha, provavelmente Paulo Guedes conquistou votos para Jair Bolsonaro.

Não se dá a devida importância ao ministro-chefe da Casa Civil. Não deveria ser assim. Ele é quase um primeiro-ministro e tem papel fundamental para garantir o bom funcionamento do governo e conduzir reformas estruturais. Sua função é de coordenação, execução e supervisão das ações governamentais, avaliando as condições políticas para o avanço das políticas públicas. Um olho na máquina pública e outro no Congresso. De quebra, como cabe à Casa Civil garantir a legalidade das ações do governo, é necessário o diálogo com o Judiciário.

A escolha do titular da Casa Civil, em alguma medida, revela o ímpeto reformista do presidente, enquanto a competência técnica e política do ministro-chefe, bem como o alinhamento com o ministro da Fazenda/Economia, pode ser um fator decisivo para o sucesso do governo.

Quando tudo dá errado, é um dos primeiros a ser sacrificado, além do ministro da Fazenda/Economia. José Sarney, por exemplo, teve quatro chefes da Casa Civil (e também quatro ministros da Fazenda/Economia) em 5 anos. Já FHC, apenas um para cada mandato.

O Brasil teve ministros que se destacaram. Um exemplo foi Pedro Parente, no segundo mandato de FHC. Um governo reformista, que, de quebra, enfrentou o racionamento de energia de 2001. Parente foi o competente gestor da crise de energia

Ribamar Oliveira: O imbróglio da cessão onerosa

- Valor Econômico

Pagamento com petróleo não afeta meta fiscal e teto

Há uma grande expectativa no governo em torno da receita que será obtida com o leilão do petróleo excedente dos campos da cessão onerosa, pois ela vai definir a programação orçamentária deste ano. O primeiro aspecto que precisa ser entendido é que a montanha de dinheiro do megaleilão não será usada para novas despesas, pois a União está submetida a um teto de gastos. Os recursos serão utilizados, portanto, para reduzir o déficit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central), programado em R$ 139 bilhões em 2019.

Uma questão que ainda não foi esclarecida é quanto a União pagará à Petrobras. Dependendo do valor, o volume de recursos que ingressará no Tesouro com o leilão do excedente do petróleo poderá ser bem menor do que muitos imaginam. Para entender a questão, vale lembrar que a União recebeu, em 2010, R$ 74,8 bilhões da Petrobras pela cessão de 5 bilhões de barris do pré-sal.

O contrato assinado previa revisão do valor pago pela empresa no momento da declaração de comercialidade dos campos de petróleo, o que ocorreu entre 2013 e 2014. Até hoje, a revisão não foi concluída, mas há um entendimento de que a Petrobras é credora, ou seja, de que pagou mais pelos 5 bilhões de barris do que deveria.

Assim, a estatal do petróleo seria credora da União. O valor a ser devolvido ainda depende da avaliação que está sendo feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Durante a transição de governo, no ano passado, a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, recebeu um documento da equipe do ex-presidente Michel Temer no qual se informava que a Petrobras teria até US$ 14 bilhões a receber da União, como noticiou o Valor - algo como R$ 52 bilhões pela taxa de câmbio de ontem.

Dividido, MDB decide nome para se manter no comando do Senado

Sigla se reúne nesta quinta para avaliar se lança Renan ou se aposta na novata Simone Tebet

Daniel Carvalho – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em busca de se manter na presidência do Senado, posto que tem ocupado nos últimos 12 anos, o MDB tenta chegar a um consenso na noite desta quinta-feira (31) e definir quem disputará a eleição de sexta-feira (1º) como representante do partido.

A sigla tem 13 senadores, mas, como está fragmentada, teme ver interrompida a tradição de que a maior bancada comanda a Casa.

Fora do governo e sem ter conseguido reeleger nomes como o atual presidente do Senado, Eunício Oliveira (CE), e o presidente da sigla, Romero Jucá (RR), o MDB tem nesta eleição sua principal perspectiva de manutenção de poder.

Nas duas últimas eleições, o partido havia chegado à véspera da disputa com consenso na bancada. Primeiro, Renan foi o presidente e Eunício o líder da bancada. Depois, eles inverteram as funções. Agora, não há previsão de nada parecido.

Renan já declarou não ter interesse na liderança, e Simone Tebet deixou o posto nesta semana --Tebet é filha do ex-presidente do Senado Ramez Tebet, morto em 2006.

Até o momento, há nove nomes na disputa —Renan (MDB-AL), Tebet(MDB-MS), Davi Alcolumbre (DEM-AP), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Alvaro Dias (Pode-PR), Esperidião Amin (PP-SC), Angelo Coronel (PSD-BA), Major Olímpio (PSL-SP) e Reguf fe (sem partido-DF). O senador Fernando Collor (AL), que nesta semana trocou o PTC pelo Pros, não admite candidatura, mas é dado como candidato por outros senadores.

A quarta-feira (30) foi de conversas e discussões sobre questões jurídicas que devem ser levantadas durante a sessão marcada para sexta.

Um dos partidos mais visados era o PSD, que chegou a dez senadores e tornou-se a segunda maior bancada.

Eleição no Senado ainda não tem regras definidas

Enquanto Senado vive indefinição, Câmara já tem até acordo para cargos

Amanda Almeida e Bruno Góes | O Globo

BRASÍLIA - Na véspera da eleição para a presidência das duas Casas do Congresso, o Senado, com ao menos dez candidatos na disputa, ainda não definiu as regras para a votação. Na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), candidato à reeleição com apoio de 16 partidos, já negociou até postos-chave na Mesa com aliados. Na véspera da eleição para a presidência das duas Casas do Congresso, o cenário no Senado é de uma disputa com muitos candidatos e regras desconhecidas sobre três questões com peso crucial para o resultado: presidência da sessão; voto aberto ou fechado; e turno único ou não. Ao menos dez senadores já se lançaram formal ou informalmente, prenunciando uma corrida histórica ao comando da Casa.

Já na Câmara, com quadro bem mais adiantado, o presidente Rodrigo Maia (DEMRJ), candidato à reeleição, conta com o apoio declarado de 16 partidos e negocia postos-chave na Mesa com aliados do centrão e do presidente Jair Bolsonaro.

Boa parte das cadeiras está com lugar marcado. A primeira vice-presidência, ocupada pelo substituto imediato do presidente da Câmara, foi reservada ao PRB. O candidato deverá ser Marcos Pereira (PRBSP), atual presidente da legenda. A segunda vice-presidência deverá ser ocupada pelo PSL, partido do governo. Luciano Bivar é o nome consensual para o cargo. Além de ser o segundo na linha de sucessão em caso de ausências, o ocupante da vaga é responsável pelo diálogo institucional da Câmara com o Poder Legislativo de estados e municípios.

Os cargos da Mesa são alvo de interesse dos deputados porque dão o direito de nomear funcionários. O primeiro vice, por exemplo, pode contratar até 43 funcionários por indicação política. O segundo, 31 comissionados.

Responsável pelos contratos assinados pela Câmara, o primeiro-secretário deve ser do PR. Há um acordo para a recondução de Giacobo (PRPR), mas Soraya Santos (PRRJ) também entrou na briga. Ontem, cabos eleitorais distribuíam adesivos com o nome de Soraya. Mulheres vestidas com a camisa “Giacobo” também entregavam folhetos com o slogan “Giacobo, inovando de novo”.

DISPUTA PELAS COMISSÕES
Na segunda-secretaria, fica a gestão dos passaportes diplomáticos requeridos por deputados. O acordo é ter um parlamentar do PP eleito. Disputam Hiran Gonçalves (PP-RR) e André Fufuca (PP-MA). O terceiro-secretário, responsável por fazer análise de licenças, justificativas de faltas de parlamentares e também pela compra de passagens aéreas, deve ser ocupada pelo PSD — Fábio Faria (RN) é o mais cotado.

Disputa no Senado tem recorde de candidatos

Congresso. À véspera da eleição, chega a 9 número de parlamentares que pretendem disputar presidência da Casa; frente de partidos ‘anti-Renan’ faz defesa de voto aberto

Renan Truffi Mariana Haubert / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O número de parlamentares que se apresentam como candidatos à presidência do Senado, na véspera da votação, é recorde, podendo transformar a eleição de amanhã na mais disputada desde a redemocratização. Ao todo, nove senadores anunciaram disposição de disputar o pleito. Até então, o maior número de concorrentes havia sido registrado na eleição de 2001, quando três candidatos disputaram o cargo. A oficialização das candidaturas será feita pouco antes do início da sessão.

Uma das possíveis explicações para esse crescimento é a pulverização de partidos no Senado desde 2015. Os resultados das urnas estabeleceram um quadro com parlamentares de 21 legendas, número muito superior às 15 siglas com representantes eleitos quatro anos atrás. Com as negociações partidárias e o troca-troca de legendas, a Casa deve começar a próxima legislatura, no entanto, com um número menor: 17 siglas representadas.

Por conta disso, caso nenhum dos pré-candidatos desista de participar, os 81 senadores poderão ter de escolher entre Alvaro Dias (Podemos-PR), Ângelo Coronel (PSD-BA), Davi Alcolumbre (DEM-AP), Esperidião Amin (PP-SC), José Reguffe (Sem partido-DF), Major Olímpio (PSL-SP), Renan Calheiros (MDB-AL), Simone Tebet (MDB-MS) e Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Um símbolo dessa pulverização é que até mesmo a maior bancada do Senado, o MDB, com 13 senadores até o momento, pode registrar o fenômeno de ver dois de seus senadores disputarem os mesmos votos no plenário. A decisão final da bancada em relação a essa disputa deve sair hoje, mas, mesmo se a bancada optar por Renan, a senadora Simone Tebet cogita se lançar como “candidatura avulsa”.

“É natural (esse número de candidaturas), nunca o Senado teve tantos partidos. Isso é relação direta da fragmentação”, disse Amin.

PSDB articula frente contra Renan no Senado

Por Vandson Lima, Fabio Murakawa e Malu Delgado | Valor Econômico

BRASÍLIA - A consolidação de Renan Calheiros como o mais provável candidato do MDB à presidência do Senado provocou ontem uma reação de partidos de centro e esquerda, com protagonismo do PSDB, para apresentar uma candidatura capaz de derrotar o senador alagoano. O movimento contou com a participação direta do governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

A articulação pode resultar no afunilamento da disputa, hoje com 10 nomes colocados, para três candidaturas: de Renan, Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Davi Alcolumbre (DEM-AP). Se este quadro se confirmar, é possível que o Senado tenha uma disputa em segundo turno, o que nunca aconteceu.

Doria atuou para dissuadir o PSD de uma aliança com Renan. O governador convenceu o ex-ministro Gilberto Kassab, a quem convidou para comandar a Casa Civil em São Paulo, a assegurar a liberação da bancada.

O partido de Kassab tornou-se a segunda maior bancada do Senado, com 10 parlamentares, após as filiações de dois senadores eleitos pelo PTB. Renan acenava ao PSD com postos de peso na Casa, como a vice-presidência, caso sua chapa contemplasse a "proporcionalidade" dos partidos no Senado. Doria procurou bloquear essas tratativas.

Na sequência, Doria procurou Tasso. A leitura dos tucanos foi de que Simone Tebet (MS), adversária de Renan na eleição interna do MDB, perdeu terreno após a reunião da sigla, na terça-feira.

O PSDB havia garantido a ela que, caso superasse Renan, teria o apoio tucano na eleição da presidência do Senado. Mas ela se indispôs com boa parte da bancada após defender que a eleição do Senado seja com voto aberto - o regimento diz que o voto é secreto e o MDB defende manter as regras como estão. Isolada, Simone renunciou à liderança do partido.

Completando sua articulação, Doria ligou ontem para Simone. Disse que os tucanos ainda veem a candidatura dela com simpatia, mas que a decisão do MDB, que só será dada após reunião da bancada hoje, no fim da tarde, a menos de 24h da eleição, obrigava outras correntes políticas a buscar alternativas.

Na manhã de hoje, pelo menos oito prováveis candidatos devem participar de uma reunião em um hotel de Brasília para definir que candidaturas devem sobreviver e qual delas é mais forte e capaz de derrotar Renan.

Tasso, segundo interlocutores, aceita ser candidato, mas apenas se estiver seguro de que soma votos para vencer Renan em qualquer circunstância, seja com voto aberto ou fechado. Além dos oito votos do próprio partido, ele buscaria os 10 do PSD e 14 do bloco dos partidos à esquerda - exceto o PT (Rede, PPS, PDT e PSB). Com estes 32 votos encaminhados, Tasso trabalharia na sequência para angariar insatisfeitos do MDB, como a própria Simone, que não votarão em Renan; e apoios de senadores com viés mais governista. Com isso, Tasso e Doria acreditam poder alcançar uma margem suficiente para desbancar Renan Calheiros na eleição à Presidência do Senado.

PSB apoia candidato próprio em disputa na Câmara, mas não rejeita bloco de esquerda

Partido tentou diversos acordos com siglas de centro e de esquerda, mas teme isolamento

Angela Boldrini / Marina Dias | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Isolado na disputa, o PSB decidiu apoiar para a presidência da Câmara a candidatura de um deputado do partido que antes concorria avulso. Atualmente terceiro secretário, JHC (AL) disputará o posto nesta sexta-feira (1º).

De acordo com o partido, a decisão foi unânime. Ela não exclui, porém, a possibilidade de o partido formar um bloco parlamentar com siglas da oposição ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).

Nesta quarta-feira (30), o PSB deve se reunir com representantes de PT, PSOL e PC do B para articular o conjunto, que poderia garantir espaços na Mesa Diretora para o partido.

Antes de tomar a decisão de apoiar JHC, o partido tentou formar bloco também com PDT e PC do B, que acabaram se unindo a Rodrigo Maia (DEM-RJ), que também arregimenta o PSL de Bolsonaro.

Um ‘novo Renan’: Editorial | O Estado de S. Paulo

Mais de uma vez, neste espaço, manifestamos nossa integral repulsa não à velha política, mas à velhacaria política. Há poucos dias, por exemplo, repudiamos as artimanhas do senador Renan Calheiros (MDB-AL) para alcançar mais uma vez a presidência do Senado, um exemplo bem acabado de tudo o que foi rejeitado pelos brasileiros nas eleições do ano passado. Graças à capacidade do político alagoano de superar seus próprios limites de caradurismo, contudo, é necessário retornar a esse desagradável assunto. Pois agora Renan Calheiros mandou avisar, pasme o leitor, que será “um novo Renan”.

Em entrevista ao Valor, Renan Calheiros disse que, se for eleito presidente do Senado, no pleito previsto para amanhã, será um político completamente diferente do atual. “Você conhecia o velho Renan. O novo chega sexta-feira, e vai discordar do outro em muita coisa”, disse o senador. Segundo ele, o “outro” Renan “era mais estatizante”; já o “novo” será “um Renan liberal, que vai ajudar a fazer as reformas”.

Desastre revela controle ineficaz de barragens: Editorial | O Globo

É positiva decisão da Vale de esvaziar reservatórios construídos com método semelhante ao de Brumadinho

Quatro dias após o rompimento da Barragem da Mina do Feijão, que já deixou 99 mortos e quase 260 desaparecidos, a Vale anunciou que, em até três anos, acabará com todos os reservatórios de rejeitos de mineração construídos pelo mesmo método do de Brumadinho (alteamento a montante), considerado inseguro e banido de países como o Chile. Desde o desastre de Mariana, em 2015, nove já foram esvaziados, restando ainda dez. Embora o processo estivesse em andamento, a decisão de acelerá-lo é fundamental para preservar a segurança junto a essas represas.

Medida acertada, sem dúvida. Mas é apenas parte do problema. Após a tragédia de Brumadinho, é certo que políticas de segurança, sistemas de fiscalização e planos de contingência foram todos soterrados pela enxurrada de lama que vazou sexta-feira. Parece evidente que o monitoramento dessas estruturas é tão frágil quanto as próprias.

Em busca de ajuda: Editorial | Folha de S. Paulo

Estados procuram governo federal para resolver problemas em suas contas

Não haverá solução para a crise das contas públicas no país sem que se resolva a calamidade financeira que aflige estados e municípios.

Os problemas da União costumam monopolizar as atenções, seja pelos valores envolvidos, seja pelas iniciativas de política econômica, mas é na vida cotidiana que o descalabro de fato se faz sentir.

Com novos governadores assumindo seus mandatos, é natural que cresça a já contumaz demanda por ajuda federal. O último pedido terminou atendido em 2016, com a aprovação da lei complementar 156: alongou-se por 20 anos o prazo de pagamento e interromperam-se as amortizações por um biênio.

Estima-se que a benesse custará à União R$ 166,7 bilhões até 2022. Os estados se comprometeram com um teto de gastos, que não poderia crescer além da variação do IPCA por dois anos.

Riscos para a transparência e o combate à corrupção: Editorial | Valor Econômico

Transparência e intransigência quanto à corrupção ocuparam a linha de frente da campanha do candidato vitorioso do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro. Em três semanas de governo, porém, surgiram medidas que objetivamente podem desmentir essas promessas. Pelo menos mais 1.288 pessoas com cargo DAS (Direção e Assessoramento Superior) passarão a ter direito a classificar documentos da administração como ultrassecretos, secretos e reservados. Uma proposta de regulamentação financeira de medidas para coibir a lavagem de dinheiro alterou o montante objeto de comunicação obrigatória ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Não se justifica a urgência para tratar logo nos primeiros dias da nova administração dos dois assuntos.

O aumento do número de pessoas que tem o poder de dizer o que o Estado deve manter em sigilo e o que deve tornar público é um retrocesso claro em relação à Lei de Acesso à Informação, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 2012. Ele foi instituído por decreto e assinado pelo presidente em exercício, Hamilton Mourão, e pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, quando o presidente Jair Bolsonaro estava em Davos, no Forum Econômico Mundial. A justificativa de Mourão para a medida não tem sentido - o de que diminuirá a burocracia. Na questão de escolher quais informações, documentos, decisões, atas, memorandos etc são sensíveis para o Estado e devem ser sonegados por um período de tempo considerável ao conhecimento da opinião pública, quanto mais pessoas tiverem direito a essa atribuição menos transparência haverá.

Fernando Pessoa: Carnaval

A vida é uma tremenda bebedeira.
Eu nunca tiro dela outra impressão.
Passo nas ruas, tenho a sensação
De um carnaval cheio de cor e poeira

A cada hora tenho a dolorosa
Sensação, agradável todavia,
De ir aos encontrões atrás da alegria
Duma plebe farsante e copiosa

Cada momento é um carnaval imenso,
Em que ando misturado sem querer.
Se penso nisso maça-me viver
E eu, que amo a intensidade, acho isto intenso

De mais Balbúrdia que entra pela cabeça
Dentro a quem quer parar um só momento
Em ver onde é que tem o pensamento
Antes que o ser e a lucidez lhe esqueça

Automóveis, veículos,
As ruas cheias,
Fitas de cinema correndo sempre
E nunca tendo um sentido preciso.

Julgo-me bêbado, sinto-me confuso,
Cambaleio nas minhas sensações,
Sinto uma súbita falta de corrimões
No pleno dia da cidade

Uma pândega esta existência toda
Que embrulhada se mete por mim dentro
E sempre em mim desloca o crente centro
Do meu psiquismo, que anda sempre à roda

E contudo eu estou como ninguém
De amoroso acordo com isto tudo
Não encontro em mim, quando me estudo,
Diferença entre mim e isto que tem

Esta balbúrdia de carnaval tolo,
Esta mistura de europeu e zulu
Este batuque tremendo e chulo
E elegantemente em desconsolo

Álvaro de Campos / Fernando Pessoa
Do livro: "Obras Completas", Edições Ática, 1970, Portugal