sexta-feira, 7 de junho de 2019

Opinião do dia: Marcelo Ramos (PL-AM)*

"—Os governadores têm que calçara sandália da humildade e vir para cá dizer assim “olha, nós não temos coragem de fazer, nós queremos pedir aos deputados que façam por nós”. É isso que eles têm fazer humildezinhos"

Segundo ele, a inclusão dos estados e municípios na reforma e a aplicação automática das novas regras configura invasão na autonomia federativa. Ramos mencionou ainda que os regimes de previdência estaduais e municipais têm regras diferenciadas, além da questão fiscal.

"—Tem estado que está quebrado, tem estado que não está quebrado. Você vai aplicar o mesmo remédio para um paciente que está na U TI e para um paciente que está com febre. Isso não me parece razoável."

*Deputado Marcelo Ramos (PL-AM), presidente da Comissão Especial da reforma da Previdência, O Globo, 7/6/2019

*José de Souza Martins: Nomes da incerteza

- Valor Econômico

Capitalismo sem ética não é capitalismo, é crime organizado. Economia que gera 13 milhões de desempregados não fruto de competência empresarial, é falta de respeito pelo outro

Desde o dia 1º de janeiro, a formação da opinião pública no Brasil oscila nas incertezas de palavras redefinidas pelo conflito ideológico. Com as que ontem se queria dizer uma coisa, hoje se quer dizer outra. Conceitos viraram preconceitos e, nessa forma, encheram a boca dos que dizem o que já não sabem. O não saber ganhou aqui uma linguagem.

Por seu lado, os que ouvem esse dizer indizente estão mais confusos do que suportam, acostumados que estavam com uma linguagem simples e clara que todos conheciam. A nova linguagem é a da incerteza com que nos fazem pensar sem querer e querer sem pensar. O real está desencaixado, anômico.

Essa linguagem nos tem sido apresentada como se fosse a de uma nova era, direita e de direita, contra uma era só de esquerda. Mas estamos confusos até mesmo quanto ao que quer dizer direita e, mais ainda, quanto ao que quer dizer esquerda. Fica evidente que quem perdeu o poder, perdeu-o porque sua fala foi esvaziada pelo desenraizamento. Em todas as eleições dos últimos anos, as esquerdas foram derrotadas porque não sabiam dizer o que eram. Nem ao que vinham. Perderam-se no desencontro entre linguagem e alianças esquisitas.

A confusa direita acabou revelando que é de direita sem saber o que a direita é, votada por um eleitorado que tampouco o sabe. Tudo o que as esquerdas e o centro fizeram no poder passou a ser avaliado e concebido como o que deveria ser banido eleitoralmente. O não dessa direita é apenas um não sem um sim alternativo.

Os partidos, de esquerda e de direita, esqueceram-se de que a classe média é apenas média. Como toda média, é apenas um ponto na escala de vacilações da sociedade. Para a classe média, direita é o setor político que pode saciar o que a esquerda não lhe deu, no muito mais de sua voracidade, do que queria e até do que a esquerda dissera que carecia.

Essa direita, que não é uma convicção político-ideológica, é em boa parte apenas disposição para seguir quem personifica os urros do ressentimento. Esta confusa direita do poder foi criada na corrosão dos partidos no processo eleitoral, que emergiu das urnas com uma cara desconhecida, sem doutrina nem direção.

*César Felício: Diminui o vendaval?

- Valor Econômico

No mercado, aposta-se em menos lavajatismo

Entre os executivos de banco de uma forma ou de outra atentos à Lava-Jato, há um moderado otimismo. Acredita-se que tanto no plano dos grandes interesses nacionais quanto no que se refere ao próprio pescoço de cada um, o pior já passou. Na visão destes atores do sistema financeiro, o resultado concreto das investigações que afetam a mais de dez bancos implicará em pagamentos acertados em termos de ajustamento de conduta. As irregularidades a serem desvendadas seriam enquadradas como falhas de controle, e não casos de corrupção. É uma agenda com seu custo para o mercado financeiro, mas suportável. Não tem cadeia. Não tem instituição sendo fechada.

Um núcleo jacobino persistiria no Rio de Janeiro, em torno da 7ª Vara Federal, comandada por Marcelo Bretas, mas a onda teria se dissipado em Curitiba, na PGR e no Supremo. A equação política, na visão de um espectador, mudou. "O lavajatismo e o bolsonarismo formaram uma aliança de ocasião que está se desfazendo com o tempo", acredita.

Na opinião desse senhor, o Brasil viveu um momento de grande perigo entre o fim do ano passado e o começo do governo atual. Era o risco do lavajatismo, com Sergio Moro à frente do governo, servir de combustível para uma escalada autoritária.

Esta marcha poderia ter o seguinte encadeamento: instalava-se a chamada CPI Lava-Toga, o que abriria caminho para pedidos de impeachment dentro do Supremo. Sob pressão, a casa aceitaria aprofundar as investigações contra detentores de foro a tal ponto que o que restasse da classe política seria destruída. Neste processo, a elite empresarial ficaria muito fragilizada e o grande líder populista poderia reunir os sobreviventes dos outrora poderosos em uma mesa e estabelecer novos termos: para a Presidência da República, tudo seria possível. Aos demais restaria a submissão.

Deste risco o Brasil estaria livre. Seja porque o bolsonarismo não demonstrou ter blindagem absoluta ao que as investigações podem trazer, seja porque a imperícia fez morada no Palácio da Alvorada. Perdeu-se apoio para isso entre os militares, no Congresso, na mídia, em parte dos eleitores, e por fim, da cúpula do Judiciário, com a troca de guarda entre Cármen Lúcia e Dias Toffoli. Passaram a viver das redes sociais.

Claudia Safatle: A estratégia e o plano econômico de Guedes

- Valor Econômico

Divulgação só vai ocorrer depois de aprovada a reforma

Na economia, o governo tem vários projetos e uma estratégia. Segundo fontes qualificadas, o plano do ministro Paulo Guedes comporta uma série de propostas que somente serão conhecidas depois de aprovada a reforma da Previdência.

A precaução tem lá os seus motivos. Trata-se de um plano com um amplo leque de projetos de mudanças que vão ferir interesses de grupos específicos com representação no Congresso Nacional. Ao conhecê-lo de antemão, parlamentares com interesses contrariados poderão se voltar contra a aprovação da reforma da Previdência, que é crucial para dar um horizonte de sustentabilidade para as contas públicas e garantia de solvência do Estado.

Só nas duas últimas semanas foram criadas três novas frentes no Congresso, em oposição a algumas das ideias consideradas pela equipe econômica. São elas: a Frente Parlamentar Contra a Privatização dos Correios; a Frente Parlamentar Contra a Privatização de Bancos Públicos Federais; e, ainda, a Frente Parlamentar Contra a Privatização da Petrobras.

A estratégia, portanto, é a de ser bastante comedido nas informações sobre o programa econômico do governo, porque haverá medidas "capazes de produzir terremotos na escala Richter de 7,5", ou seja, com grande capacidade de desagradar grupos específicos, explicou uma graduada fonte oficial; e outras com impactos menores, mas também não desprezíveis, sobretudo para uma complicada base de sustentação política, completou.

*Armando Castelar Pinheiro: A guerra comercial e o socorro do Fed

- Valor Econômico

Cenário externo tornará a economia brasileira ainda mais dependente da expansão da demanda privada doméstica

Este é o terceiro ano consecutivo em que o otimismo do início do ano dá lugar a projeções cadentes de crescimento econômico. Acontecimentos domésticos são em geral apontados como responsáveis por essas viradas: a gravação que gorou as chances da reforma da previdência, em maio de 2017; a greve dos caminhoneiros, um ano depois; e, este ano, a constatação de que Executivo e Legislativo terão uma relação conturbada, dificultando a aprovação de reformas.

Nos três anos, porém, fatores externos também tiveram um papel importante, em particular o crescente risco geopolítico que passou a caracterizar os EUA e a Europa, com o avanço do populismo. Pesaram, em especial, o receio de que, na esteira do Brexit, outros países deixassem a União Europeia, inviabilizando o euro como moeda comum, e o crescente protecionismo comercial americano, enfraquecendo as instituições multilaterais que ajudara a criar no pós-Segunda Grande Guerra.

Este ano, até aqui, o grande choque é a escalada da guerra comercial. O conflito com a China, que também envolve restrições ao acesso de empresas chinesas às tecnologias desenvolvidas nos EUA, é o destaque, mas não sua única manifestação: há uma decisão pendente sobre tarifar as importações de carros europeus pelos EUA; há a ameaça de elevar as tarifas sobre as importações americanas da Índia, retirando o país do Sistema Geral de Preferências; e há o risco de uma escalada nas tarifas sobre as exportações mexicanas para os EUA. Este último caso gerou especial inquietação, por estar associado a exigências do governo americano sobre questões que em nada se relacionam a acesso a mercado ou outras disputas de comércio exterior, mas sim à migração ilegal de centro americanos para os EUA.

Essa escalada protecionista vai prejudicar o desempenho da economia mundial nos próximos anos. Em documento divulgado esta semana, o FMI estima que "apenas" as tarifas às importações impostas ano passado e em 2019 pelos EUA e a China vão reduzir em 0,5 ponto percentual o crescimento mundial em 2020. A concretização da ameaça de tributar as exportações mexicanas para os EUA pode afetar profundamente a confiança empresarial. A eventual imposição de barreiras às importações de carros fabricados na Europa - e a retaliação que essa ensejará - podem ter impactos igualmente significativos.

Reinaldo Azevedo: STF fez o certo; a Constituição existe

- Folha de S. Paulo

Na decisão sobre privatização de estatais, triunfou a letra explícita da Carta

Supremo acertou. Depois de alguma confusão, formou-se um 11 a 0 em favor da Constituição. Empresas matrizes, públicas ou de economia mista, mas controladas pelo Estado, só podem ser privatizadas ou ter esse controle vendido com o aval do Congresso.

Por 8 a 3, decidiu-se que as subsidiárias podem ser privatizadas sem esse aval, ainda que o processo deva obedecer a princípios de moralidade pública. Venceu o estatismo? Não! No primeiro caso, triunfou a letra explícita da Carta; no segundo, a jurisprudência. Ainda que coisas assombrosas tenham sido ditas.

Ao proferir o seu voto na quarta (5), Roberto Barroso evidenciou que o Supremo pode ser poroso a vagas de opinião que corroem a institucionalidade. Deixou gravada na memória do tribunal uma fala que é coisa de prosélito e de ideólogo, não de titular da corte constitucional.

Fatio e comento sua fala. Disse: “Eu acho que, no fundo, nós estamos travando um debate político disfarçado de discussão jurídica, que é a definição de qual deve ser o papel do Estado e quem deve deliberar sobre este papel no Brasil atual.”

Errado. O que se votava era a aplicação do que dispõem dois dispositivos constitucionais: o inciso III do parágrafo 1º do artigo 173 e o inciso XXI do artigo 37. E ambos são explícitos, a qualquer alfabetizado, sobre a necessidade de uma lei que autorize a venda de ativos públicos. Logo, a palavra final é do Congresso.

Bruno Boghossian: Governabilidade, uma ilusão

- Folha de S. Paulo

Presidente aprova projetos no piloto automático, mas terreno ainda é instável

Há dois dias, Jair Bolsonaro chamou Rodrigo Maia de “meu irmão” e disse que os parlamentares estão voltados “realmente para o interesse popular”. Nem parecia o presidente que estimulou manifestações contra o Congresso e, meses atrás, reclamava que “alguns não querem largar a velha política”.

O Planalto continua abusando de erros de articulação, mas conseguiu aprovar projetos relevantes nas últimas semanas, como se algum botão de piloto automático estivesse ligado. Embora não esteja mais em guerra aberta com deputados e senadores, o governo ainda se movimenta sobre um terreno instável.

Bolsonaro conseguiu evitar um colapso político prematuro com a aprovação das duas primeiras medidas provisórias significativas de seu mandato. Houve ranger de dentes, mas o Congresso finalmente deuaval para a reorganização de ministérios e para o pente-fino que o governo quer fazer em benefícios do INSS.

Eliane Cantanhêde: Na contramão a 100 km/h

- O Estado de S.Paulo

Brasil regride nas armas, no trânsito, no ambiente, nos costumes, até no bom senso

O presidente Jair Bolsonaro anuncia o fim da “indústria da multa”, mas pode estar reforçando a “indústria da morte” com a obsessão pelas armas, o estímulo para converter carros em armas e a sensação de que, ao virar presidente, está livre para tornar suas convicções pessoais em agenda de Estado. Os papos com filhos e amigos agora viram MPs, decretos, projetos de lei. Danem-se especialistas, dados e pesquisas científicas.

Para o presidente da Comissão da Reforma da Previdência, Marcelo Ramos (PL), ele “não tem noção de prioridade e do que é importante para o País”. Além de “flexibilizar” a posse e o porte de armas, Bolsonaro levou orgulhosamente ao Congresso um projeto leniente com infratores e infrações de trânsito – um grande assassino no mundo. No Brasil, foram 35,3 mil mortes e 180 mil internações só em 2017.

Japão, Canadá, França e Espanha reduziram a mais da metade as mortes no trânsito. Como? Com educação, abordagem policial e penas duras para infratores. E o Brasil? Se depender do presidente da República, o Brasil vai na contramão, a mais de 100 km/h. Os radares estão ameaçados e os maus motoristas poderão cometer o dobro das barbaridades até perder a carteira, não terão de se preocupar com cadeirinhas e estarão livres de comprovar que não usaram algum tipo de droga, mesmo que dirijam ônibus e caminhões.

Raul Jungmann*: Nós, cúmplices do crime organizado

- O Estado de S.Paulo

Debate sobre segurança no País precisa chegar ao que se passa dentro do sistema prisional

O País registrou no dia 26/5 mais uma chacina no complexo penitenciário de Manaus, com um saldo mórbido de 55 mortos – quatro a menos que na ocorrida em 2017, na mesma capital. Naquele ano, ainda houve 59 mortes em presídios: 33 em Roraima e 26 no Rio Grande do Norte.

Ampliam essa tragédia humana uma política penal equivocada e a indiferença de uma população acuada pela criminalidade que, historicamente, vê essa política como justa e até positiva.

Pode-se compreender essa revolta da população, vítima diária do crime, porém jamais concordar com ela, pela lógica mais elementar. Trata-se, aqui, da substituição da racionalidade pelo sentimento de impotência, medo e frustração. O que não é compreensível mais é a resistência – ou inércia – em rever um modelo há muito diagnosticado como responsável pelo círculo vicioso que inverte o controle dos presídios, onde a vida do preso é garantida pelas facções criminosas, e não pelo Estado.

Um dos pontos centrais dessa distorção está na omissão na legislação das drogas, de 2006, que exime usuários de punição, mas endurece penas para traficantes – sem, no entanto, diferenciar o traficante do usuário.

Dessa forma, jovens que não respondem por crimes de sangue, ou hediondos, muitas vezes em grau primário de contravenção, são condenados à convivência com presos de alta periculosidade, engajados em facções às quais são obrigados a se filiar para ter a garantia de vida que o Estado não oferece.

A busca pela punição, e não da culpa, responde pelo porcentual de 40% de presos provisórios, não condenados, que se submetem às ordens das mais de 70 facções existentes no País. O expurgo verificado nas chacinas, portanto, alcança em sua maioria (55%) jovens, pardos e negros, de 18 a 29 anos, com baixa escolaridade, pouca renda e a maioria vinda de famílias desestruturadas (dados do Infopen, do Ministério da Justiça e Segurança Pública).

Elena Landau*: A Terra é azul

- O Estado de S.Paulo

O desprezo pela cultura, incrivelmente, encontra eco na sociedade brasileira

Acabo de voltar de viagem à Europa, onde fui para participar de um seminário organizado por estudantes brasileiros. Vivi alguns dias em outra realidade e voltei mais leve. O fuso horário ajuda muito a ficar distante da polarização nas redes daqui. O tempo de sobra foi dedicado à cultura, especialmente em longas visitas a museus. A arte, em qualquer forma, aguça a curiosidade e desperta atitude crítica frente ao mundo. Conta a história da humanidade, as inquietações dos artistas frente à realidade vivida. Não vi censura ideológica pelos lugares que passei. Vi diversidade, controvérsia e inconformismo.

Fiz uma promessa: não deixar a amargura com os descaminhos do nosso País me dominar novamente. Cansada de escrever sobre os disparates deste governo, tinha intenção de me deixar levar por essa leveza e escrever uma coluna diletante. Mas foi só aterrissar que o peso e o pessimismo voltaram.

O noticiário local reflete o desprezo pela ciência, cultura, educação e meio ambiente. A bem da verdade, essas duas semanas com pé fora me mostraram que o terraplanismo não é uma jabuticaba. Mas isso não serve de consolo.

O premiê da Hungria, um dos países que nosso chanceler tanto admira, pretende extinguir as instituições de pesquisa que integram a Academia de Ciências do país, retirando sua autonomia. Orbán escolherá os temas considerados relevantes a serem pesquisados.

Quem decide o que a ciência pode vir a descobrir são esses novos Luís XIVs, que surgem com o populismo de direita. Movimento que, como qualquer forma de autoritarismo, busca uma sociedade homogênea, incompatível com a democracia e a diversidade.

Li, recentemente, uma entrevista de Vargas Llosa, uma das vozes liberais mais importantes do momento. É mais um pessimista com o ressurgimento do nacionalismo, que vê como uma nova forma de autoritarismo. O escritor nos lembra que uma sociedade impregnada de arte forma indivíduos críticos e, por isso, mais difíceis de serem manipulados pelos grandes poderes. Diria eu, então, que estamos menos preparados por aqui para enfrentar a tentativa de pasteurização de ideias. 

Claro que o desprezo pela cultura e pela ciência não começou por aqui agora. O incêndio do Museu Nacional é a prova eloquente. Não foi obra do acaso. Foram anos de abandono, gambiarras elétricas e paredes improvisadas por compensados. Mas não se pode negar que este governo abraçou o retrocesso cultural e científico como plataforma política. Não é apenas descaso. Nenhuma manifestação aos prêmios internacionais, como Camões para Chico Buarque, e os de Cannes para o cinema brasileiro.

Luiz Carlos Azedo: A pressão dos governadores

- Nas entrelinhas / Correio Braziliense

‘O lado mais fraco são os trabalhadores do setor privado. Há dois motivos: primeiro, o desemprego em massa, que os mantêm acuados; segundo, o fim do imposto sindical, que quebrou a maioria dos sindicatos’

Cresce a pressão de governadores e prefeitos para que a reforma da Previdência inclua estados e municípios, matando todos os coelhos com uma só cajadada no Congresso. Somente os governadores da Bahia, Rui Costa (PT), e do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), não assinaram carta contra o fatiamento da reforma entre entes federados. Mesmo assim, Dino discorda da proposta do governo, mas também é contra uma reforma que não inclua todos: “Essa reforma que está tramitando eu não apoio. Precisa melhorar muito. Em melhorando, é claro que regime previdenciário dos servidores tem que ser para todos. Inclusive militares. Existirem milhares de regimes previdenciários diferentes no Brasil seria, aí sim, uma balbúrdia jurídica”, pondera.

O relator da reforma da Previdência, Samuel Moreira (PSDB-SP), trabalha para elaborar seu relatório neste fim de semana e apresentá-lo na segunda ou terça-feira à Comissão Especial da Câmara que apreciará o projeto. Sua dificuldade é conseguir elaborar um substitutivo que forme maioria no plenário, sem descaracterizar a reforma original, o que não é nada fácil. Foram apresentadas mais de 400 emendas. Deputados têm feito pressão para que estados e municípios fiquem fora do texto, porque não querem arcar sozinhos com o desgaste político de aprovar uma matéria considerada impopular. Segundo Samuel Moreira, se os estados ficarem fora do texto, os governadores que queiram sanear as finanças estaduais terão de aprovar uma proposta própria de reforma da Previdência nas assembleias legislativas.

Na carta que divulgaram ontem, os governadores argumentam que aprovar uma regra local, no estado, dificulta a uniformidade para o território nacional e é um obstáculo para a efetivação de normas. Eles também afirmam no documento que o regime de Previdência é “substancialmente deficitário”, constituindo uma das causas da “grave crise fiscal enfrentada pelos entes da Federação”. Segundo a carta, “o deficit nos regimes de aposentadoria e pensão dos servidores estaduais, que hoje atinge aproximadamente R$ 100 bilhões por ano, poderá ser quadruplicado até o ano de 2060, conforme estudo da Instituição Fiscal Independente — IFI, do Senado Federal”. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), é um dos principais articuladores da carta, em dobradinha com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

Há uma dupla esperteza dos deputados que se opõem à inclusão de estados e municípios na reforma: de um lado, se livram das pressões dos sindicatos de servidores estaduais e municipais dos seus respectivos estados (a maior concentração de servidores federais está localizada em Brasília e no Rio de Janeiro, ex-capital federal); de outro, no caso dos que vão disputar eleição como candidatos de oposição, põem uma saia justa nos governadores e prefeitos adversários, às voltas com despesas cada vez mais elevadas para pagar aposentados e pensionistas. Em alguns estados, como Rio de janeiro, Minas e Rio Grande Sul, já houve o colapso do sistema previdenciário.

Lobbies
A aprovação do relatório de Samuel Moreira pela Comissão Especial será um jogo de xadrez. Existem outros lobbies atuando para mitigar a reforma no setor público. Magistrados e procuradores têm enorme poder de pressão sobre o Congresso; de igual maneira, corporações poderosas do Executivo, como auditores-fiscais, delegados federais e professores universitários. Mesmo categorias sem o mesmo status político na alta burocracia, como os agentes penitenciários, trabalham intensamente nos bastidores do Congresso para não perder privilégios. No âmbito das categorias estaduais, policiais militares e civis, professores e pessoal da saúde exercem enorme pressão sobre suas respectivas bancadas. Todos organizam caravanas a Brasília para pressionar o Congresso.

Bernardo Mello Franco: O que o ministro não quis ouvir

- O Globo

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não gosta de contestação. Depois da vaia no Senado, ele alegou ter outro compromisso e se mandou sem ouvir as críticas à sua gestão

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não gosta de contestação. Ao ser vaiado ontem no Senado, ele alegou outro compromisso e se mandou. Saiu sob gritos de “fujão”, sem ouvir o que parlamentares e ambientalistas tinham a dizer.

Foi uma pena, porque os oradores produziram um bom retrato da sua gestão. “Vivemos tempos de obscurantismo e negacionismo, que fazem algumas das mais altas autoridades do governo desmontarem deliberadamente um legado de 30 anos de governança ambiental no Brasil”, resumiu o biólogo Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.

Ele disse que as ações de fiscalização na Amazônia caíram em 70% de janeiro a abril na comparação com o ano passado. “O Brasil fica exposto quando seu governo assume uma posição de agressor do meio ambiente e nos torna um pária climático global”, alertou.

O ex-ministro José Carlos Carvalho, que ocupou a cadeira de Salles no fim do governo FH, protestou contra o “aniquilamento” do Conselho Nacional do Meio Ambiente. Na semana passada, um decreto do presidente Jair Bolsonaro reduziu a participação da sociedade civil de 22 para quatro cadeiras. “Esta é a mais eminente expressão da desconstrução da política ambiental brasileira”, afirmou.

Míriam Leitão: As dificuldades no Congresso

- O Globo

Jereissati salvou o marco regulatório do saneamento, que será um avanço para o setor, ao fazer o que o governo não tem feito: articulação

Cem milhões de brasileiros vivem sem saneamento básico e os investimentos no setor estão estagnados. Se forem reativados, têm ainda a vantagem de criar emprego em época de aguda escassez de vagas. Esses argumentos já seriam suficientes para se aprovar o marco regulatório do setor. Uma MP do governo Temer que tratava disso, e interessava ao governo Bolsonaro, caiu esta semana. O assunto foi salvo num esforço surpreendente comandado pelo senador tucano Tasso Jereissati, que fez o projeto de lei e o aprovou em 48 horas no Senado.

O tucano se reuniu com o senador Davi Alcolumbre e com o deputado Rodrigo Maia, e propôs apresentar um projeto de lei. Alcolumbre abraçou imediatamente a ideia. O governo apoiou o esforço. Jereissatti havia sido o relator da MP do saneamento na comissão mista. Conduziu várias audiências públicas e verificou onde estava a dificuldade.

— A pressão vinha principalmente das empresas estaduais de saneamento, por isso conversei bastante com os governadores, principalmente os do Nordeste que são de oposição. Como estou aqui há muito tempo, tenho diálogo com todo mundo. Negociei intensamente. Ao todo existem 4.000 cidades brasileiras sem coleta de esgoto e tratamento. Vivemos como a Europa vivia na idade média — diz o senador.

Merval Pereira: Vitória privatista

- O Globo

‘Fetiche’ de pôr controle estatal como protagonista, segundo Luís Roberto Barroso, é que estava em discussão

No julgamento que terminou ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) com a decisão majoritária de que só a alienação do controle acionário de empresas públicas e de sociedades de economia mista exige autorização legislativa, exigência que não se aplica à alienação do controle de suas subsidiárias e controladas, houve, na verdade, a prevalência de uma visão privatista sobre a do capitalismo de Estado defendido pelo relator, ministro Ricardo Lewandowski.

Segundo ele, "crescentes desestatizações" podem apresentar prejuízos ao país. Por isso é necessário que o Congresso, onde estão os representantes do povo, se manifeste sobre as privatizações. Na sua visão o Estado não pode abrir mão da exploração de atividades econômicas por decisão exclusiva do governo.

A divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes opôs a essa idéia a tese de que o Estado não deveria entrar "nas regras do mercado privado", pois a Constituição dita que a intervenção estatal nesse deve ser mínima.

O “fetiche” de colocar o controle estatal como protagonista de tudo, segundo o ministro Luis Roberto Barroso, é que estava em discussão subjacente ao tema central, que era a tentativa de entidades sindicais de impedir a venda de subsidiárias de estatais, como é o caso do programa de desinvestimento da Petrobras.

Barroso disse que essa devia ser uma decisão do Executivo, o STF não deveria se imiscuir em questões econômicas, que devem ser resolvidas por gestores públicos. Ressaltou que a definição do papel do Estado é que estava em discussão e, no seu ponto de vista, a Constituição manda que esse papel seja o menor possível. O ministro Edson Facchin, que acompanhou o relator, ressaltou em aparte que não votou com intuito político, mas de acordo com sua interpretação da Constituição.

Ricardo Noblat: Governo do capitão sob rédea curta

- Blog do Noblat / Veja

Se não for por bem será por mal

Uma vez que o presidente Jair Bolsonaro o mantém à distância e o trata como se fosse um mero carimbador de suas vontades, o Congresso decidiu reagir. Não quer por bem compartilhar o poder? Será obrigado por mal a fazê-lo, e aguente as consequências.

Com ou sem ideias para tanto, Bolsonaro governará, mas sob rédea curta. A reforma da Previdência será aprovada não porque ele quer, mas porque o Congresso concorda que fora dela não há salvação. O governo tem pressa para votá-la? O Congresso menos.

O governo tem pressa para aprovar o pacote de leis anticrime do ministro Sérgio Moro, da Justiça e da Segurança Pública? Nesse caso, a pressa do Congresso é nenhuma. O que sair dali no final lembrará pouco o que foi recebido.

Dora Kramer: Efeito colateral

- Revista Veja

Bolsonaro atirou na má fama, mas acertou nos brios do Congresso

Tradicional carimbador das vontades do Executivo notadamente quando o presidente da República ainda recende ao aroma das urnas, criador de dificuldades para vender facilidades quando essa força arrefece, o Congresso Nacional anda dando promissores sinais de vida autônoma em questões legislativas.

Isso pela primeira vez desde a Assembleia Constituinte eleita em 1986, a última em que se viu o Legislativo atuar em ritmo e lógica de moto próprio, com trabalho da manhã à noite, todos os dias da semana, em boa medida independente de encomendas do Palácio do Planalto.

A geração mais nova não viu nada disso, mas os que estávamos lá podemos comparar as situações e constatar com algum grau de segurança que começamos a rever a cena. Ainda de modo incipiente, é verdade. Afinal, não se acorda de uma hora para outra de três décadas de indiferença ao cidadão, de submissão ao poder central e de serviços prestados quase exclusivamente aos interesses da corporação parlamentar e cercanias.

A coisa se desenvolve com vagar, dando tempo ao tempo de os monges se desfazerem dos respectivos hábitos, embora seja necessário atenção aos gestos para não perder o processo de evolução dos movimentos.

Na segunda-feira 3, o Senado votou uma medida provisória importante que endurece a vigilância a fraudes no INSS. Pois foi numa segunda-feira, dia habitualmente visto como de folga por suas excelências. Com o voto de 67 senadores (55 a favor e 12 contra), quórum alto e além do exigido pelo regimento.

Nada fizeram além da mera obrigação? De fato, mas fazia muito que isso não era um fato. Poderia ser interpretado como algo circunstancial, uma excepcionalidade que não se repetiria caso não houvesse outras evidências da disposição do Parlamento de entrar em modo recuperação de imagem mediante mudança de procedimentos.

Ação desastrada prejudica governadores

Por Andrea Jubé, Marcelo Ribeiro, Raphael Di Cunto e Vandson Lima | Valor Econômico

BRASÍLIA - A divulgação de uma carta atribuída ao colégio de governadores manifestando "repúdio" à exclusão dos Estados e municípios da reforma da Previdência ampliou o desgaste do tema no Congresso e aumentou as chances da matéria ficar de fora do relatório final. Após a reação contrária de vários governadores, uma segunda versão foi divulgada, mas líderes partidários afirmam que dificilmente será possível reverter o desconforto político com o gesto. No início da noite, uma terceira carta foi divulgada, em nome dos governadores do Nordeste.

A primeira versão da carta dos governadores foi divulgada ontem de manhã pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), sem o aval dos demais mandatários. O texto afirmava que os governadores manifestavam "veemente repúdio à sugestão de retirada dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios" da reforma previdenciária.

Horas depois, após os protestos de vários governadores, uma segunda versão foi divulgada, afirmando que os mandatários estaduais "manifestam apoio à manutenção dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios" na proposta.

Com a divisão interna no Fórum de Governadores, os gestores do Nordeste divulgaram à noite uma terceira carta. "A retirada dos Estados da reforma e tratamentos diferenciados para outras categorias profissionais representam o abandono da questão previdenciária à própria sorte, como se o problema não fosse de todo o Brasil e de todos os brasileiros", diz a "carta do Nordeste". "Estamos dispostos a cooperar, a trabalhar pelo bem e pelo progresso do nosso país", comprometem-se.

Apesar do esforço de retificação do primeiro texto, e dos governadores do Nordeste, lideranças das maiores bancadas afirmam que os deputados não estão dispostos a arcar com o desgaste eleitoral para atender aos governadores.

"A posição dos governadores desgastou violentamente a questão dos Estados e municípios na proposta", disse o líder do PL, deputado Wellington Roberto (PB), sobre a primeira versão da carta divulgada por Ibaneis. "Sou radicalmente contra a manutenção dos Estados e municípios no texto", enfatizou.

O líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), afirmou que não apoiará nem mesmo a proposta para que os governadores possam, por lei ordinária, aprovar a reforma nos seus Estados. "Só apoio se os governadores do Piauí, Ceará, Pernambuco, Bahia e outros trouxerem os votinhos deles junto. Os deputados da base deles precisam votar a favor", cobrou.

Para Lira, não faz sentido aumentar a pressão sobre o Congresso com a manutenção dos servidores estaduais e municipais na reforma, se isso não muda em nada a economia projetada para o governo federal e ainda aumenta o risco de derrota de todo o projeto. "Com isso perdemos o apoio de 10% a 20% dos deputados que poderiam votar a favor", completou.

Deputados de São Paulo contam apoios para mudanças na previdência

Por Carolina Freitas | Valor Econômico

SÃO PAULO - A possibilidade de Estados e municípios serem excluídos da reforma da Previdência que tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, já tem efeitos na Assembleia Estadual de São Paulo. Deputados da base do governo João Doria (PSDB) conduziram uma sondagem para identificar a chance de aprovação de um eventual projeto de lei para alterar regras de aposentadoria dos servidores estaduais.

A análise mostrou que há condições de aprovar uma proposta com esse teor. Apesar de ainda não ter sido escrita uma minuta, os pontos centrais seriam a fixação de uma idade mínima de aposentadoria e a mudança das alíquotas de contribuição previdenciária dos servidores do Estado. Mesmo o PT, que oferece resistência à reforma na Câmara Federal, dá mostras em São Paulo de disposição para discutir a questão no campo estadual. O projeto exigiria apenas maioria simples para ser aprovada. Na conta das lideranças, um projeto de reforma local só não teria o apoio de PT, Psol e PCdoB, que somam 15 dos 94 parlamentares.

Formalmente, o governador paulista e deputados da base dizem só ter "plano A": a manutenção do trecho da proposta de emenda à Constituição (PEC) da Previdência que estende as mudanças no âmbito federal aos Estados e municípios. No início da semana, João Doria chamou a São Paulo os governadores tucanos para um almoço com o relator da reforma na comissão especial da Câmara, Samuel Moreira (PSDB-SP). O grupo entregou a mensagem de que quer os Estados na reforma.

O líder do governo na Assembleia paulista, Carlão Pignatari (PSDB), chama de "incoerência" a inclinação de deputados federais a deixarem os Estados de fora da reforma. "Se isso acontecer, vai ter muito Estado e município que não vai fazer a sua parte e todo o Brasil será penalizado", afirma o deputado.

Carlão diz ter "70% de certeza" de que a questão vai se resolver em Brasília. Para os 30% de dúvida, Carlão e o presidente da Alesp, Cauê Macris (PSDB), avisaram Doria que, se preciso, uma reforma estadual passa. O governador esteve ontem na Assembleia, em visita mensal à casa. Doria tem sido um dos governadores mais ativos na defesa da reforma proposta pelo presidente Jair Bolsonaro.

Idade mínima seria principal ponto de uma reforma estadual no Rio

Cristian Klein | Valor Econômico

RIO - Na avaliação de deputados da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a exclusão dos servidores do Estado da proposta de reforma da Previdência em tramitação no Congresso não representará um problema tão grande, caso ocorra, embora o ideal fosse a manutenção. "O pior nós já passamos, que foi o aumento da alíquota de contribuição de 11% para 14%", afirma o presidente da Casa, André Ceciliano (PT).

O parlamentar conta que, em 28 de fevereiro, recebeu um colega de partido, Ulysses Gomes, que é deputado da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Estado que também passa por problemas para equilibrar suas contas previdenciárias. O correligionário o procurava para saber como havia sido a experiência do Rio em fazer uma reforma que contrariava os interesses dos servidores. "Primeiro, manda cercar [a Assembleia], depois compra máscara contra gás lacrimogêneo e reforça a segurança - porque vem bomba", diz Ceciliano.

Minas vê poucas chances de aprovar regime próprio

Por Marcos de Moura e Souza | Valor Econômico

BELO HORIZONTE - Com as contas no vermelho e sem maioria na Assembleia Legislativa, o governo de Minas Gerais teria poucas chances de aprovar sua própria reforma da Previdência caso o Congresso decida aprovar uma reforma federal que não abranja os Estados.

Único governador do Novo no país, Romeu Zema vem defendendo que a reforma que saia de Brasília seja a mais ampla possível para evitar que a discussão seja levada depois aos Estados.

"O governo Zema ainda não tem uma base definida, o que temos é um bloco de apoio e blocos independentes", disse ontem ao Valor o líder do governo na Assembleia Legislativa, o deputado estadial Luiz Humberto Carneiro (PSDB).

Segundo ele, o bloco que vota com o governo é composto por 22 deputados, de um total de 77 deputados. "Com certeza será mais difícil para o Estado a aprovação de uma reforma separada", disse Carneiro.

Governadores fazem apelo para ficar na Previdência

Em duas cartas, 25 governadores apelaram ao Congresso para que os Estados sejam mantidos na reforma da Previdência. Um dos documentos foi assinado apenas por governadores nordestinos. Eles argumentam que, se ficarem de fora das novas regras, o déficit nos regimes de aposentadoria, hoje em R$ 100 bilhões, pode quadruplicar até 2060 – como mostrou o Estado

Em duas cartas, uma só com nordestinos, 25 governadores pedem para que Estados e municípios não sejam excluídos da reforma em tramitação

Mariana Haubert/ O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Duas cartas assinadas por governadores de todo o País foram divulgadas ontem com um apelo ao Congresso para que Estados e municípios sejam mantidos na reforma da Previdência. Mesmo os governadores do Nordeste, quase todos de oposição ao governo Bolsonaro, referendaram documento em que apoiam que as mudanças atinjam os governos regionais, embora defendam mudanças em itens.

A primeira missiva, divulgada pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), coordenador nacional do Fórum de Governadores, apresentou a assinatura de 25 governadores, mas mandatários do Nordeste negaram, por meio de suas assessorias, terem ratificado o documento. Horas depois, eles divulgaram outra carta assinada apenas por eles.

Na primeira versão da carta, mais ampla, foi divulgada inicialmente com o termo “veemente repúdio” à possibilidade de Estados e municípios serem excluídos da proposta, o que havia desagradado alguns governadores, como Ronaldo Caiado (DEM), de Goiás. Depois, o termo foi suprimido.

Já os governadores do Nordeste são mais duros em suas críticas. Eles mantêm a defesa da inclusão dos Estados na reforma, mas são contrários a pontos da proposta, como a desconstitucionalização das regras de aposentadoria e o sistema de capitalização (modelo pelo qual as contribuições individuais vão para uma conta, que banca os benefícios no futuro).

Ramos: governadores precisam calçar sandália da humildade

Presidente da Comissão Especial defende que eles peçam aos deputados que mantenham estados e municípios na reforma

Geralda Doca / O Globo

BRASÍLIA - O presidente da Comissão Especial da reforma da Previdência, deputado Marcelo Ramos (PL-AM ), afirmou ontem que os governadores precisam calçara sandália da humildade e pedir aos deputados que mantenham os estados na proposta que altera as regras da aposentadoria. Segundo ele, a tendência na Casa é que os governos regionais sejam mesmo excluídos das mudanças, apesar da gravidade da situação financeira de alguns.

Ramos disse que os governadores não têm força política para impor sua vontade aos deputados.

—Os governadores têm que calçara sandália da humildade e vir para cá dizer assim “olha, nós não temos coragem de fazer, nós queremos pedir aos deputados que façam por nós”. É isso que eles têm fazer humildezinhos — afirmou Ramos, após fazer um balanço dos trabalhos na comissão.

Combater fraudes no INSS tem de ser ação de Estado: Editorial / O Globo

O fato de haver mais aposentados no campo do que população já indica o tamanho do problema

Fraude é quase sinônimo de Previdência, dada a quantidade de casos de burlas para roubar o contribuinte por meio do INSS descobertos desde sempre. Ao contrário do que acham os que se opõem à reforma previdenciária, coibir estes desvios, por maiores que sejam, não resolve o problema estrutural do déficit do sistema, fadado a crescer autonomamente pelas razões demográficas conhecidas. Mas, por óbvio, é algo que o Estado precisa fazer. Não apenas em nome da moralidade, do cumprimento da lei, mas também porque não é pouco dinheiro.

Mesmo assim, não foi fácil o governo aprovar a medida provisória que instituiu um sistema antifraudes nos gastos previdenciários e assistenciais, o que só conseguiu horas antes da perda de validade da MP emitida sobre o assunto, na segunda-feira, depois de fazer concessões. Como deve ocorrer nas negociações na democracia.

Regra de ouro é pensar no País; Editorial / O Estado de S. Paulo

Será injusto culpar só o governo pela quebra da regra de ouro, se o Congresso deixar de aprovar o crédito suplementar pedido pelo Executivo. O presidente da República poderá ser acusado de crime de responsabilidade, se a norma for rompida. Nesse caso, estará sujeito a impeachment. Mas a responsabilidade será, de fato, de quem se opuser à solução urgente de um enorme problema. A questão depende, neste momento, da Comissão Mista de Orçamento. A comissão suspendeu sua atividade na quarta-feira passada e deverá reunir-se de novo na terça. As condições de apoio à pretensão do governo ainda são incertas e há fortes motivos para preocupação.

A chamada regra de ouro, inscrita na Constituição, proíbe a tomada de empréstimos para despesas correntes, como salários, benefícios sociais e a maior parte dos programas típicos da administração federal. Desta vez, o governo pediu um crédito extra de R$ 248,9 bilhões para gastos indispensáveis e inadiáveis. Precisará desse dinheiro para o Plano Safra, o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada e outros compromissos previstos no Orçamento-Geral da União. Todas essas obrigações são tecnicamente classificadas como despesas correntes.

Passo em falso: Editorial / Folha de S. Paulo

Congresso cria mais gastos obrigatórios e dificulta a gestão do Orçamento

Há um longo caminho a percorrer, sem dúvida, para que o Orçamento do governo se torne um instrumento mais efetivo de definição de políticas públicas ao alcance do escrutínio da sociedade. O Congresso, infelizmente, acaba de dar um passo em falso nesse sentido.

Deputados e senadores aprovaram mudança na Constituição que torna obrigatória a execução de despesas incluídas pelas bancadas estaduais —conhecidas como emendas coletivas— na lei orçamentária anual. Tais projetos têm sido alvo rotineiro de cortes em momentos de escassez de verbas.

À primeira vista, a iniciativa parece meritória. As emendas, em geral, destinam-se a obras e outros investimentos de interesse dos entes federativos, mais capacitados a definir suas prioridades que os burocratas de Brasília. A nova regra, em tese, assegura a liberação dos recursos e reduz os riscos de descontinuidade dos projetos.

Entretanto a alteração constitucional, aprovada em tempo exíguo, moveu-se mais por uma demonstração de autonomia do Congresso diante do governo Jair Bolsonaro (PSL) —avesso à negociação legislativa— que por um debate amadurecido acerca do mecanismo.

BCE e Fed apontam de novo para a distensão monetária: Editorial / Valor Econômico

O Banco Central Europeu consolidou sua volta rumo à política de distensão monetária, seguindo os passos do Federal Reserve Bank americano. Europa e Estados Unidos continuarão com as taxas de juro baixas de agora, com a quase certeza de reduções no futuro. Com o custo do dinheiro a zero na maior parte do continente europeu e levemente positivas nos EUA, recuos da inflação acendem de novo a luz amarela - a ameaça de que a taxa de juros caia abaixo de zero mais uma vez, condição sob a qual os bancos centrais tiveram de atuar diante a maior recessão desde a crise de 1929. Onze anos após a crise financeira, e US$ 15 trilhões de aumentos de reservas dos BCs dos países desenvolvidos do mundo, esse risco ainda ronda a economia global.

Os diagnósticos do BCE e do Fed quase não divergem nas causas, mas na ênfase, dada a diferença de condições e a posição no ciclo em que se encontram suas economias. Em ambas há sinais claros de desaceleração e de recuo da inflação, o que aperta as condições financeiras mesmo que os juros sejam historicamente baixos. Os EUA, segundo a maior parte dos analistas, estão no fim de um longo ciclo de crescimento e a direção agora é para baixo, como caracterizou esta semana o Morgan Stanley. Daí a enfrentar uma recessão no curto prazo vai uma distância sobre a qual não há unanimidade. O JP Morgan, por exemplo, vê crescerem as chances de um mergulho recessivo a partir do segundo semestre do ano.

Cecilia Meireles: Canção

No desequilíbrio dos mares,
as proas giram sozinhas…
Numa das naves que afundaram
é que certamente tu vinhas.

Eu te esperei todos os séculos
sem desespero e sem desgosto,
e morri de infinitas mortes
guardando sempre o mesmo rosto

Quando as ondas te carregaram
meu olhos, entre águas e areias,
cegaram como os das estátuas,
a tudo quanto existe alheias.

Minhas mãos pararam sobre o ar
e endureceram junto ao vento,
e perderam a cor que tinham
e a lembrança do movimento.

E o sorriso que eu te levava
desprendeu-se e caiu de mim:
e só talvez ele ainda viva
dentro destas águas sem fim.