quinta-feira, 31 de março de 2022

Lauro Jardim: Doria anuncia hoje que vai abandonar sua candidatura a presidente

João Doria decidiu abandonar a sua pré-candidatura à presidência da República pelo PSDB e vai continuar no governo de São Paulo até o dia 31 de dezembro.

Pelo menos foi essa a decisão comunicada hoje cedo aos seus auxiliares mais próximos e será anunciada pelo próprio Doria numa entrevista coletiva que dará no Palácio dos Bandeirantes, às 16h. 

A saída de Doria do páreo é uma consequência da falta de apoio que sua pré-candidatura vinha sofrendo desde o início do ano dentro do PSDB. Os resultados das pesquisas de intenção de votos também não ajudavam em nada: nelas, Doria aparecia com 2%, em média.

Todo esse contexto ajudou a que sua candidatura não saisse do ponto morto.

Nas últimas semanas, o movimento anti-Doria no PSDB ficou mais forte. Essa turma se alinhou a Eduardo Leite, derrotado nas prévias de novembro, para virar a mesa e fazer do governador gaúcho o candidato do partido a presidência.

Doria sentiu o golpe. Nos últimos dias, ele tem afirmado que está sendo traído pelo partido.

Merval Pereira: ‘Amémsalão’

O Globo

Tudo está conectado. Não é por acaso que, no mesmo dia em que o deputado federal bolsonarista Daniel Silveira resiste a uma ordem judicial para colocar tornozeleira eletrônica, o presidente Bolsonaro tenha voltado, do nada, a criticar a urna eletrônica. Ambas as situações têm como alvo um único ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que presidirá o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições e determinou novas punições ao parlamentar.

Os ataques a outro ministro, Luís Roberto Barroso, reduziram-se na medida em que ele deixou a presidência do TSE. Pesquisadores que monitoram as redes sociais bolsonaristas constataram uma evidência inescapável: os verdadeiros adversários de Bolsonaro são as instituições STF, TSE e seus ministros, e não Lula ou Moro. Eles são mais buscados e citados nas redes sociais ligadas ao bolsonarismo que os adversários políticos.

Malu Gaspar: A Petrobras, o povo e a mentira

O Globo

Toda vez que algo arranha a imagem de um governante, um partido ou um político, a primeira explicação é que o problema está na comunicação. Não falha, basta o sujeito se ver em maus lençóis. De diferentes maneiras, é assim que os dois principais candidatos à Presidência da República, Lula e Jair Bolsonaro, têm justificado suas contradições a respeito da questão mais importante para o jogo eleitoral no momento: a Petrobras e a alta dos combustíveis. 

Foi assim que Bolsonaro explicou, nas conversas secretas com o economista Adriano Pires, por que precisava trocar o presidente da Petrobras. Segundo ele, era preciso alguém que soubesse se comunicar com a sociedade e com a imprensa. Não é que ele quisesse interferir no preço dos combustíveis, o problema é que a Petrobras “comunica mal”.

E Pires, embora não tenha nenhuma experiência como executivo, nem sequer como conselheiro de empresas, sempre esteve disponível aos jornalistas, dando entrevistas em linguagem acessível sobre petróleo, gás e energia. Ou seja: na visão do presidente, comunica bem.

É curioso que o presidente da República fale em “comunicar mal”. Foi ele mesmo quem reclamou que a Petrobras não tinha “qualquer sensibilidade com a população”. Contou, ainda, que o Congresso havia feito um pedido à Petrobras para atrasar em um dia o anúncio do reajuste do diesel.

Míriam Leitão: Uma nota mentirosa e assinada também pelos três comandantes de tropas

O Globo

nota comemorando a ditadura militar de 64, divulgada ontem à noite pelo Ministério da Defesa, é a pior já divulgada neste governo. Ser assinada pelo general de pijama Walter Braga Netto, que está saindo do cargo para ser candidato a vice na chapa de Jair Bolsonaro, era de se esperar. Mas o grave é ter as assinaturas do general, do almirante e do brigadeiro que comandam as tropas. Nesse ponto é uma ameaça ao país. Não se pode esquecer o contexto. Bolsonaro é um defensor de ditaduras, sente “embrulho no estômago” como disse outro dia, de respeitar a Constituição, e passou três anos e três meses no poder vomitando ameaças golpistas. Bolsonaro está disputando a reeleição, em situação desfavorável nas pesquisas, e ontem mesmo voltou a fazer ameaças. Esse contexto piora muito a nota.

Luiz Carlos Azedo: Atitude de Silveira foi uma provocação ao Supremo

Correio Braziliense

O deputado sinalizou uma linha de recrudescimento dos ataques e desafios ao STF por parte dos grupos bolsonaristas radicais. Aposta num ambiente de confrontação entre os Poderes

Ao se recusar a usar tornozeleira eletrônica, desafiando o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e buscar refúgio nas dependências da Câmara, exigindo solidariedade do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o deputado Daniel Silveira (União Brasil-RJ) escalou uma provocação política, cujo objetivo era criar um ambiente de radicalização contra a Corte, com propósitos eleitorais e um viés golpista. Silveira somente recuou diante da multa de R$ 15 mil para cada dia sem tornozeleira, que lhe foi aplicada por Moraes em consequência da rebeldia.

Pressionado, Lira fora condescendente com Silveira: distribuiu nota na qual afirmava que o plenário da Câmara é inviolável e defendeu que o plenário do Supremo analise o pedido de revogação da decisão de Moraes feito pela defesa de Silveira. Réu no STF por estimular atos antidemocráticos e ameaçar as instituições, o parlamentar fluminense passou a madrugada de terça para quarta-feira em seu gabinete, depois de anunciar que não colocaria a tornozeleira; diante da decisão de Moraes e da nota do presidente da Câmara, se refugiou no plenário. O julgamento da ação penal contra Silveira está marcado para 20 de abril.

Aliado dos bolsonaristas da Câmara, que tiveram um papel importante na sua eleição, Lira assumiu uma posição ambígua em relação a Silveira: “Decisões judiciais devem ser cumpridas, assim como a inviolabilidade da Casa do Povo deve ser preservada. Sagrada durante as sessões, ela tem, também, dimensão simbólica na ordem democrática”, argumentou. Moraes atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que solicitou a aplicação de medidas restritivas ao deputado.

Cristiano Romero: PT-PSDB: no meio do caminho tinha um Dirceu

Valor Econômico

Em 2004, transição deu a Lula e FHC prêmio nos EUA

No início do segundo ano do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Presidência da República, estourou o primeiro caso ruidoso de corrupção do governo petista. O escândalo envolvia assessor direto do então poderoso ministro José Dirceu.

Ainda que se soubesse da ocorrência de malfeitorias em gestões do partido em prefeituras, o episódio surpreendeu petistas, simpatizantes e oposicionistas. A ética, como ocorre com frequência em eleições no Brasil, foi a principal bandeira das campanhas do PT nos pleitos de 1989 a 2002.

O desgaste foi debitado inteiramente na conta de Zé Dirceu, que, além de exercer o papel tradicional do chefe da Casa Civil (coordenação de todos os ministérios, análise prévia dos principais atos de governo, formatação de projetos de lei, medidas -provisórias etc.), era o responsável pela articulação política. Por essa razão, o ministro era o principal alvo da oposição para enfraquecer Lula.

Até então (fevereiro de 2004), o petista vinha governando com amplo no Congresso Nacional - no ano anterior, a emenda constitucional que instituiu a contribuição previdenciária de funcionários públicos aposentados e estabeleceu que, a partir da regulamentação daquela emenda, os novos servidores teriam que se aposentar pelo INSS, como os trabalhadores do setor privado (a regulamentação só foi feita na gestão Dilma Rousseff).

Maria Cristina Fernandes: Carteira de clientes

Valor Econômico

Pires deve informar empresas para as quais prestou serviço

Corria o governo Michel Temer e a gestão Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados quando um currículo chegou à Diretoria de Governança e Conformidade da Petrobras. Vinha diretamente do Palácio do Planalto. Era de um advogado, cuja carteira de clientes percorria a linha sucessória da Presidência da República de cima a baixo.

Derrotada a turma do deixa-disso, a Petrobras resolveu encarar. Um emissário bateu à porta da subsecretaria de Assuntos Jurídicos da Presidência para tratar do assunto. No primeiro “veja bem” o burocrata deu pra trás. O presidente, disse, já tinha desistido de indicá-lo.

Se os procedimentos de governança, como o general Joaquim Silva e Luna garantiu em palestra do Superior Tribunal Militar, estiverem mantidos, Adriano Pires terá que passar pelo mesmo escrutínio.

Para se descobrir as causas defendidas por um advogado, porém, há meios relativamente transparentes, como a busca eletrônica nos tribunais. Para fazer o mesmo com um consultor como Pires é preciso que ele forneça as informações.

João Doria*: Obrigado, São Paulo

Folha de S. Paulo

Bons gestores também devem ter a capacidade de agir diante do improvável

Atendo nesta quinta-feira (31) à convocação do meu partido, consagrada pelo voto de todos os filiados, para que o PSDB lidere um projeto de paz social e desenvolvimento sustentável capaz de oferecer emprego e oportunidades a todos os brasileiros. Cumpro o preceito legal, que determina a desincompatibilização do governo de São Paulo, para iniciar nossa caminhada rumo à Presidência da República.

Nesses 39 meses de gestão enfrentamos os mais complexos, raros e agudos desafios da vida pública. O compromisso democrático das instituições, a necessidade de fazer o que é certo —e não o mais fácil—, a colaboração num mundo global e a resiliência do nosso povo foram testados como poucas vezes na história.

Bruno Boghossian: Inflação à flor da pele

Folha de S. Paulo

Eleitor reage com rapidez a inflação e lança responsabilidade sobre o presidente

Os candidatos a presidente encontrarão na campanha um eleitor sensível aos sobressaltos da economia. Depois de terem flertado com um certo otimismo no fim do ano passado, os brasileiros voltaram a enxergar tempos difíceis com o novo choque da inflação.

Em dezembro, o Datafolha havia registrado uma melhora das expectativas econômicas da população. Naquela época, o índice de entrevistados que diziam esperar uma subida de preços passou de 69% para 46%. Os primeiros meses de 2022, com a disparada dos combustíveis e a resistência da inflação dos alimentos, viram uma reversão desse alívio.

Ruy Castro: Dicionário Brasileiro da Corrupção

Folha de S. Paulo

Um livro a ser feito com urgência -fica a sugestão

Uma ideia jogada ao acaso nesta coluna na quinta última (24) foi recebida com entusiasmo por alguns leitores: a de um Dicionário Brasileiro da Corrupção. Nunca foi feito, e não por falta de material. Mesmo ignorando a Colônia e o Império, que tinham costumes próprios, o que se poderá levantar de sujeira a partir da República, em 1889, encherá volumes. Afinal, é uma das grandes especialidades do Brasil: o uso da República para práticas não republicanas, como roubar, desviar, desfalcar, falsificar, sonegar, subornar, aliciar, perverter —em suma, corromper.

Uns mais, outros menos, todos os governos desde Deodoro caíram na farra, com destaque para os autoritários e para os que se elegeram como vestais. Os primeiros, pelo motivo óbvio: quanto mais ditadura, mais censura e menos controle pelas leis, pela sociedade e pela imprensa, donde mais corrupção. O famoso mar de lama em que o governo constitucional de Getulio Vargas se afundou em 1954 não passou de um filete diante do que se roubou de 1964 a 1985 sob os militares —que, não por acaso, tomaram o poder para, entre outras, "combater a corrupção".

Maria Hermínia Tavares: Extrema direita põe democracia na mira

Folha de S. Paulo

Minoria radical se prepara para as eleições como se fossem uma guerra de extermínio do adversário

No porão das redes sociais por onde escoa o lodo da extrema direita, circulam duas mensagens similares. Na primeira, a imagem estilizada de um Lula barbudo com a arma apontada para um corpo sem rosto ocupa a mosca de um alvo crivado de balas. Na outra, em vídeo, um homem anuncia que é "dia de brincadeira de Magnum 357" e aperta o gatilho enquanto exclama: "Olha lá um petista passando".

Na edição de 11/3, a revista Crusoé, insuspeita de simpatias esquerdistas, informa que clubes de tiro frequentados por apoiadores de Jair Bolsonaro são estimulados a usar imagens do candidato do PT em seus estandes de tiro. Impossível dizer se isso é a regra ou exceção. É certo, porém, que, sob o incentivo declarado do governo, os indicadores de afeição pelas armas e a facilidade de comprá-las dispararam feito metralhadoras.

William Waack: ‘Profil durch kontrast’

O Estado de S. Paulo

A expressão alemã, que vale políticos e carros, diz que é preciso um contraste para se ganhar um perfil

Ao fim da era petista, Lula era o líder popular que desperdiçou uma chance histórica (o ciclo das commodities), presidiu o maior esquema de corrupção da história brasileira e apontou uma sucessora inepta que levou o Brasil à maior recessão enfrentada por um país que não estava em guerra. Hoje, recuperou de maneira formidável a imagem e é tido por ex-adversários como salvador da democracia.

Esse perfil vem pelo contraste com o seu principal adversário, Jair Bolsonaro. Lula nunca foi um radical e continua não sendo. Nunca foi um político de grandes ideias, seu “movimento” político é ele mesmo e mais ninguém. O lulismo (como o varguismo, o peronismo) é a figura de quem lhe empresta o nome, e não deixa sucessores. Sua “genial” jogada política de conquistar um ex-adversário para ter “o centro” a bordo é apenas o óbvio de quem sabe que, sozinho, não ganha.

A “fortuna” de Lula, no sentido que Maquiavel deu à expressão, é Bolsonaro. O atual presidente desperdiçou uma rara onda disruptiva, em boa parte nascida do antipetismo, que expressava um profundo desejo de mudança. Sem saber fazer política, além de vociferar boçalidades para seguidores nos cercadinhos físicos (porta do palácio) e mentais, ressaltou o patrimonialismo, cedeu instrumentos de poder do Executivo para o Legislativo e deixa o País governado por aqueles que estavam envolvidos com Lula nos piores momentos da “política”.

Adriana Fernandes: Mercadante & Arida

O Estado de S. Paulo

Interesse acontece porque Pérsio Arida foi coordenador do programa econômico de Geraldo Alckmin

É muito mais simbólica do que uma realidade efetiva a aproximação do economista Pérsio Arida com o petista Aloizio Mercadante.

Os dois se reuniram por mais de uma hora e meia, na semana passada, e o vazamento do encontro, que ocorreu na Fundação Perseu Abramo (reduto do pensamento econômico do PT), agitou o mundo político e empresarial.

O interesse geral em torno dessa liga acontece porque Pérsio Arida foi coordenador do programa econômico de Geraldo Alckmin nas eleições de 2018, e o ex-governador de São Paulo se mudou para o PSB para ser vice na chapa de Lula, ainda não oficializada.

Com a aliança política, é natural imaginar que Alckmin venha a ter influência nas costuras em torno de um acordo programático em temas econômicos.

Celso Ming: Troca de Luna por Pires

O Estado de S. Paulo

Ficou a impressão de que a substituição intempestiva do presidente da Petrobras não passou de uma operação popularmente conhecida como troca de seis por meia dúzia.

Adriano Pires, o nome indicado à presidência, que deve tomar posse dia 13, não pensa substancialmente diferente do presidente demitido, o general Joaquim Silva e Luna.

Ambos entendem que a interferência do governo nos preços dos derivados de petróleo produz mais distorções do que a manutenção do critério atual, o da Paridade Internacional de Preços, que é determinado pelas cotações em dólares vigentes no mercado internacional convertidas em reais pelo câmbio do dia.

Nem mesmo se pode dizer que Pires diverge de Silva e Luna quando recomenda que a Petrobras evite transferir a volatilidade dos preços ao mercado de consumo. O último reajuste no preço dos combustíveis determinado na gestão de Joaquim Silva e Luna, em 10 de março, guardou o espaçamento de 57 dias em relação ao reajuste anterior.

Tudo se passa como se o presidente Jair Bolsonaro pretendesse apenas produzir efeito especial para impressionar a plateia. Foi o que fez também em fevereiro de 2021 quando demitiu o presidente anterior, Roberto Castello Branco, supostamente porque não via nele acolhimento às reivindicações dos caminhoneiros.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Alta rotatividade no MEC prejudica políticas públicas

O Globo

Não se discute a demissão de Milton Ribeiro diante das graves denúncias de que verbas públicas eram negociadas de forma nada republicana dentro do MEC, por pastores estranhos ao quadro da pasta. Isolado, Ribeiro não tinha mais o apoio nem da bancada evangélica. Não havia como permanecer no comando de um dos ministérios mais sensíveis da administração. Após três anos e três meses de governo Bolsonaro, o MEC já vai para o quinto ministro.

Como mostrou reportagem do GLOBO, desde a redemocratização, Jair Bolsonaro foi o presidente que, proporcionalmente, mais fez trocas no comando da Educação — uma a cada 296 dias. O que mexeu menos foi Fernando Henrique Cardoso — durante oito anos, teve apenas um ministro da Educação, Paulo Renato Souza. Certamente não é por acaso que o ensino passou por avanços inegáveis. Dilma Rousseff também fez muitas mudanças, porém num período maior: seis ministros entre janeiro de 2011 e maio de 2016.

quarta-feira, 30 de março de 2022

Vera Magalhães: Os liberais e o flerte fatal com Bolsonaro

O Globo

A esta altura do campeonato, depois de duas intervenções na Petrobras, do casamento em comunhão de bens com o Centrão e do lançamento da versão turbo do Bolsa Família como única forma de retomar a popularidade, os que se iludiram com a versão “liberal” de Jair Bolsonaro vendida em 2018 deveriam estar se perguntando como caíram em tamanha cascata.

Já era difícil engolir a fraude para quem minimamente acompanhou a carreira parlamentar de Bolsonaro e dos filhos, mas muitos se valeram da presença de Paulo Guedes como um Cavalo de Troia na campanha, depois no governo, para validar a crença no impossível.

Pois bem, agora que não é mais possível acreditar nessa história da carochinha, qual seria a justificativa de setores do mercado para um apoio à reeleição do presidente?

Em entrevista na última segunda-feira ao “Roda viva”, o primeiro dos presidentes da Petrobras defenestrados por Bolsonaro, Roberto Castello Branco, fez um mea-culpa por ter embarcado nessa ilusão liberal. Disse ter acreditado que, por ser “pouco dotado de conhecimento”, o presidente deixaria Guedes conduzir a economia conforme vendeu na campanha.

Bernardo Mello Franco: Bolsonaro avisou

O Globo

Jair Bolsonaro declarou que botaria a “cara no fogo” pelo ministro da Educação. Quatro dias depois, decidiu rifá-lo do governo. O pastor Milton Ribeiro não caiu por defeitos novos. Sua demissão é uma tentativa de aliviar as queimaduras na imagem presidencial.

As denúncias no MEC chamuscaram um dos pilares do discurso bolsonarista: a mentira de que o governo é imune à corrupção. O escândalo começou com suspeitas de tráfico de influência. Em poucos dias, descobriu-se a existência de um balcão de negócios na pasta.

Dois pastores ligados ao ministro foram acusados de cobrar propina para agilizar a liberação de recursos. Um prefeito contou que o pedágio podia ser pago com um quilo de ouro (cerca de R$ 300 mil na cotação atual).

A revelação das negociatas deu início a um festival de hipocrisia. A bancada evangélica, que indicou o ministro, passou a exigir sua cabeça. O pastor Silas Malafaia, que orava de mãos dadas com Eduardo Cunha, fez discurso indignado contra a corrupção.

Elio Gaspari: Sete ministros de Bolsonaro

O Globo / Folha de S. Paulo

Em três anos de governo, Jair Bolsonaro empossou sete ministros na Educação e na Saúde. Esse desfile seguiu um padrão. Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, na Saúde, respeitaram os critérios de competência profissional e acabaram fritos. Os demais atolaram na inépcia e no destrambelho: Eduardo Pazuello e Marcelo Queiroga, na Saúde; Ricardo Vélez, Abraham Weintraub e Milton Ribeiro, na Educação.

Ribeiro revelou-se um campeão. De um lado, ganha um fim de semana num garimpo ilegal quem for capaz de apontar uma só iniciativa competente que ele tenha patrocinado no MEC. Não mexeu em malfeitorias passadas e meteu-se com pastores das sombras que pediam capilés para tramitar processos junto ao benevolente Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O ministério que já foi ocupado por Gustavo Capanema, Darcy Ribeiro e Ney Braga acabou nas mãos de um pastor que patrocinava colegas que enfiavam fotografias suas em exemplares da Bíblia. Coisa de deslumbrado.

Existem traficâncias federais, estaduais e municipais, Ribeiro meteu-se em malfeitorias municipais. Os dois pastores que o orientavam levavam prefeitos ao ministério, acompanhavam processos para a construção de escolas ou creches e mordiam os alcaides. Num caso, com pedido de um quilo de ouro, segundo a vítima.

Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro pauta privatização da Petrobras nas eleições

Correio Braziliense

A demissão de Luna não agradou aos militares, mas a escolha de Pires foi muito bem recebida pelo no mercado, quando nada porque defende a privatização da empresa

O principal ícone do nosso nacional-desenvolvimentismo é a Petrobras. Nasceu a partir de uma grande mobilização popular, na qual o debate sobre a industrialização do país, que já ocorria desde a Primeira República, passou a ter centralidade na intervenção do Estado na economia. O Congresso formado em 1945, após a redemocratização, na nova Constituição, admitiu a participação de capitais privados estrangeiros, desde que integrados em empresas constituídas no Brasil. Dois anos depois, quando o presidente Eurico Dutra tentou aprovar o novo Estatuto do Petróleo, deu-se a confusão.

O projeto de Dutra concluía que o Brasil não tinha condições de nacionalizar a produção de petróleo, por falta de jazidas, recursos e gente qualificada. A reação foi generalizada, a começar pelo Clube Militar, que liderou a criação do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo. Com o slogan “O petróleo é nosso”, a partir de 1948, a Campanha do Petróleo ganhou corações e mentes, com a tese de que era necessário o monopólio estatal em todas as fases da exploração.

Fernando Exman: Disputa por poder dita triste destino do MEC

Valor Econômico

Bolsonaro apresenta resultados pífios na área da educação

A escolha do novo titular do Ministério da Educação tornou-se termômetro da correlação das forças políticas que integram o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Pressionado e com mais um escândalo de corrupção para explicar, ele tem agora que escolher entre prestigiar - ou contrariar - a bancada evangélica, o Centrão ou integrantes da ala militar. Há soluções que podem até conciliar os interesses desses grupos temporariamente, mas é uma equação difícil de ser resolvida. Um quadro técnico pode desagradar a todos.

O Ministério da Educação é objeto de disputas desde o período da transição, no fim de 2018. À época, militares e acadêmicos que formulavam o planejamento estratégico da área foram pegos de surpresa quando viram pela primeira vez um professor pouco conhecido entrando na sede do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), edifício utilizado como base para as reuniões entre a equipe que deixava o poder e o grupo que vencera as eleições.

Daniel Rittner: Arrá, urrú, o Congresso é nosso!

Valor Econômico

Antes refém do Planalto, Legislativo agora impõe a pauta

Há uma mudança significativa em andamento nas relações entre o Executivo e o Legislativo. Ela já tem sido percebida pelos principais atores políticos do país, mas não devidamente assimilada pelo setor produtivo e pela sociedade civil organizada.

Evidência da mudança: a Câmara dos Deputados e o Senado, antes reféns do que queria o Palácio do Planalto, têm ditado cada vez mais a pauta legislativa. Há dez anos, dois terços dos projetos de lei aprovados no Congresso eram de autoria do governo. No ano passado, foi o inverso: dois terços das propostas que concluíram sua tramitação tiveram origem no próprio Parlamento. Nesse intervalo, desabou o índice de aprovação de medidas provisórias. Elas passaram a caducar (perder validade) com mais frequência.

Roberto DaMatta: Eleições são tempos liminares

O Globo / O Estado de S. Paulo

Períodos de passagem são problemáticos e exigem reflexão. São situações de liminaridade quando saímos de um lugar para outro. Passagens físicas em geral se atrelam a transições morais quando há mudança de posição social.

O cenário mais banal destas passagens é se imaginar ganhando uma Mega-Sena e pensar como a fortuna seria dividida para, finalmente, nos tirar do aperto, ao lado das pessoas que amamos. Na ilusão de nos “livrarmos” de um mundo repleto de carências.

Toda passagem, até entrar e sair de uma condução, oferece seus riscos. Algumas, como passar de estudante a doutor ou entrar ou ser rebaixado num emprego, acarretam choques e preocupações que, em toda sociedade humana, são ritualizados ou dramatizados. No nosso mundo moderno, usamos contratos quase sempre indignos, que implicam brutais perdas salariais. No caso extremo dos condenados à morte, há o direito a uma caprichada “última ceia”.

Vinicius Torres Freire: Campanha eleitoral já ameaça 2023

Folha de S. Paulo

Campanha eleitoral deve causar problemas para quem assumir o governo no ano que vem

A campanha eleitoral, fantasias econômicas ou demagogias descaradas podem causar problemas sinistros para quem vai governar a partir de 2023. Alguém pode acreditar que, a partir do ano que vem, vai voltar a correr leite e mel de cofres sem fundo do governo ou que a "força de vontade política" vá resolver as penúrias e falta de investimento que ajudam a encalacrar o país desde 2014, pelo menos. Acho que não.

A campanha mal começou e já há planos de aumentos de servidores, ideias ruinosas para a Petrobras e reduções malucas de impostos, um jogral cantado pelo governo e por candidatos a presidente que detestam o governo.

Considere-se o caso da Petrobras. Suponha-se que as ideias de tabelar seus preços e obrigar a empresa a construir novas refinarias à matroca não sejam em si um problema para a companhia (sim, estamos no reino da fantasia). Bem administrada, a Petrobras é uma vaca leiteira, rende muito dinheiro para o governo, assim como o negócio do petróleo inteiro. Se a empresa parar de render, de dar lucro (isso se não der prejuízo), o governo perde dezenas de bilhões de receita. Apenas os dividendos de 2021 vão render R$ 37,3 bilhões para o governo.

Silvia Matos*: Alinhando os incentivos da economia

Folha de S. Paulo

Apenas através do crescimento da produtividade conseguiremos chegar lá

Nós, economistas, estudamos como as pessoas reagem a incentivos. E aqui não há um julgamento moral. A pergunta que sempre nos fazemos é se os incentivos estão alinhados com os objetivos almejados, como desenvolvimento econômico e social.

O empresário deseja maximizar o lucro. Se os incentivos estão certos, a busca pelo lucro também deve aumentar o investimento, o emprego e a renda. O empresário deve adotar novas tecnologias, contratar uma mão de obra com mais qualidade, aprimorar o processo produtivo e, com isso, haverá ganhos de produtividade ao nível da firma. Se todas as empresas seguem o mesmo caminho, haverá um aumento de produtividade do país, com trabalhadores mais produtivos e com melhores salários.

Bruno Boghossian: Excesso de obediência

Folha de S. Paulo

Ministro forma quinteto fiel com Weintraub, Salles, Ernesto e Pazuello

Milton Ribeiro caiu por excesso de obediência. Em seus últimos dias no cargo, ele contou que seguia uma orientação de Jair Bolsonaro quando abriu o MEC para os dois pastores que passaram a tocar negociatas na pasta. O ministro também foi gravado dizendo que a preferência dada à dupla de lobistas era um "pedido especial" do presidente.

Não havia falta de sintonia entre chefe e subordinado. Eles andavam de mãos dadas no projeto de aparelhamento do Ministério da Educação e continuaram abraçados quando a crise dos pastores estourou. Bolsonaro chegou a afirmar que botaria "a cara toda no fogo" por Ribeiro, até que precisou queimar o ministro para tentar salvar a própria pele.

Hélio Schwartsman: A ética no entorno

Folha de S. Paulo

Ele não fez nada que não seja costumeiro no entorno da primeira-dama

Michelle Bolsonaro, a mulher do presidente da República, disse que o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro é honesto. Para a primeira-dama, o ex-chefe do MEC ainda vai provar que é uma pessoa "honesta, justa, fiel e leal." Como formamos nossos juízos éticos?

Nós basicamente olhamos para os lados e vemos o que as pessoas a nosso redor costumam fazer. Não é uma coincidência que os vocábulos portugueses "ética" e "moral" derivem respectivamente das palavras grega ("éthes") e latina ("mores") para "costumes". Consideramos aceitáveis comportamentos que percebemos como praticados pela maioria de nossos pares. É isso o que faz com que a moral varie tanto geográfica e temporalmente. E não surpreende que seja assim, dado que a moralidade é a solução encontrada pela evolução natural para conciliar os impulsos egoístas dos indivíduos com a necessidade de reduzir conflitos dentro do grupo —o dilema de sermos ao mesmo tempo rivais e aliados.

Maríliz Pereira Jorge: A facada como cabo eleitoral

Folha de S. Paulo

Bolsonaro não deixará que ela seja apenas uma lembrança distante do último pleito

A facada de 2018 estará presente na eleição de 2022. Jair Bolsonaro não deixará que ela seja apenas uma lembrança distante, ainda que sombria, do último pleito. A superação faz parte da imagem que ele cultiva do homem que se sacrifica pelo povo e combate a "volta do comunismo" com a própria vida.

Nem 24 horas depois de mais um evento com cara, cores e discurso de lançamento de campanha, só permitida a partir do dia 16 de agosto pela legislação eleitoral, o presidente foi internado devido a "dificuldade de esvaziamento gástrico". Passou a noite no hospital, onde ganhou dieta líquida, recebeu alta na manhã seguinte e embarcou para o Mato Grosso.

Com trocas partidárias, Bolsonaro reforça base de apoio em campanha


Legenda do presidente, PL dobra seus deputados

Lauriberto Pompeu / O Estado de S. Paulo

A três dias do prazo final para trocas partidárias, legendas que apoiam o presidente Jair Bolsonaro ganham adesões, reforçando a base da campanha pela reeleição. O PL, partido do presidente, é a sigla que mais cresceu com a permissão para mudanças. Integrante do Centrão, a agremiação política elegeu 33 deputados em 2018 e hoje, após a chegada de bolsonaristas, está com 66 parlamentares. Outras legendas governistas também encorparam.com isso, a campanha do presidente larga com 171 deputados na disputa.

A três dias do fim do prazo que autoriza as trocas partidárias, legendas que estão alinhadas com o governo de Jair Bolsonaro ganharam adesões, reforçando a base de apoio para a campanha do presidente à reeleição. O PL, partido de Bolsonaro, é a sigla que mais cresce com a chamada janela partidária na Câmara. Integrante do Centrão, a agremiação elegeu 33 deputados em 2018. Após a chegada de bolsonaristas, sua bancada dobrou: somava 66 deputados até ontem. A representação de outras legendas da base governista também cresceu.

Como a legislação eleitoral obriga que candidatos ao Parlamento vinculem sua imagem durante a campanha ao presidenciável que seu partido apoia, Bolsonaro terá uma base de ao menos 171 deputados na disputa. O cenário de aparente recuperação do presidente, indicado nas pesquisas, reforçou a impressão no meio político de que estar aliado ao governo pode ser uma garantida de voto. A avaliação é de que um contingente grande de parlamentares que também deverão disputar a reeleição vai ampliar o leque de cabos eleitorais pedindo voto para Bolsonaro.

Sergio Fausto*: Lição de democracia no Uruguai

O Estado de S. Paulo

Referendo de domingo foi o ponto culminante de um longo e civilizado processo que revitaliza as instituições políticas deste pequeno grande país

O drama da guerra na Ucrânia fez passar despercebido um evento político cheio de significado, bem perto de nós. No domingo, 27 de março, realizou-se no Uruguai um referendo popular sobre um amplíssimo conjunto de matérias, da educação pública ao direito penal, passando pela presença do Estado na economia. À primeira vista, poderia parecer um surto plebiscitário. Nada disso. Foi o ponto culminante de um longo e civilizado processo que revitaliza as instituições políticas deste pequeno grande país.

Menos que seu resultado, sobre o qual falarei mais adiante, interessa o processo que levou ao referendo, em reação a uma iniciativa do recém-empossado governo do presidente Luiz Alberto Lacalle Pou, de centro-direita. Em abril de 2020, o novo presidente recorreu à previsão constitucional que autoriza, dentro de certos limites, o Executivo a declarar “de urgente consideração” projetos de lei que considera decisivos. Até então, o mecanismo havia sido utilizado com extrema parcimônia (só 13 vezes, desde o retorno do país à democracia, em 1985) e nunca antes com tamanha abrangência.

Contendo nada menos do que 435 mudanças legislativas, criando, modificando ou revogando normas preexistentes, o projeto avançou dentro das regras constitucionais que preveem, nesses casos, tramitação mais acelerada (decisão final no prazo máximo de 100 dias, prevalecendo as mudanças propostas pelo Executivo em caso de não decisão). Com maioria parlamentar, o governo conseguiu transformá-lo em lei em julho de 2020. Mas o Congresso não deixou de modificar o projeto original (caiu, por exemplo, o fim do monopólio da empresa estatal de petróleo). A história não terminou aí.

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*: O Ministério da Educação precisa de autonomia, como a do Banco Central

A população escolar brasileira abrigada no Ministério da Educação está estimada em, aproximadamente, 55 milhões de cidadãos, 180 mil escolas públicas e privadas, 32 mil cursos ministrados por 2.364 instituições de ensino superior, e dispõe, para 2022, só no Orçamento da União, de recursos   da ordem de R$140 bilhões.  São números maiores do que os orçamentos globais de muitos países. É um sistema grandioso e complexo.  

Mas, o que assusta mesmo é pensar que esse patrimônio imaterial é entregue eventualmente a políticos ou a pessoas totalmente desconectadas. De uma maneira geral, o Ministério da Educação é tratado como mais um dos 23 ministérios gestores das políticas públicas e, como tal, cheio de cargos negociáveis com os partidos e até amigos, pessoas quase sempre pouco qualificadas para entendê-lo e administrá-lo.    

Vai para o limbo mais um ministro da Educação. É o quarto neste governo. A agenda política da semana que passou foi insuflada pelas denúncias de corrupção que pesam sobre o pastor que se tornou ministro da Educação, e que vai ter de prestar contas ao Senado esta semana. Não sei se Milton Ribeiro entrou numa fria, ao aceitar o cargo, ou se é a educação no País que parece punida pelas circunstâncias históricas, e que incluem até um presidente da República que se orgulha de nunca ter lido um livro. 

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Novo presidente da Petrobras terá de conter Bolsonaro

O Globo

Não é difícil entender a intenção do presidente Jair Bolsonaro com a troca no comando da Petrobras. Seu objetivo sempre foi usá-la como arma política. Para interferir nas decisões da empresa, demitiu o primeiro presidente em seu governo, o economista Roberto Castello Branco, e, agora, decidiu demitir seu substituto, o general Joaquim Silva e Luna. Para o lugar dele será indicado o consultor Adriano Pires, uma referência no mercado de energia. Faltando menos de sete meses para o primeiro turno das eleições, com a guerra levando o preço do petróleo às alturas, a pressão do Planalto para reduzir o preço da gasolina, do diesel e do gás não diminuirá. Pires, se confirmado no cargo, terá o desafio de atender ao novo chefe sem manchar sua biografia. Não será tarefa fácil.

Ele foi um dos principais críticos da experiência desastrosa do governo Dilma, quando os preços foram mantidos em patamares baixos de forma artificial, e a empresa acabou na lona, com a maior dívida do mundo. No governo Temer, a petroleira adotou como política seguir a flutuação do petróleo no mercado internacional e, aos poucos, resgatou sua saúde financeira. Pressões políticas para intervir no preço sempre houve, mas Bolsonaro é um caso à parte. Em entrevista ao programa “Roda viva”, Castello Branco contou que recebia até mensagens do presidente sobre o assunto — um despropósito.

Poesia | Ascenso Ferreira: Minha Escola

A escola que eu frequentava era cheia de grades como as prisões.
E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário;
Complicado como as Matemáticas;
Inacessível como Os Lusíadas de Camões!

À sua porta eu estava sempre hesitante...
De um lado a vida... — A minha adorável vida de criança:
Pinhões... Papagaios... Carreiras ao sol...
Voos de trapézio à sombra da mangueira!
Saltos da ingazeira pra dentro do rio...
Jogos de castanhas...
— O meu engenho de barro de fazer mel!

Do outro lado, aquela tortura:
"As armas e os barões assinalados!"
— Quantas orações?
— Qual é o maior rio da China?
— A 2 + 2 A B = quanto?
— Que é curvilíneo, convexo?
— Menino, venha dar sua lição de retórica!
— "Eu começo, atenienses, invocando
a proteção dos deuses do Olimpo
para os destinos da Grécia!"
— Muito bem! Isto é do grande Demóstenes!
— Agora, a de francês:
— "Quand le christianisme avait apparu sur la terre..."
— Basta
— Hoje temos sabatina...
— O argumento é a bolo!
— Qual é a distância da Terra ao Sol?
— ?!!
— Não sabe? Passe a mão à palmatória!
— Bem, amanhã quero isso de cor...

Felizmente, à boca da noite,
eu tinha uma velha que me contava histórias...
Lindas histórias do reino da Mãe-d'Água...
E me ensinava a tomar a bênção à lua nova.

terça-feira, 29 de março de 2022

Merval Pereira: Novas peças no tabuleiro

O Globo

A decisão do governador do Rio Grande do Sul de permanecer no PSDB, em vez de aventurar-se numa candidatura à Presidência da República pelo PSD, implica também aceitar a decisão do partido de ter o governador João Doria como seu candidato oficial. A não ser que até junho, quando os partidos envolvidos na negociação para um candidato único que possa derrotar Bolsonaro e Lula se decidirão, Doria não tenha saído da posição secundária em que aparece hoje na pesquisa eleitoral do instituto Datafolha.

Eduardo Leite, por sua vez, terá de aparecer na mesma pesquisa à frente de Doria para poder reivindicar o apoio de seu partido. Se conseguir isso, mesmo tendo deixado o governo do Rio Grande do Sul, terá argumentos para se impor à maioria do partido, que continua sob o controle de Doria. Terá atingido duas das três metas acordadas para a definição do candidato único: estar melhor na pesquisa e ter mais capacidade de aglutinação.

Míriam Leitão: O intangível valor da cultura

O Globo

O ambiente era de defesa da cultura. Não houve panfleto ou referência ao governo anticultura que nos arruína. Era apenas um subtexto, uma certeza parada no ar. Os convidados se entreolhavam certos de ter o mesmo amor pelas artes. A pessoa central da noite invocou todos os monstros do teatro, dos gregos a Molière, dos franceses a Augusto Boal e Nelson Rodrigues. O primeiro papel no teatro encarnado por Fernanda Montenegro foi Antígona. Sófocles, eterno, pairava no ambiente com aquela mulher imortal. Antígona incorpora o sentimento feminista mais profundo. O da mulher que, por ser radicalmente livre e profundamente cívica, é condenada à morte eterna.

Estávamos no centro do Rio. Uma cidade despossuída. Foi capital, não é mais. Foi corte, perdeu a majestade. Permanece bela. E lá estavam o prefeito e seus secretários da Cultura e da Educação, respeitados e à vontade porque são autoridades que entendem do que se falava no Petit Trianon. A Academia Brasileira de Letras (ABL) pode ser vista de diversas formas. Eu acho mais justa a visão clássica. Machado de Assis nos recebe na entrada. Foi dele a ideia dos ritos que devem cumprir os que entram naquele teatro.

Fernanda Montenegro parecia encaixar-se tão perfeitamente que a única dúvida que surgia é por que não estava desde antes. O antigo dono da cadeira 17 previu sua própria sucessão. E recomendou à atriz que escrevesse um livro para entrar na Academia. Ela obedeceu. E assim Fernanda sucedeu ao diplomata, escritor, humanista Afonso Arinos de Mello Franco.