sexta-feira, 25 de março de 2022

Vera Magalhães: O bolsonarismo saiu do armário

O Globo

Já era previsível que Jair Bolsonaro fosse experimentar uma melhora em seus índices de intenções de voto e de avaliação do governo.

O leitor desta coluna há de lembrar que escrevi, em 23 de fevereiro, que o presidente se beneficiaria da entrada dos profissionais no comando de sua campanha e da entrada de dinheiro do Auxílio Brasil nas contas dos mais necessitados para dar um salto. E que os riscos que corria de ver estancada essa esperada melhora eram a inflação fora de controle e a rejeição quase impeditiva de uma reeleição.

Os números do Datafolha mostram que Bolsonaro ganhou pontos entre os mais pobres e no Nordeste, reduzindo sua distância para Lula no segmento e na região em que o petista vai melhor. Num país em que a desigualdade e a pobreza só cresceram, a injeção de recursos do Orçamento ainda é um poderoso cabo eleitoral.

Além disso, o silenciamento das atrocidades ditas por Bolsonaro no curso da pandemia, operado pelos profissionais da política, fez com que a classe média que elegeu o capitão em 2018 perdesse a vergonha de sair do armário. E aqui entra um fenômeno de duas mãos importante de analisar: o salto alto que acometeu o entorno de Lula desde que suas condenações nos processos derivados da Lava-Jato foram anuladas.

Vinicius Torres Freire: Onde Bolsonaro empata com Lula

Folha de S. Paulo

Entre famílias com renda além de dois salários mínimos, votação é igual, indica Datafolha

No Brasil inteiro, Lula da Silva (PT) tem 43% dos votos; Jair Bolsonaro (PL), 26%. No segundo turno, Lula vence por 55% a 34%, dizem os eleitores ao Datafolha neste início de outono.

No país em que a renda das famílias é maior do que dois salários mínimos, Bolsonaro empata com Lula no primeiro turno (em 34%) e no segundo também. Entre as famílias que ganham menos de dois salários, Lula ora vence por 51% a 19% no primeiro turno. Na pesquisa de dezembro, Lula vencia nesses dois grandes grupos de renda.

Lula ganha em todas as classes de educação (entre quem estudou até o ensino fundamental, até o médio ou até o superior) e entre todos os grupos de idade do Datafolha. Ganha entre homens, mais bolsonaristas, ainda que por margem mais estreita (40% a 31%, no primeiro turno). Pela margem de erro da pesquisa, pode estar empatado com Bolsonaro nas regiões Sul e Centro-Oeste/Norte. Mais notável, no entanto, é esse empate nas classes de renda maior.

Com as manhas da estatística, pela margem de erro, é possível que, no caso extremo, Lula possa estar uns seis pontos à frente de Bolsonaro (e vice-versa). Ainda assim, o contraste entre esses dois grupos de renda (abaixo de dois salários versus acima de dois) é significativo não apenas pela diferença de preferências entre os dois candidatos.

Bruno Boghossian: O trampolim da classe média

Folha de S. Paulo

Setor puxa alta do presidente, que ainda tem avanço tímido entre beneficiários do Auxílio Brasil

O eleitor bolsonarista está à procura de um caminho de volta para casa. A nova pesquisa do Datafolha mostra que o presidente recupera espaço em segmentos da população que impulsionaram sua campanha em 2018, em especial setores da classe média.

Jair Bolsonaro deu um salto entre eleitores com renda de dois a cinco salários mínimos e reduziu significativamente a vantagem de Lula ali. Em dezembro, o presidente perdia para o petista nesse grupo por 53% a 36% na simulação de segundo turno. Agora, os dois estão em empate técnico, com vantagem numérica para o ex-presidente: 45% a 43%.

Os números indicam que a recuperação de Bolsonaro neste início de ano tem sido puxada por uma fatia da população que já foi simpática a seu projeto –mais do que por grupos recém-beneficiados por políticas direcionadas à baixa renda, como o Auxílio Brasil.

Eliane Cantanhêde: ‘Ele sabe o que esta fazendo’

O Estado de S. Paulo.

Bolsonaro tem os governadores que disputam a reeleição e palanques fortes no Sul e Sudeste

Da Bahia para cima, só dá Lula. Da Bahia para baixo, o presidente Jair Bolsonaro continua recuperando fôlego e armou muito bem seus palanques e a campanha à reeleição. Isso vale para Centro-Oeste, Sul e o populoso Sudeste, inclusive para São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Se o clima lulista era de “já ganhou” e a dúvida era se a vitória seria em primeiro ou segundo turno, as certezas balançam. Lula mantém uma dianteira folgada, mas Bolsonaro sobe nas pesquisas, melhora a rejeição, reduz a diferença para Lula e confirma que nem está morto nem será fácil tirá-lo do segundo turno.

Lula tem PT, PSB, MDB e boa parcela da direita, inclusive de partidos bolsonaristas, no Nordeste – o bolsão vermelho, onde o PT sempre vence e Fernando Haddad ganhou em 2018. Fora daí, a coisa muda de figura e não só no agrícola Centro-Oeste, como muitos creem.

Bolsonaro ainda patina no Espírito Santo, mas tem candidatos consistentes em toda parte: o ministro Tarcísio Gomes de Freitas (que irá para o Republicanos) em São Paulo e os governadores Cláudio Castro (PL) no Rio, Romeu Zema (Novo) em Minas, Ratinho Jr. (PSD) no Paraná e Carlos Moisés (Republicanos) em Santa Catarina. De quebra, o ministro Onyx Lorenzoni (PL) no Rio Grande do Sul.

César Felício: Quadro consolidado

Valor Econômico

Guerra da Ucrânia deve impactar cenário eleitoral

A pesquisa Datafolha permite dizer que o presidente Jair Bolsonaro consolidou a presença no segundo turno da eleição deste ano. Mas o longo intervalo entre a pesquisa divulgada nesta quinta e a anterior do Datafolha, em dezembro, prejudica o entendimento da curva. Na fotografia, o presidente foi de 22% para 26% e Lula de 48% para 43%. A diferença entre os dois, que era de 26 pontos percentuais, agora é de 17 pontos. Não se pode falar propriamente em queda ou alta, porque a lista de candidatos é diferente. Mas a situação de Bolsonaro indiscutivelmente melhorou.

Existissem levantamentos em janeiro e fevereiro seria possível aferir se já surte efeito a inflação persistentemente alta, fator que deve travar a recuperação presidencial no próximo trimestre, de acordo com os especialistas Christopher Garman, da Eurasia, e Antonio Lavareda, do Ipespe.

Com Rússia e Ucrânia em guerra, não há como impedir no Brasil os repasses de aumentos de cotações internacionais em commodities. Há como mitigar, mas não se impedirá perda de renda. O presidente deu azar, porque tinha o terreno antes preparado para continuar crescendo até junho.

Fernando Abrucio*: A campanha do medo e seus efeitos

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Sociedade precisa se preparar para a guerra informacional que será arma do bolsonarismo. O que está em jogo é a democracia brasileira

O medo será a principal estratégia eleitoral do presidente Jair Bolsonaro para as eleições de 2022. Isso vai acontecer em três dimensões: na defesa de um modelo moral tradicionalista e intolerante, na utilização das instituições públicas para perseguir e destruir os adversários, bem como no formato da comunicação bolsonarista, que será guiada por uma lógica de guerra de informações. Por meio dessas três armas, o bolsonarismo vai transformar o pleito presidencial deste ano no mais virulento da história do país. A pergunta que fica é: a sociedade brasileira que se diz adepta da democracia está preparada para uma disputa política com feição de batalha final?

Geralmente, os candidatos concorrem a eleições prometendo novas soluções aos problemas públicos, o que pode ser traduzido como uma proposta de futuro. A ideia de esperança de dias melhores resume bem a campanha dos principais vencedores de disputas democráticas recentes. Mas o bolsonarismo não se encaixa nessa visão, pois a extrema direita que se espalhou por vários países do mundo é contrária à ideia de mudança e melhoria contínua que ancora o mundo contemporâneo.

Seu modelo de política é outro: defende a manutenção de tradições e valores morais do passado, ao mesmo tempo que repele novas ideias e comportamentos. Mais do que isso: o bolsonarismo não tem nenhuma tolerância com visões diferentes de mundo e busca bani-las. Não por acaso a guerra cultural é a principal característica desse neopopulismo autoritário presente no trumpismo, no governo húngaro de Viktor Orbán e na gestão do presidente Bolsonaro.

Luiz Carlos Azedo: Disputa de legado marca os 100 anos de PCB

Correio Braziliense

A diáspora comunista faz com que ideias defendidas pelo antigo Partidão estejam por aí, vivíssimas. A mais importante é a de frente ampla em defesa da democracia, adotada com êxito contra ditadura

O velho Partidão completaria, hoje, 100 anos de fundação. Surgiu em março de 1922, com o nome de Partido Comunista do Brasil (PCB), alterando o nome para Partido Comunista Brasileiro, sob comando de Luiz Carlos Prestes, em 1961, e Partido Popular Socialista (PPS), em 1992, sob liderança de Roberto Freire. Essas mudanças provocaram dois grandes rachas, dos quais surgiram os atuais Partido Comunista do Brasil (PCdoB), em 1962, encabeçado por João Amazonas, e o novo Partido Comunista Brasileiro (PCB), liderado por Ivan Pinheiro, que conseguiu seu registro em 1996. Em 2020, o PPS fez nova mudança, passando a se chamar Cidadania, para incorporar ideias social-liberais e fazer uma ruptura definitiva com o passado comunista.

Entretanto, os três partidos comemoram o centenário, cada qual com uma narrativa própria, que resgata uma fatia do seu legado. O PCdoB realiza um festival de música no Caminho Niemeyer, em Niterói, no estilo das antigas festas dos jornais comunistas. O PCB realiza um ato na Associação Brasileira de Imprensa (ABI). O Cidadania promove um seminário e homenageia antigos militantes e os dirigentes “desaparecidos” durante o regime militar, na Faculdade de Direito de Niterói (UFF). O PCB foi fundado naquela cidade, por Astrojildo Pereira.

Em 1982, o poeta Ferreira Gullar resumiu: “Eles eram apenas nove: o jornalista/ Astrojildo, o contador Cordeiro,/o gráfico Pimenta, o sapateiro José Elias, o vassoureiro/Luís Peres, os alfaiates Cendon e Barbosa/ o ferroviário Hermogênio/ e ainda o barbeiro Nequete/ que citava Lênin a três por dois/ Em todo o país,/ eles não eram mais de setenta/ Sabiam pouco de marxismo/ mas tinham sede de justiça/ e estavam dispostos a lutar por ela…” Segundo Gullar, “o PCB não se tornou o maior partido do Ocidente/ nem mesmo do Brasil/ Mas quem contar a história de nosso povo e seus heróis/ tem que falar dele/ Ou estará mentindo”.

Bernardo Mello Franco: O passado que não passa

O Globo

A Argentina parou ontem para celebrar o Dia da Memória. O feriado foi criado há duas décadas. Relembra o golpe de 24 de março de 1976, que instalou uma ditadura militar no país.

Com lenços brancos sobre a cabeça, mães e avós de desaparecidos marcharam até a Praça de Maio, no coração de Buenos Aires. A caminhada começou na antiga Escola Superior de Mecânica da Armada (Esma), centro de torturas que hoje abriga um museu de direitos humanos.

Os argentinos restauraram a democracia em 1983, mas ainda acertam contas com os responsáveis pelo terrorismo de Estado. Desde que os processos foram retomados, em 2006, a Justiça condenou 1.058 acusados. Outros 165 foram absolvidos, 964 morreram sem julgamento e 22 estão foragidos, segundo a Procuradoria de Crimes contra a Humanidade.

Pedro Doria: A Dissonância cognitiva explodiu

O Globo

Fossem apenas os militantes de redes sociais, seria menos grave. Mas o fato de, nas últimas semanas, a imprensa de esquerda na internet brasileira ter incorporado a sua pauta a desinformação russa deveria preocupar a todos. Pode não ser óbvio, mas é a democracia brasileira que fica em risco.

A desinformação cumpre um ciclo para que ponha em xeque democracias. Atinge primeiro os com maior tendência a adotar teorias conspiratórias, que se agrupam como seita nas redes. No segundo momento, porque estão em busca de audiência, veículos noticiosos percebem ali um público fiel potencial e começam a reverberar as informações falsas.

Flávia Oliveira: Exterminador do futuro

O Globo

A pandemia da Covid-19 aprofundou a crise na educação, mas não a forjou. Escancarou a tragédia de uma área negligenciada por um governo incompetente e mal-intencionado. Não é por boa-fé que um presidente da República, em três anos de mandato, conta quatro ministros da Educação; quatro presidentes do FNDE, o fundo que banca as políticas públicas do setor; e cinco presidentes do Inep, o órgão responsável por monitoramento e avaliação do sistema educacional, além da aplicação do Enem, porta de entrada dos jovens no ensino superior. À luz do atual escândalo, está claro que exterminador do futuro de crianças e adolescentes brasileiros é o veneno que mistura desmonte institucional, violação à laicidade do Estado, tráfico de influência, corrupção e propina em barra de ouro.

Jair Bolsonaro nunca escondeu ser motor de destruição da educação, da cultura, do meio ambiente. Elegeu-se para, em aliança com líderes evangélicos, militares, grileiros, lobistas das armas, levar a nocaute direitos humanos, instituições democráticas, reputação diplomática, pactos civilizatórios consagrados. Na educação, indicou, segundo declaração do próprio titular da pasta, o pastor presbiteriano Milton Ribeiro, um par de religiosos sem cargo no governo para intermediar o acesso de prefeituras aos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, sob a gestão de aliados do Centrão.

Ruy Castro: Para as biografias de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Como se sairão nelas figuras como Aras, Moro, Wal do Açaí?

Quando o repórter de televisão informa que tal acusação contra Jair Bolsonaro será "apreciada pela Procuradoria-Geral da República", pode-se quase ouvir as gargalhadas varando a noite e entrando pela janela. A ideia de que o procurador-geral Augusto Aras "apreciará" —analisará— uma denúncia contra Bolsonaro é tão pândega que ninguém mais se ofende. Com tudo isso, Aras já se declarou confiante na posteridade. E com razão —a história o poupará. Sua participação nas futuras biografias de Bolsonaro será como alívio cômico, na categoria Olavo de Carvalho, Fabrício Queiroz, Regina Duarte.

Não que faltem candidatos a essa categoria. As ditas biografias terão de se equilibrar entre o trágico e o humorístico ao tratar de ministros que Bolsonaro esbofeteou continuamente em público e que exibiram orgulhosos suas bochechas em fogo pela mão do chefe. Entre eles, Sergio Moro, que apanhou na cara todos os dias em que esteve no governo, Eduardo Pazuello, imortalizado ao salivar sabujamente e piar que "um manda, outro obedece", e Paulo Guedes, mestre em refazer de hora em hora as contas do país segundo as conveniências políticas de Bolsonaro.

Reinaldo Azevedo: Alô, imprensa! Lava Jato nunca mais

Folha de S. Paulo

Que o jornalismo não mais abandone a Justiça em favor de justiceiros; o 'jurista' Reinaldo Azevedo segue atento

A imprensa não militante —chamava-se "grande" antigamente— deveria ter aproveitado a punição aplicada pelo STJ a Deltan Dallagnol para fazer um mea-culpa. Por 4 votos a 1, o tribunal decidiu que o ex-procurador tem de pagar ao ex-presidente Lula multa de R$ 75 mil, valor que ainda será corrigido, numa ação por danos morais.

O agora pré-candidato a deputado federal está indignado e já anunciou uma suposta vaquinha espontânea na internet, que teria arrecadado quase o dobro desse valor. Faz chacota da Justiça.

A imprensa condescendeu com todos os métodos ilegais a que recorreu a Lava Jato. Foi além. Tornou-se sua beneficiária à medida que repórteres se transformaram em clientes de procuradores e delegados no mercado negro dos vazamentos. O espetáculo grotesco do PowerPoint, no dia 14 de setembro de 2016, destroçava o devido processo legal.

Hélio Schwartsman: Kant não aprovaria

Folha de S. Paulo

Seu esquema tirou do centrão o poder de influir na liberação de verbas

Kant era um chato de galochas. Para o filósofo de Königsberg, há duas formas de cumprir uma obrigação. Podemos agir "de acordo com o dever" ou "pelo sentido do dever".

Quando respeitamos a velocidade máxima de uma estrada por medo da multa, agimos "de acordo com o dever". Mas podemos também observar o limite de velocidade por acreditar que ele está de acordo com a racionalidade humana, que proporciona segurança e promove a paz no trânsito, por exemplo. Nesse caso, agimos "pelo sentido do dever". Para um consequencialista, desde que o motorista siga a norma que produz bons resultados, suas motivações são irrelevantes. Não para Kant. Para o prussiano, só o condutor que age "pelo sentido do dever" atua de forma autônoma, o que equivale a dizer de forma moral e livre.

José de Souza Martins*: Nós, quem, cara pálida?

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Os indígenas brasileiros autênticos, em sua maioria, não querem ser como nós. Querem ser como eles são e ainda podem ser

O cara pálida que ocupa a Presidência da República teve seu momento de esplendor plumário em cerimônia no Ministério da Justiça, quando lhe foi entregue (e a membros do seu governo) a Medalha do Mérito Indigenista. O governo condecorou-se.

A cerimônia, no entanto, teve aspectos antropologicamente interessantes e reveladores, não só por ser uma usurpação cultural da imagem do índio por brancos anti-indigenistas. Faziam-se de índios, que não são nem sabem o que são. Mas também os teve nos detalhes das fotos oficiais que chegaram aos jornais.

As revelações vêm do inesperado. A começar da fotografia centralizada pela figura secundária da criança indígena que o presidente, de cocar na cabeça, segurava no colo. A criança tenta tomar distância para ver melhor a cara de quem o carrega. A direção de seu olhar e sua expressão são de “O que é isto?!”.

Claudia Safatle: Casa Civil travou o pacote de crédito

Valor Econômico

Ala de técnicos da área jurídica da Casa Civil enxerga nas medidas a concessão de novos benefícios em ano de eleições gerais, o que seria proibido pela legislação eleitoral

O pacote de crédito para micro, pequenas e médias empresas parou na área jurídica da Casa Civil e não se sabe ao certo se e quando ele sairá de lá com o selo de aprovação. Há uma ala de técnicos da área jurídica da Casa Civil que enxerga nas medidas a concessão de novos benefícios em ano de eleições gerais, o que seria proibido pela legislação eleitoral.

O pacote de crédito foi concebido com base na extensão dos benefícios do Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para até dezembro de 2023. O programa de crédito nasceu no auge da pandemia, em 2020, para socorrer as companhias micro e de pequeno porte. O argumento da área econômica para contestar a posição dos técnicos da Casa Civil é que os efeitos da pandemia ainda persistem e, agora, estão agravados pela guerra entre Rússia e Ucrânia.

“Estamos vivendo em uma situação emergencial. Temos a guerra e os efeitos colaterais da pandemia. É uma situação excepcional”, argumentou um assessor do Ministério da Economia, em defesa das medidas de expansão da oferta de crédito.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Pesquisas não significam eleição definida

O Globo

A corrida eleitoral nem começou, mas, pelas análises das últimas pesquisas, parece que já está definida. Para a maioria, a única dúvida é se o presidente Jair Bolsonaro perderá para Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro ou no segundo turno. Uma minoria ainda acredita que Bolsonaro tem chance. Mas todos só enxergam essas duas possibilidades. É como se a polarização que viceja nas redes sociais tivesse posto antolhos no debate e deixado o país numa trilha inexorável, fechando os caminhos para a reflexão serena.

É um truísmo, mas não custa repetir: ninguém ganha eleição na véspera. A História não cansa de dar exemplos — em escala municipal, estadual ou federal — de candidatos no início desconhecidos que, no final, saem vitoriosos como resultado da argúcia política ou da capacidade de sintonizar o espírito do eleitorado. De Luiza Erundina a Alexandre Kalil, de Romeu Zema a Wilson Witzel, de Fernando Collor ao próprio Bolsonaro, todos eram dados como azarões — e todos venceram.

O Datafolha divulgado ontem revela uma oscilação nas intenções de voto, tanto em Bolsonaro quanto em Lula, com este ainda na frente daquele. Mas é ilusão acreditar que as preferências estejam consolidadas. Claro que a disputa entre os dois é o cenário mais provável. Mas não o único possível. Embora os números reforcem a percepção de que o jogo esteja definido, ainda estão contaminados pelo passado, e obviamente estão na frente os candidatos mais conhecidos do eleitor.

Poesia | Ferreira Gullar: Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?