Valor Econômico
Às vésperas de Natal, Pacheco lança ideia
para bagunçar ainda mais o ano legislativo de 2024
Como se não bastasse a sanha por maiores
emendas orçamentárias, de tempos em tempos os presidentes da Câmara e do Senado
lançam ideias para desviar o foco e drenar a energia política da agenda
legislativa.
Faz parte do jogo as lideranças do Congresso
complicarem a vida dos presidentes da República. Instrumentos para isso não
faltam. Pode ser a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, deixar um
projeto menos relevante trancar a pauta de votações ou não incluir determinadas
propostas do governo na ordem do dia de votações. Dar prioridade a proposições
polêmicas e muito complexas, como o PL das Fake News ou a proposta para limitar
a atuação do Supremo Tribunal Federal, também dão resultado.
Nos últimos anos, Arthur Lira tem ameaçado levar adiante a proposta, defendida por políticos como o ex-presidente Michel Temer e o ministro do STF Gilmar Mendes, de implantar no Brasil o semipresidencialismo.
As duas ideias, de Lira e de Pacheco, trazem
consigo o mesmo objetivo: enfraquecer a posição de Lula frente ao
Congresso. Mesmo que ambos assegurem que o objetivo é implantar as novas
regras somente após 2030, quem mais perde com a redução do poder da presidência
da República é quem o ocupa atualmente e pretende continuar por lá: Lula e o
PT.
Embora na campanha o petista tenha dito que
não pretendia concorrer à reeleição em 2026 (como, aliás, Bolsonaro fez em
2018), ele não esconde que é candidatíssimo a um quarto mandato. E não faltam
interessados a serem ungidos como seu sucessor depois disso. Nesse caso,
iniciativas como o semipresidencialismo ou o fim da reeleição exigirão um
esforço de Lula e seu governo para conter o avanço dos interessados em minar a
posição do presidente.
Para complicar, não há nenhum consenso de que
acabar com a reeleição trará ganhos para o sistema político brasileiro.
A maioria dos países que adotam o regime
presidencialista atualmente admitem a reeleição. Entre os países mais
populosos, as principais exceções são México e Filipinas (que vedam a
reeleição, mas possuem mandatos presidenciais de seis anos), além de Chile e
Colômbia (com mandatos de quatro anos, sem possibilidade de um novo período
subsequente).
Como se sabe, o Brasil aprovou a emenda da
reeleição em 1997, permitindo a Fernando Henrique Cardoso uma extensão de seu
governo. À época, o argumento era que um único mandato de quatro anos seria
muito pouco para se implementar as reformas de que o país precisava.
Além disso, a reeleição seria um incentivo para que o titular do cargo atendesse as demandas do eleitorado, pois sua gestão seria reavaliada após transcorrido um quadriênio no poder, como uma espécie de referendo em que a população seria convocada para ratificar se o governo estava no caminho certo ou não.
Desde então, dois argumentos principais são
usados pelos críticos da reeleição. Para alguns, a possibilidade de concorrer a
dois mandatos consecutivos dá uma vantagem desproporcional para quem já está no
poder (os incumbentes), que podem usar a máquina estatal em seu benefício.
Prova disso seria a experiência dos presidentes da República: FHC, Lula e Dilma
se reelegeram, e Bolsonaro só perdeu porque tinha diante de si um ex-presidente
extremamente popular – e ainda assim por uma margem bastante estreita.
Quando se olham os dados nos Estados, porém,
essa vantagem não é tão evidente. Embora em 2022 a reeleição de governadores
tenha sido altíssima (90%), nos pleitos de 2002 e 2018 os incumbentes tiveram
muito mais dificuldade: a taxa de sucesso foi de 47% e 50%, respectivamente.
Completam a série os pleitos de 2006 (64% de reeleitos), 2010 (67%) e 2014
(65%).
Nos municípios, os números também não indicam
uma vantagem inconteste dos prefeitos em busca de reeleição: 56,3% de
sucesso em 2004, 67,9% em 2008, 55,2% em 2012, 47% em 2016 e 57,6% em 2020.
Para se medir o efeito isolado da reeleição
sobre a possibilidade de vitória, contudo, seria necessário filtrar outras
variáveis que possam afetar essa correlação, como o volume de recursos
disponível para financiamento de campanhas, o alinhamento político com o
presidente da República e/ou governador e o acesso a transferências e emendas
orçamentárias, além do contexto macroeconômico ao tempo da eleição, entre
outros fatores.
O outro ponto contra a reeleição segue o
raciocínio de que, assim que tomam posse, prefeitos, governadores e presidentes
da República direcionam todos os seus esforços para obter um novo mandato.
Segundo essa visão, esse permanente clima eleitoral estimula gastos populistas
e leva à irresponsabilidade fiscal.
Num estudo publicado em 2009, Paulo
Arvate, George Avelino e José Tavares não encontram evidências de que
governadores “gastões” foram premiados com a reeleição. Analisando dados
eleitorais e fiscais de municípios entre 2001 e 2012, Fernanda Marciniuk e
Maurício Bugarin concluíram que prefeitos em primeiro mandato se comportaram de
forma mais responsável do que seus colegas em segundo mandato – um outro
sinal de que o instituto da reeleição funciona como um instrumento de controle
dos eleitores sobre a disciplina fiscal dos chefes do Poder Executivo local.
Como se vê, a decisão de ressuscitar a discussão sobre o fim da reeleição no Congresso se baseia muito mais no interesse político do que nas evidências dos dados eleitorais e dos estudos acadêmicos.
Excelente, MUITO INFORMATIVO! Parabéns ao autor e ao blog que divulga seu trabalho e, ainda, nos oferece visões tão diversas e interessantes sobre a realidade brasileira!
ResponderExcluir90% dos governadores se reelegeram,muita coisa!
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