quarta-feira, 1 de novembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

É sensato recurso da PGR em processo envolvendo Moraes

O Globo

Ministro foi aceito como assistente da acusação em inquérito que apura agressão em aeroporto

Tem razão a procuradora-geral da República interina, Elizeta Ramos, em impetrar recurso contra a inclusão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STFAlexandre de Moraes como assistente de acusação no inquérito que apura as circunstâncias do tumulto provocado por bolsonaristas contra a família dele na Itália. Permitir a participação de Moraes numa acusação em estágio inicial — não há sequer formalização de indiciamento nem denúncia — seria, nas palavras dela, um “privilégio incompatível com o princípio republicano”. A decisão partiu do ministro Dias Toffoli, relator do caso no STF. Se não for suspensa, permitirá a Moraes sugerir obtenção de provas e questionar testemunhas num caso em que ele próprio é parte envolvida.

Elio Gaspari - O déficit zero era rudimentar

O Globo

Lula diz que é uma metamorfose ambulante e é mais que isso. É também, desde sempre, um urso que come seus donos. Na galeria desse urso há várias cabeças, e as de Antonio Palocci, seu ministro da Fazenda, e José Dirceu, o “capitão” de seu time, são as mais conhecidas. Em algum momento, por boas razões, eles acreditaram na imagem que projetavam. Palocci expeliu-se, e Dirceu sofreu em silêncio.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não cabe nesses dois figurinos, mas só o tempo dirá o que Lula pretendeu ao se afastar da meta do déficit zero para 2024. Ela estava bichada desde o primeiro momento, desde a hora em que Haddad prometeu um crescimento inviável da arrecadação. Deu-se um caso de perigosa manipulação de expectativas. Lula, Haddad, o mercado e a torcida do Flamengo sabiam que a meta estava bichada, mas confiavam numa expectativa.

O risco embutido no episódio do café da manhã com os jornalistas é a possibilidade de repetição da joelhada que o ministro Antonio Palocci levou da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, em 2005. Na ocasião, o Ministério do Planejamento anunciou um plano de ajuste fiscal de longo prazo, e Dilma fulminou-o com duas palavras:

— É rudimentar.

Vera Magalhães - Tiro no próprio pé

O Globo

O descrédito a que o presidente submeteu seu ministro mais importante é injustificável e mina seu próprio mandato

Menos de uma semana depois de implodir ao vivo, num café da manhã com jornalistas, a meta fiscal estipulada por seu ministro da Fazenda e aprovada pelo Congresso há menos de três meses, Lula agora corre atrás dos líderes e presidentes de partidos enfatizando a importância da pauta do mesmo Fernando Haddad para elevar a arrecadação. A pergunta é: depois de sua fala, ficou mais fácil ou mais difícil aprovar essas matérias? Mais caro ou mais barato?

Não são questões complexas, essas. Na verdade, são elementares tanto para o ex-líder sindical acostumado a negociações exaustivas, com alta carga de pressão psicológica, quanto para alguém que está no terceiro mandato presidencial. A pergunta menos óbvia, para a qual não encontro resposta convincente de ninguém desde sexta-feira é: por quê?

Bernardo Mello Franco - Bolsonaro transformou Alvorada em bunker do golpe

O Globo

Presidente quis usar palácio para esconder fugitivos da polícia, acusa ex-ajudante de ordens

Ao projetar o Palácio da Alvorada, Oscar Niemeyer imaginou uma estrutura leve e elegante, com colunas que parecessem pousar sobre o solo. “Procuramos adotar os princípios de simplicidade e pureza”, explicou, antes da inauguração de Brasília.

Desde 1960, a residência oficial recebeu diversos tipos de inquilinos: de general a ex-guerrilheira, de sociólogo a metalúrgico. No ano passado, quase se transformou em esconderijo para criminosos em fuga.

Às vésperas do fim do governo, Jair Bolsonaro quis usar o Alvorada para abrigar aliados na mira da polícia. O plano foi revelado pelo tenente-coronel Mauro Cid, segundo reportagem do UOL.

Luiz Carlos Azedo - Notícias de uma guerra que chega até nós

Correio Braziliense

Israel vive um drama existencial: continuar sendo um Estado judeu e deixar de ser uma democracia liberal, ou se tornar uma democracia multiétnica e deixar de seu um Estado judeu

A coisa mais tenebrosa que conheci foram os campos de concentração de Auschwitz e Birkenau, na Polônia, designados pelo regime nazista de Adolph Hitler como o lugar para a “Solução Final” para os judeus. Entre o começo de 1942 e o fim de 1944, homens, mulheres, crianças e anciãos de toda a Europa foram transportados em trens para serem eliminados em câmaras de gás e crematórios naquele complexo macabro. Cerca de 1,3 milhão e 3 milhões de prisioneiros foram ali exterminados, sendo 90% judeus. Aproximadamente 150 mil poloneses, 23 mil ciganos, 15 mil soldados soviéticos e 400 testemunhas de Jeová também foram executados, morreram de fome, doenças ou em experiências médicas.

Wilson Gomes* - Lições de uma guerra da propaganda

Folha de S. Paulo

Nada de novo sob o sol da propaganda entre as guerras do século 20 e do 21

Como estamos em guerra de novo, voltei ao meu manual de propaganda bélica de cabeceira. Que estamos em guerra, creio que ninguém duvidará. Não me refiro, claro, apenas às guerras em sentido estrito —Rússia e UcrâniaIsrael e Palestina—, mas também aos conflitos políticos deflagrados como guerra cultural e guerrilha ideológica, que nem sempre matam, mas arrastam países à destruição e terminam em tentativas de golpes de Estado, como vemos seguidamente desde 2016.

E o manual a que me refiro é, na verdade, um tratado muito bem documentado sobre o uso da propaganda na Primeira Guerra. Chama-se "Propaganda Technique in the World War" e foi publicado por Harold D. Lasswell em 1927. Na guerra, diz ele, desde que a meta a ser alcançada passe por alguma forma de convencimento das pessoas, a propaganda tem que ser considerada.

Hélio Schwartsman - O Presidente e a verdade

Folha de S. Paulo

Ao revelar o que realmente pensa sobre déficit, Lula passou rasteira em Haddad

Lula afirmou que o déficit fiscal de 2024 não precisa ser zero e, ao dizer isso casualmente, acabou passando uma bela rasteira em Fernando Haddad, seu ministro da Fazenda. Pouca gente acredita em déficit zero, de modo que é possível dizer que Lula foi apenas honesto. Presidentes devem sempre dizer a verdade?

Acho que existem profissões que estão comprometidas com a honestidade. Penso que um médico, por exemplo, jamais pode mentir para o paciente competente que o questiona diretamente sobre seu estado de saúde. Fazê-lo, aliás, seria inútil, já que o paciente pode sempre requisitar seu prontuário e descobrir o que o médico desejava esconder. Mas o caso de presidentes é diferente.

Bruno Boghossian - Lula conta os centavos para 2024

Folha de S. Paulo

Presidente blinda despesas, fala em ampliar inaugurações e reconhece algum marasmo no primeiro ano

Faltam dois meses para o fim do ano, mas Lula está inquieto com 2024. A tentativa de afrouxar a meta fiscal e blindar os gastos do governo aponta para o que o petista trata como um ajuste de rota. "No ano que vem, se preparem, porque eu vou viajar para cada estado. Eu quero inaugurar muitas escolas, muitas universidades", afirmou o presidente.

Em 30 minutos de entrevista ao canal do governo, nesta terça (31), Lula falou três vezes em promessas para o próximo ano. Nas três vezes, misturou um balanço positivo de 2023 com um sutil reconhecimento de frustrações do eleitor. "Obviamente, quando você planta um pé de fruta, não vai dar fruta no mesmo ano", disse. "Às vezes, demora um pouco."

Vera Rosa - Rui Costa vence a disputa com Haddad

O Estado de S. Paulo

Centrão aprova recuo sobre meta fiscal e quer agora diretorias do Banco do Brasil e da Petrobras

Desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeu o sincericídio de dizer que o governo pode descumprir a meta de déficit zero para 2024, o apetite dos partidos do Centrão só aumentou. Em público, o discurso oficial é o de que o Executivo precisa fazer o ajuste das contas públicas. Nos bastidores, porém, a conversa é outra.

A cúpula do Centrão não se contentou com o comando dos ministérios do Esporte e de Portos e Aeroportos nem com a presidência da Caixa Econômica Federal. Quer as 12 vice-presidências da Caixa, a Funasa ressuscitada e também diretorias do Banco do Brasil e da Petrobras, estatal que foi pivô do escândalo do petrolão.

Fernando Exman - Omissão do Congresso no controle da inteligência

Valor Econômico

Colegiado foi concebido para verificar a legalidade das ações das diversas instituições que compõem o Sistema Brasileiro de Inteligência

Finalmente, aqui e acolá, surgem sinais de que alguns congressistas querem dar nova dinâmica à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência.

Não é um colegiado qualquer. Pouquíssimo conhecido pelo público em geral, ele foi concebido para verificar a legalidade das ações das diversas instituições que compõem o Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin). E aqui deve-se registrar, por justiça, a importância desses órgãos no processo decisório da Presidência da República.

Como em outros países, a comissão deveria analisar orçamentos, a eficiência e eficácia de cada uma dessas agências. Por aqui, contudo, ela tem sofrido até com uma insistente falta de quórum para conseguir cumprir minimamente sua missão: a defesa do próprio estado democrático de direito.

Lula lista votações prioritárias a deputados da base aliada

Por Raphael Di Cunto, Fabio Murakawa, Marcelo Ribeiro e Julia Lindner, Valor Econômico

Presidente pede aprovação de medidas para recuperar arrecadação e equilibrar contas públicas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu a deputados da base aliada nessa terça-feira, em reunião no Palácio do Planalto, a aprovação de medidas até o fim do ano para ajudar no equilíbrio das contas públicas, mas defendeu que não pretende fazer cortes no Orçamento enviado para 2024 e evitou cravar uma decisão sobre mudar a meta de resultado fiscal de 2024 por enquanto. À noite, diante da pauta ainda paralisada, ele se reuniu a sós com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

No encontro com os parlamentares, Lula expôs que há queda na arrecadação e que isso tornou mais difícil cumprir a meta, mas tentou argumentar que isso não ocorrerá para expandir as despesas e que a aprovação das medidas de ajuste fiscal pelo Congresso continua necessária. “A gente não quer gastar mais. O que não quer é contingenciar”, afirmou o presidente, segundo relatos dos deputados ao Valor.

Maria Cristina Fernandes - Insegurança do consumidor, que subiu, só piora com o embate sobre superávit

Valor Econômico

Situação se soma à perda de fôlego da popularidade presidencial e expõe os riscos do embate sobre as contas do governo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desperdiçou a oportunidade do seu programa semanal “Conversa com o presidente” para convencer o distinto público da importância do debate sobre a meta fiscal. Preferiu sair pela tangente e requentar a tentativa de golpe de Estado bolsonarista. É possível que tenha mudado de assunto para não continuar a mexer no angu que azedou, mas a estratégia de deixar decantar não parece suficiente. O índice de confiança do consumidor do Ibre/FGV para o mês de outubro demonstra que a insegurança sobre os rumos da economia já afeta o humor dos brasileiros.

Lu Aiko Otta - A coisa já estava feia antes da fala de Lula

Valor Econômico

Novo arcabouço fiscal pode ser desmoralizado logo na estreia

Antes mesmo de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocar em xeque a estratégia econômica do seu próprio governo, ao afirmar que o resultado fiscal de 2024 não precisa ser zero, era de apreensão o clima nos bastidores do Ministério da Fazenda. No jovem time do ministro Fernando Haddad, a habitualmente alta disposição para enfrentar desafios já vinha cedendo lugar para o reconhecimento das grandes dificuldades que há pela frente. A declaração de Lula foi a cereja amarga do bolo.

“Depois de tudo o que aconteceu, a Selic recuou um ponto. Um ponto!”, comentou um integrante do Ministério da Fazenda um dia antes da fala do presidente. A taxa, completou, segue muito alta. Está em 12,75%, ante 13,75% em janeiro. É um fator que estressa a vida de pessoas e empresas. “As pessoas acham que está tudo bem, mas não está”, avaliou.

Zeina Latif - Nada de novo, mas não convém abusar

O Globo

O descompasso entre a promessa da Fazenda e as expectativas dos analistas não significa que o governo tenha grande liberdade para alterar metas

Temos mais um capítulo da novela do arcabouço fiscal.

Vale uma breve retrospectiva. Lula e seu time político negociaram no Congresso a PEC da Transição, que expandiu bastante os gastos em 2023, contrariando o padrão usual de se começar o mandato com maior disciplina fiscal, para afrouxar depois. Tudo isso antes mesmo de anunciar Fernando Haddad como ministro da Fazenda.

É possível que essa tenha sido uma tentativa de preservar o futuro ministro do desgaste por defender mais gastos. Haddad, por sua vez, em sua posse, afirmou que não aceitaria “um resultado primário que não seja melhor do que os absurdos R$220 bilhões de déficit previstos no Orçamento para 2023”. Jogo combinado?

Vinicius Torres Freire - Mexer no 'déficit zero' mais cria do que resolve problema

Folha de S. Paulo

Mexer nas regras do jogo para escapar de punições por excesso de gasto causa o dano maior

Até o início da noite desta terça-feira (31), os ministros mais envolvidos na querela do déficit zero não tinham ideia do que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiria a respeito do assunto. Fernando Haddad estava em reunião no Planalto. Na sexta-feira (3), deve haver uma ou várias reuniões ministeriais com Lula. Talvez tratem também da mudança da meta.

Mas esse sururu e tanta fofoca é o mais importante? Discutir se a nova meta é 0,25% ou 0,5%? Não.

Ninguém sabia dizer se Lula mandaria emendar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO, onde estão definidas as metas dos próximos anos) até a semana que vem. Ou se pediria ao Congresso que fizesse a emenda mais tarde, a depender do destino da lei que manda cobrar imposto federal sobre parte das isenções de ICMS.

Martin Wolf* - As consequências econômicas da guerra entre Israel e Hamas

Folha de S. Paulo

Forma como o conflito se desenrola terá implicações para uma economia global já abalada por uma série de choques

O que o Hamas esperava alcançar com seu ataque a Israel em 7 de outubro? A resposta certamente era incendiar a região. Mais especificamente, era provocar a resposta que vemos agora, com consequências inevitáveis para a reputação global de Israel e as perspectivas de paz na região.

A estratégia, em outras palavras, é fazer dos habitantes de Gaza mártires de uma causa maior. Infelizmente, está funcionando. A forma como isso se desenrola terá implicações para vidas humanas, equilíbrio de poder regional e talvez até mesmo para a paz global.

Mas também tem implicações para a economia mundial, que tem sido abalada por uma série de choques nos últimos quatro anos —Covid-19, inflação pós-Covid, guerra da Ucrânia e agora isso. Então, qual será o impacto desse último horror?

Isso vai além de uma questão de dólares e centavos. De acordo com o capítulo "Special Focus" do mais recente Relatório de Mercados de Commodities do Banco Mundial, sobre as "Potenciais Implicações de Curto Prazo do Conflito no Oriente Médio", o número de pessoas sofrendo de insegurança alimentar grave aumentou em mais de 200 milhões entre 2019 e 2021.

Gustavo Krause* - A democracia desafiada

Metrópoles

A democracia é uma forma de sociedade cuja coesão depende da coesão de laços de confiança pessoal e institucional.

Nas duas últimas décadas, a radicalização política, as ameaças à democracia e a emergência das múltiplas face do populismo têm sido objeto de pesquisa, estudo e obras sobre um ciclo de expansão do autoritarismo o que alguns autores denominam de “recessão democrática”, termo criado por Larry Diamond (1951).

O título do artigo toma emprestada a definição da obra magistral do cientista social, Doutor em ciência política pela USP, pós-Doutor pela Universidade de Roma e Professor Titular de Teoria Política da UNESP, Marco Aurélio Nogueira, articulista do jornal Estado de São Paulo.

“Este não é um livro acadêmico […] Trata-se de um ensaio”. Com todo respeito, permito-me discordar. O autor deu leveza à profundidade acadêmica. Na dosagem exata. Estão presentes atualíssimos autores ao lado de dois clássicos de mentes brilhantes: Antonio Gramsci e Noberto Bobbio, dos quais é o fiel tradutor de Cadernos do Cárcere e de quase uma dezena das obras de Bobbio.