quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Manter vitória sobre a inflação depende de confiança fiscal

O Globo

Em vez de atacar Campos Neto, PT e Lula precisam zelar pelo cumprimento das metas assumidas

O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), conclui hoje sua última reunião deste ano. A expectativa é um corte de meio ponto percentual na taxa básica de juros, a Selic, para 11,75%. A reunião ocorre um dia depois do anúncio da inflação de novembro: 0,28%, menor resultado para o mês desde 2018. No acumulado do ano, o índice está em 4,04%. A previsão dos analistas ouvidos pelo BC é de 4,51% em 2023, abaixo do teto da meta (4,75%). Depois de dois anos acima do limite, o Brasil volta enfim a dominar a inflação. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deveria lembrar tal feito antes de voltar a atacar o presidente do BC, Roberto Campos Neto. Inflação alta, vale ressaltar, é particularmente perniciosa aos pobres.

O Copom deu início à escalada de juros em março de 2021, antes da maioria dos bancos centrais das grandes economias, que depois seguiram a mesma estratégia contra o choque inflacionário da pandemia. A Selic saiu de 2% em janeiro de 2021 até chegar a 13,75% em agosto de 2022. Apesar disso, em 2021 a inflação ficou em 10,06%, quase o dobro do teto da meta (5,25%). No ano passado, caiu para 5,79%, ainda acima do teto. Só neste ano voltou para dentro dos limites. A conquista só foi possível também graças aos compromissos fiscais assumidos pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Sem eles, as expectativas inflacionárias sofreriam deterioração, exigindo do BC juros ainda mais altos.

Vera Magalhães - Tudo ao mesmo tempo agora

O Globo

Ao deixar tudo para a última hora, Lula corre riscos na agenda econômica e na política

O risco de deixar tudo para a última hora, como o governo resolveu fazer neste fim de ano no Congresso, é que alguma tartaruga pode acabar escapando. Como os assuntos pendentes são relevantes em várias searas, pode-se dizer que Lula está vivendo perigosamente na economia e na política ao término de seu primeiro ano.

Há um silêncio da parte do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que denota que nem ele, desta vez, tem um cenário claro daquilo que é possível e o que não é viável entregar ainda neste ano entre as muitas pendências.

Sua prioridade é desde sempre a reforma tributária. É aquele feito que sabe que será creditado mais a seu empenho pessoal e sua capacidade de liderança sobre a Casa que preside que ao governo ou ao Senado. Aprovar em definitivo a Proposta de Emenda à Constituição e promulgá-la depois de décadas será, para ele, o momento de auge de seu mandato e um possível passaporte para um futuro longe da planície da Câmara quando deixar a presidência.

Bernardo Mello Franco – A hora da motosserra

O Globo

Javier Milei prometeu renovar a política e eliminar os privilégios da “casta”. Eleito, estreou na Presidência da Argentina com um ato de nepotismo.

Desde 2018, um decreto proibia a nomeação de parentes de altos dirigentes do serviço público. No primeiro dia de governo, o presidente mudou a regra para beneficiar a irmã caçula.

Karina Milei foi dona de borracharia e planejou abrir uma loja de bolos. Visionária, trocou doces e pneus pelo marketing político. Ela ajudou o irmão a compor a imagem de rebelde, com jaquetas de couro e cabelo despenteado. Agora será a personagem mais poderosa da Casa Rosada.

Milei havia garantido que a irmã não teria cargo nem salário no governo. A pirueta não parece um acidente de percurso. O presidente prometeu transparência, mas nomeou os ministros numa cerimônia secreta. Acusou os rivais de se apropriarem do Estado, mas mandou cunhar a imagem de seus cães no bastão presidencial.

Elio Gaspari - Lula evitou a frigideira

O Globo

Mandar Amorim para a reunião no Caribe foi ótima ideia

Se Lula fosse para a reunião dos presidentes da Venezuela e da Guiana que começa amanhã numa ilha do Caribe, correria o risco de cair numa frigideira de expectativas. Apesar do palavrório de Nicolás Maduro, não se sabe exatamente o que ele quer, muito menos até onde é capaz de ir. Na outra ponta do problema, não se sabe o que o presidente da Guiana quer negociar, muito menos se a ExxonMobil aceita discutir seus contratos de exploração de petróleo na plataforma continental da Guiana. Em qualquer dos casos, pesará uma decisão da Corte Internacional de Haia.

Essa circunstância dá à encrenca de Essequibo uma diferença em relação a duas grandes, e fracassadas, aventuras militares: a da Argentina nas Ilhas Malvinas, em 1982, e a do Iraque no Kuwait, em 1990. Naqueles casos, dois ditadores invadiram terras alheias pensando em conversar depois. Deu no que deu. Maduro não moveu um só soldado. Anexou o Essequibo nas tipografias de Caracas que imprimem mapas e avisou que quer conversar.

Fernando Exman - O trânsito de Dino entre a magistratura e a política

Valor Econômico

O calendário marcava o dia 2 de janeiro quando Flávio Dino tomou posse no Ministério da Justiça e Segurança Pública. Ao concluir o discurso, dividiu-se entre Karl Marx e a Bíblia.

“O critério da verdade é a prática”, afirmou citando a obra “Teses sobre Feuerbach”, sem mencionar o autor. No caso, Karl Marx. Disse apenas que era uma frase de um filósofo da sua predileção. “As nossas intenções, o nosso ideário, as nossas palavras são valiosíssimas. Mas, acima de tudo, é a nossa prática que vai definir o perfil desse governo e o seu julgamento perante o povo e perante a história. E o Tribunal da História leva em conta uma frase bíblica que está numa das cartas de Paulo, a carta de Thiago: ‘A fé sem obras é morta’”, acrescentou.

Nessa toada, Dino assumiu o cargo defendendo a pacificação nacional e, ao mesmo tempo, destacando que ponderação não deveria ser confundida com leniência. Mas seus planos iniciais ruíram: poucos dias depois, viu-se no turbilhão provocado pelos ataques extremistas do 8 de janeiro.

Nilson Teixeira* - Obstáculos no governo Lula

Valor Econômico

A reduzida influência do governo perante parte substancial de parlamentares tornou a negociação da reforma tributária mais suscetível à concessão de privilégios injustificáveis

O presidente Lula enfrentou um enorme desafio para formação de uma coalizão de apoio robusta no Congresso neste 1º ano do seu 3º mandato. Apesar de compreensível, a demora em ceder espaço na sua equipe ministerial e em estatais para grupos que apoiaram a campanha do ex-presidente Bolsonaro dificultou a construção dessa maioria.

Embora venha ocorrendo gradual incorporação de nomes indicados pelos partidos de centro, a coalizão formada é frágil. A aprovação das propostas do Executivo continua demandando árdua negociação com os parlamentares que exigem contrapartidas à cada etapa da negociação, mesmo com os seus partidos obtendo crescente representação nos ministérios e em estatais. O argumento dos membros desses partidos é sempre o mesmo: os indicados não os representam, e sim apenas ao pequeno grupo que o apoiou.

Lu Aiko Otta - Compensações tributárias, a incerteza para 2024

Valor Econômico

O problema é que não se sabe quando os contribuintes utilizarão seus créditos nem em que quantidade

Do ponto de vista da equipe econômica, a grande incerteza para as contas públicas em 2024 chama-se compensações tributárias. Trata-se de um bolo de créditos estimado em R$ 150 bilhões que o governo precisa pagar às empresas.

São direitos adquiridos pelos contribuintes na Justiça, sobre tributos federais cobrados indevidamente, e que por isso precisam ser devolvidos. Isso pode ser feito na forma de compensação, ou seja, a empresa os desconta dos valores que tem a pagar à Receita Federal.

Nos últimos meses, o valor das compensações tem aumentado. Isso acendeu sinais de alerta no Ministério da Fazenda. Discute-se nos bastidores se há alguma forma de limitá-las ou mesmo de reabrir na Justiça a discussão que responde pelo maior volume de créditos: a exclusão do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo das contribuições PIS/Cofins.

Paulo Delgado* - O diplomata da guerra morreu

O Estado de S. Paulo

Como assumiu a prevalência de suas ações sobre tantos fatos mundiais, que Kissinger tenha ido em paz com sua consciência acertar as contas com o Deus de todos nós

Ele tinha o Estados Unidos como civilização pessoal e se dedicou a vida inteira a americanizar o mundo. Sabia que um sistema de poder, para durar, é sempre superior às pessoas que imaginam dirigi-lo. Nascido na Alemanha, refugiado que se tornou sargento do exército, voltou ao país que o expulsou para derrotar o nazismo. A fascinante, polêmica e verdadeiramente ativa vida do diplomata Henry Kissinger terminou mês passado em Connecticut, Estados Unidos. Tanta desordem e desarmonia o fez constatar que o mundo vivia uma destrutividade sem precedentes.

Kissinger recebeu o mais contestado e precipitado Prêmio Nobel da Paz por uma guerra que não tinha acabado. Dividiu com o Comitê Norueguês, que o concede, o constrangimento de ver Le Duc Tho não aceitar a honraria, único até hoje a recusar o prêmio. O líder vietnamita considerou incompleto e insuficiente o Acordo de Paris que previa terminar o conflito e restaurar a paz no Vietnã.

Vera Rosa - A aliança de Lula com o Supremo

O Estado de S. Paulo

Presidente investe em parceria com a Corte para evitar impeachment

A partir de hoje, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai selar, de fato, uma aliança com o Supremo Tribunal Federal (STF). No Palácio do Planalto, não há dúvida sobre a aprovação do nome do ministro da Justiça, Flávio Dino, para ocupar a vaga de Rosa Weber na Corte, apesar dos protestos da oposição, que promete fazer um carnaval durante a sabatina dele na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

A avaliação no governo é a de que Dino passará, mas com menos votos do que Paulo Gonet, o nome indicado por Lula para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR). Na prática, porém, essa diferença pouco importa.

O que Lula quer é garantir a governabilidade e evitar um processo de impeachment, como o que atingiu Dilma Rousseff, em 2016. Diante da crescente fatura cobrada pelo Congresso a cada votação, ele está cada vez mais convencido de que a agenda fiscal do governo depende, em grande parte, da parceria com o Supremo.

Wilson Gomes* - A normalização do radicalismo

Folha de S. Paulo

Os radicais continuam na moda e nada indica que deixarão de fazer sucesso

As vitórias de Javier Milei, na Argentina, e do partido de Geert Wilders, nos Países Baixos, só não são mais preocupantes do que as sucessivas demonstrações de que Donald Trump pode voltar ao poder nos Estados Unidos, apesar de tudo o que aprontou na Presidência.

Os radicais, definitivamente, continuam na moda e nada indica que deixarão de fazer sucesso nas passarelas eleitorais nas próximas temporadas.

Isso deveria ser suficiente para desmentir a hipótese de que uma conjunção rara de fatores excepcionais produziu o surpreendente inverno democrático dos últimos anos. Que se tratou de uma singularidade permitida por um vacilo das forças democráticas, mas que agora que estamos vigilantes e não acontecerá de novo.

Ao que parece, não é bem assim, como tenho insistido ao longo das últimas semanas.

Bruno Boghossian - Milei abusa da antipropaganda em recado a apoiadores e oposição

Folha de S. Paulo

Como tantos populistas liberais, argentino assume com motosserra na mão direita e cassetete na mão esquerda

Sob a faixa, Javier Milei manteve um figurino oposicionista. Na posse, ele descreveu a crise argentina como resultado de "cem anos de fracasso" dos rivais e, como se não tivesse recebido a missão de administrar um país, assumiu o bordão de que "não há dinheiro" para nada. "Nenhum governo recebeu uma herança pior."

Milei repete uma fórmula que marcou a onda de choques neoliberais em países da América Latina nas décadas de 1980 e 1990. Essas reformas eram recebidas pela população com mais tolerância quando eram encaradas como remédios contra situações econômicas dramáticas, que corriam risco de agravamento.

Luiz Carlos Azedo - Haddad enfrenta gula do Centrão e "fogo amigo" do PT

Correio Braziliense

O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC ‘independente’ e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país, afirma o PT

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enfrenta simultaneamente a gula do Centrão e o "fogo amigo" do PT. Fosse um economista como Pérsio Arida, e não um político petista "puro-sangue", calejado por administrar o terceiro maior orçamento do país como prefeito de São Paulo, já teria pegado o boné e ido embora para casa. É muito mais confortável dar aulas de ciência política ou filosofia na Universidade de São Paulo do que administrar as pressões que sofre de todos os lados da Esplanada e da Faria Lima.

A gula do Centrão é retroalimentada pela narrativa petista de que Haddad advoga um "austericídio fiscal", o mote sacado por Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, na conferência nacional da legenda, para atacar a política econômica e responsabilizar Haddad, por antecipação, pelas dificuldades que o partido enfrentará nas eleições municipais.

"Não faz nenhum sentido, neste cenário, a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC, rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado. O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC 'independente' e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país", afirma a resolução aprovada ontem, em votação remota.

Entrevista |Giannetti: ‘Risco é querer fazer crescimento a ferro e fogo, como tentou a Dilma. E deu no que deu’

Por Luiz Guilherme Gerbelli / O Estado de S. Paulo

Na avaliação do economista e filósofo, porém, economia brasileira termina o primeiro ano do terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva melhor do que começou

O economista e filósofo Eduardo Giannetti avalia que a economia brasileira termina o primeiro ano do terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva melhor do que começou. O crescimento será maior do que o previsto, a inflação está dentro do intervalo da meta estabelecida, o desemprego está baixo e houve uma apreciação dos ativos denominados em reais.

“Eu acho que essa é uma grande conquista do ano”, diz. “Reflete muito a virada das expectativas pelo fato de que, num ano em que houve um aumento forte do juros nos Estados Unidos e no mundo, o real se apreciou e se valorizou em relação ao dólar americano”, afirma Giannetti, que contribuiu com o plano econômico de Marina Silva, hoje ministra do Meio Ambiente, nas vezes em que ela disputou a Presidência.

Com o último dado do Produto Interno Bruto (PIB) – alta de apenas 0,1% no terceiro trimestre -, Giannetti diz que um dos riscos na condução da política econômica no ano que vem é a “impaciência”, de “querer fazer o crescimento a ferro e fogo, uma espécie de marcha forçada, como tentou fazer a Dilma. E deu no que deu.”

A seguir trechos da entrevista concedida ao Estadão:

Moraes chama PEC das decisões monocráticas de irreal e defende delação de Cid pela PF

Fabio Victor / Folha de S. Paulo

Magistrado se diz muito feliz com Dino e Gonet, mas afirma que ministro do STF não se mete em indicação

BRASÍLIA - O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), criticou a chamada PEC (proposta de emenda à Constituição) das decisões monocráticas, que limita a atuação individual de magistrados desta e de outras cortes do país.

Em entrevista à Folha, Moraes defendeu a importância das deliberações individuais para o sistema Judiciário, citando o exemplo hipotético de uma medida provisória que permitisse a crianças a partir de 12 anos comprar fuzis.

"Uma coisa é o relator dar a liminar: suspende imediatamente e coloca para referendar. Mesmo que um ministro peça vista, outro peça vista, nenhuma criança vai comprar a arma. Agora, se passa essa PEC, o relator não pode suspender. Aí o relator coloca imediatamente com o seu voto para derrubar a medida provisória. Um ministro pede vista, 90 dias. Quando devolve, outro ministro pede vista, mais 90 dias. Nesses 180 dias, quantas crianças de 12 anos vão comprar fuzis?", questionou.

Aprovada em novembro pelo Senado –e atualmente em tramitação na Câmara–, a PEC estabelece prazos para os pedidos de vista nos julgamentos colegiados do Poder Judiciário e determina que decisões individuais não podem suspender leis aprovadas no Congresso e outras casas legislativas e sancionadas pelo Executivo. Para isso ocorrer, apenas com decisão colegiada.

Hélio Schwartsman - Duelo pela vida

Folha de S. Paulo

Ala política do PT insiste na tese de que gasto público é vida, o que é um problema para Haddad

Mais uma vez, a ala política do PT investe contra o ministro da Fazenda de um governo do partido. A corrente que identifica gastos públicos com crescimento e vida, representada por Gleisi Hoffmann, se opõe à proposta de Fernando Haddad de equilibrar as contas em 2024. Defende que o governo se permita um déficit primário de até 2% do PIB. Quem tem razão?

Se, nas últimas décadas, o estatuto epistemológico da economia, entendido como a capacidade de desenvolver modelos que permitem previsões acuradas, avançou no campo da microeconomia, o mesmo não se deu na macro. Nela, coisas demais acontecem ao mesmo tempo, o que multiplica os fatores de confusão, estragando os modelos. O câmbio existe para humilhar os economistas, diz a velha piada.

Como política típica, Hoffmann não detalhou o que tem em mente. Ainda assim, é fácil ver que a versão forte da hipótese de que gasto é vida está errada. Se não existissem limites à capacidade do Estado de gastar, não haveria países pobres. Qualquer nação com renda per capita menor que a de Luxemburgo (US$ 127 mil) estaria comendo mosca, pois bastaria o poder público "investir" mais para zerar a diferença.

Vinicius Torres Freire - Argentina de Milei anuncia uma paulada social, mas ainda não tem plano econômico

Folha de S. Paulo

Megadesvalorização do peso e corte de gastos vão doer muito, mas não são um programa de ajuste ou futuro

"No hay plata". Não tem dinheiro. Antes de começar a melhorar, a vida dos argentinos vai piorar muito, por alguns meses.

Não há alternativa: a Argentina precisa se livrar do vício secular do déficit do governo, que é a causa da dívida, da inflação, do dólar disparado, da pobreza. Se dar calote fosse solução, a Argentina seria a Suíça.

Foi assim que o ministro da Economia de Javier Milei, Luis "Toto" Caputo, introduziu as 10 medidas do "pacote de emergência", uma paulada de manual de economia, vaga e temperada com algumas demagogias.

Era o que vinha vazando do governo de transição, faz dias, afora a pancada no peso. "Toto" deu a impressão de que precisava dar logo alguma notícia aos argentinos ansiosos ou já irados, mas que ainda estuda o que fazer. Não foi um "Plano Collor". Ou plano algum.

Memória: 45 anos atrás | (Gilvan e Graziela) Exilados voltam e passam o Natal presos

Jornal do Brasil - terça-feira, 26/12/78

Legenda: Graziela e Gilvan Cavalcanti de Melo foram liberados na Polícia Marítima às 11 horas

Exilados voltam e passam o Natal explicando por que voltaram sem passaportes

Fora do país há seis anos, absolvido em setembro último da acusação de pertencer ao PCB, o ex-funcionário do INPS Gilvan Cavalcanti Melo, chegou do Panamá com a mulher e os dois filhos, no domingo e foi preso. A Embaixada do Brasil informara que poderiam desembarcar só com a carteira de identidade, mas a polícia deteve o casal por 12 horas durante a noite de Natal, para saber porque estavam sem passaportes.

O Sr. Gilvan e D. Graziela Cavalcanti Melo passaram a noite num sofá da Delegacia de Polícia Marítima, onde foram interrogados ontem de manhã e liberados depois de preencherem um questionário mimeografado. Os filhos, Gilvan de 16 anos, paralítico, e Ana Amélia, de 12, foram dispensados pela polícia ainda no aeroporto e ficaram com parentes.

GARANTIA

Hoje, com 43 anos, o Sr. Gilvan de Cavalcanti Melo, nascido em Pernambuco, foi demitido do INPS por decreto baseado no AI-5, em 1972, sob a acusação de pertencer ao Partido Comunista Brasileiro. Logo após foi com a família para Buenos Aires, Porto Alegre e finalmente Santiago onde trabalhou na Corporação de Fomento.

Com a derrubada do Governo Allende, asilaram-se na Embaixada do Panamá, país onde o Sr. Gilvan conseguiu trabalho numa empresa de administração. Morou durante algum tempo em Cuba que lhe forneceu documento de identidade.

Ao saber de sua absolvição em processo na 2ª Auditoria da Marinha em 19 de setembro, o Sr. Gilvan consultou a Embaixada do Brasil no Panamá e recebeu a garantia de que poderia voltar normalmente apenas com a carteira de identidade brasileira emitida em 1972 se viajasse por uma empresa aérea brasileira.

A família embarcou num voo da Varig às 8,43 de domingo e chegou ao Aeroporto Internacional do Rio às 19,50. Levados para a Polícia Marítima e Aérea, o casal e os dois filhos foram informados de que teriam que prestar depoimentos, por não estarem com passaportes.

Após entendimento com os policiais, o Sr. Gilvan conseguiu que os filhos fossem liberados, enquanto ele e a mulher eram levados à sede da Polícia Marítima, na Av. Rodrigues Alves. Ali passaram a noite do Natal, recostados num sofá. O advogado Humberto Jansen chegou à delegacia às 7hs, mas só conseguiu liberar o casal, às 11h, depois que os dois prestaram depoimentos de uma hora cada um. 

No questionário tiveram que informar as condições de saída do país, como viviam e onde trabalhavam no exterior e porque voltaram. Agora o que quero fazer mesmo é assistir um jogo do meu Vasco”, disse o Sr. Gilvan.