Folha de S. Paulo
Efeito surpresa foi fundamental para evitar
emissão indiscriminada de títulos com isenção de IR
O Ministério
da Fazenda começou o ano com dois movimentos no campo da regulação com
grande poder de mexer com o mercado de capitais brasileiros e diminuir as
distorções que acabam beneficiando os investidores com renda mais alta via
incentivo tributário.
O efeito surpresa foi fundamental para evitar
que forças contrárias se articulassem para barrar as duas medidas antes mesmo
da decisão.
Na primeira delas, o CMN
(Conselho Monetário Nacional) fechou brechas, no início de fevereiro, que
permitiam a emissão indiscriminada de cinco títulos de renda fixa com isenção
do Imposto de Renda, as LCA, LCI, CRA, CRI e LIG.
São papéis de renda fixa que em tese precisariam ter como base operações no setor imobiliário e no agronegócio. Empresas de outros setores e bancos, porém, estavam se apropriando desse incentivo tributário do IR, que foi concedido para estimular o financiamento do agronegócio e imobiliário no Brasil.
Poucas semanas depois, foi a vez de o CNSP
(Conselho Nacional de Seguros Privados) fechar outra brecha que servia de rota
de fuga para investidores mais ricos após a aprovação da nova tributação dos
chamados fundos exclusivos.
A resolução do CNSP
proibiu a criação de novos planos familiares exclusivos de Previdência com
saldos individuais acima de R$ 5 milhões.
O aperto regulatório foi feito para evitar
que esses fundos continuassem sendo usados de forma indevida para planejamento
tributário e sucessório dos investidores de alta renda.
Assim como os títulos isentos, os
investidores também estavam se beneficiando de incentivo tributário voltado
para a poupança previdenciária.
Nos dois casos, o governo estava aceitando
perder arrecadação com a renúncia tributária para dar ganho maior a
investidores de renda alta. Em outras palavras, subsidiando quem não precisa.
Os críticos das medidas vão dizer que os
títulos isentos beneficiam muito o pequeno poupador. Não é bem assim.
Na maioria das vezes, o banco espreme tanto a
taxa de LCI, LCA e LIG que a diferença em relação ao CDB (um dos investimentos
mais populares do mercado) acaba ficando muito próxima. Nesses casos, a maior
parte do incentivo tributário fica com o banco e as empresas que emitiram os
títulos.
É diferente do cenário para o grande
investidor, que tem milhões para investir nesses papéis. Para eles, as taxas
saem sempre mais vantajosas.
O comportamento do mercado provou que a
medida estava na direção correta. Já nos dias seguintes à decisão do CMN, as
taxas desses títulos para as empresas do agronegócio e imobiliário, no mercado
secundário, começaram a cair.
É a lei da oferta e da procura. O mercado
percebeu que a oferta dos títulos seria menor e só quem teria de fato acesso à
emissão desses papéis seriam os dois setores para os quais o incentivo do IR
foi criado lá atrás.
Há casos de CRAs e CRIs de empresas do agro e
do setor imobiliário em que as taxas caíram muito, adiantando o efeito de queda
da taxa Selic de até duas reuniões à frente do Copom (Comitê de Política
Monetária) do Banco Central.
Em menos de um mês, o CMN e o CNSP mostraram
força para coibir abusos visíveis no mercado de capitais. Os dois poderosos
conselhos do governo há muito estavam com atuação apagada no campo da
regulação.
Houve um tempo que o resultado da reunião do
CMN era o mais esperado pelos agentes econômicos na agenda de Brasília.
Toda essa movimentação no mercado de capitais
está acontecendo porque o Congresso aprovou a proposta do governo de mudar a
tributação dos fundos exclusivos, que permitia aos super-ricos ficarem com o
dinheiro parado em renda fixa, ganhando, e sem cobrança de imposto, enquanto os
demais fundos eram tributados.
A festa acabou. Esses aplicadores estão
procurando novos investimentos para aplicar o dinheiro com maior rentabilidade.
Quem pode sair ganhando é a bolsa e o mercado de debêntures (títulos privados).
Quem venham mais medidas desse tipo. Foi uma
paulada bem-vinda.
Pois é.
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