sexta-feira, 21 de junho de 2024

Maria Cristina Fernandes - Governadores que miram a vitrine eleitoral na segurança resistirão

Valor Econômico

Lula aguarda a proposta de Ricardo Lewandowski para discuti-la com os ministros que governaram Estados

A proposta de emenda constitucional destinada a constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública chegou, finalmente, à antessala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo menos foi isso que ele deu a entender em entrevista à rádio “Verdinha” nesta quinta-feira, ao dizer que aguarda a proposta do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, para discuti-la com os ministros que foram governadores.

A PEC foi empurrada pela pressão da opinião pública por respostas do governo federal à escalada do crime organizado. Como a segurança pública é, por determinação constitucional, uma atribuição dos Estados, a proposta teria por objetivo dotar a União de instrumentos para endereçar soluções ao tema.

A proposta é tão antiga quanto a lei que criou o SUSP, em 2018. Ao contrário do Sistema Único de Saúde, o Susp nunca pegou porque não tem verba carimbada. Como os pisos constitucionais da saúde e da educação estão sob risco, a ideia não é criar um terceiro piso, mas fundir o Fundo Nacional de Segurança Pública e o Fundo Penitenciário num único, com previsão constitucional de maneira que a soma de seus recursos, da ordem de R$ 2,7 bilhões, não possa ser contingenciada. Financiados pela loteria federal, o aumento desses fundos dependeria de encontrar uma outra fonte de receita, como o fundo de direitos difusos.

Lewandowski diz que as políticas públicas de saúde e educação, como os planos de enfrentamento à dengue ou a lei de diretrizes e bases da Educação, só podem ser nacionalizadas porque as duas áreas têm previsão constitucional para tanto.

Se a gestão do SUS hoje é tripartite, entre União, Estados e municípios, com coordenação do Ministério da Saúde, o MJ também almeja algo semelhante para o Susp. Na segurança pública a constitucionalização permitiria, por exemplo, a uniformidade dos bancos de dados para a integração das policiais e de instrumentos como o uso de câmeras policiais nos uniformes.

Recentemente, o governo paulista resistiu às diretrizes nacionais para as câmeras. Como os critérios eram mandatórios apenas para os Estados que fizessem uso do Fundo Nacional de Segurança Pública foi preciso que o Supremo Tribunal Federal interviesse para que o Estado seguisse as diretrizes.

O ministro da Justiça diz que a minuta foi preparada de maneira a que a autonomia dos Estados no tema não seja afrontada. Vê, ainda boa receptividade dos parlamentares afeitos ao tema à PEC e diz que a PEC tem sido discutida com as forças estaduais de segurança pública. Não se deve, porém, descartar resistências à proposta.

A segurança pública é a vitrine eleitoral de pelo menos dois pré-candidatos à Presidência da República, os governadores Tarcísio de Freitas (SP) e Ronaldo Caiado (GO). Ambos resistirão se ficar claro que suas polícias estarão submetidas a diretrizes nacionais.

Além dos governadores-candidatos, a bancada da bala na Câmara é muito sensível às demandas dos policiais militares. Se estas gozam de grande autonomia em relação aos governadores resistirão também se vierem a ser submetidas a diretrizes nacionais.

O argumento de Lewandowski — “Se a criminalidade está organizada nacionalmente, a segurança pública também tem que ter diretrizes nacionais” — é plausível, mas não assegura a transposição dessas barreiras Desconhece-se, por exemplo, qual seria a reação das polícias militares a uma dos artigos da PEC que permitirá uma maior ingerência da Polícia Federal no enfrentamento do crime organizado.

 

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