segunda-feira, 26 de agosto de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Só com menos exceções será evitado IVA de 28%

Folha de S. Paulo

Reforma tributária dá transparência à carga exorbitante; cada vantagem cedida a um setor implica sacrifício aos demais

Como não poderia ser diferente, a distribuição de supostas bondades pela Câmara dos Deputados na regulamentação da reforma tributária —por meio da ampliação da lista de bens e serviços com taxação reduzida— resultará em uma alíquota geral mais alta do futuro imposto sobre valor agregado (IVA).

Cálculos do Ministério da Fazenda indicam que a cobrança esperada subirá 1,47 ponto percentual, para 27,97%, devido a novas benesses inseridas no projeto de lei complementar em tramitação.

Desse percentual, 0,69 ponto decorre da inclusão de carnes e queijos na cesta básica, por decisão demagógica dos parlamentares, em alinhamento a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O restante advém de produtos como medicamentos e demais alimentos, entre outros.

Entrevista | Jairo Nicolau - Urnas devem fortalecer PL, PT e PSD, avalia cientista político

Por Camila Zarur / Valor Econômico

Cientista político acredita que pleito municipal deste ano servirá para partidos se reorganizarem para disputa presidencial e parlamentar de 2026

Quem espera que as eleições municipais sejam uma prévia da disputa presidencial de 2026 poderá se frustrar ao ver que a polarização entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não deve se refletir nas urnas deste ano. O pleito de agora, diz o cientista político Jairo Nicolau, professor e pesquisador da FGV CPDOC, é um referendo das questões locais, e os dois líderes políticos não estão sob avaliação.

No entanto, pondera o especialista, a corrida eleitoral deste ano pode deixar antever as eleições parlamentares de daqui a dois anos. O motivo é a reorganização e reestruturação pelas quais os partidos passam na votação municipal, sobretudo pela proximidade que o pleito gera entre o político e a sigla com o eleitor.

Fernando Gabeira - Eleições e a ameaça em gestação

O Globo

Disputa na maior cidade do Brasil traz a mensagem apocalíptica de que todos são criminosos

Sinto que é hora de planejar férias. Nada de grandes viagens, mas apenas um mergulho no território da literatura e de outras artes. Isso me ajudou na pandemia. Encontrei a obra de Jorge Luis Borges, quatro volumes editados pela Globo Livros, um refúgio de sensibilidade e erudição. Saltei alguns poemas, mas foi um tempo enriquecedor.

O ato de interpretar o cotidiano da política brasileira desgasta e pede um respiro anual. Pressenti o desgaste do STF quando decidiu julgar, sem estrutura adicional, milhares de pessoas. Prisões consideradas ilegais, problemas na própria cadeia, gente com câncer precisando de tratamento e, sobretudo, penas consideradas muito pesadas — enfim, uma sequência de problemas que acabariam se voltando contra a Corte.

Tentei ser discreto, mas não deixei de mencionar minha apreensão. O resultado foi a desconfiança de que protegia a direita. Da mesma forma que a própria direita acusa a defesa de direitos humanos como proteção de bandidos.

Miguel de Almeida - Chame o ladrão

O Globo

Três momentos simultâneos e nada alegres na vida brasileira:

1 — Hoje a Universidade de São Paulo realiza cerimônia de diplomação de 15 alunos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) mortos durante a ditadura militar. Eram jovens com menos de 25 anos, assassinados pelas forças do governo. Serão oferecidos diplomas honorários de graduação.

2 — Como se fossem anúncios, os outdoors digitais paulistanos avisam (sem modéstia): a cada 16 minutos uma moto é roubada ou furtada. É uma produtividade baixa quando se trata de outro objeto de desejo: na Avenida Paulista, em números de 2022, cerca de 5,3 mil celulares foram abduzidos. Na cidade, a cada três minutos (!) um aparelho é levado. No elevador do meu prédio, o síndico cola um aviso: “Não espere o Uber na calçada com o celular à mostra. Ciclistas ou motoqueiros levam seu aparelho!”. É a rotina do medo.

3 — Um garoto de 14 anos (!) cometeu suicídio depois de ser reiteradamente vítima de bullying em um colégio de elite paulistano. Ele era negro, bolsista e sofria assédio homofóbico. Como a escola não o protegeu? O que os pais ensinam a seus filhos em casa?

Irapuâ Santana - Emenda inconstitucional


O Globo

Interferir na igualdade de chances entre grupos étnicos contraria o objetivo que a Constituição estabelece: combater o racismo

Na última semana foi promulgada a Emenda Constitucional 133, que retira a possibilidade de punição aos partidos políticos que praticaram racismo contra a população negra brasileira nas eleições de 2020 e de 2022. Segundo essa nova regra, “deve ser considerada como cumprida” a obrigação de aplicação das verbas eleitorais para as candidaturas negras.

Para diminuir o peso desse absurdo, existe uma condição de que isso só acontecerá se os partidos pagarem o que foi devido até então, mas apenas a partir de 2026.

Existe alguma esperança de que isso realmente seja respeitado?

Marcus André Melo - O presidente é refém?

Folha de S. Paulo

Mudança decorre de alterações como a impositividade do orçamento e também de fatores contextuais

O que explica as mudanças recentes no padrão de relações Executivo-Legislativo? Tratei do assunto aqui e aqui. Sim, o "equilíbrio de presidente forte" que vigeu até o governo Dilma está sob forte tensão. A mudança decorre de alterações tais como a impositividade do orçamento (PECs 86/2015 e 100/2019), a criação do fundo de campanha, as limitações às medidas provisórias (EC 32), e a centralização das casas legislativas pós-pandemia (fortalecendo lideranças congressuais em detrimento das partidárias).

E também fatores contextuais que levaram às alterações citadas: crises econômicas, escândalos, declínio da popularidade presidencial, situação fiscal crítica e redução do tamanho do partido do presidente e de sua base congressual, além do novo protagonismo do STF (ora em aliança —como no atual momento— ou em oposição ao executivo).

Lygia Maria - O STF não é a democracia

Folha de S. Paulo

É um órgão do Poder Judiciário e, assim como Executivo e Legislativo, está sujeito ao escrutínio popular e da imprensa

"A liberdade é um tema ao qual me tenho preso". Seguindo o aforismo de Millôr, vamos falar sobre o STF, de novo. Afinal, a corte é guardiã das liberdades expressas na Constituição e tem agido de forma duvidosa sob pretexto de defendê-las —desde 2019, pelo menos, quando foi aberto o inquérito das fake news.

Alexandre de Moraes abriu investigação para apurar a revelação de mensagens que mostram ações fora do rito por parte de seu gabinete. Chama atenção o tom conspiratório e falacioso do documento.

Deborah Bizarria - Aprendemos a lidar com outsiders?

Folha de S. Paulo

Um dos principais motivos para o crescente apoio a candidatos é a desconfiança nas instituições tradicionais

Nos últimos anos, a política global tem sido marcada pela emergência de "políticos de fora" ou "outsiders", indivíduos ou grupos que operam à margem dos sistemas partidários tradicionais. Podem tanto ser pessoas que acreditam na democracia e desejam se engajar para contribuir na correção de falhas no sistema político, quanto aqueles que se apresentam como antissistema e buscam subverter a ordem estabelecida.

Como sabemos, a internet tem um papel essencial nesse fenômeno. Por meio das redes sociais, esses atores conseguem contornar os tradicionais "gatekeepers" e se comunicar diretamente com o público. Isso permite a construção de movimentos, a mobilização de recursos e a disseminação de suas mensagens sem a necessidade de apoio de partidos ou grandes veículos de comunicação.

Bruno Carazza - Uma visão distópica de um Brasil que deu errado

Valor Econômico

Em 2033, no primeiro governo pós-polarização, um país paga o preço de péssima escolhas de parlamentares 

O ano é 2033 e mais uma crise paralisa o país. O novo presidente busca um acordo com os presidentes da Câmara e do Senado para aprovar um pacote de medidas para tentar salvar seu governo.

Transcorrida a metade de seu mandato, o ocupante do Palácio do Planalto, vencedor das primeiras eleições após o fim do longo ciclo em que a política brasileira ficou polarizada sob a influência de Lula e Bolsonaro, vivia um impasse.

Não havia sido fácil chegar ali. Os analistas políticos haviam classificado a disputa presidencial de 2030 como “a eleição do cansaço”.

As velhas fórmulas políticas da década que se encerrava estavam desgastadas. Eleitores à direita e à esquerda haviam se dado conta da energia gasta em tantos anos de brigas nas redes sociais e no convívio social e resolveram dar crédito àquele candidato que propunha o básico: melhorar as políticas públicas com foco nos mais pobres e destravar a economia para a prosperidade das empresas.

Alex Ribeiro - Mercado acha BC confuso e põe prêmio de risco no juro

Valor Econômico

Galípolo foi mal entendido quando negou que o BC estivesse num córner

Os participantes do mercado financeiro consideraram confusa e contraditória a mais recente comunicação de política monetária do Banco Central e adicionaram prêmio de risco na curva de juro futuro.

Algum nível de volatilidade era esperado, já que o cenário econômico está bem incerto no Brasil e no exterior e, nesse ambiente, os banqueiros centrais evitam compromissos muito firmes sobre o que pretendem fazer com as suas taxas básica de juros.

Assim, os preços dos ativos financeiros oscilam ao sabor dos novos dados e informações divulgados. Mas, no caso do Brasil, não foi só isso. O sobe e desce tem ocorrido durante pronunciamentos de membros do Copom. Como essas falas não têm sido poucas, a volatilidade é mais intensa.

Gustavo Loyola - Subir ou não subir, eis a questão

Valor Econômico

Não é crível se esperar uma melhora substantiva do resultado fiscal nos próximos dois anos

Estão divididas as expectativas dos analistas sobre a decisão a respeito da taxa Selic que o Copom adotará em sua próxima reunião, em meados de setembro próximo. Isso ocorre porque, no momento, podem ser considerados tanto fatores que apontam para o início de um processo de alta de juros quanto para a manutenção da taxa em seus patamares atuais.

A última pesquisa Focus trouxe elevação das estimativas para o IPCA em 2024 pela quinta semana consecutiva (de 4,20% para 4,22%), embora tenha havido redução das expectativas para 2025 pela segunda semana consecutiva (de 3,97% para 3,91%). Considerando todo o horizonte de tempo contemplado na pesquisa, não se prevê a convergência da inflação para a meta de 3% ao ano.

Não obstante a atual taxa Selic (10,5% ao ano) possa ser considerada restritiva do ponto de vista monetário, a verdade é que não parece ser suficiente para assegurar a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante para a política monetária. Em princípio, dadas as dificuldades de estimativa da taxa neutra de juros - variável não observável - trata-se de uma situação que exige cautela do Banco Central (BC), não se podendo descartar, a priori, um ajuste para cima da taxa Selic já na próxima reunião do Copom.

André Gustavo Stumpf - A crise do sistema

Correio Braziliense

As principais cabeças políticas brasileiras precisam pensar seriamente na adoção do parlamentarismo. É um sistema mais simples, de maior representatividade e vacinado contra crises

Por inércia e inapetência, o governo Bolsonaro deu início, por acaso e por consequência de sua omissão nos quatro anos de mandato, a um sistema de governo muito próximo ao parlamentarismo. O presidente entregou o Orçamento ao centrão, abdicou de determinar gastos e obras, abandonou o projeto de construir um novo país para tentar apenas a própria continuidade no Palácio do Planalto à custa do golpe de Estado comandado por alguns militares de alto coturno. Quando os gatos saem, outros bichos tomam conta da casa.

Os parlamentares descobriram que poderiam encaminhar verbas à vontade para suas bases sem qualquer tipo de controle. A famosa emenda Pix dispensava o seu autor de indicar o beneficiário, o nome do responsável e revelar as fontes de financiamento do Orçamento da República. Um festival de saques a descoberto. Sem qualquer responsabilidade e, pior, sem o mínimo respeito por qualquer tipo de planejamento ou atenção às urgências do município. Algumas cidades do Brasil receberam uma profusão de chafarizes para ornamentar seu centro. Sem noção da necessidade ou de outras carências. 

Diogo Schelp - Marçal e o sistema

O Estado de S. Paulo

Marçal quer surfar na onda desbravada por Bolsonaro. Ele não precisa de um marçalismo

Pablo Marçal, candidato do nanico PRTB à Prefeitura de São Paulo, ameaça a hegemonia de Jair Bolsonaro no campo da direita autoritária? Não há dúvida de que o influenciador de autoajuda conseguiu atrair para si a intenção de voto de eleitores bolsonaristas que hesitavam em aderir ao prefeito Ricardo Nunes, apoiado pelo ex-presidente.

Mas estaria Marçal ganhando envergadura para substituir o próprio Bolsonaro como messias desse público?

Alguns analistas ponderam que o autonomeado coach não representa uma ameaça para Bolsonaro porque, apesar dos violentos embates online com os seus filhos, faz questão de se manter identificado com ele.

Ora, tudo o que Marçal quer é surfar na onda desbravada por Bolsonaro, não produzir um tsunami próprio. Marçal não precisa de um marçalismo.

Muito mais eficiente é ser o herdeiro do bolsonarismo. Se Bolsonaro não o reconhece como tal, tudo bem. O que importa é o reconhecimento dos eleitores de Bolsonaro.

Denis Lerrer Rosenfield - Amadurecimento democrático

O Estado de S. Paulo

Se olharmos as administrações estaduais, observaremos a preocupação com a responsabilidade fiscal, o cuidado com a educação, a confiança nas eleições

Lula da Silva não foi eleito por suas ideias e projetos, aliás inexistentes, mas por ter se colocado como alternativa a Jair Bolsonaro. Chegou a encarnar, a despeito das convicções nada democráticas de seu partido, sendo o apoio à fraude eleitoral de Nicolás Maduro o seu exemplo mais escandaloso, uma frente “democrática”. Os cidadãos que o elegeram o fizeram por ter podido se apresentar como a concretização do “não”. Foi eleito por ser anti o presidente de então, e não por ter algo a propor.

Bolsonaro perdeu as eleições por falar demais, não saber silenciar em momentos cruciais, pela falta de empatia com as vítimas da covid e por ter enveredado para um ataque às instituições democráticas. Sua contestação das urnas eletrônicas foi um exemplo de até onde poderia ir, embora tenha sido freado de ir mais além. Se mais moderado tivesse sido, muito provavelmente teria ganhado a eleição. Um eleitorado de centro, não petista, terminou por abandoná-lo. Não soube ter a cautela que o momento exigia.