segunda-feira, 21 de outubro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

É sensata iniciativa da Fazenda para plataformas digitais

O Globo

Proposta do governo segue regulação da concorrência adotada na UE. Seria uma lástima se parasse no Congresso

As diretrizes do Ministério da Fazenda para regular a competição entre as grandes plataformas digitais são sensatas e devem ser aprovadas quando forem analisadas no Congresso. Como mostra a experiência internacional, a ausência de regras é perniciosa à livre concorrência e ao interesse dos consumidores. Controladoras dos mercados em que atuam, as plataformas sufocam a concorrência em benefício próprio. Privilegiam produtos delas mesmas, forçam a assinatura de acordos de exclusividade em vendas casadas e compram concorrentes antes que virem ameaça. Ao propor o fim do vale-tudo no mercado digital, a Fazenda pretende colocar o Brasil no rol dos países com os melhores padrões de regras concorrenciais.

A proposta de regulação tem como inspiração a experiência da União Europeia (UE). Estabelecida recentemente, a lei europeia determina regras que as principais plataformas são obrigadas a seguir. Estão sujeitas a elas Alphabet (dona de Google e YouTube), AmazonApple, Booking, ByteDance (TikTok), Meta (FacebookInstagram e WhatsApp) e Microsoft (LinkedIn). Para definir os alvos da regulação, empresas a que a Fazenda atribui “relevância sistêmica”, serão necessários critérios sobre faturamento (local e global), número de usuários, política de acesso a dados pessoais e de fornecedores.

Fernando Gabeira - Caminhamos nas trevas

O Globo

Não é saudável ficar dependendo de elefantes como a Enel. Não funcionam nem investem o necessário

O curso dos acontecimentos é cruel. Passaram os incêndios no Brasil, a dor lancinante em Gaza se estendeu ao Líbano, quase não se fala nela, e, agora, o apagão na maior metrópole do país passará rápido também. Como também estou passando e passarei, não hesito em abordar esse tema.

Estava em São Paulo na noite de sexta, 11 de outubro, quando caiu a tempestade. Na manhã de sábado, fui pegar para viajar uma pessoa que passara por uma cirurgia: ela estava com as malas tentando descer as escadas de um prédio sem luz. Pensei nessa contradição: uma cidade com grandes hospitais e medicina avançada, mas com um serviço de energia vagabundo. Confesso que já vi apagões em Boa Vista, quando dependiam da energia da Venezuela, e comentei aquele longo apagão de Macapá, que, por sinal, definiu as eleições de 2020 contra o governo.

Miguel de Almeida - PT. o fim?

O Globo

Partido envelheceu, e os trabalhadores já não são mais os mesmos

Talvez a frase inspirada em Gore Vidal — o PT é como uma velha senhora: tem muito passado e nenhum futuro — possa causar arrepios num ou noutro militante renitente. Mas não é injusta. Basta a patacoada do partido em apoio à vitória forjada de Nicolás Maduro, até em oposição à reticência diplomática abraçada por Lula da Silva, para entender como a velhice traz bico de papagaio.

Criado em São Paulo, em 1980, quando ainda não havia caixa eletrônico, numa exótica reunião de sindicalistas, religiosos de esquerda e professores universitários, o PT no recente primeiro turno abocanhou apenas três prefeituras no interior do estado — Santa Lúcia (candidato único); Lucianópolis (2.255 habitantes); e Matão (79.033 almas). Foi o mesmo número alcançado pelo risível Novo.

Existem esperanças em mais três cidades no segundo turno. Entre elas, Diadema, a primeira cidade tomada pelo partido na eleição de 1982, então com 228.663 habitantes, com 23 mil votos para Gílson Menezes. Aquela vitória lendária deu emprego a muita gente — começava então o estilo de administração petista. Esqueça o mérito, vale a filiação e, agora, o conceito sempre ampliado de cotas — fala-se no momento na inclusão de indígenas cadeirantes com TDAH.

Irapuã Santana - A urna fala

O Globo

Eleitor busca pragmatismo, algo que tenha impacto na vida dele, concreto, palpável

Depois dos resultados do primeiro turno das eleições municipais, é preciso entender a foto do eleitorado brasileiro a fim de projetar não apenas o que ocorrerá no segundo, mas também a corrida de 2026.

De 155.912.680 aptos a votar, 21,71% não compareceram às urnas, número muito maior que em 2016, quando houve 17,58% de abstenção, e pouco menor que em 2020 na pandemia (23,15%). Em 2022, a abstenção também foi alta e chamou a atenção, mas, ainda assim, mais baixa, 20,9%. É um recado claro da população, expondo sua desesperança nas instituições políticas, entendendo que seu voto não tem poder algum.

Só no município de São Paulo, mais de 2,5 milhões de eleitores deixaram de votar, soma que supera os votos obtidos por Ricardo Nunes (1,8 milhão) e Guilherme Boulos (1,77 milhão).

Entrevista | Dorothea Werneck: Movimentos trabalhistas precisam entrar no século 21

Emerson Voltare / Folha de S. Paulo

Ex-ministra do Trabalho defende reforma trabalhista e sugere que profissionais se organizem por empresa, e não por categoria

As relações de trabalho mudaram drasticamente e os movimentos trabalhistas precisam entrar no século 21 se quiserem recuperar alguma relevância, defende Dorothea Werneck, 76, primeira mulher a ocupar um cargo de ministra na redemocratização brasileira.

Ela defende que a organização dos trabalhadores deve se dar no âmbito de uma empresa, não de uma categoria. "Cada empresa tem a sua realidade. Uma é completamente diferente da outra. Quando você unifica, fica pela média baixa. Medíocre."

Ministra do Trabalho (1989-1990) e da Indústria e Comércio (1995-1996), com forte articulação com os sindicatos, Dorothea elogia a reforma trabalhista de 2017, que abriu novas possibilidades. "Deixe a mão de obra livre. Quanto menos regulamentação, melhor", afirma.

Atuante na vida pública quando os grandes problemas eram inflação e dívida externa —hoje controlados—, a economista mineira aponta que a emergência climática é prioridade número um da economia brasileira atual, à frente das contas públicas, da reforma tributária, das novas relações de trabalho ou da revolução tecnológica.

Para Dorothea, a atuação do governo Lula nessa área tem sido "zero à esquerda", e setor público, iniciativa privada e sociedade ainda não estão falando a mesma língua. "Acho que as coisas ainda vão piorar até encontrarmos um consenso mínimo", disse à Folha numa conversa por vídeo, de sua casa em Brasília, em uma tarde sufocada pela fumaça das queimadas.

A ex-ministra também minimizou um episódio de machismo que ganhou as manchetes em 1989, quando o então presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) Mario Amato (1918-2016) afirmou que a ministra do Trabalho "era muito inteligente, apesar de mulher".

"Na verdade, tinha pena da ignorância dele. Quando tive a oportunidade, até acabei agradecendo pessoalmente: ‘Mario, obrigado por ter me inspirado. Estava quase acabando um livro, mas não tinha um título para obra. Agora encontrei’." O livro "Apesar de ser mulher", lançado em 1990, narra experiências da economista no cenário político da época.

Bruno Carazza - O PL dos supersalários vai aumentar as despesas

Valor Econômico

Haddad e Tebet precisam ter cuidado com o cavalo de Troia da proposta que quer acabar com penduricalhos

De tempos em tempos surge em Brasília a esperança de que alguma proposta legislativa vai provocar profundas mudanças em algum dos nossos imensos desajustes econômicos.

A bola da vez é o PL nº 2.721/2021, popularmente conhecido como PL dos Supersalários, que promete acabar com os penduricalhos que fazem com que uma pequena elite de servidores públicos receba mais do que o teto remuneratório previsto na Constituição, atualmente em R$ 44.008,52 (o subsídio mensal dos ministros do Supremo Tribunal Federal).

O item já apareceu em entrevistas dos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet e vem sendo apontado como um dos pilares do pacote de medidas de corte de gastos que o governo deve anunciar após o segundo turno das eleições municipais. Diz-se que a aprovação do PL pode gerar uma economia de até R$ 5 bilhões anuais, o que seria uma boa ajuda para manter o arcabouço fiscal em pé.

César Felício - Segundo turno disputado pode frear avanço de bolsonaristas

Valor Econômico

São Paulo é uma exceção em conjunto de pesquisas que mostram equilíbrio entre adversários

Viradas no segundo turno por definição são improváveis, mas a primeira rodada de pesquisas Quaest e os levantamentos do Datafolha e do Atlas Intel indicam que a disputa nas 15 capitais que não definiram o jogo no último dia 6 está bastante acirrada. Em dez delas a diferença entre o primeiro e o segundo colocado é inferior a dez pontos.

A mais provável virada é em Belo Horizonte, onde o prefeito Fuad Noman (PSD) está numericamente à frente de Bruno Engler (PL), que o superou no primeiro turno por quase oito pontos percentuais. Agora Noman marca 46% e Engler 39%, de acordo com a última pesquisa Quaest.

Há ainda outras três reversões a caminho, em situação atual de empate técnico: em Palmas Siqueira Campos (Podemos) aparece na frente de Janad Valcari (PL) e em Porto Velho os 19 pontos percentuais de dianteira de Mariana Carvalho (União Brasil) sobre Léo Moraes (Podemos) viraram um: ela o supera agora por 43% a 42%.

Maria Cristina Fernandes – O apelo do apagão se esgotou

Valor Econômico

No lugar do tema apagão, Boulos voltou a cobrar, com insistência, que Ricardo Nunes abra seu sigilo bancário

A brevidade com que o apagão ocupou o debate da Record demonstrou que o assunto pode ter se esgotado. A despeito da chuva leve na capital paulista ao longo do dia ter voltado a aumentar o número pessoas sem energia – 80 mil no sábado – o tema esteve longe de monopolizar os ataques do candidato de oposição, Guilherme Boulos. No seu lugar, Boulos voltou a cobrar, com insistência, que Ricardo Nunes abra seu sigilo bancário, como já havia feito no SBT durante encontro que era para ser debate e virou sabatina do candidato do Psol pela ausência do prefeito.

Diogo Schelp - Pablo Marçal estava no debate

O Estado de S. Paulo

Boulos procurou apresentar Nunes como gestor fraco; o prefeito o tachou de defensor de bandido

Em comparação com as cadeiradas, os socos e os apelidos caluniosos que deram o tom da campanha no primeiro turno para a Prefeitura de São Paulo, o debate Estadão/Record entre Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) pareceu uma discussão entre cavalheiros.

Segundo parâmetros normais de debates políticos, contudo, o de sábado passou longe de ser morno ou civilizado. Nunes e Boulos estavam dispostos a ferir de morte a honra um do outro.

Denis Lerrer Rosenfield - Igualdade

O Estado de S. Paulo

A igualdade de oportunidades e a igualdade civil foram conquistas da ‘direita’, e não da ‘esquerda’

A esquerda perdeu o rumo. Da proposta que orientou o pensamento marxista desde o século 19, até os seus desdobramentos totalitários no século 20, pouco restou daquela ideia que outrora pareceu universal, voltada para a emancipação de todas as pessoas. Sua realização prática foi o comunismo soviético com seu cortejo de repressão, tortura, assassinatos, de inimigos e amigos, desembocando na fome, tendo o Holodomor da Ucrânia como um dos seus exemplos mais aterradores. O cortejo fúnebre seguiu com o maoísmo na China, eliminando por sua vez mais de 60 milhões de seus habitantes, com a aniquilação de quaisquer liberdades. No Camboja, o horror ainda se revelou mais horripilante, com o assassinato de 50% de sua população. Poderíamos seguir o cortejo na Albânia, nos países da Europa Oriental, até os nossos esbirros em Cuba, dos Castros, e na Venezuela, de Hugo Chávez e Nicolás Maduro. Aliás, ícones da esquerda brasileira em suas distintas correntes, do PT ao PCdoB e ao PSOL, passando pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) de Guilherme Boulos, agora posando de moderado para captar votos de incautos.

Ruy Castro - Eles existem

Folha de S. Paulo

Vivemos em bolhas e, pela primeira vez, vi-me em meio a um grupo de negacionistas

Um bate-papo na sala de espera de um hospital pode ser mais torturante do que a perspectiva de um exame delicado ou a expectativa por um diagnóstico. Num mau dia, ouvem-se opiniões estarrecedoras. No meu caso, foi na semana passada, pela voz de quatro ou cinco homens e mulheres, todos articulados e com leitura talvez acima da média, num ambiente —um reduto médico— em que, se não acreditamos na ciência, não sei o que estamos fazendo ali.

Marcus André Melo - Celso Furtado e o papel das instituições no desenvolvimento econômico

Folha de S. Paulo

Presidente ‘urbano’ vs Congresso ‘dos grotões’ costuma ser imagem recorrente no debate público

O Nobel de economia de 2024 foi concedido a pesquisas sobre o papel das instituições no desenvolvimento econômico. Em Political Obstacles to economic growth in Brazil (1965), Celso Furtado foi neoinstitucionalista avant la lettre. Seu objetivo era explicar por que tivemos industrialização sem política de desenvolvimento. Isso se devia à falta de "uma classe industrial armada de ideologia própria e com forte atuação", e às instituições que obstaculizavam os interesses do mundo urbano industrial.

André Gustavo Stumpf - Esperar e rezar

Correio Braziliense

Quando for conhecido o resultado da eleição norte-americana um novo ciclo político e econômico vai se iniciar no mundo. Os muros custam a cair. Mas terminam por desabar. A questão é para que lado este cenário vai se desmontar

A eleição nos Estados Unidos começou nos 47 estados que permitem o voto pelo correio. Jimmy Carter, ex-presidente dos Estados Unidos, que recentemente completou 100 anos, fez sua escolha e não pediu segredo: votou em Kamala Harris, democrata, como ele. A questão dos que se preocupam com a democracia norte-americana, uma experiência de governo com mais de 200 anos, é afastar o perigo fascista de Donald Trump, que, além de propagandear ideias autoritárias, está começando a viver dificuldades típicas de quem está próximo dos 80 anos.

A eleição presidencial nos Estados Unidos é sempre importante. Esta é particularmente importante pela qualidade dos candidatos e pelas ideias absolutamente opostas de um e outro. Kamala Harris é um produto que só pode surgir numa sociedade aberta como é a norte-americana. Ela é filha de um jamaicano com uma indiana, nascida na Califórnia, que estudou em seu estado natal e morou no Canadá. Tem uma bela carreira jurídica que chegou a colocá-la na situação de procuradora geral do Estado. É uma democrata em todo o sentido do termo. É a expressão de uma sociedade livre, soberana, capaz de administrar seu destino, sem depender de terceiros. Ela chegou aonde chegou por esforço e mérito próprios.

Poesia | Graziela Melo - Vidas desvividas

Quantas vidas
desvividas
passaram
no meu
caminho?

Revividas e
mal
vividas

sem afeto
sem afago
sem carinho!!!

Quantas vidas
divididas
pela estrada
deste mundo

e quantas almas
perdidas
neste abismo
tão profundo!

Neste universo
perverso,
oriundo
de outras
Vidas,

oriundo
de outros
mundos!!!