segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Governadores erram ao criticar PEC da Segurança

O Globo

Objetivo da proposta não é tirar poder dos estados, mas implantar combate eficaz ao crime organizado

São equivocadas as críticas dos governadores do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança, uma tentativa bem-vinda do governo federal de ampliar sua participação no combate às organizações criminosas. Reunidos em Florianópolis (SC) no final de novembro, os governantes de sete estados se manifestaram contra o projeto apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, alegando que ele enfraqueceria o poder estadual.

Na Carta de Florianópolis, afirmam que, se aprovada, a PEC trará “incertezas” às gestões estaduais. Dizem ser contra “qualquer proposta que enfraqueça os estados e reduza sua capacidade de agir de forma rápida e adequada às necessidades locais”. Acrescentam que a segurança deve ser implementada com cooperação, respeito às diferenças regionais e fortalecimento das capacidades locais, “e não por meio de estrutura centralizada, que limita a eficiência e amplifica a burocracia”.

Vivendo na distopia – Fernando Gabeira

O Globo

Não cabe mais a pergunta ingênua: onde vamos parar? Já estamos numa situação inaceitável

Escassos dezembros. Outros meses também não se repetirão muito. Mas o clima de fim de ano sempre nos força a um balanço, ao suspiro de como passa rápido o tempo, ao espanto com as surpresas da vida.

Considero-me feliz por ter passado um fim de semana colado à TV, vendo o fim de uma longa ditadura, as pessoas festejando nas ruas de Damasco, os presos saindo das masmorras, bandeiras, gritos, exilados preparando a volta.

Pensei em escrever sobre a Síria. Na verdade, estou lendo o livro de Clarissa Ward, uma repórter de TV que conta suas incursões clandestinas para documentar a oposição a Bashar al-Assad. À noite, depois de enviar suas reportagens, ela costumava se indagar como os americanos receberiam aquilo, na hora do jantar, ou mesmo levando as crianças para a cama. Tudo tão distante.

O ‘janjismo’ cultural – Miguel de Almeida

O Globo

Acredito que Janja da Silva já tenha ouvido falar da Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung. Na dúvida, ajudo: foi uma campanha de consolidação de poder a partir de 1966 contra os “Quatro Velhos” — costumes, cultura, hábitos e ideias. Como saldo, mortes estimadas entre 500 mil e 2 milhões, crise econômica brutal e, no que nos interessa aqui, a destruição do patrimônio histórico e artístico.

Entre outras boçalidades, lembra Rosa Freire d’Aguiar no delicioso “Sempre Paris”, artistas foram enviados ao campo para plantar repolho e camponeses colocados na cidade para fazer cultura. Ninguém se lembra dessas realizações, e obviamente houve desabastecimento de repolho.

É o que deve ficar do espírito do “janjismo” cultural que inspira os resultados do edital da Petrobras. São alegados R$ 250 milhões destinados às diversas áreas da produção artística. De início, rezavam as regras, seriam 30% para as afamadas cotas — gênero, raça e localização geográfica (uma tal desregionalização). Terminaram por ser 95%. São Paulo e Rio de Janeiro ficaram com os restantes 5% que escapam às citadas delimitações ideológicas.

Em linguagem corrente, aos dois principais centros culturais do país, onde se concentra o maior número de produtores e artistas, sobrou apenas 5% da verba que não se enquadra no corte de raça, gênero e localização geográfica. Como Mao Tsé-Tung, não se deseja premiar a qualidade dos projetos, tampouco a experiência do realizador. Valem os novos conceitos dados como divinos pela camarilha petista, inspirados, como se sabe, pela primeira-dama Janja da Silva.

As contradições da ‘Trumponomics’ - Gillian Tett*

Valor Econômico

Se você se sente confuso em relação a Trump, não se preocupe: incerteza é a resposta mais racional neste momento

Que raios vai acontecer com a política econômica dos Estados Unidos quando Donald Trump se tornar presidente do país? A pergunta já vem gerando preocupações generalizadas. E até os investidores supostamente mais experientes parecem perdidos quanto à resposta.

Nesta semana, por exemplo, o fundo hedge Bridgewater informou aos clientes que as “nomeações [para cargos] e a retórica” de Trump “até agora parecem sugerir que ele vai tentar pensar grande e remodelar radicalmente as instituições dos EUA, o comércio internacional e a política externa dos EUA”. Ai, ai. Na sequência, contudo, frisou que isso é apenas “um palpite”, já que há “pouca confiança agora na probabilidade dos programas”. Em português claro: tenha um plano B para proteger qualquer aposta financeira que fizer.

A regulamentação das redes e a garantia da democracia - Marcus Vinicius Furtado Coêlho*

Valor Econômico

Em situações de incitação ao crime, desinformação ou discurso de ódio, se faz necessária uma intervenção para proteger o Estado democrático e os direitos da coletividade

O crescente impacto das redes sociais no cenário global tem gerado discussões sobre a regulamentação dessas plataformas, especialmente no contexto do Estado democrático de Direito. Há mais de uma década, o Brasil já reconhecia a relevância de se estabelecer, em lei, deveres e direitos no ambiente digital.

Contudo, a evolução tecnológica e a explosão de conteúdos ilícitos nas redes deram urgência a uma resposta jurídica precisa e adaptada aos desafios impostos pela internet, como o fenômeno da desinformação e a disseminação de discurso de ódio.

A sopa de letrinhas da concentração de renda - Bruno Carazza

Valor Econômico

Decisão do STF sobre incidência de ITCMD sobre PGBL e VGBL ilustra máquina de concentração de renda

A mensagem de WhatsApp foi disparada no final do expediente de sexta-feira. A gerente de contas de um banco-boutique comunicava a seus clientes ‘prime’ que o Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, havia acabado de afastar a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) sobre os planos de previdência privada chamados de PGBL e VGBL (respectivamente Plano e Vida Gerador de Benefício Livre).

No cabeçalho do informe do banco veio o assunto: “Alerta Wealth Planning”. E é exatamente disso que a decisão do STF trata: um incentivo ao planejamento sucessório dos mais ricos.

Conservador, Galípolo surpreende o mercado - Alex Ribeiro

Valor Econômico

Alta maior que a esperada da Selic, como costuma acontecer nessas circunstâncias, gerou muita volatilidade

A alta da taxa Selic em três pontos percentuais até março, para 14,25% ao ano, foi um minichoque de juros e pegou os participantes do mercado de surpresa. Mas, apesar do aperto forte, ainda há muito ceticismo. Alguns atribuem a decisão ao presidente que sai do Banco Central, Roberto Campos Neto, e não ao que entra em janeiro, Gabriel Galípolo.

A ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, que sai amanhã, e o fim do período de silêncio do colegiado devem começar a desfazer essa impressão. Podem mostrar que o colegiado votou unanimemente pela alta mais forte de juros na reunião da semana passada, de 11,25% ao ano para 12,25% ao ano, e pela sinalização feita para subir um ponto percentual nos encontros de janeiro e março.

Braga Netto e a oportunidade - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Os conspiradores de 2022 viram oportunidade onde não havia e calcularam mal o risco de punição

A prisão preventiva do general Braga Netto é uma demonstração de que a PF, a PGR e o STF não estão dispostos a pegar leve com quem possivelmente conspirou contra a ordem democrática. Caberá à Justiça concluir se ele e outros indiciados pela tentativa de golpe, inclusive Jair Bolsonaro, são culpados. A historiadores e cientistas políticos, porém, já é permitido se perguntar por que um grupo de militares, 36 anos depois da redemocratização, se sentiu no direito – ou mesmo no dever – de arquitetar um golpe e o que os fez acreditar que poderiam ser bem-sucedidos.

A derrota do colonialismo iraniano - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

O Irã colecionou nos últimos meses uma série de derrotas que abalou todo o seu projeto estratégico de dominação do Oriente Médio

O “Eixo da Resistência” não resistiu. O “Eixo do Mal” quebrou. O Irã colecionou nos últimos meses uma série de derrotas que abalou todo o seu projeto estratégico de dominação do Oriente Médio, tendo como alvo a destruição do Estado de Israel. O Hamas foi militarmente destruído. O Hezbollah foi duramente atingido, sendo hoje uma pálida figura do que era. No Iraque continua reinando, embora o seu poder de influência seja menor. O Iêmen segue intacto, porém os seus dias estão contados. A joia da coroa, a Síria, sob o seu controle, desmoronou em dez dias. Gastou bilhões de dólares que desapareceram em um efeito dominó.

Cidades ao pé da letra - Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Todas têm um patrimônio tipográfico em suas fachadas, que só percebemos quando elas são destruídas

É raro, mas acontece —um livro nos cair às mãos e nos darmos conta de que, sem saber, esperávamos ardentemente por ele. Acaba de acontecer comigo, diante do recém-lançado "O Texto da Rua – Tipografia Pública no Rio de Janeiro", do designer gráfico Victor Burton, pela Sextante. É o primeiro livro de Burton como autor, com seu nome acima do título —ele, que tem sido responsável pela beleza gráfica de tantos livros alheios, um deles, meu.

É preciso acabar com o DDD - Ana Cristina Rosa

Folha de S. Paulo

Academia Riograndense de Letras produziu um exemplo lamentável de DDD na entrega da Premiação Literária 2024

O Brasil precisa acabar com o DDD. Não me refiro ao sistema de telefonia que conecta pessoas dos diferentes estados e municípios pela discagem direta a distância. Falo do ciclo vicioso de Desvalorização, Discriminação e Desigualdade da população negra, coisa que o procurador do estado do RS Jorge Terra, homem preto, batizou de DDD.

A desvalorização se traduz no olhar para pretos e pardos como uma gente inferior, sem reconhecer o potencial da maioria do povo brasileiro, que cotidianamente é desrespeitado e maltratado.

A discriminação se dá pelo tratamento desigual e injusto em razão da aparência.

Emendas orçamentárias - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Nos EUA o orçamento é globalmente impositivo mas o país não degenera numa espécie de localismo centrípeto

O assim chamado orçamento secreto ou emendas Pix assentam-se na ocultação da autoria das emendas. Eis um paradoxo: Por que os autores das emendas orçamentárias não reivindicam o crédito pelo seu patrocínio?

Reivindicar crédito por obras e provisão de serviços é parte essencial do que parlamentares fazem em qualquer democracia. A expressão credit claiming entrou no jargão da ciência política através da obra seminal de Mayhew, que também identificou duas outras atividades fundamentais para a sobrevivência política: a propaganda, ex. marcar presença para o reconhecimento do nome e marcar posição (position taking), que visa defender bandeiras de seu eleitorado mais que mudar políticas.