Correio Braziliense
Ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) pediu para ser transferido da 1ª Turma para a 2ª Turma da Corte.
O anúncio foi feito em plenário após condenação de kids pretos
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal
(STF) condenou, nesta terça-feira, os sete réus do núcleo 4 da trama golpista,
entre os quais os militares chamados de kids pretos, por terem integrado as
forças especiais do Exército. O grupo foi acusado de disseminar notícias falsas
para criar uma instabilidade institucional que favorecesse uma tentativa de
golpe de Estado.
O ministro Luiz Fux protagonizou os momentos
mais tensos do julgamento. Único voto divergente na condenação dos acusados de
operar a máquina de desinformação e espionagem da “Abin paralela”, ele não
apenas votou contra a condenação como também pediu formalmente sua
transferência da 1ª para a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). O gesto
evidencia seu crescente isolamento dentro da Corte e acentua a cisão entre o
entendimento majoritário, liderado por Alexandre de Moraes, e a posição
minoritária de Fux, mais restritiva quanto à caracterização do golpe e ao
alcance penal das ações.
O voto da maioria foi dado pela ministra Cármen Lúcia, que seguiu o entendimento de Moraes e entendeu pela condenação dos sete réus por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A Primeira Turma tem cinco integrantes. Além de Moraes e Cármen Lúcia, os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino votaram seguindo o parecer do relator.
Moraes descreveu o grupo como parte essencial
de uma engrenagem golpista voltada à desestabilização das instituições
democráticas e à permanência de Jair Bolsonaro no poder após a derrota nas
urnas em 2022. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os acusados
utilizaram a estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para
monitorar adversários, produzir e disseminar notícias falsas e promover ataques
coordenados às autoridades do Judiciário e à legitimidade do processo
eleitoral.
O relator sustentou que as provas revelaram a
existência de uma organização criminosa armada, atuando de forma hierarquizada
e com a finalidade de romper o Estado Democrático de Direito. Cristiano Zanin e
Flávio Dino também aderiram integralmente ao entendimento de que houve
tentativa de golpe de Estado, sustentando a condenação pelos cinco crimes
imputados.
Foram condenados Ailton Moraes Barros,
ex-major do Exército; Ângelo Denicoli, major da reserva do Exército; Carlos
Cesar Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal; Giancarlo
Rodrigues, subtenente do Exército; Guilherme Almeida, tenente-coronel do
Exército; Marcelo Bormevet, agente da Polícia Federal; e Reginaldo Abreu,
coronel do Exército.
A dissidência
Na contramão da maioria, Fux defendeu a
improcedência da acusação e a absolvição de todos os réus. Em seu voto,
argumentou que os fatos descritos pela PGR não configuram crimes de execução,
mas meros atos preparatórios ou cogitações políticas desprovidas de “lesividade
ao bem jurídico tutelado”. Para Fux, a mera intenção ou o planejamento genérico
de ruptura institucional não bastam para caracterizar tentativa de golpe de
Estado.
“De qualquer sorte, ninguém pode ser punido
pela cogitação. Os atos preparatórios não atraem qualquer resposta penal. O
intérprete da lei não deve equiparar atos preparatórios aos atos executórios”,
afirmou. Fux classificou como “absolutamente reprovável” o comportamento dos
militares e agentes públicos que integraram a estrutura paralela de
inteligência, mas avaliou que tais condutas, embora irregulares, deveriam ser
enquadradas no âmbito da improbidade administrativa, e não do direito penal.
Em relação aos crimes de dano qualificado e
deterioração do patrimônio público, o ministro afirmou que não há provas que
vinculem os réus à depredação ocorrida em 8 de janeiro. Também destacou que as
investigações não comprovaram a intenção dos acusados de interferir diretamente
no funcionamento dos Poderes da República nem a relação entre suas atividades e
os atos violentos em Brasília.
A dissidência de Fux no julgamento dos kids
pretos não foi um caso isolado. Desde o início das ações penais relativas ao 8
de Janeiro — especialmente na Ação Penal 2668, que apura a “trama golpista”
liderada por Jair Bolsonaro e militares de sua confiança —, o ministro tem
votado de forma divergente em pontos centrais. Ele rejeita a tese de que os
ataques de 8 de janeiro configuraram tentativa de golpe de Estado.
Para Fux, os manifestantes e articuladores não
possuíam “capacidade efetiva” de alterar o regime político ou abolir o Estado
Democrático de Direito. Em suas palavras, tratava-se de “turbas desordenadas”,
e não de um movimento com estrutura e comando para a tomada do poder. Argumenta
também que o STF não seria o foro adequado para julgar parte dos réus, por não
exercerem mais cargos públicos. Defendeu que o julgamento deveria ocorrer em
primeira instância.
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