quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Fux vota contra condenação e pede para sair da Primeira Turma do Supremo, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) pediu para ser transferido da 1ª Turma para a 2ª Turma da Corte. O anúncio foi feito em plenário após condenação de kids pretos

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, nesta terça-feira, os sete réus do núcleo 4 da trama golpista, entre os quais os militares chamados de kids pretos, por terem integrado as forças especiais do Exército. O grupo foi acusado de disseminar notícias falsas para criar uma instabilidade institucional que favorecesse uma tentativa de golpe de Estado.

O ministro Luiz Fux protagonizou os momentos mais tensos do julgamento. Único voto divergente na condenação dos acusados de operar a máquina de desinformação e espionagem da “Abin paralela”, ele não apenas votou contra a condenação como também pediu formalmente sua transferência da 1ª para a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). O gesto evidencia seu crescente isolamento dentro da Corte e acentua a cisão entre o entendimento majoritário, liderado por Alexandre de Moraes, e a posição minoritária de Fux, mais restritiva quanto à caracterização do golpe e ao alcance penal das ações.

O voto da maioria foi dado pela ministra Cármen Lúcia, que seguiu o entendimento de Moraes e entendeu pela condenação dos sete réus por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A Primeira Turma tem cinco integrantes. Além de Moraes e Cármen Lúcia, os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino votaram seguindo o parecer do relator.

Moraes descreveu o grupo como parte essencial de uma engrenagem golpista voltada à desestabilização das instituições democráticas e à permanência de Jair Bolsonaro no poder após a derrota nas urnas em 2022. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os acusados utilizaram a estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para monitorar adversários, produzir e disseminar notícias falsas e promover ataques coordenados às autoridades do Judiciário e à legitimidade do processo eleitoral.

O relator sustentou que as provas revelaram a existência de uma organização criminosa armada, atuando de forma hierarquizada e com a finalidade de romper o Estado Democrático de Direito. Cristiano Zanin e Flávio Dino também aderiram integralmente ao entendimento de que houve tentativa de golpe de Estado, sustentando a condenação pelos cinco crimes imputados.

Foram condenados Ailton Moraes Barros, ex-major do Exército; Ângelo Denicoli, major da reserva do Exército; Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal; Giancarlo Rodrigues, subtenente do Exército; Guilherme Almeida, tenente-coronel do Exército; Marcelo Bormevet, agente da Polícia Federal; e Reginaldo Abreu, coronel do Exército.

A dissidência

Na contramão da maioria, Fux defendeu a improcedência da acusação e a absolvição de todos os réus. Em seu voto, argumentou que os fatos descritos pela PGR não configuram crimes de execução, mas meros atos preparatórios ou cogitações políticas desprovidas de “lesividade ao bem jurídico tutelado”. Para Fux, a mera intenção ou o planejamento genérico de ruptura institucional não bastam para caracterizar tentativa de golpe de Estado.

“De qualquer sorte, ninguém pode ser punido pela cogitação. Os atos preparatórios não atraem qualquer resposta penal. O intérprete da lei não deve equiparar atos preparatórios aos atos executórios”, afirmou. Fux classificou como “absolutamente reprovável” o comportamento dos militares e agentes públicos que integraram a estrutura paralela de inteligência, mas avaliou que tais condutas, embora irregulares, deveriam ser enquadradas no âmbito da improbidade administrativa, e não do direito penal.

Em relação aos crimes de dano qualificado e deterioração do patrimônio público, o ministro afirmou que não há provas que vinculem os réus à depredação ocorrida em 8 de janeiro. Também destacou que as investigações não comprovaram a intenção dos acusados de interferir diretamente no funcionamento dos Poderes da República nem a relação entre suas atividades e os atos violentos em Brasília.

A dissidência de Fux no julgamento dos kids pretos não foi um caso isolado. Desde o início das ações penais relativas ao 8 de Janeiro — especialmente na Ação Penal 2668, que apura a “trama golpista” liderada por Jair Bolsonaro e militares de sua confiança —, o ministro tem votado de forma divergente em pontos centrais. Ele rejeita a tese de que os ataques de 8 de janeiro configuraram tentativa de golpe de Estado.

Para Fux, os manifestantes e articuladores não possuíam “capacidade efetiva” de alterar o regime político ou abolir o Estado Democrático de Direito. Em suas palavras, tratava-se de “turbas desordenadas”, e não de um movimento com estrutura e comando para a tomada do poder. Argumenta também que o STF não seria o foro adequado para julgar parte dos réus, por não exercerem mais cargos públicos. Defendeu que o julgamento deveria ocorrer em primeira instância.

 

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