Valor Econômico
Na eventualidade de Messias vir a ser rejeitado, alternativa é indicar uma mulher que enfrente golpistas
O mapa de votos em poder do Palácio do
Planalto mostra que o ministro da Advocacia-Geral da União tem um terço dos
votos do Senado. Um outro terço votará com o presidente da Casa. O terceiro
votará contra a indicação de Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal. Sem
o apoio do senador Davi Alcolumbre (União-AP), portanto, o ministro da AGU não
chegaria a 30 votos.
O mesmo mapa parece ter norteado o presidente do Senado na carta divulgada neste domingo, um monumento à habilidade de tornar toda a Casa cúmplice de seu jogo. É possível que Alcolumbre não tenha posto cargos sobre a mesa neste momento, mas não dá para dizer que um presidente de Casa Legislativa que indica de ministérios (Desenvolvimento Regional e Comunicações) a postos comissionados do Senado, tome por ofensiva uma negociação que leve em conta a negociação de cargos.
Como a carta foi divulgada na tarde de
domingo, é possível que Alcolumbre tenha esperado todo o fim de semana por uma
chamada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou, ainda, pela confirmação de
que a mensagem com a indicação lhe seria entregue em mãos. Como Lula viaja
nesta terça para Pernambuco e só estará de volta a Brasília na quarta-feira em
que Alcolumbre marcou a leitura de uma mensagem presidencial, por enquanto,
inexistente, o presidente do Senado foi deixado com a broxa na mão em relação
ao calendário anunciado.
Até o início da noite desta segunda, não
havia encontro entre Alcolumbre e Lula agendado. Faz 40 dias que se encontraram
pela última vez, antes do embarque do presidente para a cúpula da Asean, na
Malásia. O que se sabe dessa conversa, sem testemunhas, é que Alcolumbre pediu
para Lula encontrar o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Assim foi feito.
O presidente do Senado tinha a expectativa de
que Lula reconsideraria a decisão de não indicá-lo ao STF ao ouvir sua
indisposição de disputar o governo de Minas. Só que não. O presidente seguiu
adiante com Messias. O tom da carta dificulta o diálogo, mas não o impede. A
expectativa, acalentada no Palácio do Planalto, de que Alcolumbre ceda apenas
ao sinal de que Lula deixará claro seu mérito em acolher e aprovar Messias,
faria bonito numa cartinha para Papai Noel.
Lula já deu sinais eloquentes de que vai até
o fim por Messias, mas está sendo aconselhado a maturar um plano B para o caso
de o Senado, pela primeira vez em 131 anos, rejeitar o indicado presidencial
para a Corte. Dos cinco ministros indicados por Floriano Peixoto, três não
tinham formação em direito. Foi dessa crise que surgiu a adição, ao texto
constitucional, das expressões “notável saber jurídico” e “reputação ilibada”.
Ambos os critérios, segundo o relator da
indicação, senador Weverton Rocha (PDT-MA), que almoçou nesta segunda com o
presidente, foram atendidos, mas nada disso aumenta as chances de Messias. Da
mesma maneira que o governo pretende acionar o STF contra a bomba fiscal armada
pelo Congresso com a aposentadoria dos agentes de saúde, o Senado também quer
ter ministros para desarmar, por exemplo, operações da Polícia Federal contra
seus interesses.
Como o presidente tem a prerrogativa
constitucional da indicação e não pretende cedê-la ao Senado, a única
alternativa que lhe resta é, na eventualidade de derrota de Messias, indicar um
nome cuja rejeição traga mais custo que benefício para os senadores. A recusa a
Messias pode custar dissabores aos senadores junto ao eleitorado evangélico,
mas rejeitar uma mulher que, ainda por cima, enfrenta golpistas, é um custo
inflacionado demais para mandatários de voto majoritário.
Daí porque o plano B hoje tem o nome de Maria
Elizabeth Rocha, a presidente do Superior Tribunal Militar. Não é um nome da
cozinha do Senado, mas tampouco o é da cozinha do presidente da República. E
ainda permitiria a Lula enfrentar as urnas sem a cobrança de ter cortado pela
metade a representação feminina no STF.
Procuradora-federal e doutora em direito
constitucional, Maria Elizabeth chegou a trabalhar como assessora da subchefia
para Assuntos Jurídicos da Casa Civil de 2003 a 2007, quando foi indicada para
o STM. Não chegou, porém, a estabelecer vínculos com o presidente.
Maria Elizabeth é um roteiro pronto e acabado
de um confronto a ser evitado pelo Senado. Na sua eleição à Presidência do STM,
a despeito de ser sua vez de ocupar o cargo, pela regra verbal que se vale da
longevidade na Corte, teve que votar em si mesma para ser eleita por apenas um
voto.
No ato ecumênico em homenagem a Vladimir
Herzog, nos 50 anos de sua morte, Maria Elizabeth pediu perdão às famílias de
todos aqueles que “tombaram e sofreram lutando pela liberdade no Brasil”,
inclusive à sua, pelos erros da justiça militar. Seu marido, o general de
divisão aposentado Romeu Costa Ribeiro Bastos, teve um irmão, Paulo, militante
do MR8, morto pela ditadura. Seu desaparecimento deu-se em 1972, mas a certidão
de óbito foi entregue três meses atrás.
Numa sessão sem a presença da presidente da
Corte, o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, tenente-brigadeiro da Aeronáutica,
rechaçou a fala de Maria Elizabeth e sugeriu que ela “estude mais a história do
país”. Ao responder ao ministro, em plenário, Maria Elizabeth criticou o “tom
misógino, travestido de conselho paternalista” do colega e mostrou ter retórica
capaz de fazer desse enfrentamento compreensível para mais da metade do
eleitorado nacional.

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