terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Um plano B para Lula no STF, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Na eventualidade de Messias vir a ser rejeitado, alternativa é indicar uma mulher que enfrente golpistas

O mapa de votos em poder do Palácio do Planalto mostra que o ministro da Advocacia-Geral da União tem um terço dos votos do Senado. Um outro terço votará com o presidente da Casa. O terceiro votará contra a indicação de Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal. Sem o apoio do senador Davi Alcolumbre (União-AP), portanto, o ministro da AGU não chegaria a 30 votos.

O mesmo mapa parece ter norteado o presidente do Senado na carta divulgada neste domingo, um monumento à habilidade de tornar toda a Casa cúmplice de seu jogo. É possível que Alcolumbre não tenha posto cargos sobre a mesa neste momento, mas não dá para dizer que um presidente de Casa Legislativa que indica de ministérios (Desenvolvimento Regional e Comunicações) a postos comissionados do Senado, tome por ofensiva uma negociação que leve em conta a negociação de cargos.

Como a carta foi divulgada na tarde de domingo, é possível que Alcolumbre tenha esperado todo o fim de semana por uma chamada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou, ainda, pela confirmação de que a mensagem com a indicação lhe seria entregue em mãos. Como Lula viaja nesta terça para Pernambuco e só estará de volta a Brasília na quarta-feira em que Alcolumbre marcou a leitura de uma mensagem presidencial, por enquanto, inexistente, o presidente do Senado foi deixado com a broxa na mão em relação ao calendário anunciado.

Até o início da noite desta segunda, não havia encontro entre Alcolumbre e Lula agendado. Faz 40 dias que se encontraram pela última vez, antes do embarque do presidente para a cúpula da Asean, na Malásia. O que se sabe dessa conversa, sem testemunhas, é que Alcolumbre pediu para Lula encontrar o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Assim foi feito.

O presidente do Senado tinha a expectativa de que Lula reconsideraria a decisão de não indicá-lo ao STF ao ouvir sua indisposição de disputar o governo de Minas. Só que não. O presidente seguiu adiante com Messias. O tom da carta dificulta o diálogo, mas não o impede. A expectativa, acalentada no Palácio do Planalto, de que Alcolumbre ceda apenas ao sinal de que Lula deixará claro seu mérito em acolher e aprovar Messias, faria bonito numa cartinha para Papai Noel.

Lula já deu sinais eloquentes de que vai até o fim por Messias, mas está sendo aconselhado a maturar um plano B para o caso de o Senado, pela primeira vez em 131 anos, rejeitar o indicado presidencial para a Corte. Dos cinco ministros indicados por Floriano Peixoto, três não tinham formação em direito. Foi dessa crise que surgiu a adição, ao texto constitucional, das expressões “notável saber jurídico” e “reputação ilibada”.

Ambos os critérios, segundo o relator da indicação, senador Weverton Rocha (PDT-MA), que almoçou nesta segunda com o presidente, foram atendidos, mas nada disso aumenta as chances de Messias. Da mesma maneira que o governo pretende acionar o STF contra a bomba fiscal armada pelo Congresso com a aposentadoria dos agentes de saúde, o Senado também quer ter ministros para desarmar, por exemplo, operações da Polícia Federal contra seus interesses.

Como o presidente tem a prerrogativa constitucional da indicação e não pretende cedê-la ao Senado, a única alternativa que lhe resta é, na eventualidade de derrota de Messias, indicar um nome cuja rejeição traga mais custo que benefício para os senadores. A recusa a Messias pode custar dissabores aos senadores junto ao eleitorado evangélico, mas rejeitar uma mulher que, ainda por cima, enfrenta golpistas, é um custo inflacionado demais para mandatários de voto majoritário.

Daí porque o plano B hoje tem o nome de Maria Elizabeth Rocha, a presidente do Superior Tribunal Militar. Não é um nome da cozinha do Senado, mas tampouco o é da cozinha do presidente da República. E ainda permitiria a Lula enfrentar as urnas sem a cobrança de ter cortado pela metade a representação feminina no STF.

Procuradora-federal e doutora em direito constitucional, Maria Elizabeth chegou a trabalhar como assessora da subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil de 2003 a 2007, quando foi indicada para o STM. Não chegou, porém, a estabelecer vínculos com o presidente.

Maria Elizabeth é um roteiro pronto e acabado de um confronto a ser evitado pelo Senado. Na sua eleição à Presidência do STM, a despeito de ser sua vez de ocupar o cargo, pela regra verbal que se vale da longevidade na Corte, teve que votar em si mesma para ser eleita por apenas um voto.

No ato ecumênico em homenagem a Vladimir Herzog, nos 50 anos de sua morte, Maria Elizabeth pediu perdão às famílias de todos aqueles que “tombaram e sofreram lutando pela liberdade no Brasil”, inclusive à sua, pelos erros da justiça militar. Seu marido, o general de divisão aposentado Romeu Costa Ribeiro Bastos, teve um irmão, Paulo, militante do MR8, morto pela ditadura. Seu desaparecimento deu-se em 1972, mas a certidão de óbito foi entregue três meses atrás.

Numa sessão sem a presença da presidente da Corte, o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, tenente-brigadeiro da Aeronáutica, rechaçou a fala de Maria Elizabeth e sugeriu que ela “estude mais a história do país”. Ao responder ao ministro, em plenário, Maria Elizabeth criticou o “tom misógino, travestido de conselho paternalista” do colega e mostrou ter retórica capaz de fazer desse enfrentamento compreensível para mais da metade do eleitorado nacional.

 

Nenhum comentário: