Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
sábado, 8 de março de 2025
Opinião do dia - Friedrich Engels (nossa herança democrática )
O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões
Alta do PIB está alicerçada em bases movediças
O Globo
Comemoração não deve esconder a realidade:
resultado deriva da política insustentável de gasto público
Depois de crescer 3,2% em 2023, a economia brasileira cresceu ainda mais no ano passado — 3,4%, segundo o dado oficial do IBGE. Trata-se de resultado fora do padrão. O desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) nos dois anos iniciais do atual governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi superior aos obtidos por Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro no mesmo período. A média é igual ou próxima às registradas na metade dos primeiros mandatos de Fernando Henrique Cardoso e do próprio Lula. Nos últimos 30 anos, apenas o início do segundo mandato de Lula apresentou números bem superiores. Poucos previam resultado tão positivo. O desemprego está em nível baixo, 6,5%, a informalidade em queda e o rendimento salarial em alta.
País enfim bate o recorde de 'riqueza' de 2013 - Vinicius Torres Freire
Folha de S. Paulo
PIB per capita de 2024 foi o maior; economia
desacelera mais que o previsto e investe muito pouco
Em 2013, a renda (PIB) por pessoa no
Brasil havia chegado ao nível mais alto da história. Em certa medida e na
média, portanto, os brasileiros jamais haviam sido tão "ricos".
Então, rolamos ladeira abaixo.
Apenas no ano passado, em 2024, o PIB per
capita superou aquele recorde, como pudemos confirmar nesta sexta-feira
(7), com
os dados do crescimento da economia divulgados pelo IBGE.
Foi uma temporada no inferno da Grande
Recessão (2014-2016), da quase estagnação de 2017-2019 e do desastre da
epidemia (2020-2021). Foi uma depressão causada por tolice econômica e
selvageria política em anos de azares para os quais não nos protegemos (secas
terríveis, economia mundial em crises, queda do preço dos produtos que o país
mais exporta).
O ano foi bom, sim. O crescimento do PIB e do PIB per capita foi o maior desde 2011 (a alta do PIB de 2021, de 4,8%, não conta, pois em grande parte foi recuperação do tombo de 3,3% do 2020 da epidemia). E daí?
O país das ressalvas – Alvaro Costa e Silva
Folha de S. Paulo
Estão engatilhadas duas PECS que aumentam a
impunidade de parlamentares
Igual ao governo Lula, a avaliação
negativa do Congresso bate recordes. Ao contrário do presidente, que se
desespera de olho em 2026 e corre o risco de meter ainda mais os pés pelas
mãos, senadores e deputados não estão nem aí. Findo o Carnaval, é hora de
retomar a folia.
A homologação do acordo entre os três Poderes em relação às emendas parlamentares diminuiu a crise aguda de abstinência iniciada em agosto, quando o ministro Flávio Dino, do STF, determinou a suspensão de pagamentos. O dinheiro grosso —mais de R$ 148,9 bilhões nos últimos cinco anos— vai voltar a jorrar, mas com a exigência de ressalvas.
Tribunais dizem que Trump não é rei - Oscar Vilhena Vieira
Folha de S. Paulo
Mas preocupa a omissão do Legislativo,
dominado por um Partido Republicano capturado por Elon Musk
Na política ninguém renuncia ao poder
voluntariamente. Essa premissa levou os arquitetos do constitucionalismo
moderno a engendrarem sistemas de freios e contrapesos, de forma que o
exercício do poder sempre encontre resistência no exercício de outro Poder.
Como os demais populistas de sua cepa, Donald Trump dá sinais claros do seu desconforto com os limites ao exercício do poder estabelecidos pela Constituição. O uso abusivo e sistemático de ordens executivas, driblando a deliberação parlamentar, a postura intimidatória em relação aos servidores públicos e a ameaça de descumprimento de decisões judiciais são expressões de uma disposição de alargar os limites inerentes ao exercício do poder numa democracia liberal.
A Doutrina Trump – Demétrio Magnoli
Folha de S. Paulo
Presidente dos EUA é um
oportunista de convicções políticas fluidas, mas mantém visão de mundo coerente
O Japão nos rouba,
economicamente, e a Europa aproveita-se de nós fazendo com que paguemos por sua
segurança. As duas mensagens apareceram no primeiro anúncio de TV publicado
pelo então incorporador imobiliário Donald Trump, nos idos de 1987. A figura que
hoje ocupa o Salão Oval é um oportunista de convicções políticas fluidas, mas
mantém uma visão de mundo coerente. Dela emana aquilo que deve ser descrito
como Doutrina Trump.
A "cidade brilhante no alto da colina" –a expressão, oriunda do sermão laico pronunciado em 1630 por John Winthrop, o puritano fundador de Boston, a bordo do navio Arbella, ressurgiu vezes incontáveis em discursos de presidentes republicanos ou democratas. Historicamente, para o bem ou o mal, os EUA exibiram-se a si mesmos e aos estrangeiros como um farol de reforma do mundo. Trump substitui a visão luminosa da cidade profética pela visão sombria de uma fortaleza em declínio, traída e explorada por pérfidos aliados.
Duas tolices sem tamanho - Bolívar Lamounier
O Estado de S. Paulo
Grande parte dos conflitos e rancores que se formam na sociedade é ortogonal, ou seja, perpendicular ao eixo esquerda x direita
Quem acompanha o dia a dia de Brasília não
precisa de uma lupa para perceber que não estamos voando num céu de brigadeiro.
Sabemos que a economia vai mal, com previsão de que o Produto Interno Bruto (PIB) de 2025 crescerá pouca coisa acima de 2%. Em relação à eleição presidencial de 2026, ainda não estamos cem por cento livres das candidaturas de Lula e Bolsonaro, embora a maioria saiba que a reedição dessa tragicomédia é o caminho mais curto para uma tragédia. E o cenário internacional se desarranja a olhos vistos, em razão do oceano de asnices que desabou sobre a outrora exemplar democracia dos Estados Unidos.
Quando o atravessador é o governo – Carlos Alberto Sardenberg
O Globo
A inflação não é só de alimentos. Está
espalhada. Quando a cada mês aparece um “culpado”, é sinal de que o problema é
geral
Não é a primeira vez que Lula acusa
atravessadores pelo aumento de preços. Ontem o presidente levantou essa
suspeita no caso dos ovos. Antes, havia acusado distribuidores pelo preço dos
combustíveis. A tática é manjada. Trata-se de tirar a responsabilidade do
governo, encontrar um culpado externo e prometer “ir atrás” dele. Disse ontem
que poderia tomar “medidas drásticas”.
Não explicou o que seriam, mas o cardápio é conhecido na história de governos populistas. Uma variável, muito praticada nas gestões peronistas na Argentina, é cobrar imposto sobre os exportadores para encarecer o produto no exterior, de modo que os produtores tenham de vender no mercado interno. Nunca funcionou. O exportador, diante do preço não compensatório, simplesmente deixa de produzir ou produz o mínimo para manter a fazenda funcionando. Fica o pior dos mundos. Negócio ruim para os produtores, perda de divisas para o país, escassez e preço alto para o consumidor.
Trump está em guerra com a universidade – Pablo Ortellado
O Globo
Em vez de fortalecer o pluralismo e o livre
debate, o governo tem promovido repressão seletiva que ameaça a autonomia
universitária e o próprio ideal de educação superior como espaço de pensamento
crítico
O governo Trump declarou guerra às
universidades. Essa é a opinião de 94% dos reitores de cem instituições de
ensino superior que se reuniram em Yale. Trump tem adotado, também na educação
superior, a estratégia de “choque e pavor”, impondo decisões de forma rápida e
avassaladora. A abordagem parte do diagnóstico de que as universidades foram
tomadas pelo esquerdismo woke, precisam ser derrotadas e energicamente
submetidas a novas diretrizes, mais ou menos como Viktor Orbán fez na Hungria.
Uma das primeiras ações de Trump foi congelar o financiamento federal à pesquisa. Além disso, cortou parte do financiamento dos Institutos Nacionais de Saúde, órgão responsável pelo financiamento da pesquisa em biomedicina. A medida retirou US$ 4 bilhões de apoio às instituições nos orçamentos dos projetos de pesquisa.
As melhores intenções – Eduardo Affonso
O Globo
'Ainda estou aqui' é bom por causa do
roteiro, da fotografia, da direção, das interpretações — não pelas boas
intenções
‘Ainda estou aqui’ mereceu todos os prêmios que amealhou mundo afora — o Oscar foi só o mais vistoso. E os mereceu não por contar uma história edificante de “resiliência”, “resistência”, “superação”. Nem por ter como protagonista essa nova Antígona, que luta pelo direito de saber a verdade sobre o desaparecimento do marido, poder enterrar seu corpo, conseguir uma certidão de óbito. Ou — usando uma das muitas metáforas do filme — para fazer pelo companheiro e pai de seus filhos o que fez pelo cachorro atropelado na frente de casa. É uma história forte e cheia de simbolismo, filmada enquanto o país ainda se recupera de um quase desastre institucional. Os prêmios reconheceram que havia ali um bom filme. É isso o que importa. Ou deveria importar.
Falhas e tensões mal processadas - Marco Aurélio Nogueira
Revista Será?
Não há nada pior para um governo no meio do
mandato do que uma abrupta e consistente queda de popularidade.
Diz a tradição (que remonta a Maquiavel) que
governos devem fazer o “mal”, o mais difícil e impopular, logo em seu início,
para então poder distribuir benesses ao povo na parte final. Maquiavel falava
numa época em que os mandatos não estavam predeterminados e não havia eleições.
Hoje, os governantes não têm mais como seguir o conselho maquiaveliano. A vida
ficou rápida e imprevisível demais, os problemas se acumulam e não há como
programar no calendário as intervenções governamentais. Os governos estão forçados
a seguir as imposições do real. Se forem capacitados, desenham um plano bem
articulado e procuram cumpri-lo, o que não é fácil.
Além disso, em regimes de competição eleitoral permanente, os governos são arrastados por cálculos voltados para as próximas eleições, especialmente quando podem se recandidatar. Condicionam o desempenho governamental aos movimentos eleitorais, o que torna mais difícil fazer “entregas” substantivas à população. Há muita retórica, muitas promessas e pouquíssimo tempo para que frutifiquem. Com isso, o governo se desgasta, se debate com as mãos vazias.
Não há soluções simples para problemas complexos - Marcus Pestana
Fui secretário de saúde de MG (2003/2010), presidente do CONASS (2005/2006) e titular da Comissão de Seguridade Social e Saúde da Câmara dos Deputados (2011/2018), quando conheci o SUS por dentro, sua complexidade, seus desafios e limitações.
Moral e política do petróleo - Cristovam Buarque
O dilema de Lula: olhar para a humanidade ou defender o eleitor?
O presidente Lula tem a chance de levar para a COP30, em Belém, metas ambiciosas para uma economia mundial sem combustíveis fósseis e a inclusão de compromisso com a educação para mudar a base da crise ambiental, em frágil equilíbrio pressionado pela voracidade por consumo e ganância por lucro. O problema: terá de optar entre a moral para cuidar da humanidade e a política para atender aos eleitores locais. A exploração de petróleo provoca desequilíbrios ecológicos, mas a população quer produção de petróleo na “Amazônia Azul”. Apesar da nomeação de André Corrêa do Lago e de Marina Silva, Lula perderá força moral se optar pela política e autorizar a Petrobras a fazer as pesquisas para aumentar, em vez de reduzir, a produção de petróleo. O eleitor não vota por barrar o aumento do nível do mar daqui a vinte anos, quer mais petróleo que permita reduzir o preço da gasolina.