sábado, 17 de março de 2012

OPINIÃO DO DIA – Walter Benjamin: o homem e os modernos

Isso quer dizer, porém, que somente na comunidade o homem pode comunicar em embriaguez com o cosmos. É o ameaçador descaminho dos modernos considerar essa experiência como irrelevante, como descartável, e deixá-la por conta do indivíduo como devaneio místico em belas noites estreladas. Não, ela chega sempre e sempre de novo a seu termo de vencimento, e então povos e gerações lhe escapam tão pouco como se patenteou de maneira mais terrível na última guerra, que foi um ensaio de novos, inauditos esponsais com as potências cósmicas. Massas humanas, gases, forças elétricas foram lançadas ao campo aberto, correntes de alta freqüência atravessaram a paisagem, novos astros ergueram-se no céu, espaço aéreo e profundezas marítimas ferveram de propulsores, e por toda parte cavaram-se poços sacrificiais na Mãe Terra. Esse grande corte feito ao cosmos cumpriu-se pela primeira vez em escala planetária, ou seja, no espírito da técnica. Mas, porque a avidez de lucro da classe dominante pensava resgatar nela sua vontade, a técnica traiu a humanidade e transformou o leito de núpcias em mar de sangue.

BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas II: Rua de mão única, p. 68-69. 5. ed. Brasiliense, São Paulo: 1995.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Procurador decide denunciar Chevron por crime ambiental
Blatter sela paz e recebe promessas
Pará usa Anistia e não reabre caso Curió
Dilma vai confrontar 'velhas práticas'
Emprego com carteira tem queda recorde
Juro de cheque especial do BB pode cair a 3%
Chávez volta à Venezuela após 22 dias em Cuba

FOLHA DE S. PAULO
Universidade frauda MEC e paga comissão a igrejas
Políticos vão a Lula em busca de ajuda para a crise
Governo federal não abandonou UPPs, diz ministro
Procurador vai processar Chevron por vazamento de petróleo no Rio

O ESTADO DE S. PAULO
Cresce suspeita de novo grande vazamento na área da Chevron
Lula diz a novo líder governista que apoia a 'luta' de Dilma
Mantega pode ser investigado
Justiça barra ação sobre desaparecidos
Empresas nacionais perdem rentabilidade

CORREIO BRAZILIENSE
Advogados vão perder emprego
Uma crise de R$ 27 bilhões
Pontapé, bebida e churrasco

ESTADO DE MINAS
Justiça eleva teto que tira credor da fila
Ação contra coronel Curió é rejeitada
Após relação com o Brasil azedar, presidente da Fifa garante acordo

ZERO HORA (RS)
Blatter, de bem com o Brasil
Proibição de Twitter na campanha é questionada

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Tudo azul entre Dilma e Fifa

Políticos vão a Lula em busca de ajuda para a crise

A crise entre o governo e a sua base no Congresso levou aliados do Planalto a procurar o ex-presidente Lula em busca de ajuda.

Nos últimos dias, José Sarney (PMDB-AP), Eduardo Braga (PMDB-AM), Eduardo Campos (PSB-PE) e o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral) foram recebidos por Lula.

Aliados pedem ajuda a Lula para resolver crise na base

Cúpula do PMDB se sentiu desprestigiada com destituição do líder no Senado

Dilma diz a assessores que o governo não precisa votar nada no Congresso até outubro se persistir atual clima

Valdo Cruz, Simone Iglesias

BRASÍLIA - A crise política entre o governo e a base aliada no Congresso, que se agravou nesta semana com a troca de líderes no Senado e na Câmara e ameaças de rebelião, levou aliados do Palácio do Planalto a procurarem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em busca de ajuda.

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), foi a São Bernardo do Campo anteontem à noite encontrar o petista, num momento em que a cúpula do seu partido está incomodada com o tratamento que tem recebido da presidente Dilma Rousseff.

Nos últimos dias, Lula falou ainda com o novo líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), que o visitou ontem no Hospital Sírio-Libanês, e com o governador Eduardo Campos (PSB-PE) e com o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral), muito próximo a ele.

Apesar dessa movimentação, o ex-presidente afirmou que só retomará o "ritmo normal" de suas atividades em 30 dias. Ontem, terminou o tratamento contra uma infecção pulmonar que o deixou internado por uma semana.

Segundo a Folha apurou, Sarney relatou a Lula que a base aliada vive momento de tensão com o Planalto e que é preciso buscar entendimento para pacificar os ânimos.

A cúpula do PMDB sentiu-se desprestigiada com a decisão de Dilma de trocar o senador Romero Jucá (PMDB-AP) por Braga, do grupo dissidente. Na avaliação dessa ala, ela valorizou um senador que jogava contra o governo.

À Folha, Sarney disse que a visita a Lula foi de cortesia e que o tema principal da conversa foi a saúde do ex-presidente. "Ele quis falar de política, mas eu disse que estava ali para falar da recuperação dele, de como a recuperação é importante para o país."

O primeiro sinal sério de insatisfação na base foi a rejeição de Bernardo Figueiredo, indicado por Dilma, para a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).

O episódio foi a gota d´água que levou Dilma a trocar seus líderes, o que alimentou o clima de rebelião e piorou ainda mais a desarticulação política do governo.

A confusão chegou ao ápice com as idas e vindas em torno da Lei Geral da Copa.
O governo cedeu à base recuou da liberação de bebidas alcoólicas em estádios, mas teve de voltar atrás um dia depois -negociadores palacianos não sabiam de compromisso firmado pelo próprio governo com a Fifa em 2007, que garantia a venda.

A semana tumultuada levou Dilma a reforçar orientação que já havia dado à sua equipe -votar temas de interesse do governo só quando houver segurança.

A presidente disse a assessores que, em caso extremo, pode prescindir do Congresso até outubro, quando terá de votar o Orçamento de 2013. Até lá, teria tempo suficiente para reconstruir as relações.

Isso significa que, no atual clima, o governo não votará o Código Florestal. Em relação à Lei Geral da Copa, aposta na pressão da sociedade, por se tratar de um evento popular.

Colaborou Daniel Roncaglia

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lula diz a novo líder governista que apoia a 'luta' de Dilma

O ex-presidente Lula apoia a presidente Dilma Rousseff na turbulência com a base aliada, segundo o novo líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), que o visitou em São Paulo. "A Dilma está certa. Essa é a boa luta", afirmou Lula, conforme relato de Braga. O ex-presidente também disse ao senador que o Brasil de hoje não é o de 2003, quando ele assumiu a Presidência, e que são necessárias "novas práticas políticas".

Lula dá aval à "boa luta" de Dilma com a base e defende "novas práticas políticas"

Christiane Samarco

BRASÍLIA - Fiador do governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva rompeu o silêncio das últimas semanas imposto por uma pneumonia para se enfileirar ao lado presidente Dilma Rousseff no confronto com os partidos da base aliada. "A Dilma está certa. Vale a pena essa luta, porque essa é a boa luta", afirmou Lula ao novo líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), ontem, segundo relato do próprio senador ao Estado.

Em sua primeira manifestação sobre a crise política entre o Planalto e partidos da base, o ex-presidente apoiou as mudanças feitas por sua sucessora na interlocução do governo com o Congresso. A presidente decidiu trocar os líderes do governo na Câmara e no Senado após ter sido derrotada na recondução de Bernardo Figueiredo como diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

"O momento é de transformação. O País vive uma nova realidade econômica e social, por isso é fundamental a renovação e a instituição de novos métodos e práticas políticas", teria dito Lula, segundo contou Braga. O presidente referia-se às pressões dos partidos e, mais especificamente, de grupos políticos por cargos e espaços no governo.

Braga o visitou no hospital Sírio Libanês, onde o ex-presidente ficou internado ontem para receber a última dose de antibióticos contra a infecção pulmonar que o acometeu no início do mês, em decorrência da baixa de imunidade provocada pelo tratamento de radioterapia contra o câncer na laringe.

O ex-presidente disse ao novo líder que pode contar com o seu apoio e sua interlocução. Relutante em render-se ao fisiologismo e à pressão dos partidos para fazer trocas ministeriais e com um diálogo complicado com congressistas, a presidente Dilma tem sofrido retaliações da base e ameaças nos últimos dias. A nomeação de Eduardo Braga, por exemplo, colocou o governo em posição de confronto com caciques peemedebistas como Renan Calheiros (AL) e Romero Jucá (RR), destituído do posto.

Na conversa com Braga, Lula observou que o Brasil de hoje não é mais o Brasil de 2002, quando ele assumiu a Presidência, e afirmou que era hora de fazer uma "frente pela transformação". Ao se dispor a ajudar pessoalmente o governo na pacificação da base e no diálogo com o Congresso, o ex-presidente disse que tem esperança de que esta transformação ocorra.

Conselhos. Em entrevista ao Estado (leia trechos abaixo), Braga relata que foi a São Paulo primeiramente para rever o amigo convalescente, mas também para se aconselhar com o ex-presidente. O apoio de Lula à conduta política do governo neste momento tem significado especial diante do quadro de base conflagrada, insatisfação generalizada de aliados e ameaças.

A situação se agravou na quarta-feira, quando o líder do PR no Senado, Blairo Maggi (MT), anunciou o rompimento da bancada de sete senadores com o governo. O número é significativo, pois representa quase 10% do total de 81 senadores. O partido rebelou-se após reunião do líder com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti. Blairo levou uma lista de candidatos do PR a ministro dos Transportes, mas Ideli riscou os nomes sugeridos, um a um. A conversa acabou quando a ministra disse que Paulo Sérgio Passos continuaria na pasta, embora o PR não o reconheça como indicado da sigla.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mantega pode ser investigado

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enviou ontem à Procuradoria da República no Distrito Federal pedido feito por seis senadores para investigar se o ministro da Fazenda, Guido Mantega, cometeu improbidade administrativa por causa das suspeitas que levaram à demissão do ex-presidente da Casa da Moeda Luiz Felipe Denucci. Mantega sempre disse que não sabia das denúncias de que Denucci teria recebido propina de fornecedores.

Procuradoria poderá investigar Mantega

Procurador-geral enviou a Ministério Público representação de senadores contra ministro

Ricardo Brito

BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enviou ontem à Procuradoria da República no Distrito Federal um pedido feito por seis senadores para investigar se o ministro da Fazenda, Guido Mantega, cometeu improbidade administrativa por causa das suspeitas que levaram à demissão do ex-presidente da Casa da Moeda Luiz Felipe Denucci.

Na terça-feira, seis senadores pediram a Gurgel que apurasse se Mantega teria sido omisso em manter Denucci no cargo, mesmo diante de denúncias de corrupção levantadas contra ele pela Receita e pela Polícia Federal.

O ex-presidente da Casa da Moeda foi demitido no fim de janeiro. As suspeitas são de que os R$ 25 milhões movimentados por Denucci em empresas instaladas em paraísos fiscais teriam sido fruto do pagamento de propina de fornecedores da Casa da Moeda.

Mantega sempre disse que não sabia das suspeitas que pairavam sob seu ex-subordinado, sustentando que a sugestão do nome coube ao PTB em 2008. O partido nega tê-lo indicado.

Gurgel repassou a representação para a Justiça de primeira instância porque é o foro competente para julgar casos de improbidade supostamente cometidos por ministros de Estado. Segundo o procurador-geral, ele só tem competência para investigar Mantega criminalmente, o que não é o caso.

"Não detém o procurador-geral da República atribuição para a análise desta representação, uma vez que a presente iniciativa não veicula pretensão de natureza criminal, mas exclusivamente de enfoque civil, sob a perspectiva da improbidade administrativa", justificou Gurgel, ao despachar o pedido.

Caberá a um procurador da República avaliar a representação. Entre os caminhos, ele poderá decidir se abre inquérito civil contra o ministro, move ação de improbidade (o que pode, em caso de condenação, suspender seus direitos políticos) ou arquivar o pedido.

O pedido de investigação foi subscrito pelos senadores Demostenes Torres (DEM-GO), Alvaro Dias (PSDB-PR), Aloysio Nunes (PSDB-SP), Pedro Taques (PDT-MT), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Randolfe Rodrigues (Psol-AP).

A investigação na Casa da Moeda provoca tensão no Planalto e na relação com a base aliada. Mais de uma vez Mantega se viu obrigado a explicar o episódio, num roteiro de desgaste que deve se prolongar no Congresso nas próximas semanas.

Mantega sempre justificou que a substituição de Denucci já estava em andamento e não foi consumada antes porque estava esperando ser fechado o orçamento da Casa da Moeda com os resultados de 2011. O ministro também nega que tenha usado o PTB para endossar uma indicação pessoal sua, como afirmaram deputados petebistas, e disse que nunca tinha visto Denucci antes de ele ir para a Casa da Moeda.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fora da coalizão, PR fala até em CPI da Casa da Moeda

Partidos preparam outras bombas legislativas para Dilma, como votação que tira autonomia da União para demarcar terras

Rosa Costa, Denise Madueño

BRASÍLIA - O pêndulo do PR voltou-se para a oposição e o partido já ensaia uma retaliação ao Planalto. Tão logo oficializou o rompimento na última quarta-feira, o senador e ex-ministro Alfredo Nascimento (AM) procurou o tucano Flexa Ribeiro (PA) para avisar que estava disposto a assinar a CPI da Casa da Moeda, que atinge em cheio o ministro da Fazenda, Guido Mantega. "Onde é que eu assino", indagou.

Recém convertidos à oposição, os sete senadores do PR terão a chance de marcar a mudança de posição na próxima semana. O líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), vai sondar a disposição do PR. "Se eles quiserem fazer a CPI da Casa da Moeda nós faremos", disse o tucano, referindo-se às denúncias de enriquecimento do ex-presidente da estatal Luiz Felipe Denucci.

Terras indígenas. Na Câmara, o campo está minado. Deputados da base e, principalmente, a bancada ruralista, preparam uma derrota para Dilma na próxima semana com a aprovação de uma proposta de emenda constitucional retirando poderes do presidente da República na demarcação de terras indígenas, de áreas de preservação ambiental e regiões de quilombolas.

A proposta de emenda constitucional transfere para o Congresso a palavra final sobre a delimitação dessas terras, hoje definidas por ação do Executivo.

O projeto, pronto para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, é uma das bombas legislativas com potencial para prejudicar o governo no momento em que a presidente enfrenta uma crise com sua base parlamentar. Representante do PT na CCJ, o deputado Alessandro Molon (RJ) avalia que a votação não será uma disputa entre governo e oposição, mas uma queda de braço com os ruralistas. "O que está por trás é a sanha por mais terra para exploração do agronegócio", afirmou. "Será um grave retrocesso para o País", sentenciou Molon. Ele avaliou que o Congresso estará sinalizando ao mundo que o País, ao contrário de ampliar a proteção ambiental e a defesa das populações, estará aumentando a possibilidade de diminuir essas áreas.

Reajuste. Ainda na Câmara, a comissão de Finanças e Tributação ameaça colocar para andar o projeto de reajuste salarial de servidores do Judiciário. A proposta significa um gasto adicional de estimados R$ 6,4 bilhões ao conceder aumento médio de 56% para 100 mil funcionários.

Na comissão de Fiscalização e Controle, os deputados da oposição vão insistir na votação da convocação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para explicar as disputas na direção do Banco do Brasil e a troca no comando da Casa da Moeda, provocada por suspeitas de irregularidades na gestão. Na semana passada, o governo teve apoio dos aliados e conseguiu barrar essas iniciativas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Pará usa Anistia e não reabre o caso Curió

O juiz federal João Otoni de Matos, de Marabá (PA), rejeitou ontem a denúncia do Ministério Público contra o coronel Sebastião Curió, acusado de sequestrar cinco militantes na ditadura. Para Matos, a Lei de Anistia impede a investigação de crimes daquele período. Já a ONU pediu que a Justiça do Brasil apure esses csos.

Lei da Anistia volta ao STF

Justiça rejeita denúncia contra Curió, e tribunal vai decidir se desaparecimentos estão perdoados

Carolina Brígido, Juliana Castro e Thiago Herdy

No dia em que a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu que o Judiciário brasileiro levasse adiante a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o coronel Sebastião Curió pelo crime de sequestro qualificado contra cinco militantes capturados na guerrilha do Araguaia na década de 1970, o juiz federal João César Otoni de Matos, de Marabá, no Pará, rejeitou a iniciativa. O MPF informou que vai recorrer da decisão ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

Como o grupo está desaparecido até hoje, o MPF argumentou que o crime não terminou e não poderia ser acobertado pela Lei da Anistia, que perdoou ilícitos cometidos por agentes do governo e opositores durante a ditadura militar. A tese não convenceu o magistrado paraense.

Para resolver de vez a questão, o Supremo Tribunal Federal (STF) julga na próxima quinta-feira se crimes continuados, como os desaparecimentos, estão incluídos entre os que foram perdoados pela Lei da Anistia. A Ordem dos Advogados do Brasil entrou com embargo para esclarecer o alcance da Lei da Anistia, depois do questionamento dos procuradores. Em 2010, o STF decidiu que a lei perdoou crimes políticos cometidos durante a ditadura militar, mas o MPF levantou nova argumentação que exige esclarecimento.

O juiz que rejeitou a denúncia do MPF contra Curió considerou ilegal a argumentação dos procuradores federais e ressaltou aspectos políticos. "Pretender, depois de mais de três décadas, esquivar-se da Lei da Anistia para reabrir a discussão sobre crimes praticados no período da ditadura militar é equívoco que, além de desprovido de suporte legal, desconsidera as circunstâncias históricas que, num grande esforço de reconciliação nacional, levaram à sua edição", anotou João César Matos em sua decisão.

A denúncia aponta como vítimas Maria Célia Corrêa, a Rosinha; Hélio Luiz Navarro Magalhães, o Edinho; Daniel Ribeiro Callado, o Doca; Antônio de Pádua Costa, o Piauí; e Telma Regina Cordeiro Corrêa, a Lia. Eles teriam sido sequestrados por tropas comandadas pelo então major Curió entre janeiro e setembro de 1974, levados a bases militares coordenadas por ele e submetidos a sessões de tortura. Depois disso, nunca mais foram vistos.

Para Matos, os procuradores não apontaram "documento ou elemento concreto que pudesse, mesmo a título indiciário, fornecer algum suporte à genérica alegação de que os desaparecidos a que se refere teriam sido, e permaneceriam até hoje, sequestrados".

Segundo o magistrado, para configurar crime de sequestro, não basta o fato de os desaparecidos não terem sido localizados. "Aliás, dada a estrutura do tipo do sequestro, é de se questionar: sustenta o parquet (o MPF) que os desaparecidos, trinta e tantos anos depois, permanecem em cativeiro, sob cárcere imposto pelo denunciado? A lógica desafia a argumentação exposta na denúncia", disse. O juiz também considerou que, mesmo que houvesse indício de crime, o militar não poderia ser punido, pois teria prescrito.

O advogado Adelino Tucunduva, que atua na defesa de Curió, comentou a decisão da Justiça do Pará em rejeitar a denúncia do Ministério Público Federal contra o militar:

- A decisão não é diferente do que esperávamos. Se por um lado existem procuradores afoitos, por outro há juízes com os pés no chão.

ONU pede que caso de Curió vá adiante

Antes da decisão da Justiça do Pará, a ONU divulgou nota em Genebra assinalando que o acolhimento da denúncia seria "um primeiro passo crucial na luta contra a impunidade que rodeia o período do regime militar no Brasil".

"Estamos esperançosos de que o Judiciário brasileiro vai defender os direitos fundamentais das vítimas à verdade e à justiça, permitindo que este processo muito importante vá para a frente", disse o comunicado, que remete a uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que determinou ao Brasil esclarecer os fatos e punir os responsáveis pelos crimes cometidos por agentes da ditadura no Araguaia .

A denúncia do MPF foi ajuizada na última quarta-feira. com a esperança de ser a primeira ação do país com o objetivo de punir um militar por crime cometido na ditadura. "As violentas condutas de sequestrar, agredir e executar opositores do regime governamental militar, apesar de praticadas sob o pretexto de consubstanciarem medidas para restabelecer a paz nacional, consistiram em atos nitidamente criminosos, atentatórios aos direitos humanos e à ordem jurídica", diz a denúncia.

A ação leva a assinatura dos procuradores da República Tiago Rabelo e André Casagrande Raupp, de Marabá; Ubiratan Cazetta e Felício Pontes Jr., de Belém; Ivan Marx, de Uruguaiana; Andrey Borges de Mendonça, de Ribeirão Preto; e Sérgio Suiama, de São Paulo. Em nota, os procuradores ressaltaram a importância da ação. "Não existe convicção de que as pessoas estão mortas, portanto, é fundamental que a Justiça analise os casos, permita a produção de provas, traga à luz a história dessas vítimas", diz a nota.

Em São Paulo, parentes de opositores ao regime militar e organizações de defesa dos direitos humanos lamentaram a decisão da Justiça .

- O Judiciário brasileiro está abrindo mão de mais uma oportunidade de consolidar o estado de direito no Brasil, é decepcionante - criticou Beatriz Affonso, diretora do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), entidade que levou o Brasil à Corte Interamericana de Direitos Humanos.

- Essa foi a primeira, mas não será a última vez em que juízes federais terão que se deparar com a questão. Com a decisão, retornamos a um lugar conservador e inadequado a uma democracia sólida - acrescentou Beatriz.

Irmã de três guerrilheiros que teriam sido torturados e mortos no Araguaia, Maria Laura Petit se disse indignada e frustrada pela recusa de recebimento da denúncia e acusa o Judiciário paraense de "cerceamento de direito".

- A sensação que fica é de que, politicamente, o Brasil teve avanços nos últimos anos, como eleições diretas etc. Mas, em outros níveis, sobrevivem enclaves autoritários que nos impedem de rever o nosso passado e viver uma democracia verdadeira. É isso que estamos encontrando hoje no Poder Judiciário - afirmou.

Irmão de Maria Célia Corrêa, estudante de Ciências Sociais que desapareceu no Araguaia, Aldo Corrêa já temia que a denúncia não fosse aceita:

- Era uma questão de coragem para a Justiça aceitar essa denúncia. Não importa se o Estado já havia considerado em lei que minha irmã está morta. Nós queremos saber o que aconteceu com ela, onde está o seu corpo.

FONTE: O GLOBO

Para Amorim, Comissão da Verdade é o fórum

Bruno Góes

O ministro da Defesa, Celso Amorim, evitou comentar diretamente a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o coronel Sebastião Curió, mas ressaltou ontem que a posição do governo sobre o assunto está expressa na criação da Comissão da Verdade.

- A minha posição é que nós temos para tratar desses temas a lei que criou a Comissão da Verdade. E vamos tratar da Comissão da Verdade com todos os aspectos que estão ali englobados. Vamos investigar tudo o que aconteceu, todos terão que cooperar para que se conheça a verdade, e, ao mesmo tempo, a comissão incorpora também a Lei de Anistia - disse Amorim, durante visita ao Rio, onde participou da cerimônia de imposição da Medalha Mérito Desportivo Militar aos atletas civis e militares que se destacaram em competições esportivas nacionais e internacionais.

Amorim destacou que o Ministério Público é um órgão autônomo e que "não vai dizer se ele está certo ou errado":

- A nossa posição é de dar força à Comissão da Verdade com toda a integralidade que ela tem.

O ministro aproveitou para rebater algumas críticas de militares, que consideram a comissão um ato de revanchismo.

- Vamos eliminar mitos, como esse de que a Comissão da Verdade é revanchismo. Não é revanchismo, é a busca da verdade. E a verdade é a verdade. Não existe verdade de um lado e de outro. Existe a verdade - enfatizou.

Sobre o manifesto de oficiais da reserva que criticaram o governo, Amorim acha que a situação está pacificada:

- Eu não vou ficar (preocupado) com todo mundo que se manifestar. Isso aí está controlado. Quer dizer, controlado não é uma boa palavra. Claro que é uma coisa importante, os comandantes têm conversado a respeito. As coisas têm caminhado de uma forma adequada. Agora vamos olhar um pouco para frente.

FONTE: O GLOBO

Caserna longe da crise com governo

General diz que não olha pelo espelho retrovisor

Roldão Arruda

Convidado pelo Instituto Plínio Corrêa de Oliveira para falar sobre o papel e os desafios atuais do Exército, o comandante militar da Região Sudeste, general Adhemar da Costa Machado Filho, aceitou logo o convite. Na noite de quinta-feira, ele falou durante uma hora e vinte minutos para cerca de 200 pessoas, em um clube na Avenida Paulista, em São Paulo. O clima no auditório era de intensa expectativa. Por duas razões.

A primeira era o fato de o evento ter sido programado em meio às tensões entre o governo Dilma Rousseff e militares da reserva - por causa da Comissão da Verdade. A segunda estava na origem do convite: veio de uma instituição ultraconservadora, que disputa o título de legítima herdeira da Tradição, Família e Propriedade (TFP), uma das organizações civis que ajudaram na montagem do golpe militar de 1964. Na primeira fila encontravam-se o príncipe d. Bertrand de Orleans e Bragança, que postula o título de herdeiro da monarquia brasileira, e o empresário Adolpho Lindenberg, presidente do instituto.

O general de quatro estrelas não correspondeu ao clima de tensão. Bem-humorado e comunicativo, deu a entender que a agitação da reserva não tem a repercussão que se imagina nos quartéis. Os novos oficiais estão preocupados com a profissionalização.

As queixas entre eles devem-se à lentidão na liberação de recursos para a modernização de seus equipamentos. "Somos o quinto país em extensão territorial e a sexta economia do mundo. Um país como esse precisa de Forças Armadas à altura da posição que ocupa", disse Machado Filho.

Ao final, o mestre de cerimônias fez ao general, como se citasse um bilhete encaminhado da plateia, a seguinte observação: "O que mais tenho ouvido é elogio ao período militar, em comparação com a situação atual. Urge uma intervenção. Caso contrário seguiremos nessa senda nefasta em direção à ditadura da qual nos livramos em 1964."

O general juntou as mãos e, após breve silêncio, respondeu: "Dias atrás me perguntaram: "General, quando os senhores voltam?" Respondi: "Nunca mais. O Brasil mudou"."

Em outro momento, ele falou sobre a vocação democrática do Exército: "Somos um instrumento do Estado brasileiro a serviço do governo eleito democraticamente".

A escolha dos políticos, segundo Machado Filho, é atribuição da sociedade.

Não falou diretamente sobre Comissão da Verdade, mas não a esqueceu: "Nós olhamos para o futuro. Não olhamos pelo espelho retrovisor".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Políticos questionam proibição sobre Twitter

PPS vai recorrer da decisão do TSE de punir pré-campanha no microblog; candidatos citam risco à liberdade de expressão

Bruno Góes, Juliana Castro, Tatiana Farah e Silvia Amorim

RIO, BRASÍLIA E SÃO PAULO. Políticos questionaram ontem, inclusive em seus microblogs na rede social, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de proibir campanha eleitoral no Twitter antes de cinco de julho, quando, só então, os candidatos às eleições poderão oficialmente divulgar suas plataformas. O PPS vai recorrer da proibição, e políticos manifestaram preocupação com o risco à liberdade de expressão.

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), disse que a sigla deve entrar com mandado de segurança assim que a decisão for publicada pelo TSE. Na noite de anteontem, horas após o fim do julgamento no Tribunal, ele postou no Twitter: "Decisão, no mínimo, equivocada do TSE sobre internet na eleição". Freire entende que a proibição viola o direito de livre pensamento previsto na Constituição.

Presidente nacional do PSDB, o deputado Sérgio Guerra (PE) escreveu no seu microblog que via "com preocupação a decisão do TSE", já que a iniciativa "pode acabar ferindo o direito à liberdade de expressão".

No Rio, o pré-candidato do DEM à prefeitura, Rodrigo Maia, com 8.928 seguidores no Twitter, afirmou não fazer campanha pela rede social, mas disse ser contra o entendimento do Tribunal.

- A internet, quanto mais livre, melhor para a democracia e para as eleições. O PPS anunciou que vai entrar com representação contra a decisão, e acho que tomou a atitude correta. O Democratas com certeza vai acompanhar o partido nesta decisão.

Já o candidato do PSOL, Marcelo Freixo, que tem 32.602 seguidores na rede, diz que é preciso estar atento à proteção da atividade política e do cidadão:

- Ainda preciso ler a decisão para ter a clareza do que se pretende. Uma coisa é a proibição de campanha: um candidato pedir voto, outro dar o seu número, coisas explicitamente eleitorais, e que são proibidas. Outra é o cerceamento da expressão do cidadão politicamente.

Para o pré-candidato do PSDB, deputado Otávio Leite, a situação é "complexa".

- Concordo que o pedido de voto que parte de um candidato tenha que obedecer expressamente a uma data. Agora, o cidadão não poder declarar o voto e ser acusado de fazer campanha?

Usuário frequente do Twitter, onde reúne 940.826 seguidores, José Serra (PSDB), pré-candidato do PSDB à prefeitura de São Paulo, questionou o alcance dessa nova limitação:

- Precisa ver direito qual é a resolução. Vale para quem é candidato. Mas, e para o amigo do candidato, para o partido do candidato? Se alguém te mandou um tuíte dizendo que você é um bom candidato, você faz o quê? Pode retuitar ou não?

Já o pré-candidato do PT em São Paulo, Fernando Haddad, elogiou a decisão, mas afirmou não ter página no Twitter:

- A decisão (do TSE) é correta. Não tenho Twitter, mas vou ter numa hora dessas - disse, afirmando que a rede social "não vai fazer falta" na pré-campanha.

O deputado Gabriel Chalita (PMDB), que tem 136 mil seguidores no Twitter, ponderou que a rede social deve ser vista sem tanta rigidez.

- Decisão judicial se cumpre. Acho que o Twitter não é local adequado para pedir voto ou fazer campanha. Mas também não deve haver um controle tão rígido no Twitter como sobre os meios de comunicação tradicionais.

Com pouco menos que seis mil seguidores, o deputado Celso Russomanno (PRB) também levantou dúvida sobre a regra:

- É preciso haver esclarecimento.

FONTE: O GLOBO

TSE terá dificuldade para aplicar a regra

Há questões indefinidas, dizem especialistas

A decisão do TSE de proibir campanha no Twitter antes do período eleitoral divide advogados e especialistas que atuam na área do direito eleitoral. O único consenso foi que o Tribunal terá trabalho para aplicar a regra.

Ex-ministro do TSE, Torquato Jardim alerta que ainda há questões indefinidas, como o direito de resposta e, por isso, as representações chegarão à Justiça para serem decididas caso a caso. E ressalta a dificuldade para se estabelecer um elo entre um internauta que faça propaganda antecipada - que também é enquadrado - com o candidato:

- Ainda que você identifique (o dono do perfil) e chame essa pessoa para depor, como vai se provar o vínculo?

- Eles não vão ter perna para acompanhar o Twitter de todos os candidatos - avalia Juliano Borges, cientista político do Iuperj.

Para o advogado Fernando Neves, é difícil caracterizar propaganda antecipada. Mas, assim como o advogado Hélio Silveira, ele concorda que ela não pode ser feita em lugar algum, nem no Twitter.

FONTE: O GLOBO

Políticos criticam restrição do Twitter

Decisão do TSE de proibir a pré-campanha eleitoral na rede social foi mal recebida; ontem, direção do PPS afirmou que vai recorrer

Bruno Boghossian, Fábio Grellet, Luciana Nunes Leal e Mariângela Gallucci

A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de proibir a pré-campanha no Twitter foi mal recebida no meio político e dividiu o ambiente jurídico. Partidos alegam que a regulamentação viola a livre manifestação, mas juízes e procuradores ponderam que é preciso evitar a propaganda antecipada nas redes sociais.

O PPS anunciou ontem que vai recorrer, pois avalia que a proibição viola o direito de livre pensamento. O partido pretende protocolar um mandado de segurança no próprio TSE ou uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Como bem disse a ministra Carmen Lúcia, o Twitter é como se fosse uma conversa de bar. Você vai proibir uma conversa de bar? É um atentado à liberdade de expressão", disse Freire.

O tribunal liberou a propaganda no Twitter somente a partir de 6 de julho, quando começa oficialmente a campanha para as eleições municipais. Por 4 votos a 3, a Corte entendeu que a legislação que proíbe as propagandas de pré-candidatos em meios como rádio e TV também impede a veiculação de mensagens eleitorais antecipadas no Twitter.

O presidente nacional do PSDB, Sergio Guerra, afirmou que o TSE agiu de maneira "precoce", pois o uso da internet nas campanhas eleitorais está em fase experimental e seus efeitos ainda precisam ser analisados.

"É correta a preocupação de evitar a propaganda eleitoral antecipada, mas a decisão é muito perigosa, porque pode coibir a livre manifestação", afirmou.

A sigla defende que a regulamentação das redes sociais sirva apenas para eleições realizadas após 2012. Procurados, os presidentes do PT e do PMDB não se manifestaram.

A decisão dividiu opiniões de juristas. O presidente da Comissão Especial de Direito Eleitoral e Reforma Política da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Luiz Viana Queiroz, destaca que o TSE interfere em uma relação direta entre político e seguidor.

"As regras da propaganda primam pela igualdade entre os candidatos e pelo controle do abuso de poder econômico e de comunicação. Essa limitação atinge a liberdade de comunicação e não limita o abuso do poder econômico", afirma o conselheiro.

O advogado Alberto Rollo, presidente do Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo (Idipea), também defende o contato dos pré-candidatos com seus seguidores. "No Twitter, o eleitor só vai receber a mensagem se for um seguidor do perfil do pré-candidato. Portanto, depende de um ato voluntário do eleitor. É uma situação diferente daquela que envolve o espectador ou o ouvinte", diz.

Sócio-fundador do Instituto de Direito Político e Eleitoral, Eduardo Nobre diz que o Twitter "é como uma reunião de amigos em que alguém pede votos" e portanto não deve ser limitado.

Já o ex-ministro do TSE Fernando Neves compara um post no Twitter a uma faixa em um condomínio fechado. "É proibido, antes de 6 de julho, pôr uma faixa pedindo votos no condomínio de acesso limitado. O que é um (post no) Twitter senão uma faixa de 120 caracteres?", afirma. Para o advogado, a intenção do tribunal foi garantir os limites da propaganda eleitoral, a fim de evitar abusos em outros meios.

Procurador regional eleitoral do Rio, Maurício da Rocha Ribeiro elogiou a decisão do TSE. "Não precisa ser seguidor no Twitter para ver o que uma pessoa está dizendo. Não pode usar o Twitter sem restrição, porque haverá propaganda dissimulada", sustenta.

Por recomendação do procurador, técnicos passarão a acompanhar as páginas de pré-candidatos do Rio no Twitter. "Sei que não há como monitorar todos os pré-candidatos a vereador, mas pelo menos vamos acompanhar os pré-candidatos a prefeito", afirmou.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

SP: Haddad defende TSE, Soninha ataca e Serra 'examina'

Bruno Boghossian e Felipe Frazão

A proibição do TSE provocou reações diversas a pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo. Fernando Haddad (PT), que não usa a rede social, concorda com a decisão. José Serra (PSDB), que tem quase 1 milhão de seguidores, disse que a questão ainda deve ser "examinada". Soninha Francine (PPS) considerou a resolução uma "hipocrisia". Os três concordam, porém, que políticos não devem usar redes como o Twitter para pedir votos e defendem a página como uma ferramenta de diálogo.

"Posso até utilizar, mas não para fazer campanha. Talvez para me comunicar com as pessoas", disse Haddad. Soninha criticou o TSE e afirmou que os pré-candidatos não podem ser obrigados a omitir suas opiniões políticas na rede. "É ridículo querer adiar uma discussão sobre propostas para a cidade", afirmou.

Cauteloso, Serra disse que a questão ainda precisa ser regulamentada, mas admite que o Twitter funciona como uma ferramenta política. "É um instrumento de política, sobretudo quando é um trabalho organizado, como existe do lado do PT. Eles têm uma grande tropa organizada", disse Serra, que negou que o PSDB convoque militantes para defender o partido nas redes sociais.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Decisão da Justiça Eleitoral ameaça 600 políticos em SP

Candidatos cujas contas foram rejeitadas nas eleições de 2010 podem ser barrados nas disputas deste ano

Alguns políticos já conseguiram reverter as decisões na Justiça, entre eles a ex-prefeita Marta Suplicy (PT)

Silvio Navarro, Flávio Ferreira

SÃO PAULO - A resolução do Tribunal Superior Eleitoral de retirar das eleições municipais candidatos que tiveram as contas de campanhas anteriores rejeitadas pode atingir mais de 600 políticos em São Paulo.

Nesse grupo, entretanto, alguns conseguiram reverter essas decisões na Justiça Eleitoral, entre eles a ex-prefeita Marta Suplicy (PT).

No total, 624 candidatos tiveram as contas de campanha recusadas em 2010. Mas a Procuradoria Regional Eleitoral em São Paulo, autora dos pedidos de desaprovação, ainda pode recorrer.

"Não se pode encarar prestações de contas como algo simbólico, que se faz de qualquer maneira", diz o procurador eleitoral Pedro Barbosa.

A resolução que barrou os candidatos com contas rejeitadas foi aprovada em decisão apertada (4 a 3) e gerou reação de 18 partidos. As siglas defendem que a norma entre em vigor em 2013.

As contas de Marta continham erros formais e uma doação vedada pela Lei Eleitoral no valor de R$ 200 mil.

A petista tentou viabilizar sua candidatura à prefeitura, mas acabou preterida em disputa interna do partido. Ainda assim, há setores do PT que insistem no seu nome diante da dificuldade inicial do ex-ministro Fernando Haddad em deslanchar.

O deputado Paulo Maluf (PP), que abriu mão de concorrer à prefeitura, ainda recorre ao TSE. A defesa alega que uma empresa informou incorretamente ter fornecido material à campanha.

Outros políticos que tentam reformar decisões são os deputados Nelson Marquezelli (PTB) e Mendes Thame (PSDB) e os ex-deputados Arnaldo Madeira (PSDB) e José Genoino (PT), este último assessor do Ministério da Defesa. Eles afirmam que não vão às urnas neste ano.

"É o AI-5 eleitoral, já recorri porque se trata de um erro técnico", afirmou Genoino.

"Não houve má-fé, apenas irregularidades formais", disse o tucano Madeira.

Marquezelli e Mendes Thame, que também recorrem, disseram que são apenas questões contábeis.

O ranking dos partidos com mais candidatos que podem ser barrados em São Paulo é encabeçado pelo nanico PV e pelo PSL, com 52 nomes cada um. Das siglas grandes, PMDB e PSDB tiveram 26 casos cada, e o PT, 15.

O TSE estima que 21 mil políticos tiveram as contas recusadas no país em 2010.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Recife: PSDB prepara ato com pré-candidatos

Enquanto a ala DEM-PMDB-PPS não bate o martelo sobre a candidatura à Prefeitura do Recife, o PSDB, sozinho, avança em torno do nome do deputado estadual Daniel Coelho (PSDB). Os tucanos marcaram para o dia 27 deste mês um encontro regional que reunirá todos os pré-candidatos majoritários do partido, incluindo o próprio Daniel. Além de funcionar como mais um reforço interno à postulação do ex-verde, a reunião terá como objetivo alinhar as propostas do PSDB em nível local para o pleito de outubro.

Todos os pré-candidatos serão convocados a assinar um protocolo de propostas que deverão ser defendidas ao longo da campanha em cada cidade onde houver postulação tucana. “Vamos pactuar algumas diretrizes. A ideia é dar uma unidade às propostas do partido e fortalecer nosso discurso como legenda”, assinalou Daniel.

No Recife, a previsão é que o PSDB permaneça isolado no campo das oposições, o que para o presidente nacional do partido, Sérgio Guerra, não é visto como obstáculo. “O DEM, em 2008, saiu praticamente sozinho e quase levou a eleição para o segundo turno. Isso (isolamento) não seria um problema”, avalia , descartando a hipótese da sigla abrir mão de candidatura própria na capital. Apesar da postura auto-suficiente, Guerra disse que buscará o apoio dos demais legendas da oposição assim que definirem os rumos que irão tomar.

Outra possibilidade já cogitada seria uma aliança com o PP, do deputado federal Eduardo da Fonte, bastante próximo a Guerra. A negociação, porém, está em banho-maria porque Da Fonte ainda não retirou sua pré-candidatura e se integrou ao grupo liderado pelo senador Armando Monteiro Neto (PTB) , que busca um nome alternativo ao do prefeito João da Costa dentro da própria Frente Popular.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

A fritura de Ideli pela base

Pressionada pela crise deflagrada e pela falta de trânsito com os parlamentares, a ministra de Relações Institucionais começará a semana sob ameaça de três partidos irem para a oposição ao Planalto no Congresso

Karla Correia, Gabriel Mascarenhas

Alvo das reclamações da maior parte dos parlamentares da base aliada, a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, é apontada na bancada governista como o principal combustível da crise instalada entre o Palácio do Planalto e sua base de sustentação no Congresso, mais até do que a conhecida hesitação do governo em liberar emendas parlamentares e nomear indicados políticos para cargos no primeiro e no segundo escalão. Descrita como "espalhafatosa" e "autoritária" por deputados e senadores da base, Ideli colecionou desafetos nos nove meses em que ocupa o posto responsável pela articulação política do governo de Dilma Rousseff.

Embora tenha ocupado a liderança do governo no Senado durante uma parte da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, Ideli Salvatti é vista por muitos dos antigos colegas de Legislativo como uma ministra de pouco trânsito entre os parlamentares, sobretudo na Câmara dos Deputados. O modus operandi da ministra acabou por afastar boa parte dos senadores que, inicialmente, viam nela uma representante do parlamento no Palácio do Planalto.

"Ela é garoto de recado, não tem autonomia, mas o maior problema é o tratamento. Em política, cada palavra tem peso, política é gesto. E ela ignora isso", avalia um líder do Senado, dando o tom do azedume que tem marcado os ânimos da Casa em relação à ex-senadora. É nessa situação que a ministra enfrentará uma semana decisiva no Parlamento, com três bancadas aliadas — o PR, na Câmara, mais PTB e PSC — decidindo se permanecem na base governista.

Parte da carga de rancores dirigidos a Ideli pode ser atribuída às características de sua função. Criada ainda durante o primeiro mandato da gestão Lula, a Secretaria de Relações Institucionais já teve oito titulares desde 2004. Nenhum deles chegou a passar dois anos no cargo. "É uma cadeira incômoda essa pasta. Quem senta lá, pendura um alvo nas costas. Tem que dizer "não" várias vezes no dia, muito mais do que "sim". E ela não é exatamente uma miss simpatia", alfineta um deputado.

Outro parlamentar magoado com as negativas da ministra vai mais longe: "Ela não tem o menor verniz, não sabe conversar. O episódio da saída do PR da base é uma amostra disso. Não se fala "não" para um aliado e dá as costas para ele. Tem que convencê-lo que o sacrifício de hoje é a mão estendida de amanhã".

Fama de brigona

O pulso firme de Ideli, hoje sentido pelo Congresso, vem desde os tempos de militância política em Santa Catarina. Quem acompanhou a trajetória da atual braço direito de Dilma afirma que a agressividade sempre foi característica marcante no perfil político de Ideli. "Ela é e sempre foi brigona. Nunca teve votação expressiva para cargos de governo ou prefeitura, justamente por ser combativa em excesso", resume um petista do diretório catarinense.

À frente do sindicato estadual dos professores, no início da década de 1990, Ideli participou ativamente da invasão do gabinete do então secretário de Educação, o hoje senador Paulo Bauer (PSDB-SC), durante uma das maiores greves no funcionalismo público catarinense. "Ela promoveu a paralisação junto com cerca de 600 professores e permaneceu acampada no meu gabinete por 11 dias. Um episódio emblemático marcou essa manifestação e virou folclore: "Eles fritavam ovos no hall de entrada do gabinete, e faziam festas de comemoração da ocupação dentro do prédio da secretaria", lembra Paulo Bauer. Como deputada estadual, teve papel fundamental na abertura da uma CPI contra um atual colega de cúpula: Paulo Afonso Vieira, ex-governador e hoje assessor do vice-presidente Michel Temer.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

A pseudocrise e a ética:: Fernando Rodrigues

Petistas dilmistas, em número crescente, reclamam de análises sobre a frieza e até o desprezo com que Dilma Rousseff trata políticos encrencados.

A reclamação é na linha de "a mídia criticava o ex-presidente Lula por suas alianças e por contemporizar com os políticos. Agora, resmunga por causa do tratamento duro dado por Dilma aos fisiológicos".

Não é bem assim. Se é verdade que, em certa medida, trata-se de uma pseudocrise a atual troca de farpas entre o Planalto e o Congresso, também é um fato que as coisas não vão bem na política em Brasília.

É positivo a presidente da República dar bananas sucessivas para uma certa escória política que há muito habita o Congresso. Mas tal solução tem escopo limitadíssimo. Até porque essa escumalha infesta o Legislativo apenas por se aproveitar da lassidão das regras existentes -aliás, todas elas aprovadas e sustentadas "con gusto" pelo PT.

Se os partidos existem e dão apoio nas eleições, é natural depois apresentarem suas demandas. Podem ser pleitos inconfessáveis. A presidente tem o dever de recusar o que é imoral e antiético. Muito bem.

Ocorre que o governante está obrigado também à ética da responsabilidade, como teorizou Max Weber. Fernando Henrique Cardoso recebeu Paulo Maluf no Planalto. Lula refestelou-se com Collor.

Uma das muitas missões de um presidente é trabalhar na construção de maiorias e consensos. Mesmo porque gritar "não" para os fisiológicos é fácil e alavanca a imagem de qualquer um. Difícil é encontrar dentro do atual modelo os caminhos éticos, por óbvio, para que o Congresso volte a trabalhar.

Culpar deputados e senadores é pueril e ineficaz, pois o Legislativo fica paralisado. O Brasil, atolado no atraso. E Dilma corre o risco de o país, no seu mandato, não encontrar o caminho para crescer, de maneira sustentável, acima de 3% ao ano.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Bons ventos:: Merval Pereira

Mesmo que por inércia, o Brasil provavelmente chegará à elite do capitalismo global, mas ainda não se trata de uma certeza. Esse pode ser o resumo da atualização de cenários prospectivos sobre o Brasil que a empresa de consultoria Macroplan faz de tempos em tempos, sempre com uma alta dose de acertos, e que costumo registrar aqui na coluna.

A recorrência da questão "o Brasil tem jeito?" - que motivou uma série de livros da editora Zahar para debater as perspectivas do país, da qual fiz parte em 2006 - entre pensadores dedicados à análise de nossas possibilidades futuras e à investigação da causa dos entraves nacionais é a constatação de algo preocupante para o economista Claudio Porto, presidente da Macroplan: a evidência de que está aberta uma janela de oportunidades sem precedentes para o Brasil - e que pode determinar o desenvolvimento futuro do país - e, ao mesmo tempo, a dúvida quanto ao pleno aproveitamento deste momento histórico.

No ano passado, Claudio Porto e o também economista Fábio Giambiaggi, do BNDES, organizaram o livro "2022: propostas para um Brasil melhor no ano do bicentenário", que reuniu análises de 31 autores sobre o futuro do país.

O livro parte das evidências históricas que comprovam que o Brasil atravessou vários momentos de crises e dificuldades, mas sempre em processo de acumulação de melhorias, para concluir que o país vive o seu melhor momento econômico em três décadas.

Cenários econômicos possíveis para a próxima década foram apresentados no livro, desde os que registram um crescimento sustentado entre 4% e 5,5% ao ano, um sintomaticamente denominado "Capitalismo chinês à brasileira", no qual a economia global oferece amplas possibilidades para países emergentes mais bem posicionados, até o que prevê um choque ortodoxo de capitalismo, improvável do ponto de visa político, mas que, segundo o estudo, pode ocorrer na medida que o equilíbrio fiscal tornar-se muito ameaçado e houver uma reação dos agentes econômicos e políticos no sentido de um ajuste competitivo.

O cenário menos provável prevê uma trajetória de dificuldades crescentes no cenário externo que obrigam o Brasil a fazer fortes ajustes no seu modelo econômico.

Na atualização dos cenários da Macroplan, em princípio, há motivos para o otimismo, registra Porto.

Além de dados positivos como o mercado de trabalho a pleno emprego - embora os números de fevereiro tenham sido os piores em três anos - ou o recente anúncio de que o Brasil já é a 6ª economia mundial, Porto vê bons sintomas de mudanças no ambiente público.

Para ele, não seria exagero dizer que o país, no cenário de crise internacional, passou a ser modelo no que se refere ao Proer, à Lei de Responsabilidade Fiscal e à solidez do nosso sistema bancário.

A ampliação do investimento público em 2012 - comum em anos eleitorais - deve ocorrer também em função do prazo para a Copa do Mundo e Olimpíadas.

O maior benefício desses investimentos deve ser em áreas urbanas. Também é esperada a ampliação do programa Minha Casa Minha Vida, que oferece espaço para participação do setor privado e atende a grande demanda da população.

Finalmente, o aumento do salário mínimo deve fazer crescer o salário médio do brasileiro, mas sem grande impacto na inflação.

A Macroplan destaca como fatos portadores de um bom futuro para o Brasil a óbvia exploração petrolífera do pré-sal, com a possibilidade de elevar o país à posição de 4º maior produtor de petróleo do mundo em 2030, a privatização de grandes aeroportos, que Claudio Porto considera, simbolicamente, uma espécie de "queda do Muro de Berlim" em relação ao tema "privatização", e a expansão do mercado interno.

A nova classe C terá até 2016 um poder de compra, segundo projeções da consultoria, que ultrapassará a barreira de R$ 1,4 trilhão.

Os motivos para o otimismo também extravasam as razões econômicas, analisa Porto. A mobilização social para a aprovação da Lei da Ficha Limpa e a recente decisão do Supremo Tribunal Federal confirmando a competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça são episódios que, para ele, têm enviado sinais de que os brasileiros querem construir uma nova sociedade.

O mais recente sinal portador de um bom futuro ocorreu há pouco, destaca o estudo da Macroplan: a aprovação na Câmara dos Deputados do projeto que institui novas regras para a aposentadoria dos servidores públicos, decisivo para equilibrar as contas no sistema previdenciário brasileiro.

Uma reforma que se iniciou no 1º mandato do presidente Fernando Henrique, deu um passo importante no 1º mandato do governo Lula e finalmente será regulamentada, quase 16 anos depois, no 2º ano do governo Dilma Roussef.

Uma avaliação da trajetória mais provável desses cenários indica, segundo a Macroplan, que as perspectivas são positivas.

Mas, se as evidências positivas preponderam, por que ainda nos questionamos se o Brasil tem jeito? Para o economista da Macroplan, o que nos impõe a dúvida é a falta, fundamentalmente, de uma visão de longo prazo para projetos e mudanças estratégicas para o país.

Ele alerta que as análises e as formulações políticas e econômicas no país são, quase sempre, vinculadas ao curto prazo.

"Num momento propício para lançar o país num novo ciclo de desenvolvimento econômico, a ênfase da nossa política econômica é cuidar de emergências, viés que se acentuou após a alta medíocre do PIB em 2011 e as dificuldades experimentadas pela indústria brasileira", lamenta.

E infelizmente isso não é casual. Historicamente somos um país com uma cultura imediatista, com escassa visão de futuro, diz ele. "Sem uma visão de longo prazo, corremos o risco de desperdiçar as melhores oportunidades", alerta Claudio Porto.

(Amanhã "Descontinuidades")

FONTE: O GLOBO

Número de novos empregos cai 57%

Comércio e indústria em desaceleração e menos dias úteis contribuíram para reduzir as contratações, com 159,6 mil vagas em fevereiro

Célia Froufe

BRASÍLIA - O enfraquecimento do comércio e da indústria e o número menor de dias úteis tiveram forte impacto sobre o mercado de trabalho em fevereiro. Foram criadas 150,6 mil vagas com carteira assinada no País no mês passado, uma queda de 57% ante fevereiro de 2011, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgado ontem pelo Ministério do Trabalho. A desaceleração já está no radar do governo.

"Tivemos dois trimestres fracos de atividade por causa da crise externa e de efeitos defasados das políticas do governo, como elevação de juros e medidas para enxugar o crédito", lembrou o economista da LCA Consultores Fabio Romão. "Isso pegou na atividade e, agora, no mercado de trabalho", continuou.

A fraca contratação da indústria foi um dos pontos que mais chamaram a atenção. O setor registrou apenas 19,6 mil funcionários a mais do que os demitidos no mês passado. Ainda que o setor apresente volatilidade, o volume é bem inferior aos vistos no mesmo mês dos últimos anos.

O comércio não foi diferente. Usualmente, as lojas devolvem funcionários para o mercado logo após o fim das festas de fim de ano. Desta vez, porém, o movimento começou em dezembro e não parou. Em fevereiro, o saldo líquido de emprego ficou negativo em 6,6 mil, ante uma média positiva de contratações nesse mês entre 10 mil e 15 mil pessoas.

Por fim, o "efeito calendário" prejudicou os números do Caged. É que o carnaval foi em fevereiro este ano e, em 2011, em março. Com menos dias úteis, as contratações foram menores este ano. "Houve clara antecipação das contratações em fevereiro do ano passado", comparou Romão. Naquele mês, o Caged registrou a criação de 347 mil postos.

O resultado não foi mais baixo em fevereiro porque serviços (93,1 mil novos postos) e construção civil (27,8 mil) puxaram o resultado para cima. "Construção e serviços vieram bem, mas claro que preponderaram os pontos negativos", disse Romão.

Alerta. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já mostrou que está alerta em relação ao mercado de trabalho. Na quinta-feira, ele disse que o governo apenas dará incentivo a setores produtivos que, em contrapartida, mantiverem ou ampliarem o seu quadro de funcionários. Até porque a desaceleração do mercado de trabalho não é nova, mas vem se aprofundando.

Um dado que chamou a atenção em fevereiro é que, pela primeira vez desde março do ano passado, o volume de admissões não é recorde para o período.

Até então, apesar de os saldos estarem menores, eles eram frutos de altos volumes de contratações e demissões. No mês passado, apenas os desligamentos registraram recorde para meses de fevereiro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Indústria de transformação deve continuar patinando neste ano

Setor deve ter taxas de crescimento menores que as da indústria extrativa mineral e da construção civil em 2012

Daniela Amorim

RIO - A indústria da transformação ainda crescerá bem abaixo das taxas da indústria extrativa mineral e da construção civil em 2012, segundo economistas. Em estudo exclusivo feito pela Gradual Investimentos a pedido da Agência Estado, a corretora prevê que a participação da indústria nacional no PIB aumente de 27,5% em 2011 para 27,78% em 2012.

Um resultado influenciado não exatamente pela recuperação da atividade industrial, mas pela perda relativa do setor agropecuário, que recuaria de 5,5% para 5,4% devido a problemas climáticos e menor dinamismo do setor de serviços.

Mesmo com todas as medidas de incentivo à indústria, como a desoneração da folha de pagamentos, e do esforço do governo para conter a valorização cambial, o segmento da indústria da transformação contribuirá pouco para o aumento do PIB industrial este ano, preveem analistas. A Gradual aposta em expansão puxada pela extrativa mineral.

"O que vai puxar a participação da indústria são as commodities, o que corrobora muito o argumento de quem fala em "primarização" ou desindustrialização do País", afirmou André Guilherme Pereira Perfeito, economista-chefe da Gradual.

Dentro da indústria geral, a extrativa mineral é movida por uma demanda externa ainda consistente, apesar da turbulência internacional.

Construção. Já a construção civil deve ser apoiada em 2012 tanto pelo aumento na concessão de crédito quanto por investimentos públicos e obras previstas para a Copa de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.

"A expectativa é que a indústria da transformação continue com desempenho abaixo da média, e que esse movimento possa ser compensado pelo aumento da atividade da construção, com a retomada de investimentos do governo e a aproximação de grandes eventos", lembrou Silvio Sales, consultor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

A Tendências Consultoria Integrada espera um crescimento de 3,1% para o PIB industrial em 2012. A consultoria calcula uma expansão de 4% da indústria extrativa mineral, uma alta de 4,7% na construção civil, contra um aumento de apenas 2,3% na indústria da transformação, que ficou praticamente estagnada e, 2011, com leve alta de 0,1%.

"Essas medidas do governo não são uma maravilha, mas acabam melhorando um pouco a situação da indústria da transformação", avaliou a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências, que espera um aumento de 3,2% no PIB deste ano.

Na última década, a indústria manteve sua participação no PIB ao redor de 27%. Mas o resultado foi sustentado pela expansão da indústria extrativa mineral e da construção civil, que evitaram uma perda maior de participação, apesar do acentuado recuo no setor da transformação. A fatia da indústria da transformação recuou significativamente, de 17,2% em 2000 para apenas 14,6% do PIB em 2012. Já a participação da extrativa mineral saltou de 1,6% para 4,1%, enquanto a da construção civil saiu de 5,5% para 5,8%.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Criação de vagas com carteira assinada caiu 56% em fevereiro

Saldo de 150 mil contratações é o pior para o período nos últimos três anos

Geralda Doca

BRASÍLIA. A criação de vagas de trabalho com carteira assinada no país continuou desacelerando em fevereiro, quando registrou um saldo de 150.600 contratações. Apesar de positivo, foi o pior resultado para o mês nos últimos três anos - quando a crise financeira internacional de 2008 atingiu em cheio o mercado de trabalho brasileiro - e representou queda de 56,6% frente a igual mês de 2011.

Entre janeiro e fevereiro, foram criados 269.495 postos, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho.

No mês passado, todos os setores da economia tiveram desempenho inferior ao registrado no mesmo período do ano passado, com destaque para o comércio, que ficou negativo, com 6.645 desligamentos. A agricultura eliminou 425 postos.

Mesmo nos setores que mais contrataram, o recuo foi forte, como na indústria, que apresentou saldo de 19.609 vagas, contra 60.098 em fevereiro de 2011. O mesmo aconteceu com serviços, setor que respondeu por 93.170 vagas, queda de 30,6% se comparado ao desempenho do ano passado. Esse também foi o setor que mais contratou em fevereiro, sobretudo nos subsetores de ensino, serviços de comércio e administração de imóveis, de transporte, comunicação e instituições financeiras.

A construção civil ficou em segundo lugar, com 27.811 empregos, próximo ao desempenho do ano passado para o mês. A administração pública contratou 14.694 trabalhadores com carteira assinada e a extração mineral respondeu por 1.490 vagas.

Segundo o Caged, São Paulo foi o estado que mais contratou, com saldo de 55.754, seguido por Minas Gerais, com 21.031. O Rio ficou em terceiro lugar, 16.071 vagas - o segundo melhor resultado para o mês, devido principalmente às contratações no setor de serviços e construção civil.

Todos os estados do Nordeste eliminaram postos

Influenciado pela entressafra no ramo sucroalcooleiro, com exceção do Piauí, todos os estados do Nordeste eliminaram postos de trabalho, o que fez a região registrar saldo negativo de 9.610. No Norte, Amazonas foi o único estado onde o emprego caiu, com 472 postos desativados.

As oportunidades de emprego tanto nas regiões metropolitanas, quanto no interior do país foram equivalentes no mês passado, segundo levantamento do Ministério do Trabalho. Ao todo, foram admitidos no mês passado 1.740.062 empregados e foram demitidos 1.589.462, o maior número de desligamentos para o período.

O ritmo de criação de emprego formal vem caindo desde meados do ano passado e em dezembro - mês tradicionalmente negativo - os desligamentos superaram a média. Janeiro veio positivo, mas também menor que em 2011.

FONTE: O GLOBO

Por trás dos números:: Regina Alvares

O desempenho da indústria foi muito ruim em 2011 e continua assim. A queda de 2,1% na produção em janeiro acendeu um enorme sinal de alerta no governo e a crise passou para o topo da enorme lista de preocupações da presidente Dilma Rousseff. Medidas estão sendo tomadas para atenuar os efeitos do câmbio e proteger o setor industrial, mas são ações emergenciais, paliativas, que não atacam os problemas estruturais.

O governo tem concentrado suas ações nos setores mais afetados pela valorização do real frente ao dólar e pela concorrência com os produtos asiáticos. Esses setores tiveram os piores desempenhos entre os segmentos da indústria, que, na média, cresceu só 0,2%. Têxteis recuou 14,9% e calçados e artigos de couro, 10,4%.

O economista Júlio Gomes de Almeida, do Iedi, propõe um novo olhar sobre o desempenho da indústria, que não substitui a visão do governo, mas contribui para a busca de soluções permanentes. Na lista de segmentos industriais, destaca três que se saíram bem em 2011, mesmo enfrentando os percalços do câmbio e da crise global. O exercício serve para mostrar o que está dando certo e poderia ser disseminado por meio de políticas públicas ou ações do setor privado.

O segmento de equipamento de instrumentação médico- hospitalar e ópticos é o melhor colocado nesse ranking. Cresceu 11,4% em 2011, incentivado pelo aumento da demanda interna, combinado com o fato de ser dinâmico tecnologicamente.

- A lição desse segmento é que vale a pena investir em setores de alta tecnologia, especialmente onde a demanda é crescente - explica.

O setor de outros equipamentos de transportes cresceu 7,9%, puxado pelos aviões da Embraer. O diferencial é uma primorosa cadeia produtiva. A lição, destaca Almeida, é trabalhar para que as cadeias produtivas sejam mais eficientes, adotando políticas com esse foco.

O terceiro segmento que se destacou em 2011, com crescimento de 3,2%, é o de minerais não metálicos, puxado pelo aquecimento no setor imobiliário e o programa Minha Casa, Minha Vida. A lição é que vale a pena investir em habitação e incentivar a construção. Esse novo olhar, voltado para os setores que se saíram bem na crise, pretende apontar caminhos para a recuperação da indústria ainda pouco explorados.

Se o governo incluir outros vetores na política já em curso, com foco na produtividade da indústria e incentivos aos setores com potencial elevado de crescimento, ainda vai levar um tempo, mas a indústria acabará dando a volta por cima e de forma sustentada, sem a tensão da competitividade deficiente, destaca o economista do Iedi.

FONTE: O GLOBO

Pedi, e não recebereis:: Celso Ming

Dá para entender a impaciência dos dirigentes da indústria com as soluções tipo "meia-boca" apresentadas pelo governo, destinadas a conter o esvaziamento do setor. Mas eles também são responsáveis por essa mediocridade de políticas. Aceitam e aplaudem esse jogo.

Esses dirigentes criticam todos os dias o tratamento à base de cosméticos proporcionados pelo governo, mas, quando vêm, as acabam aceitando sob o argumento de que, afinal, é melhor isso do que nada.

Os dirigentes da indústria têxtil, por exemplo, aplaudiram a desoneração das contribuições sociais. E, semanas depois, reclamaram de que foi pouco. Agora cobram contribuições extras dos seus associados, de R$ 600 milhões neste ano, declaradamente para financiar consultorias e iniciativas de defesa comercial. Sabem que nada disso melhorará sua competitividade perdedora nem acrescentará um dólar sequer nas exportações. No entanto, insistem nessas iniciativas, que dão impressão de que "estão fazendo alguma coisa". Não centralizam esforços no que poderia melhorar de fato suas condições de negócio: reforma tributária; investimento em infraestrutura; derrubada de custos financeiros.

Na semana passada, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, avisou que a renegociação das concessões das hidrelétricas, que estão para vencer, não contribuirá para baratear a tarifa - a quarta mais cara do mundo. Surpreendentemente, nenhum dirigente industrial mostra indignação contra essa passividade.

Toda a chamada política industrial está funcionando à base de improvisações, paliativos e "cala-bocas", em geral distribuídos para quem grita mais alto. Nada vem que, de fato, enfrente o problema principal: incapacidade da indústria brasileira de tirar proveito de um mercado consumidor interno que cresce quase o dobro do PIB, num ambiente inédito de pleno emprego e abundância nunca vista de crédito externo a juros rastejantes.

O governo alardeia que passou a exigir conteúdo nacional nos fornecimentos da Petrobrás, política que deveria priorizar interesses dos produtores. No entanto, o mesmo governo impõe política de preços dos combustíveis às custas do caixa da Petrobrás que, de cambulhada, também arrebenta o setor do etanol, até há pouco entendido como altamente competitivo.

A indústria acha que sabe fazer lobby e pressionar o governo, mas se limita quase sempre a pedir mais câmbio e mais isenções tributárias, mesmo sabendo que não há condições práticas de que o governo possa ir fundo nessas concessões.

A que câmbio, por exemplo, a indústria recobraria sua competitividade? O ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, tem opinião formada sobre isso. Ele diz que, "no atual estado da arte", abaixo de R$ 2,50 por dólar não se garante futuro para a indústria. E, no entanto, um câmbio à altura dos R$ 1,90 já parece impraticável para a economia do Brasil. Não é por faltar câmbio que o moderno grupo Coteminas está fechando fábricas no Nordeste.

Se pressões por mais câmbio não têm futuro, então é preciso voltar ao ataque às questões de fundo, que constituem o chamado custo Brasil. Mas o empresário prefere aplicações de doses de morfina a enfrentar o doloroso processo da quimioterapia que salvaria seu negócio.

CONFIRA

O gráfico mostra o ritmo do emprego com carteira registrada no Brasil.

Dilma desautoriza. No Confira passado, esta coluna comentou que a presidente Dilma Rousseff, em encontro com sindicalistas, mencionou como exemplo a não ser imitado a política econômica da Argentina, que produziu inflação de 20% em 2011, embora suas estatísticas oficiais apontem para apenas 9,5%. Nesta sexta-feira, nota oficial do Palácio do Planalto diz que a presidente Dilma desautoriza comentários feitos em seu nome, por terceiros, sobre a situação econômica na Argentina.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Trabalhadores de Jirau mantêm paralisação

Até o final da tarde de ontem, cerca de 16 mil trabalhadores permaneciam em greve no canteiro de obras da Hidrelétrica Jirau, no Rio Madeira, em Porto Velho (RO). Outros cinco mil funcionários que não aderiram à paralisação foram dispensados das atividades pelo Consórcio Energia Sustentável do Brasil, para evitar tumultos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Esforço para entender o Brasil - José Murilo de Carvalho. Entrevista

O historiador José Murilo de Carvalho, um dos principais nomes do pensamento nacional, critica a demonização da elite intelectual e diz que as universidades do País estão mais autorreferentes, afastando-se da 'mentalidade colonizada'

O historiador José Murilo de Carvalho está otimista. Ele acredita que, graças à multiplicação dos cursos de pós-graduação, o mundo acadêmico nacional começou a abandonar o que chama de “resíduo de mentalidade colonizada”, isto é, a deferência excessiva ao pensamento de autores estrangeiros. Membro da Academia Brasileira de Letras e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carvalho é um dos principais estudiosos de História do Brasil e, por extensão, uma das vozes mais importantes do pensamento nacional - que defende com vigor. “Não sou partidário da demonização de nossas elites intelectuais”, disse ele em entrevista ao Estado.

Coordenador do livro A Construção Nacional (1830-1889), segundo volume da coleção História do Brasil Nação (Objetiva), que acaba de ser lançado, Carvalho também comenta a relação difícil entre o País e seus vizinhos latino-americanos, fala da persistência por aqui do espírito escravocrata e faz um exercício sobre como os historiadores brasileiros do futuro analisarão o momento atual. Para ele, os pesquisadores terão de esperar mais para saber se o bom momento da economia é sólido o bastante de modo a “operar a redução real da imensa desigualdade que ainda nos aflige”.

Em A Construção Nacional, o sr. diz que, no Brasil as relações senhor-escravo entraram na prática política, contaminando a cidadania com os germes do autoritarismo e do paternalismo, e esse “terrível libelo ainda se reflete no debate político atual, quando se discutem ações afirmativas”. Como isso se dá efetivamente?

A afirmação inspirou-se em Joaquim Nabuco. Em O Abolicionismo, ele afirmou que a escravidão no Brasil fora mais hábil do que a norte-americana porque se manteve aberta a todos, sem exclusão racial. Libertos e escravos podiam possuir escravos e, no dia seguinte à alforria, o liberto tornava-se cidadão pleno. Assim, a dialética senhor-escravo transportava-se para dentro do cidadão, invadindo o domínio da civitas, cujos valores corrompia. Com isso, previu ele, as consequências da escravidão estariam conosco por um século ou mais. Desdobrei a visão de Nabuco, colocando-a, ao lado de valores ibéricos e patriarcais, na origem de fenômenos como o autoritarismo, o corporativismo, o clientelismo que permeiam até hoje nossa cultura política. A ideia dos efeitos duradouros da escravidão é usada para justificar as políticas atuais de compensação, assim como o complexo senhor-escravo dentro do cidadão certamente afetou a natureza dos movimentos negros, menos radicais do que nos Estados Unidos, e a resistência mais prolongada ao reconhecimento da legitimidade das reivindicações por parte da sociedade e dos governos.

O sr. defende a ideia de que o Brasil teve uma “monarquia presidencial”. Podemos dizer que hoje temos um “presidencialismo monárquico”, dado o tamanho do poder do presidente, garantido pela harmonia interesseira de sua “corte” de partidos governistas?

A ideia de monarquia presidencial busca dar conta de um sistema monárquico que não era absolutista como no Antigo Regime, nem parlamentarista, como na Inglaterra. O Poder Moderador conferia a seu titular poderes presidenciais de ingerência em todos os assuntos de Estado, sobretudo no exercício do veto e na livre nomeação dos ministros. A expressão “Sua Majestade, o Presidente” já era defendida por John Adams, um dos pais da pátria norte-americana. Presidencialismo monárquico ou imperial foi, e é, expressão usada comumente nos EUA, sobretudo nos mandatos de Bush I e Bush II. Entre nós, Ernest Hambloch, cônsul inglês no Rio, publicou em 1936 o livro Sua Majestade o Presidente do Brazil. A livre nomeação dos ministros, o poder de veto e a posse da Caneta, além do esvaziamento dos partidos e do Congresso, justificam, sem dúvida, a expressão presidencialismo imperial que é, aliás, aplicável, e com mais razão, a outros países ibero-americanos.

Na sua opinião, a guerra foi o principal ponto de contato entre o Brasil e seus vizinhos hispânicos. O Brasil segue sendo visto como imperialista na região?

As críticas ao expansionismo português, que levou nossas fronteiras para muito além dos limites estabelecidos pelo Tratado de Tordesilhas, foram transferidas para o Brasil independente. A decisão da Argentina de se juntar ao Brasil na guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai foi surpreendente e excepcional. A desconfiança dos vizinhos de intenções expansionistas e imperialistas por parte do Brasil é de difícil extirpação, mesmo após longo período sem ações que a justifiquem. Diria que ela ressurge agora quando o País atinge um patamar econômico que implica grande aumento nas relações comerciais e exige uma política externa mais agressiva. Um país que se expande ocupa necessariamente mais espaço econômico, político e cultural. Se isso for visto como imperialismo, vai depender da capacidade de diluir as velhas desconfianças.

Por outro lado, a aproximação do Brasil com seus vizinhos foi qualificada pelo sr. como ambígua e hesitante, já que havia maior afinidade brasileira com os EUA e a Europa. Ainda hoje é assim, mesmo com o Mercosul e a adesão, ao menos retórica, ao “espírito bolivariano” a partir de Lula?

As tentativas de aproximação datam das últimas décadas e quase se resumem ao Mercosul, que vê as cláusulas de seus tratados frequentemente violadas pelos parceiros. A retórica bolivariana do presidente da Venezuela é isso mesmo, retórica, que não foi ainda nem mesmo capaz de liberar o dinheiro prometido para a construção conjunta da refinaria Abreu e Lima. Seria muita ingenuidade do governo brasileiro dar-lhe maior importância. A diplomacia companheira pode ter gerado boa vontade de alguns governos. Mas, na prática, será difícil evitar que o novo expansionismo, mesmo com cara benevolente, traga de volta fantasmas do passado, mesmo que eles reapareçam como chantagem para arrancar vantagens do bom gigante.

Gostaria de falar um pouco sobre o ofício do historiador e a História. Em 1999, o sr. publicou o artigo “Como escrever a tese certa e vencer”, que ficou célebre entre os estudantes de História, mostrando que só é possível se sair bem nas avaliações da academia citando determinados autores e usando vocabulário pernóstico e empolado. Isso continua assim?

O artigo foi motivado pela vivência de longos anos de nossa prática acadêmica. Alguns o interpretaram como oposição provinciana ao uso de autores europeus e norte-americanos. Nada mais equivocado. O que critiquei, espero que em tom bem-humorado, foi o resíduo de mentalidade colonizada embutido nesse uso, foi a crença de que esses autores, sobretudo franceses, ingleses, alemães e italianos, fornecem as teorias e nós entramos com os dados, eles dão a tecnologia e nós, a matéria-prima. Daí a moda de rechear teses e dissertações com os autores da moda, todos ou quase todos não brasileiros. Mas diria que o rápido crescimento da comunidade intelectual brasileira, graças à multiplicação dos cursos de pós-graduação, já começou a alterar o quadro. Essa comunidade é cada vez mais autorreferente, recorrendo ao diálogo externo como complemento e em bases mais igualitárias.

Russell Jacoby, professor de História na Universidade da Califórnia, diz em Os Últimos Intelectuais que os chamados “intelectuais públicos”, aqueles desvinculados de instituições acadêmicas, estão acabando, e ganham espaço cativo apenas pensadores que, embora nada de original acrescentem ao debate público, são levados a sério porque são “de Harvard” ou “de Yale”. O sr. acha que temos esse mesmo problema no Brasil? É possível ser reconhecido como pensador público sem ter vínculos com as universidades?

A história dos intelectuais nos EUA, a que se refere Jacoby, é naturalmente distinta da nossa. Mas pode-se dizer que algo semelhante se passou entre nós, com o tradicional atraso. Esse atraso deve-se em boa parte à tardia criação de nossas universidades. Na década de 30, nossos maîtres-à-penser não eram universitários. São os casos de Oliveira Viana, Gilberto Freyre, Caio Prado e mesmo Sérgio Buarque de Holanda. Até pouco tempo atrás ainda tínhamos Raymundo Faoro, José Honório, Guerreiro Ramos. Este último, aliás, escreveu uma crítica da ideologia do professor de sociologia dirigida a Florestan Fernandes. Com a expansão da universidade, a partir da USP e da Universidade do Brasil, o panorama tinha de mudar. Os intelectuais freelance estão reduzidos hoje a pequeno número, posto que ainda influente. Houve perda na qualidade ou no alcance do pensamento? Alguma, sim. O antigo intelectual era, sobretudo, um ensaísta, às vezes brilhante. O treinamento universitário lhes impõe maior rigor no raciocínio, mas esse mesmo rigor restringe a imaginação. O historiador ou cientista social que se aventurar a ensaios será malvisto pelos colegas, embora não perca o espaço na mídia, nem os leitores, o que pode ser um agravante. Mas vi agora na Argentina um bom exemplo de intelectuais universitários comportando-se como autênticos intelectuais públicos. Historiadores, juristas, críticos culturais manifestaram-se publicamente, e com muita coragem, contra a maneira pela qual o governo está ressuscitando a questão das Malvinas.

Como o sr. avalia o trabalho do historiador ante a nova categoria de fonte, virtual, na forma de profusão de textos na internet, alguns com apenas 140 caracteres? O sr. acha que ficou mais complicado estabelecer valor à documentação em se tratando desse tipo de fonte?

O trabalho de pesquisa foi enormemente facilitado. Documentos de arquivos e bibliotecas inteiras estão sendo digitalizados. Isso é fantástico, além de ser democratizante. A imensa enciclopédia digital em que se transformou o Google também facilita as coisas. O problema é o uso de textos da internet, que não são reprodução de documentos, como se fossem documentos. Os mecanismos de filtragem ainda são precários. Hesitei em minhas aulas em aceitar esse tipo de fonte nos trabalhos dos alunos. Acabei rendendo-me, mas continuo preocupado com a banalização, a superficialização e falsificação.

A propósito dos desafios para o historiador, parece que vivemos um momento importante da República, no qual uma parcela da população historicamente marginalizada está se deslocando para cima na pirâmide social. Como o sr. imagina que os historiadores brasileiros do futuro avaliarão este período?

A análise do fenômeno é trabalho para historiadores, mas, a curto prazo, mais ainda para cientistas sociais. Como historiador, tenho de buscar a origem do fenômeno na Revolução de 1930. A partir daí, teve início o processo rápido de mobilização social e política que marca o Brasil moderno. O deslocamento de populações rurais para as cidades, por exemplo, foi violento durante os governos militares. As perturbações políticas que marcaram País de 1930 a 1985 estiveram sempre relacionadas com essas mudanças. Agora, a aceleração recente do fenômeno tem a ver com a combinação da redemocratização, com a estabilização monetária e com a maior ênfase na política distributiva. Sociólogos e cientistas políticos já o estão examinando. Historiadores terão de esperar um pouco mais. Esperar, por exemplo, para verificar se a mudança será consistente, se a expansão da economia permitirá colocar em base sólida o aumento da renda e operar a redução real da imensa desigualdade que ainda nos aflige. Dado nosso início tardio, o caminho à frente é mais longo do que o já percorrido.

O sr. mostra neste volume sobre a História do Brasil que, no País, a temática europeia sempre foi adaptada à perspectiva local, razão pela qual “os liberais conseguiam conviver com a escravidão”. Podemos dizer que é o “jeitinho brasileiro” no campo das ideias, aquilo que Roberto Schwarz classificou de “comédia ideológica” em seu ensaio As Ideias Fora do Lugar? Há aí, para o sr., um certo cinismo das elites nacionais?

Não sou partidário da demonização de nossas elites intelectuais. Desde a independência, se houve esforços para justificar o existente, houve-os também para o reformar. E boa parte do recurso a teorias estrangeiras era recurso de retórica. A retórica exigia o uso do argumento de autoridade (um autor estrangeiro). A adesão às ideias desse autor era outra história. Havia muita adaptação e inversão. O liberalismo econômico era considerado a doutrina correta, mas na prática se fazia protecionismo. O liberal Tavares Bastos defendia a intervenção do Estado em políticas sociais. O positivismo comtista, conservador na França, foi usado aqui para defender a abolição, a república, a legislação trabalhista. Juntava-se o positivismo com o marxismo, como fez Leônidas de Rezende. Tudo isso podia ser jeitinho, mas era um esforço autêntico para entender nosso país e nossa inserção no mundo. Não era comédia.

COLEÇÃO HISTÓRIA DO BRASIL NAÇÃO - VOLUME 2
A CONSTRUÇÃO NACIONAL: 1830-1889
Coordenação: José Murilo de Carvalho
Editora: Objetiva
(320 págs., R$ 43,90)

FONTE: SABÁTICO/ O ESTADO DE S. PAULO