sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Fernando Gabeira: Sonhos e realidade

- O Estado de S.Paulo

Associação entre o PT e as minorias trouxe para elas a desconfiança do homem comum

A vitória de Bolsonaro não é idêntica à de Trump. Mas antes e depois das duas eleições há pontos de contato. Não servem para explicar tudo, mas ajudam.

Um dos livros em que encontro as semelhanças é de Mark Lilla, uma crítica aos liberais com um subtítulo interessante: Depois das políticas de identidade. A julgar pelo livro de Lilla (The Once and Future Liberal: After Identity Politics), a vitória de Trump suscitou o mesmo movimento nos EUA e no Brasil: resistência. Lilla põe essa palavra entre aspas, pois significa uma oposição a tudo o que Trump representa, sem ainda uma visão clara de futuro.

A vitória de uma figura controvertida acabou despertando nos EUA uma grande solidariedade entre os derrotados, campanhas, marchas, abaixo-assinados. Mas ainda são raras aqui, no Brasil, onde Bolsonaro acaba de vencer, as visões críticas do período que abriu o caminho para que ele triunfasse.

Lilla fala no descaminho dos democratas por se terem fixado nas políticas identitárias: mulheres, homossexuais, indígenas e negros. Não que seja contra essas lutas.

Sua análise da campanha republicana mostra que na maior parte do tempo ela se fixava em temas nacionais, que interessam a todos. O exame do site democrata, no entanto, revela grande peso às lutas fragmentárias, que interessam a setores bem específicos do eleitorado.

Lilla considera um erro a fixação nas lutas identitárias porque elas afastam um pouco as pessoas dos temas mais amplos, que envolvem o bem comum. As pessoas mergulhadas nessas lutas têm tendência menor a defender temas nacionais, sair para uma conversa nas ruas sobre o que ele chama o bem comum.

Eliane Cantanhêde: O soldado Moro

- O Estado de S.Paulo

Mercado e redes comemoram Moro na Justiça, mas o PT vai passar de palavras a atos

Petistas, esquerdistas, condenados, investigados, juristas e advogados reagiram mal à ida do juiz Sérgio Moro para o Ministério da Justiça de Jair Bolsonaro, mas, mais uma vez, eles estão em minoria e, no fim, o PT vai ficar falando sozinho. A grande maioria, principalmente nas redes sociais e no mercado financeiro, não foi só a favor, mas entusiasticamente a favor da novidade.

Segundo Bolsonaro, Moro agiu como “soldado, indo à guerra sem medo de morrer”. De fato, Moro sabia que os ataques seriam implacáveis, mas balançou os prós e contras e assumiu a trincheira com inimigos definidos, objetivos claros e a ambição de reunir todo o aparato federal possível para jogar o combate à corrupção e ao crime organizado no centro do governo e da própria agenda política.

Ao resgatar para a Justiça o recém-criado Ministério da Segurança Pública, Moro terá uma Polícia Federal fortalecida, a Controladoria-Geral da República e, se a lei permitir, também o Coaf, unidade de inteligência para detectar movimentações atípicas e crimes financeiros transnacionais.

Assim, Moro deixa de ser o juiz de Curitiba e passa a ser o principal responsável pelo combate à corrupção na administração pública e o “xerife” contra organizações criminosas que pululam pelo País afora. Lutará também por novas regras anticorrupção, contra a lei de abuso de autoridade e para evitar retrocessos na Lava Jato. Com ele, vai ser difícil “estancar a sangria”.

Vera Magalhães: Ganha Bolsonaro, perde a Lava Jato

- O Estado de S.Paulo

O aceite de Sérgio Moro ao convite para assumir um super Ministério da Justiça é um golaço para Jair Bolsonaro, mas pode significar o início do fim da Operação Lava Jato —além de representar um risco talvez desnecessário para a imagem que o juiz construiu nos últimos anos.

A decisão de Bolsonaro de turbinar a Justiça com a volta das atribuições relativas à segurança pública e todos os órgãos que atuam no combate à corrupção e a crimes financeiros deu a Moro uma justificativa forte para aceitar o convite.

Mas não anula o fato de que o coordenador da Lava Jato está se associando politicamente a um político que acaba de ser eleito, entre outras razões, como substrato da operação que ele comandou. Isso vai fortalecer a narrativa falsa que o PT vem sustentando nos últimos anos: a de que Moro promoveu uma cruzada política contra Lula e os demais caciques do partido.

Falsa porque o arcabouço reunido pela Lava Jato, composto de provas, dinheiro devolvido, delações premiadas, depoimentos, rastreamento de dinheiro desviado pelo mundo, depoimentos, imóveis e outros bens arrestados e a recuperação da Petrobras depois de ter sido debulhada pelo conluio de políticos e empresários não se resume a Moro nem é demolível na base do gogó.

Merval Pereira: Plano Real contra corrupção

- O Globo

É absurdo achar que Sergio Moro, desde o início, tivesse a ideia de uma carreira política, coisa que negou várias vezes

A nomeação do juiz Sergio Moro para um Ministério da Justiça ampliado, que tratará também da segurança e dos crimes financeiros, foi uma iniciativa meritória do presidente eleito Jair Bolsonaro, além de movimento político certeiro.

As críticas da oposição, especialmente o PT, estão precificadas pelo próprio Moro, que deve ter feito um balanço dos prós e contras e, aceitando, demonstra que considera a possibilidade de montar um esquema coordenado de combate à corrupção uma tarefa acima da que se propunha como juiz.

“Um bem maior” para o país valeria, na sua avaliação, as agruras por que passará, tanto devido aos ataques da oposição, quanto aos problemas que enfrentará no interior do próprio governo, com seu jogo político a que não está habituado.

Trazer o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) do Ministério da Fazenda para o superministério da Justiça propiciará a que sejam acompanhados em tempo real os alertas de movimentação financeira, sinais exteriores de riqueza que passam pelos órgãos fiscalizadores que não têm como objetivo prioritário o combate à lavagem de dinheiro ou o combate à corrupção.

Míriam Leitão: A decisão de Moro divide

- O Globo

Moro não virou político, mas estará em um governo que fez ameaças à democracia e tem em sua base partidos que ele condenou

A ida do juiz Sérgio Moro para o governo Jair Bolsonaro abre inúmeras dúvidas e polêmicas, mas não torna a Lava-Jato uma conspiração contra o PT. Ela tem serviços prestados ao país e atingiu políticos de diversos partidos. Moro, contudo, abriu o flanco para muitas críticas. Ele entra num governo que tem uma agenda que pode representar ameaça a direitos e garantias constitucionais e que governará com alguns dos partidos envolvidos em casos de corrupção.

O PT está dizendo que a ida de Moro é a prova final de que era tudo uma armação para tirar o ex-presidente Lula do rumo do Planalto e levá-lo para uma cela em Curitiba. Mas existem inúmeros fatos que mostram que a Lava-Lato é, e continua sendo, a mais bem sucedida operação anticorrupção do país. Ela condenou 130 pessoas, entre políticos, empresários e operadores, totalizando 1900 anos de prisão. Conseguiu recuperar R$ 12 bilhões. Puniu políticos do PMDB, do PSDB, e levou à prisão parlamentares de partidos que hoje estão indo para a base do governo Bolsonaro, como o PP. Expôs da forma mais explícita jamais vista os esquemas de corrupção dentro das empresas, como se pôde constatar na revelação da existência de um departamento dedicado à corrupção na Odebrecht. Não deixou nenhum pingo de dúvida de que diretores da Petrobras roubavam para si e para os partidos da base nos governos petistas.

O fato de o juiz Sérgio Moro virar ministro da Justiça não significa que ele “entrou na política”, como muita gente está interpretando. O cargo é técnico e pode ser exercido dessa forma ou ser ocupado por um político. Alguém ir para o governo não significa que virou um político. Inúmeras pessoas entram e saem e não viram políticos. O problema que Moro terá é com a agenda de Bolsonaro.

Bernardo Mello Franco: Moro será colega de clientes em potencial

- O Globo

Moro descumpriu a promessa de não entrar na política. Agora será colega de figuras com o mesmo perfil da sua clientela em Curitiba

Ao virar ministro de Jair Bolsonaro, Sergio Moro contraria suas próprias palavras como chefe da Lava-Jato. O juiz repetiu diversas vezes, nos últimos anos, que “jamais” aceitaria entrar na política.

“Não existe jamais esse risco”, ele garantiu ao jornal O Estado de S. Paulo, em 2016. “Não seria apropriado da minha parte postular qualquer espécie de cargo político, porque isso poderia, vamos dizer assim, colocar em dúvida a integridade do trabalho que eu fiz até o presente momento”, reforçou à revista Veja, em 2017.

O cargo de ministro da Justiça é político por natureza. Por lá passaram raposas como Nelson Jobim e Renan Calheiros. A pasta também projetou futuros presidentes, como Epitácio Pessoa e Tancredo Neves. Na equipe de Bolsonaro, Moro já é cotado como opção para 2022.

Fãs incondicionais do juiz aplaudiram a mudança de emprego. Não foi uma reação unânime. José Carlos Dias, ministro de FH, considerou a troca “lamentável”. “Mostra um partidarismo, uma posição política que é absolutamente contrária à índole do magistrado”, disse.

Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, foi além. “Esse tipo de mudança de camisa, tão rapidamente, projeta no inconsciente coletivo (...) uma imagem pouco favorável dos membros do Poder Judiciário”, afirmou.

Bruno Boghossian: Glória passageira

- Folha de S. Paulo

Contrato político torna Moro sócio do projeto de poder de Bolsonaro

Sergio Moro assinou um contrato político. Ao entrar no primeiro escalão do próximo governo, o juiz da Lava Jato se torna sócio inquestionável de um projeto de poder.

Embora não fosse um jogador inscrito no torneio, o futuro ministro da Justiça reconfigurou o tabuleiro da eleição. Ao longo dos últimos anos, autorizou operações contra caciques políticos, condenou dirigentes partidários e mandou prender o candidato que liderava as pesquisas antes de ir para a cadeia.

É difícil ignorar a influência de Moro sobre o resultado das urnas. O presidente eleito reconhece. "Em função do combate à corrupção, da Operação Lava Jato, as questões do mensalão, entre outros, me ajudou a crescer politicamente falando", disse Jair Bolsonaro, horas depois de confirmar a nomeação do juiz.

Quando aceita um cargo com superpoderes no novo governo, Moro se beneficia diretamente de suas ações. O juiz passa a ser um personagem da arena política e eleitoral que ele mesmo trabalhou para moldar.

Moro tenta pegar um atalho para evitar a repetição do que ocorreu com a Operação Mãos Limpas. Estudiosos do caso italiano dizem que a corrupção sobreviveu porque políticos eleitos na esteira das investigações minaram os mecanismos de combate ao crime. No centro do poder, o juiz quer blindar a Lava Jato.

Hélio Schwartsman: Bolsonaro é uma criação do PT?

- Folha de S. Paulo

Erros do partido contribuíram para a ascensão dele, mas outros elementos também intervieram

Para responder à pergunta do título, precisamos explorar um pouco a cadeia da causalidade. Tudo tem causas proximais e distais. Quando eu digo que o vírus provocou a doença no paciente, estou me referindo à causa mais imediata. Mas, se eu quiser ser mais abrangente, poderia mencionar também causas mais remotas, como as comorbidades de que ele padecia e fragilizavam seu sistema imune e até seus péssimos hábitos de higiene, que acabaram facilitando a entrada do vírus.

Para fazer jus ao título de “criador”, o agente precisa ser causa imediata ou pode estar um pouco mais afastado na cadeia? É fácil ver que as posições extremas levam a paradoxos. Se eu for muito rigoroso ao exigir que a causa seja imediata, teria de inocentar o pistoleiro que erra o tiro disparado contra a vítima, mas a faz sair em disparada pelas ruas e ela morre atropelada.

Se for excessivamente liberal, teria de responsabilizar o Big Bang por todos os problemas do mundo. Foi, ele, afinal que gerou a matéria —e não há nada que classifiquemos como problema que não envolva átomos.

Reinaldo Azevedo: Ministro Moro é Judiciário com partido

- Folha de S. Paulo

Os protagonistas da Lava Jato estavam e estão envolvidos em um projeto político

“Consummatum est”! Sergio Moro fulminou a classe política e sai como um dos dois grandes beneficiários da razia que promoveu. Já é o primeiro na fila de sucessão —quando Jair Bolsonaro quiser, bem entendido.

Não é “fake news”. O futuro superministro da Justiça e agora ex-juiz encontrou-se com Paulo Guedes durante a campanha e recebeu o convite para chefiar um troço que faz o antigo SNI, mesmo em seus dias de esplendor, parecer brincadeira de criança.

A conversa desta quinta com o presidente eleito foi uma formalidade. Alguém poderia objetar: “Não compare ditadura com democracia”. Claro que não! Se, no entanto, num regime democrático, as leis são submetidas por togados a uma leitura de exceção, depois referendada por colegiados, cumpre que se questione qual é a diferença entre uma ditadura genuína e uma democracia degradada. Certamente as há. Mas nem um regime nem outro conduzem os países a um bom lugar.

Leitores desta coluna e do meu blog e os que me acompanham no rádio e na TV sabem que não tardou para que eu percebesse e apontasse que a Lava Jato era muito pouco reverente à Constituição e ao Código de Processo Penal. E isso para começo de conversa. Liberal, alinhado com o que entendo ser a direita democrática —ainda que seja esta, hoje, uma das vastas solidões do Brasil—, crítico severo das esquerdas e particularmente do petismo, passei a sofrer primeiro as restrições e depois o assédio moral daqueles que me viam como uma peça de propaganda de seus delírios autoritários.

Vinicius Torres Freire: Superministros maiores que o governo

- Folha de S. Paulo

Além de terem grande poder, Guedes e Moro representam revoltas sociais

Jair Bolsonaro fez grandes lances em seus poucos dias de presidente eleito. Considerem:

1) deu impulso e poder a dois movimentos maiores do que ele, o projeto de encolhimento do Estado e a revolta contra a corrupção, nomeando Paulo Guedes e Sergio Moro;

2) colocou militares em postos de guarda e alerta no governo;

3) até agora não negociou coalizão com o Congresso por meio de compartilhamento de poder no ministério.

Guedes e Moro terão extenso poder sobre a máquina pública, mas a influência dos dois no destino do governo vai além. São representantes de uma reivindicação maior de mudanças.

Um clichê da política diz que um governante não deve nomear ninguém que não possa demitir. Em caso de sucesso, Bolsonaro dificilmente terá motivo para demitir seus superministros, mas contaria com força política para fazê-lo. Em caso de fracasso, a demissão será irrelevante, pois seu governo terá ido para o fundo do vinagre ou coisa pior.

Guedes representa o projeto de desmanche do Estado que foi formalizado em 2015, no plano de deposição de Dilma Rousseff, e implementado a partir de 2016.

A estabilidade do governo em 2019 (volta de algum crescimento) depende do sucesso parlamentar e do sequenciamento preciso dessas reformas, que não são remendo. Trata-se de um plano histórico de mudança, que tem apoio de parte da elite econômica e de várias classes médias.

Murillo de Aragão:Nem Quadros nem Collor

Revista ISTOÉ

A história se repete como farsa, como disse Marx. Mas Bolsonaro não pode deixar de observar o que se passou com Quadros e Collor. Quando o passado fala, o presente deve ouvir e analisar para poder construir um futuro melhor.

A vitória de Jair Bolsonaro (PSL) nas urnas guarda relação com a eleição de dois ex-presidentes no Brasil: Jânio Quadros (1960) e Fernando Collor (1989). Características na trajetória política de ambos lembram a de Bolsonaro: surpreenderam o mundo político e eram percebidos pelo eleitorado como outsiders da elite política da época.

Ambos também chegaram ao poder com bases políticas não tradicionais e discursos que capturaram os anseios dos eleitores. Quadros fez um governo de apenas sete meses. Em meio a uma crise temperamental, renunciou achando que o povo forçaria o seu retorno ao cargo com poderes ampliados. Não aconteceu. Collor fez um governo de pouco mais de dois anos até sofrer um impeachment por conta de graves acusações de corrupção.

Nos dois casos, apesar de os motivos da saída do poder terem sido diferentes, houve uma raiz comum: a falta de apoio no Congresso Nacional. Problema que também vitimou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que, tal como Collor, sofreu impeachment em 2016.

Considerando as identidades de trajetória com Quadros e Collor, Bolsonaro corre o risco de sofrer impeachment? Ou de ter sua governabilidade fortemente tolhida a ponto de o país viver nova crise institucional?

Apesar das características em comum, Bolsonaro parte com uma base de apoio significativa no Congresso. Cerca de 260 deputados e 39 senadores devem apoiar, de início, o seu governo. Portanto, o novo presidente deve encontrar condições bastante razoáveis para usar bem o período de graça que os parlamentares e a sociedade oferecem aos presidentes recém-eleitos. Bolsonaro conhece os meandros do Congresso e sabe como transitar por lá. Tal fato o diferencia em muito dos demais.

Ricardo Noblat: Moro, de servidor a serviçal

- Blog do Noblat | Veja

Passo em falso

Dê-se de barato, quando nada só para argumentar, que havia prova de sobra no processo do tríplex do Guarujá para condenar o ex-presidente Lula como o fez o juiz Sérgio Moro. Não é o que dizem centenas de juristas, mas tudo bem. É jogo jogado. Sobre o sítio de Atibaia, caso a ser julgado em breve, até petistas coroados admitem que o processo esteja estufado de provas e que Lula não escapará a outra condenação.

Mesmo assim, convenhamos: ao aceitar ser ministro da Justiça do futuro governo de Jair Bolsonaro, Moro ofereceu de graça aos seus detratores farta munição para que o ataquem, e também à Lava Jato. E para que lancem dúvidas sobre sua isenção. O juiz que removeu Lula do caminho de Bolsonaro acolhe feliz da vida o convite para servir àquele que mais se beneficiou de suas sentenças. Esquisito, não? Para dizer o mínimo.

Moro havia jurado mais de uma vez nos últimos anos que jamais entraria para a política e que sua vocação era de magistrado. Deu o dito pelo não dito, mas até aí problema dele. Cada um emporcalha ou lustra ao seu gosto a própria imagem. Acontece que Moro de há muito deixara de ser apenas um juiz destemido que teve a coragem de bater de frente com a corrupção. Por seus méritos, fora alçado à condição de uma ideia.

Dora Kramer: Crítica e autocrítica

- Revista Veja

O Brasil pode criar novas balizas para o exercício do contraditório

Ainda sob os efeitos do azedume geral, pode ser difícil pensar em produzir limonadas a partir da colossal quantidade de limões encruados nas almas e entalados nas gargantas país afora. Não falo de pacificações ao molde de conversões forçadas por um bom-mocismo de ocasião. Tampouco me refiro a pregações por união nacional mediante a interferência da figura de um pacificador, dada a semelhança com o anseio por um salvador.

Tudo isso é mito. Civilizatório, realista e institucionalmente pedagógico é o aprendizado do exercício do contraditório dentro das balizas do bom-senso. A eleição de Jair Bolsonaro, do jeito e pelas razões (ainda a ser completamente desvendadas e catalogadas) que ocorreu, põe o Brasil diante de uma preciosa oportunidade de subir de patamar na qualidade das relações entre governantes e governados.

Por paradoxal que soe, esse caminho foi aberto pelo ambiente de acirramento extremo que vem tomando conta do país já há algum tempo e que chegou aos píncaros durante a campanha eleitoral. Tivemos um processo inédito do qual resultou uma situação também sem precedentes. Nenhuma das eleições anteriores, desde a retomada do voto direto para presidente, produziu uma vitória que aborrecesse com tanta estridência tal volume de eleitores. O mesmo teria ocorrido caso o vencedor fosse o oponente, diga-se.

Helio Gurovitz: Bolsonaro, a imprensa e o ardil do populismo

- Revista Época

Bolsonaro, a imprensa e o ardil do populismo Jair Bolsonaro ainda é uma esfinge. A campanha eleitoral, ditada pela polarização e pelo discurso raivoso, não permitiu que suas propostas fossem analisadas em detalhes, nem submetidas a debates com visões antagônicas. Seu programa de governo começa a ganhar forma agora, ditado pelas circunstâncias das articulações políticas. Sua personalidade será decisiva para determinar o êxito do governo. 

Nas primeiras declarações e movimentos depois da vitória, ele procurou se mostrar sereno e conciliador, em contraste com a rebeldia, a agressividade e as ofensas que marcaram a carreira de deputado e a campanha. Tentar vislumbrar a realidade que existe atrás do “mito” Bolsonaro continua a ser um desafio, diante da falta de conhecimento de qualidade sobre sua ascensão. Quem estiver interessado em conhecer em profundidade o novo presidente terá enorme dificuldade.

Com exceção de um livro publicado pelo próprio filho Flávio no ano 2000, a única biografia disponível de Bolsonaro saiu neste ano. Publicada pelo jornalista Clóvis Saint-Clair diante da oportunidade oferecida pela corrida eleitoral, tem os defeitos inerentes a um livro produzido às pressas. 

Monica De Bolle: Conversa na Igreja Universal

- Revista Época

A bancada evangélica, para minha surpresa, defende a abertura comercial sob diretrizes não apenas razoáveis, mas absolutamente recomendáveis.

Conversa na Igreja Universal “Da soleira do La Crónica, Santiago fita a Avenida Tacna sem amor: carros, edifícios desiguais e desbotados, esqueletos espalhafatosos de pôsteres flutuando na névoa, o meio-dia cinzento. Em que momento havia o Peru se arruinado?” Essa é a abertura de Conversa no Catedral, de Mario Vargas Llosa, um de meus romances políticos prediletos.

Outro de meus romances políticos favoritos é O leopardo, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, belíssima crônica da unificação italiana no século XIX. Os atropelos e impasses políticos e a tentativa da aristocracia de manter sua relevância política em meio às grandes mudanças são muito bem resumidos pelo personagem Tancredi na célebre frase: “Para que tudo permaneça igual, é preciso que tudo mude”.

Nas eleições de 2018, houve impressionante renovação no Congresso brasileiro, incluindo a bancada evangélica, que cresceu — agora são 199 deputados e 4 senadores. A Frente Parlamentar evangélica, composta por diversas agremiações, é quatro vezes maior do que as bancadas do PT e do PSL individualmente, embora haja sobreposições. Recentemente, li o manifesto da frente evangélica lançado em 24 de outubro, intitulado O Brasil para os brasileiros — afinal, não apenas essa bancada tem significativa representação na Câmara, como também já havia declarado apoio ao presidente eleito Jair Bolsonaro antes do primeiro turno. O documento está estruturado em quatro eixos: a modernização do Estado, a segurança jurídica, a segurança fiscal e a “revolução na educação”.

Luiz Carlos Azedo: Os intocáveis

- Correio Braziliense

“Moro deixa a carreira de magistrado às vésperas de mais um julgamento do ex-presidente Lula. No processo do sítio de Atibaia, as provas seriam até mais robustas do que as do tríplex de Guarujá”

O mais famoso investigador da história norte-americana era apenas um agente do Tesouro inconformado com o descumprimento da Lei Seca em Chicago. Eliot Ness (Chicago, 19 de abril de 1903 — Coudersport, 16 de maio de 1957) liderou a equipe de investigadores que conseguiu prender Al Capone e desmantelar a quadrilha. Por ter resistido a várias tentativas de suborno, a força-tarefa ficou conhecida como Os intocáveis e foi glamorizada pelo diretor Brian de Palma no filme do mesmo nome, lançado em 1987, com Kevin Costner no papel principal, coadjuvado por Sean Connery e Robert De Niro.

O Ness de carne e osso era um homem comum, que raramente andava armado. De 1935 a 1942, após a liberação da venda e consumo de bebidas alcoólicas, foi secretário da Segurança Pública de Cleveland. A boa reputação desmoronou, porém, em 1942, quando abandonou o local de um acidente de trânsito aparentemente provocado por ele. Após o episódio, perdeu uma eleição para prefeito e fracassou como empresário. Morreu pobre, de ataque cardíaco, em 16 de maio de 1957.

É meio inevitável a analogia com a indicação do juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, para o Ministério da Justiça, confirmada ontem pelo presidente eleito Jair Bolsonaro, depois de conversa na qual recebeu carta branca para combater a corrupção e o crime organizado. Bolsonaro concordou com as propostas de Moro: “Ele queria liberdade total para combater a corrupção e o crime organizado e um ministério com poderes para tal”, disse o presidente eleito. Para a opinião pública, foi um gol de placa.

No livro Artes da Política: diálogo com Amaral Peixoto, de Aspásia Camargo, Lucia Hippolito, Maria Celina D’Araujo e Dora Rocha, o ex-interventor e ex-governador eleito do antigo Estado do Rio de Janeiro atribui parte do seu sucesso como administrador à escolha do seu secretário de Segurança Pública. Sem um bom chefe de polícia, segundo ele, ninguém consegue governar. Há controvérsias sobre essa relação entre o governante e o chefe de polícia, cujas atribuições e autoridade estão estabelecidas na Constituição de 1988, que garante autonomia à autoridade policial. A Polícia Federal é judiciária.

Superministros: Editorial | Folha de S. Paulo

Bolsonaro pretende governar com o menor número de pastas desde Collor

A proliferação do número de ministérios na administração federal —em particular na era petista, quando se atingiu o recorde de 39 órgãos com tal status— gerou justa indignação na opinião pública.

Era evidente, afinal, que o aumento do primeiro escalão se destinava, na maioria dos casos, a acomodar apaniguados e partidos ávidos por cargos e verbas, em detrimento da eficiência da gestão.

Daí se seguiu a percepção errônea, entretanto, de que a criação de pastas constituía causa da deterioração das finanças públicas. Essa noção foi alimentada, de forma demagógica, por forças políticas que apresentavam o corte de ministérios como solução indolor para a ruína orçamentária.

Esse não parece o caso do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), cujo intento é reduzir o número de ministérios dos atuais 29 para algo em torno de 15 —a menor cifra desde os 12 do início do governo Fernando Collor (1990-1992).

Sergio Moro na Justiça: Editorial | O Estado de S. Paulo

Ao escolher o juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça, o presidente eleito Jair Bolsonaro foi coerente com seu discurso de campanha, fortemente marcado pela promessa de combate à corrupção - e, como se sabe, esse combate, simbolizado pela Operação Lava Jato, teve naquele magistrado um de seus próceres nos últimos quatro anos. “Sua agenda anticorrupção, anticrime organizado, bem como respeito à Constituição e às leis, será o nosso norte!”, escreveu Bolsonaro no Twitter ao dar a notícia, ainda em tom marcadamente eleitoral.

Já Sergio Moro, ao aceitar o convite, declarou que o fez porque sua ida para o Ministério da Justiça, “na prática, significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior”. Ou seja, a Operação Lava Jato, que já tinha assumido traços nitidamente políticos em razão da ação militante de alguns de seus procuradores contra toda a classe política, terá agora status de Ministério.

Mais do que isso: se for confirmado o desenho do Ministério da Justiça projetado por Bolsonaro, Sergio Moro terá autoridade extraordinária em áreas importantes. A pasta poderá absorver o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União e o Ministério da Segurança Pública, além do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), hoje vinculado ao Ministério da Fazenda.

Moro na Justiça reforça combate ao crime: Editorial | O Globo

Bolsonaro acerta ao ampliar estrutura de enfrentamento da violência e da corrupção

Se o candidato Jair Bolsonaro foi eleito com um discurso de apoio forte ao combate à corrupção, com citações favoráveis à Lava-Jato, seria um desdobramento natural ele, vitorioso, convidar o juiz Sergio Moro para o primeiro escalão do governo. Aconteceu, Moro aceitou, e a escolha é a de maior impacto positivo até agora.

A quem comentou com o juiz as repercussões negativas junto à oposição, principalmente o PT, Moro, com razão, disse que já é mesmo atacado desde sempre.

De fato, pois a militância petista sempre foi muito ativa dentro e fora do país em investidas contra o principal magistrado da já histórica Operação Lava-Jato.

A criativa banca de advogados de Lula, como esperado, já prepara recursos com argumentos de que a nomeação de Moro por um governo antipetista configuraria a parcialidade no julgamento do ex-presidente. Mas, para ter base sólida, a argumentação precisa atingir todos os juízes do TRF-4 (Porto Alegre), STJ e Supremo que já votaram contra Lula no tríplex do Guarujá, motivo pelo qual o ex-presidente está preso.

É hora de coerência: Editorial | Veja

Sobretudo quando fala de improviso, Bolsonaro não expressa as mesmas ideias com a mesma firmeza, deixando a desconfiança que explica a cobrança insistente

O presidente eleito Jair Bolsonaro consagrou-se nas urnas com 57,8 milhões de votos, fez três pronunciamentos no domingo da vitória e, no dia seguinte, enfrentou uma maratona de entrevistas a cinco emissoras de televisão. É perceptível que Bolsonaro fica desconfortável com uma cobrança que não passa um dia sem ouvir: se pretende, mesmo, de verdade, respeitar a Constituição.

É fato que, em sua primeira manifestação depois da vitória, Bolsonaro leu um texto diante das câmeras de TV no qual assumiu um compromisso incontroverso. “Faço de vocês minhas testemunhas de que esse governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade”, declarou, o que deveria ser suficiente para sepultar quaisquer dúvidas sobre sua fidelidade aos princípios constitucionais.

O problema é que, sobretudo quando fala de improviso, Bolsonaro não expressa as mesmas ideias com a mesma firmeza, deixando a desconfiança que explica a cobrança insistente. O caso mais emblemático refere-se à liberdade de imprensa, instituição basilar de todo regime democrático e garantida pela Constituição brasileira. Bolsonaro já disse que respeita e respeitará a liberdade de imprensa, mas também disse que a ditadura militar — cuja existência ele nega — respeitava a liberdade dos meios de comunicação e jamais praticou censura. Em entrevista ao Jornal da Band, afirmou que algumas reportagens não foram publicadas porque os textos continham mensagens cifradas endereçadas a grupos que pretendiam atacar autoridades.

O eleito: Editorial | Época

Presidente Jair Bolsonaro. Três palavras que eram impensáveis um ano atrás agora se tornaram o futuro do país, porque assim o desejaram 58 milhões de brasileiros. Tendo sido impulsionado pelas elites, Bolsonaro atingiu os rincões do Brasil e os estratos mais numerosos da sociedade. Aproveitou-se de um establishment complacente para impor-se a ele como alternativa viável e esperança única. E com 55% dos votos válidos obteve a vitória legítima que só o sistema democrático proporciona.

Outros 47 milhões de eleitores, no entanto, disseram: “Ele não”. Estes, somados aos 43 milhões que não votaram, anularam ou votaram em branco, formam uma inegável maioria de 90 milhões de brasileiros que não sufragaram o candidato do PSL. Para esses milhões de brasileiros — e para grande parte do restante do mundo —, o 38º presidente do Brasil é motivo de apreensão, dúvida e até desespero.

Depois de um ano e meio de tuítes erráticos e discursos incoerentes, de uma campanha calculadamente feita por meio de redes sociais e aplicativos de mensagens, não é possível ter certeza sobre quem foi eleito presidente da República. Não se sabe como Bolsonaro executará as funções básicas do Poder Executivo. Não se sabe se ele tem alguma ideia do que significa liderar o país em questões candentes da política, da economia e da sociedade. Não se sabe se ele tem capacidade de se concentrar em qualquer questão e chegar a uma conclusão que se possa qualificar como seu projeto de governo.

Bolsonaro, o homem e seu tempo: Editorial | IstoÉ

Jair Messias Bolsonaro, o 38º presidente do Brasil, é o homem que captou o espírito do seu tempo, aquilo que os cientistas passaram a resumir na expressão alemã “Zeitgeist” para refletir as manifestações intelectuais, políticas e culturais de uma determinada época e geração. Bolsonaro parece ter entendido, como poucos candidatos, o clima de expectativas e necessidades dos eleitores que foram às urnas. Venceu contrariando todas as previsões, no bojo de um partido nanico, sem campanha, sem tempo de TV, sem alianças partidárias representativas, com parcos recursos e uma massa de opositores que se mantém numerosa. Há pouco mais de um ano, quando iniciou a caminhada, ninguém enxergaria qualquer chance nessa candidatura.

Quando tentou, pouco antes, a presidência da Câmara dos Deputados contra Rodrigo Maia, do DEM, obteve meros quatro votos dos parlamentares. Tinha dificuldades para encontrar uma legenda que o abrigasse e até mesmo um nome a vice. Era tido como personagem pitoresco, movido a arroubos radicais. Um xenófobo, homofóbico e racista de carteirinha, que abominava as liberdades de gênero e opinião, com um temperamento provocador, instigando emoções extremas. Bolsonaro erigiu, mesmo assim, um personagem sob medida para uso eleitoral nesse escrutínio. 

Caiu nas graças do povo, tendo como reflexo mais de 57 milhões de votos – feito extraordinário para quem mal havia emplacado meia dúzia de projetos de lei na longa temporada de quase 30 anos e sete mandatos no Congresso. No fundo, no fundo, Bolsonaro surfou a onda de um sentimento difuso da população, misturando medo e esperança, desencanto e rebeldia. No Brasil, como de resto em boa parte do mundo, há uma espécie de histeria conservadora que impacta a vida das pessoas e coloca de ponta-cabeça comportamentos e princípios, resvalando no retrocesso.

O capitão reformado despontou por encarnar esses valores. A evangelização do moralismo entrou na ordem do dia. Não é difícil encontrar quem aposte em transformações concretas na rotina dos brasileiros por conta dessa ascensão da ultradireita por aqui. Nas escolas, livros didáticos podem ser revistos e o hábito, superado faz tempo, de cantar o Hino Nacional antes das aulas pode voltar a vigorar. Na TV, programas de cunho erótico-sexual já começam a sofrer com o fenômeno da baixa audiência. Nas ruas, o patriotismo virou moda. Sinal de “novos” velhos tempos. Nos idos de 60, o então presidente Jânio Quadros, tido como um delegado de costumes, celebrizou-se não apenas pela vassoura na mão a varrer corruptos como também por proibir o biquíni na praia e multar apostadores do jogo de bicho e das corridas de cavalo. 

‘Moro me ajudou politicamente’, afirma Bolsonaro

Em entrevista em sua casa, presidente eleito também se refere a juiz da Lava Jato como ‘soldado que vai à guerra sem medo de morrer’

Roberta Pennafort / O Estado de S. Paulo

RIO - O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), definiu ontem o juiz Sérgio Moro como um “soldado que está indo à guerra sem medo de morrer” e afirmou que o magistrado terá mais poderes para combater a corrupção e o crime organizado no Ministério da Justiça do que teve até hoje à frente da 13ª Vara Federal Criminal em Curitiba. Em entrevista concedida ontem em sua casa, no Rio de Janeiro, Bolsonaro se comparou a seu futuro ministro e disse que “cresceu politicamente” a partir de episódios como a Operação Lava Jato e o escândalo do mensalão.

“O trabalho dele foi muito bem feito. Em função do combate à corrupção e à Operação Lava Jato, as questões do mensalão, entre outras, me ajudaram a crescer, politicamente falando”, disse o presidente eleito.

Bolsonaro descartou a possibilidade de a Lava Jato ser enfraquecida com a saída de Moro de Curitiba, alegando que outros juízes vão assumir o trabalho que vinha sendo feito pelo futuro ministro. A magistrada substituta na 13ª Vara Federal de Curitiba, Gabriela Hardt, ficará à frente dos processos até que seja escolhido um novo juiz titular (mais informações à pág. A8). O presidente eleito – que depois do atentado sofrido em setembro passado passou a contar com forte esquema de proteção em todos os seus deslocamentos – também comparou as restrições de segurança sofridas pelo magistrado às suas.

“Temos de reconhecer o trabalho dele. É um homem que perdeu a liberdade de comprar um pão na padaria, de passear com a família no shopping. Costumo dizer que não só ele, como eu, temos menos direito do que alguém com uma tornozeleira, tendo em vista a questão da segurança.

Supremo. Na eventualidade de abertura de uma futura de vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente eleito disse que não teria problema em perder o ministro par nomeá-lo para o posto. Em 2020, ao completar 75 anos, o ministro Celso de Mello terá de se aposentar compulsoriamente. No ano seguinte, outra vaga se abrirá com a saída de Marco Aurélio Mello.

“Não ficou combinado, mas ele, tendo um bom sucessor, estamos abertos a isso (ida de Moro para o STF). A decisão dele é difícil, está abrindo mão da carreira, 22 anos de serviço, para enfrentar um desafio. Não tem compromisso de tempo. Para mim, ele fica ad eternum lá (no ministério)”, afirmou ele.

Jornais e agências são barrados em entrevista coletiva

Equipe de Bolsonaro dá acesso somente a emissoras de televisão e sites; questionado, presidente eleito diz que não faz restrição

- O Globo

O staff do presidente eleito, Jair Bolsonaro, proibiu a entrada de parte dos profissionais de imprensa que aguardavam o começo de uma entrevista coletiva, na tarde de ontem. Apenas emissoras de televisão e sites foram autorizados a entrar no seu condomínio, na Barra da Tijuca, apesar da solicitação de credenciamento ter sido feita por todos os repórteres. Jornais e agências internacionais foram barrados.

Uma agente da Polícia Federal destacada para fazer a triagem dos veículos autorizados alegou questões “de espaço físico” para impedir a entrada de representantes de todos os jornais e das rádios presentes. Em outro momento, ela afirmou que a autorização dos profissionais era “de dentro para fora”, explicando que a ordem partiu de dentro da casa do Bolsonaro. Ao todo, 21 pessoas tiveram a permissão para ir à entrevista.

Questionado sobre os critérios para a seleção dos repórteres, Tercio Arnaud Tomaz, que se apresentou como assessor de comunicação do presidente eleito, afirmou que apenas TVs participariam da entrevista, apesar de profissionais de sites terem sido autorizados. É praxe, no entanto, que coletivas de autoridades permitam a participação de todos os meios profissionais de comunicação.

Durante a entrevista, questionado sobre o porquê de veículos impressos, como O GLOBO, Valor, “Folha de S.Paulo” e “Estado de S.Paulo”, além de agências internacionais, terem ficado fora da coletiva, Bolsonaro respondeu:

Indicação de Moro provoca críticas e elogios

Para Luiz Fux, do STF, a escolha atende aos anseios da população, enquanto o ex-ministro Ayres Britto diz que a ida do juiz para o governo põe em dúvida a independência do Judiciário; o meio político também se divide

Carolina Brígido, Cleide Carvalho, Natália Portinari, Sérgio Roxo, Dimitrius Dantas, Silvia Amorim e Amanda Almeida | O Globo

A indicação do juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública foi elogiada pelo ministro Luiz Fux , do Supremo Tribunal Federal (STF), por entidades de magistrados e de delegados da Polícia Federal, além de integrantes da força-tarefa da Lava-Jato. Eles destacaram, sobretudo, o trabalho de Moro no combate à corrupção. O ex-ministro do STF Ayres Britto foi voz dissonante. Para ele, a migração do juiz para o governo compromete a imagem do Judiciário, que deve zelar pela separação e independência dos Poderes.

Nomeio político, a decisão de Mo rode integrara equipe de Jair Bolsonaro (PSL) foi criticada por opositores do presidente eleito. Para eles, o novo cargo coloca em xeque a isenção do juiz à frente da Lava-Jato. Já apoiadores do capitão da reserva comemoraram, dizendo que Moro “estenderá seu rigor” ao Executivo.

O ministro Luiz Fux afirmou que a escolha atende aos anseios da população:

— Excelente nome. Imprimirá no Ministério da Justiça a sua marca indelével no com bate à corrupção e na manutenção das nossas instituições democráticas, prestigiando a independência da PF (Polícia Federal ), MP( Ministério Público) e Judiciário. A sua escolha é a que a sociedade faria, se consultada. É um juiz símbolo da probidade e da competência. Escolha por genuína meritocracia.

Já Ayres Britto afirmou que a decisão de Moro coloca em suspeição a independência da Justiça:

— O Judiciário se define pelo desfrute de uma independência que não pode ser colocada em xeque. Os magistrados devem manter o máximo de distância dos outros dois poderes. Isso não parece rimar com o espírito da coisa de um membro do Judiciário pedir exoneração e já se transportar, com mala e bagagens, para um cargo do Poder Executivo.

Pelo Twitter, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso aprovou a indicação: “Moro na Justiça. Homem sério. Preferia vê-lo no STF, talvez (seja) uma etapa ”, escreveu, também em uma rede social .“A corrupção arruína apolítica e o país. Se Moro a combater, ajudará”, completou.

Frederico Garcia Lorca: Volta de passeio

Assassinado pelo céu,
entre as formas que vão para a serpente
e as formas que buscam o cristal,
deixarei crescer meus cabelos.

Com a árvore de tocos que não canta
e o menino com o branco rosto de ovo.

Com os animaizinhos de cabeça rota
e a água esfarrapada dos pés secos.

Com tudo o que tem cansaço surdo-mudo
e mariposa afogada no tinteiro.

Tropeçando com meu rosto diferente de cada dia.
Assassinado pelo céu !