sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Hélio Schwartsman - Ufa, escapamos do distritão

Folha de S. Paulo

Mas era só o bode na sala para reduzir as resistências à volta das coligações

Escapamos do distritão. Nosso sistema eleitoral não vai, portanto, piorar tanto quanto os mais pessimistas temiam. Mas ainda pode piorar bastante. É que o distritão era só o bode na sala para reduzir as resistências à volta das coligações em eleições proporcionais, outra medida com impacto negativo sobre o sistema político que tem chances de materializar-se.

Já fui um ardoroso defensor do parlamentarismo. A literatura não deixa muita dúvida de que esse regime é, em vários aspectos, superior ao presidencialismo. Mas, quando cogitamos embarcar em mudanças mais profundas, precisamos considerar não apenas a qualidade intrínseca das alternativas como os custos de adotá-las. Mesmo que o eleitor brasileiro não tivesse fortes resistências ao parlamentarismo, implantá-lo implicaria umas duas décadas (cinco ciclos eleitorais) de funcionamento subótimo ou até precário, que é o tempo que políticos e eleitores levariam para aprender a navegar eficazmente sob as novas regras.

Luiz Carlos Azedo - Ninguém morre de véspera

Correio Braziliense

Às vésperas do ano eleitoral, a maioria dos deputados voltou do recesso legislativo convicta de que não conseguiria votos de legenda suficientes para se reeleger

Todas as vezes que se discutem reformas eleitorais na Câmara, o que determina o seu desfecho são os cálculos eleitorais da maioria dos deputados, empenhados na própria sobrevivência, muito mais do que os projetos partidários. Não são as contas do Palácio do Planalto nem dos donos dos partidos, ainda que controlem os recursos financeiros das legendas. É como naquela fábula já citada algumas vezes: “Não se convida os perus para participar da ceia de Natal, eles sabem que vão morrer”.

Talvez seja essa a explicação da resiliência das eleições proporcionais e das dificuldades para acabar com as coligações partidárias nas eleições para o Legislativo, aprovadas na noite de quarta-feira. Ontem, mais uma decisão importante foi tomada: a criação das federações partidárias. Nesse desfecho, um personagem muito importante foi o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que manobrou nas votações para impedir a aprovação do Distritão, que seria uma solução radical para salvar os mandatos da maioria dos atuais deputados. A moeda de troca foi a volta das coligações proporcionais, que haviam sido proibidas na reforma eleitoral passada, apesar de terem sido testadas nas eleições municipais de 2020.

Ricardo Noblat - Lira pede a Pacheco que o Senado mate no peito a reforma eleitoral

Blog do Noblat / Metrópoles

E assim será, para desespero dos partidos sem voto e das siglas de aluguel

Se dependesse unicamente de Arthur Lira (PP-AL), a Câmara dos Deputados não teria aprovado uma nova lei eleitoral. Se aprovasse, ela não mexeria no sistema proporcional de votação, nem permitiria a volta das coligações partidárias proibidas desde 2017.

Mas, sabe como é… Para eleger-se presidente da Câmara, Lira prometeu o que seus pares queriam, e a esmagadora maioria deles está em pânico com a eventual possibilidade de uma derrota no ano que vem. Fazer o quê então?

Na noite em que a reforma foi aprovada, Lira jantou com Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente do Senado, e pediu-lhe que desse um jeito de segurar mais essa. Pacheco, depois, em conversa com senadores, comentou: “Lira jogou a reforma no peito da gente”.

O sistema proporcional de votação ficou como era, mas as coligações partidárias voltaram para salvar os pequenos partidos que carecem de poucos votos e que poderiam ser extintos. Pacheco já disse que o Senado passará o rodo na reforma. A conferir.

Vera Magalhães - CPI vive seu pior momento

O Globo

A suspensão abrupta do depoimento de Ricardo Barros na CPI da Covid, nesta quinta-feira, foi a crônica de um desastre anunciado.

Aqui neste espaço escrevi, ainda nos primórdios da investigação, em 5 de maio, quando os senadores estavam embevecidos com tanto holofote: “Para que não seja um placebo de açúcar, esta CPI precisa urgentemente entender que, sem um corpo técnico consistente, não irá a lugar algum”.

Na saída para o recesso, voltei a contrariar o coro dos empolgados: “A pausa de duas semanas (…) poderá ser salutar para que mergulhem nos documentos a fim de traçar a linha acusatória”.

Na última segunda-feira, perguntei a Renan Calheiros se eles estavam preparados para o depoimento de Barros, que seria difícil e poderia resultar na impressão de que ele venceu o confronto. O relator parecia seguro de que sim.

No entanto o que se viu nesta quinta foi um deputado que chegou disposto a ditar o próprio depoimento e a enquadrar os senadores.

A estratégia avançava bem, até que Barros foi tragado pela própria arrogância e teve as asas cortadas pela intervenção como sempre cirúrgica e bem fundamentada do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), o mais técnico dos integrantes da CPI, um dos autores do requerimento de sua criação e, infelizmente, apenas suplente no colegiado.

Bruno Boghossian – Perdido no camelódromo

Folha de S. Paulo

Ao dizer que comissão espantou laboratórios, Barros joga luz sobre negócios suspeitos

O governo se embrenhou tanto no camelódromo das vacinas intermediadas por personagens suspeitos que perdeu o caminho da saída. O último movimento bolsonarista na CPI da Covid mostra que os aliados do presidente não conseguem mais explicar os rolos identificados nas negociações de imunizantes.

A tropa de choque de Jair Bolsonaro tentou virar o jogo na sessão desta quinta (12), mas acabou se complicando. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP), disse que a comissão havia "espantado os interessados" em vender vacinas. "Não há mais laboratórios buscando o Brasil, porque não querem se expor a esse tipo de inquirição", declarou.

O esforço de Barros para defender investigados e transferir a culpa para a comissão atiçou senadores governistas. Flávio Bolsonaro (Patriota) pegou carona no descaramento do líder e lançou a nova linha de defesa do Planalto: declarou que "a única coisa concreta que a CPI conseguiu" foi "impedir milhões de vacinas nos braços dos brasileiros".

Reinaldo Azevedo - Barros e o crime como liberdade

Folha de S. Paulo

Ao acusar CPI de afastar as vacinas, líder do governo na Câmara se torna o símbolo de um notável momento de delinquência política e intelectual

Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, é um exemplo bastante eloquente —até porque muito bem-sucedido na sua profissão— da pistolagem intelectual e política que chegou ao poder em 2019. Ele não fazia parte do grupo original, é verdade. Estava como aqueles crocodilos do Nilo que ficam nas águas rasas do rio Mara, no Quênia, à espera da passagem dos gnus. Em algum momento, a manada serviria de repasto. E lá estavam ele e outros de sua espécie com a bocarra pronta.

A afirmação que tal senhor fez em depoimento à CPI —segundo ele, a comissão afastou do Brasil empresas dispostas a vender vacinas ao país— é mais do que uma provocação barata. Trata-se de uma mentira filo-homicida. E não tenham dúvida de que ele apelará ao que entende ser “liberdade de expressão” para mentir ainda mais e para tripudiar sobre quase 600 mil cadáveres. “Oh liberdade de expressão! Quantos crimes se cometem em teu nome!”

Eliane Cantanhêde - De ‘tucanarés’ e vírus

O Estado de S. Paulo

Voto impresso e coligações comprovam: o bolsonarismo contaminou o centro e os partidos

As votações do voto impresso, da volta das coligações e da criação de federação de partidos confirmam um diagnóstico dramático: assim como a covid-19 contaminou mortalmente o Brasil, o bolsonarismo se infiltrou maliciosamente nos partidos brasileiros, que já têm tantas comorbidades. Estão rachados, sem liderança, energia e rumo. Logo, são alvos fáceis.

O principal exemplo é o PSDB, mas os demais partidos de centro também deram mais votos a favor do que contra o retrocesso gritante da volta da cédula de papel, sob pretexto de auditar a urna eletrônica (o que é ridículo). No PSDB, 14 a 12 pró-voto impresso e a única abstenção, do deputado e ex-presidente do partido Aécio Neves. No MDB, 15 a 10. No DEM, 13 a 8. No PSD, 20 a 11.

Quem contaminou o ambiente político-institucional com a obsessão pelo voto impresso foi o presidente Jair Bolsonaro, por oportunismo político, para tumultuar, por real ameaça às eleições, por pavor da derrota em 2022 ou por simples ignorância e teimosia. Só a ele interessava, e interessa, manter esse debate vivo.

Fernando Guarnieri* - A personalização na política cresce, e o partido enfraquece

O Estado de S. Paulo

Abelardo Barbosa, o Chacrinha, dizia ter vindo para confundir, e não para explicar. Observando o relatório da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 125/2011 da reforma eleitoral, a impressão é de que a intenção da relatora, deputada Renata Abreu (Podemos-SP), seria a mesma. Nunca houve uma proposta tão confusa de reforma eleitoral.

Propunha-se a combinação do sistema atual com o de voto único não transferível (conhecido como “distritão”) nas eleições para o Legislativo e o voto alternativo nas eleições para o Executivo. Segundo a justificativa da relatora, nosso sistema eleitoral, por conta da representação proporcional de lista aberta, não seria “inteligível ao eleitor médio” (sic). Por que não, então, complicá-lo um pouco mais?

Com a derrota dos principais pontos do projeto, ao fim e ao cabo parece que se tratou apenas de uma finta. Ao colocar esse bode na sala promoveu-se o retorno das coligações nas eleições proporcionais, o que beneficia diretamente partidos pequenos, como o Podemos da relatora.

Simon Schwartzman* - O sábio e os sabidos

O Estado de S. Paulo

Giannotti foi sempre o sábio do pensamento independente, crítico, e do diálogo

 “Vem me fazer uma visita”, disse-me José Arthur Giannotti da última vez que nos vimos, num seminário no Instituto Fernando Henrique Cardoso. Disse que ia, lembrando-me de outras ocasiões em que me recebeu em sua casa no Morumbi, falando sobre os temas de filosofia, política e das pessoas que o fascinavam. Acabei não indo, e agora ele nos deixou. O encontro anterior havia sido em um voo desde Brasília em que nos encontramos e no qual ele falou longamente acerca do que estava escrevendo sobre Wittgenstein. No final perguntou se eu estava entendendo, eu disse que sim e ele sorriu, contente: “Viu como é simples? Até você entende!”.

Na verdade, não havia entendido direito, hoje acho que compreendo melhor. Se Giannotti era tão difícil de entender, tanto por escrito quanto falando, como explicar o grande sentimento de perda de tanta gente, agora que ele se foi? Não deve ser só por sua produção como filósofo, cujo valor cabe aos colegas de profissão avaliar. Para os demais foi, sem dúvida, importante sua presença e liderança na vida intelectual brasileira, que começa na antiga Faculdade de Filosofia da USP na Rua Maria Antônia, continua no famoso grupo de leitura de O Capital nos anos 50 e 60 e se prolonga nos anos em que presidiu e participou do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), a instituição criada pelos professores de filosofia e ciências sociais que, como ele, haviam sido expulsos da USP pelo regime militar. Mais importantes, no entanto, eram a permanente abertura e disposição para o debate e o diálogo, contestando certezas estabelecidas, trazendo ideias inesperadas. E fazendo pensar.

José de Souza Martins* - Bolsonaro e a política da ignorância

Valor Econômico / Eu & Fim Semana

O presidente é um caso cansativo de obstinação na suposição equivocada de que o povo renunciou ao seu direito de eleitor cidadão na definição de quem o governa e de como deve governá-lo

Em dias passados, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, dirigiu-se ao povo brasileiro, com seu proverbial civismo e suas proverbiais serenidade, lucidez e erudição, para uma lição pública sobre o que é democracia, o que é democracia num país como o Brasil, o que é progresso eleitoral e o que é atraso eleitoral e político.

Mostrou-nos a importância do voto e da segurança do voto na confirmação e na renovação da democracia de que tanto carecemos. Contra a tese autoritária dos defensores de mecanismos retrógrados de expressão eleitoral. O que, em tempos passados, foram poderoso instrumento de manipulação do voto, de usurpação da vontade do brasileiro menos eleitor e menos cidadão. Os mecanismos de redução do poder a uma renúncia forçada de vontade política expressa no voto, mediante fraude.

O ministro Luís Roberto Barroso defendeu e justificou o protagonismo político do cidadão e do povo como fundamento da ordem democrática, um bem cívico que deve ser assegurado e protegido. Ensinou - e bem.

Apoiado por seus pares, deu ao seu pronunciamento a beleza cívica de um ato de esperança de que o país tanto carece. O discurso do ministro libertou o ouvido dos brasileiros do discurso de botequim, das improvisações ignorantes dos que têm se revelado incapazes de assumirem-se como cidadãos. Os que, nesse sentido, assumem-se como usurpadores do poder que não é seu.

Dora Kramer - Voz ao vento

Revista Veja

Bolsonaro transita por adversidades como se convicto de enxergar aí a chance de voltar a se apresentar como a vítima a ser salva das garras do “sistema”

Há quem tenha mais medo do ridículo que da morte. No campo simbólico, a morte como sinônimo de derrota pode provocar temor nos que fogem do ridículo como o diabo da cruz. Não é o caso de Jair Bolsonaro, cuja trajetória desde antes e, sobretudo, na Presidência desenha um personagem destemido ante o escárnio.

Foi assim quando se expôs à zombaria geral ao abordar o tema “golden shower” nos primeiros acordes do uso da internet como instrumento de interlocução presidencial com a sociedade. Tem sido assim ao longo do mandato. Incumbência esta que ele submeteu a elevado grau de caçoada nacional e internacional no dia da votação da emenda constitucional do voto impresso, com a promoção de um passeio de artefatos bélicos Brasília afora.

Bernardo Mello Franco - O deputado na bolha

O Globo

Depois de dois anos e dois meses, a Câmara enfim cassou o mandato da deputada Flordelis, do PSD. A pastora é acusada de encomendar a morte do marido, o também pastor Anderson do Carmo. Escapou da prisão preventiva graças à imunidade parlamentar.

Como esperado, o plenário aprovou a cassação por ampla maioria: 437 a 7. A única surpresa foi o voto contrário de um deputado do PSOL, Glauber Braga. Até o início da semana, ele se dizia pré-candidato ao Planalto. Depois desse episódio, arrisca se complicar até numa eleição para síndico.

Glauber nunca foi um aliado de Flordelis. Na sessão de quarta, fez questão de dizer que considerava sua linha política “sofrível”. Ainda assim, o deputado endossou a tese da defesa. Disse que a pastora deveria ser suspensa, e não cassada, até o veredicto do tribunal do júri.

A argumentação contém um erro primário: confunde o julgamento criminal, feito pela Justiça, com o julgamento político, feito pela Câmara. Não cabe aos congressistas decidir se a colega mandou ou não mandou matar o marido. O que se discute ali é se houve quebra de decoro parlamentar.

Pedro Doria - O 5G brasileiro já está na rua

O Globo / O Estado de S. Paulo

Numa manhã desta semana, peguei emprestado um iPhone 12 Pro Max, dentre os melhores celulares no mercado. Pus ao lado do meu aparelho, da versão anterior. Ambos lado a lado. De cara, a diferença na tela era uma só. No canto superior direito de um, 4G. No do outro, 5G. Disparei então, simultaneamente, um teste de velocidade. Meu aparelho, de que não tenho reclamações, encostou em 20Mbps. É uma velocidade que muita banda larga fixa não tem. Com bem menos disso já dá para ver um filme por streaming. No aparelho indicando 5G, passou de 150Mbps. Para padrões brasileiros, mesmo para máquinas conectadas à fibra óptica, isso é voar baixo. Em alguns cantos do país tem gente conseguindo passar dos 500Mbps no 5G.

Mas o ministro das Comunicações, Fábio Faria, quer proibir as operadoras de dizer que já começaram a oferecer a nova geração da telefonia celular em alguns lugares. Num vídeo que fez circular, sugere que é propaganda enganosa. Uma de suas cobranças é que tirem, dos aparelhos habilitados para a nova tecnologia, o indicativo “5G”.

Flávia Oliveira - Horror a pobre, pré-requisito

O Globo

No governo Jair Bolsonaro, aporofobia não é surpresa, mas pré-requisito. Ministro da Economia, Paulo Guedes já depreciou empregadas domésticas, filhos de porteiro, brasileiros em situação de fome. A mais recente demonstração de horror a pobres partiu do titular da Educação, Milton Ribeiro, há um ano no cargo. Numa entrevista à TV Brasil, o pastor presbiteriano, autodeclarado professor, disparou um trio de declarações de ruborizar Justo Veríssimo, o personagem de Chico Anysio que melhor encarnou o desprezo dos homens públicos pelos brasileiros de baixa renda. Combinou indiferença, preconceito e desinformação, a santíssima trindade do constrangimento. Merece resposta.

1) “Na Alemanha são poucos os que fazem universidade, universidade na verdade deveria ser para poucos nesse sentido de ser útil à sociedade.” O ministro parece desconhecer que, no Brasil, universidade já é para poucos. Em 2019, segundo a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, apenas um em cada quatro jovens de 18 a 24 anos, idade desejável, frequentava o ensino superior. Comparado aos membros da OCDE, clube que o governo de Milton Ribeiro sonha adentrar, o Brasil tem menos habitantes que concluíram a universidade. Em Portugal, Turquia e Colômbia, a proporção de adultos de 25 a 34 anos com carreira universitária supera a do Brasil.

Votação da PEC do voto impresso ‘valorizou a posição’ de Arthur Lira, afirma sociólogo

Para Brasílio Sallum Jr., presidente da Câmara se tornou mais importante porque a ‘disposição oposicionista aumentou muito’

 Tulio Kruse, O Estado de S. Paulo

O sociólogo Brasílio Sallum Jr. vê a discussão sobre o impeachment como um ato fora do roteiro: as principais lideranças políticas do País já se planejam para uma eleição em 2022 com o presidente Jair Bolsonaro na disputa. Autor do livro O impeachment de Fernando Collor, que analisa a queda do primeiro presidente eleito pelo voto direto na Nova República, ele diz que a oposição hoje está desunida contra o governo. Para Sallum Jr., a votação da proposta de emenda à constituição (PEC) do voto impresso fortaleceu o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e mostrou que a chance de se alcançar dois terços de oposição a Bolsonaro na Casa já não é impossível – mas segue improvável.

“Tenho a impressão de que, para o impeachment, podem haver condições de se formar base parlamentar – o que no fundo depende do presidente da Câmara – mas as forças políticas não vão se articular imediatamente nessa direção”, ele disse.

Confira os principais trechos da entrevista:

O sr. acha que há condições de aprovação de um eventual pedido de impeachment?

Motivos não faltam, mas do ponto de vista das condições políticas as coisas são mais complicadas. Isso porque estamos a um ano e poucos meses das eleições e as forças políticas estão todas posicionadas e fazendo seus cálculos com base na polarização. De um lado se imagina o (ex-presidente) Lula e, de outro, Bolsonaro. O próprio PT faz seus cálculos imaginando que do lado de lá está Bolsonaro. O problema deles é conquistar o centro, e Lula deve tentar se aproximar de forças ao centro e ainda recuperar parte da esquerda que perdeu. As forças de centro hoje se articulam e há uma competição muito grande entre as pré-candidaturas, mas o fato de haver Bolsonaro de um lado e Lula de outro dá um certo estímulo para que exista algum tipo de composição – embora ela seja muito difícil. Ou seja, os candidatos estão se posicionando para definir as alternativas mais ou menos até o fim do ano.

O que a mídia pensa: Editoriais

EDITORIAIS

A miséria da política

O Estado de S. Paulo

O desgoverno de Jair Bolsonaro não é caso isolado. Há muita gente – partidos e parlamentares de várias correntes – não apenas tolerando, mas apoiando retrocessos institucionais

Sem pudor, a Câmara dos Deputados revela o atual estado da política. A semana foi pródiga em exemplos de que o desgoverno de Jair Bolsonaro não é um caso isolado. Há muita gente – partidos e parlamentares de várias correntes ideológicas – não apenas tolerando, mas apoiando retrocessos institucionais.

A aprovação em primeiro turno da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 125/11, que libera as coligações partidárias em eleições proporcionais, mostrou como a Câmara pode ser indiferente a um dos principais avanços da legislação eleitoral dos últimos anos. Em 2017, o Congresso proibiu, por meio da Emenda Constitucional (EC) 97/2017, as coligações nas eleições para vereador e deputado (estadual e federal).

A medida, aplicada pela primeira vez nas eleições municipais de 2020, é uma importante proteção da vontade do eleitor. Com a coligação, o voto em determinado candidato pode eleger outro candidato, de outro partido, simplesmente em razão de um acordo entre as legendas. A revisão da proibição, antes sequer de ser aplicada nas esferas federal e estadual, é inteiramente descabida, além de revelar descaso com a Constituição, cujo texto requer um mínimo de estabilidade.

Pode-se, com razão, criticar o papel da presidência da Câmara nessa agenda do retrocesso. Arthur Lira tem pautado temas importantes de forma açodada, sem que haja o necessário debate. De toda forma, o problema ultrapassa a definição da pauta do plenário da Câmara. 

Veja-se, por exemplo, o papelão do PSDB. Em 2017, o partido foi um dos principais articuladores do fim das coligações nas eleições proporcionais. Agora, dois terços dos deputados do PSDB na Câmara foram favoráveis ao retorno dessa irrazoável possibilidade. Dos 32 nomes da bancada tucana, 21 votaram pela volta das coligações. Apenas 11 deputados do PSDB foram contra na votação em primeiro turno.