quarta-feira, 28 de junho de 2023

Vera Magalhães – Revés de Bolsonaro é chance para Lula

O Globo

Iminente inelegibilidade do antecessor dá ao presidente também a chance de se aproximar de evangélicos

O inferno astral que se inicia para Jair Bolsonaro, com a iminente inelegibilidade graças a uma de dezenas de vezes em que ele usou o cargo para investir contra o sistema eleitoral brasileiro, dá a Lula a chance de recuperar terreno perdido para os setores mais fidelizados pelo bolsonarismo no processo de rápida radicalização da sociedade iniciado em 2013.

O agronegócio é um deles. O presidente está certo quando se espanta com a aversão demonstrada pelos grandes empresários rurais a ele e ao PT. Afinal, em seus dois primeiros governos a exportação de produtos agrícolas cresceu mais, em média, que no mandato de Bolsonaro. A produção de grãos aumentou de forma equivalente. O que desequilibra a estatística a favor do ex-presidente é o crescimento do PIB do agro, bem superior nos últimos quatro anos.

Ainda assim, isso não justificaria a verdadeira ojeriza manifestada por expoentes do agro à volta de Lula ao poder. Trata-se de um coquetel que mistura o discurso anticorrupção encorpado na Lava-Jato e apropriado por Bolsonaro, a investida do ex-presidente para armar o campo e seu discurso de depreciação das pautas ambiental e indígena e da reforma agrária.

Bernardo Mello Franco - O Coronel e o capitão

O Globo

Covardia de Jean Lawand Junior combina com novo tom de Bolsonaro diante da Justiça

O coronel Jean Lawand Junior é um bolsonarista típico. Fala grosso na internet, mas afina na hora de assumir seus atos. Depois da derrota do capitão, o oficial se esgoelou no WhatsApp em defesa do golpe. Ontem ele tentou se fazer de inocente na CPI.

O militar passou ao menos um mês incentivando uma quartelada. Em mensagens enviadas ao tenente-coronel Mauro Cid, pregou uma ação militar para subverter o resultado das urnas. Queria que Jair Bolsonaro desse “a ordem” para botar os tanques na rua.

“Ele tem que dar a ordem, irmão. Não tem como não ser cumprida”, suplicou. Em outro diálogo, o coronel disse que o presidente precisava escolher entre a ruptura institucional e a cadeia. “Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso”, insistiu.

Elio Gaspari - As mentiras que circulam nas redes

O Globo

Patranhas na política são uma coisa, na saúde, outra

É possível que nos próximos meses o Supremo Tribunal Federal e o Congresso retomem a questão do lixo eletrônico que circula na internet por meio das grandes empresas de tecnologia. Quando esse assunto estava na Câmara, as plataformas defenderam-se alegando que o projeto abria uma porta para a censura de ideias. Não abria, mas a cautela adiou uma decisão.

Enquanto a discussão girou em torno da censura de ideias, ela tinha algo de abstrato. Agora vê-se que o lixo vai além, enganando consumidores e prejudicando empresas. Uma única operadora de planos de saúde, a Amil, listou 231 casos de anúncios irregulares na rede em apenas seis meses. Num aspecto, prometem reembolsos impossíveis. Noutros, e são milhares, oferecem curas milagrosas e juventude eterna.

As big techs defendem-se dizendo que procuram filtrar o que levam à rede e que cumprem as decisões da Justiça quando ela determina a retirada dos materiais. É pouco.

O que sempre esteve em questão foi a cooperação das big techs para limpar a parte da rede que está sob seu domínio. Há anos elas oscilam entre a arrogância e o descaso. Quando a Justiça manda, elas cumprem. Só faltava que não cumprissem. Os danos empresariais provocados pelas mentiras sugerem que o Supremo possa tratar desse lixo de maneira diferente. Se é difícil quantificar o dano derivado de uma mentira política, isso é fácil no caso das patranhas empresariais.

Luiz Carlos Azedo - O ex-presidente Bolsonaro em seu labirinto

Correio Braziliense

As investigações sobre o 8 de janeiro estão complicando a situação do ex-presidente. Mesmo que novas provas não sejam incorporadas ao processo pelo TSE, sua inelegibilidade é dada como certa

Com perdão para a memória de Simón Bolívar, o Libertador, e parafraseando Gabriel García Márquez, a história do ex-presidente Jair Bolsonaro começará a ser contada a partir de seu julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que deve condená-lo à inelegibilidade até 2030. O ex-capitão, como o general de romance histórico da literatura latino-americana, construiu um labirinto do qual não consegue sair. Como o personagem fictício, cuja trajetória é fiel aos fatos históricos, Bolsonaro ingressa agora numa fase na qual toda glória se foi. Precisará de muita resiliência para enfrentar mais de uma dúzia de processos, sem a prostração e a angústia do mitológico caudilho de Gabo no final de sua vida.

Spoiler desse clássico da literatura universal: García Márquez, vencedor do prêmio Nobel de Literatura, ao contar a história de Simón José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar y Palacios Ponte-Andrade y Blanco, O Libertador, fala dos percalços da vida, do sofrimento e de sua sina cruel, que a realidade traz à tona sempre que pode, ao final da vida do caudilho.

O general em seu labirinto (Record), de 1989, começa de trás pra frente, nos últimos dias do caudilho venezuelano, durante sua derradeira viagem através do Rio Magdalena, quando rememora paixões, batalhas, derrotas e vitórias. Tecido pelas dores do declínio, seu labirinto é uma mente ambiciosa, muito inteligente e sagaz, que sonhou fazê-lo o chefe político e militar perpétuo de uma única grande nação, do México à Terra do Fogo, depois de conquistar a Venezuela, a Colômbia, o Equador e a Bolívia. O seu ocaso, porém, é cruel.

Hélio Schwartsman - Cabo eleitoral

Folha de S. Paulo

Dificilmente ex-presidente será um 'king maker' em 2024

Jair Bolsonaro será um bom cabo eleitoral? O PL pensa que sim. O partido já faz contas e espera que o ex-presidente prestes a tornar-se inelegível o ajude a eleger 1,5 mil prefeitos em 2024, quintuplicando o número de alcaides da legenda. Mas será que esse cálculo tem base ou é só um desejo meio delirante?

Quando o futuro é opaco, consultar o passado é um bom ponto de partida para as estimativas. E, a julgar pelo passado, Bolsonaro foi uma figura decisiva nas eleições de 2022 —ele conseguiu transformar um poste pessoal no governador de São Paulo—, mas teve um desempenho pífio como cabo eleitoral no pleito municipal de 2020. Na ocasião, o então presidente emprestou seu apoio a 13 candidatos a prefeito e a 45 a vereador. Desses todos, apenas 13 se elegeram, sendo só dois prefeitos, os de Parnaíba (PI) e Ipatinga (MG), que não são exatamente megalópoles.

Bruno Boghossian - O 'dedazo' de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Ex-presidente expõe aflição com sucessão e inventa 'bala de prata' para manter controle na direita

O governador Tarcísio de Freitas "é um excelente gestor" e poderia até concorrer ao Planalto em 2026, mas Jair Bolsonaro "teria de conversar com ele" antes de bater o martelo. A ex-primeira-dama Michelle "pode sair candidata", mas não tem experiência para ser presidente e funcionaria melhor como cabo eleitoral.

À beira de uma condenação que pode tirá-lo da próxima corrida presidencial, Jair Bolsonaro faz zigue-zague para não ser atropelado na própria sucessão. Em entrevista a Mônica Bergamo, o ex-presidente se recusou a apontar um substituto na direita e mostrou que fará de tudo para adiar a definição desse nome.

Mariliz Pereira Jorge - Bala de prata chamada Michelle

Folha de S. Paulo

O imbrochável parece que vai ter de engolir a fraquejada; espero estar errada

Jair Bolsonaro continua o mesmo. A entrevista concedida à jornalista Mônica Bergamo mostra que está mais em forma do que nunca. Raso, vitimista, desclassificado, fala com naturalidade sobre a hipótese de virar garoto-propaganda de imóveis nos Estados Unidos, avalia sua popularidade pelo fato de que encheu uma hamburgueria e comeu de graça: "Enchi a pança". Que pesadelo.

Como esse sujeito foi presidente do Brasil e quase se reelegeu para um segundo mandato? Não é uma pergunta retórica. A reportagem me rendeu um "meudeusdocéu" atrás do outro. Eu me pergunto como não perdemos a capacidade de nos chocar com tanta barbaridade, com tanta distopia. Talvez porque ele sempre conseguiu nos surpreender. Negativamente, claro.

Vera Rosa - Sem Bolsonaro, desafio de Lula é Arthur

O Estado de S. Paulo

Presidente da Câmara desconfia de investigações da PF e Centrão quer derrubar Padilha

Diante do julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode tornar Jair Bolsonaro inelegível por oito anos, a avaliação do núcleo duro do governo é a de que o problema do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, agora, tem outro nome. Em busca de votos da direita após a cassação dos direitos políticos do ex-presidente, dada como certa, a articulação política do Palácio do Planalto será posta à prova. E o desafio de Lula, nesse cenário, se chama Arthur Lira (PP-AL).

Líder do Centrão, o presidente da Câmara anda contrariado por não ter mais o controle da distribuição de emendas parlamentares. No diagnóstico do grupo de Lira, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, é o responsável por travar a liberação de R$ 9,9 bilhões que, com o fim do orçamento secreto, foram herdados por ministérios.

O Centrão passou a trabalhar para derrubar Padilha e se aproximou do chefe da Casa Civil, Rui Costa. Nesse serpentário, nada poderia ser mais simbólico do que a foto postada ontem nas redes sociais, mostrando Padilha, Costa e o líder do governo na Câmara, José Guimarães, sorridentes e com mãos entrelaçadas.

Fernando Exman - O que esperar do Ministério do Turismo

Valor Econômico

Celso Sabino tem se mantido discreto para não melindrar a atual titular da pasta

Mais uma leva de dados sobre o desempenho do setor de turismo era divulgada no Rio de Janeiro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas no último dia 15 de junho, quando começou a circular na capital federal, a quilômetros de distância, a informação de que o deputado Celso Sabino integraria a comitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Pará, seu Estado natal. Não era uma viagem a passeio.

Decidido a aumentar sua base de apoio no Congresso, Lula colocava em prática os princípios da boa hospitalidade e oferecia ao União Brasil da Câmara o Ministério do Turismo. Sabino acabara de ganhar uma passagem, com escala, para a Esplanada dos Ministérios: teria apenas que fazer uma conexão de alguns dias, para que a exoneração da ministra Daniela Carneiro ocorresse sem turbulência.

Martin Wolf* - A reconstrução do mundo americano


Valor Econômico

A raiva e a decepção dos americanos da “classe média” são uma realidade perigosa

Quando os Estados Unidos falam, o mundo escuta. Afinal, trata-se da potência mais influente do mundo. Isso não se deve apenas ao seu tamanho e riqueza, mas também à força de suas alianças e ao seu papel central na criação das instituições e princípios da ordem econômica atual. O país teve um papel decisivo na criação das instituições de Bretton Woods, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio e a Organização Mundial do Comércio (OMC). Também promoveu oito rodadas sucessivas de negociações comerciais multilaterais. Ganhou a guerra fria contra a União Soviética. E desde o início dos anos 1980, pressionou por uma abertura ampla e profunda da economia mundial, recebendo a China na OMC em 2001. Gostemos ou não, todos vivemos no mundo que os EUA construíram.

Agora, sofrendo de arrependimento de comprador, decidiram reconstruí-lo. A secretária do Tesouro americano, Janet Yellen, delineou os aspectos econômicos da nova visão dos EUA em um discurso proferido em 20 de abril. Sete dias depois, Jake Sullivan, o conselheiro de segurança nacional do presidente Joe Biden, fez um discurso ainda mais abrangente, embora complementar, sobre “renovar a liderança econômica americana”. Ele representou um repúdio à política passada. Isso poderia ser visto apenas como uma volta ao intervencionismo de Alexander Hamilton. Contudo, desta vez a agenda não é destinada a um país recém-formado, mas à potência dominante do mundo.

Vinicius Torres Freire - Juros, déficit e nova direção do BC

Folha de S. Paulo

Receita do governo e nomeações de Lula vão influenciar inflação, Selic e taxas de mercado

A grande querela nacional sobre a queda de mísero 0,25 ponto percentual na Selic deve esfriar depois dessa ata da reunião da diretoria do Banco Central, divulgada nesta terça-feira. Deve haver um chorinho de corte da Selic, de 13,75% para 13,50%, em agosto.

O problema maior, como se tem escrito nestas colunas, é quão rápido a Selic vai cair e até que nível. Quanto a isso, nem a ata do BC nem as notícias da inflação por ora permitem estimar que a redução de juros seja rápida e grande.

Além do mais, daqui até o final do ano, dois motivos vão mudar a música da inflação e dos juros no mercado: o tamanho do déficit nas contas do governo e as novas indicações de Luiz Inácio Lula da Silva para a direção do BC.

Zeina Latif - Acertar o passo para o futuro

O Globo

Pesa o fato de os impostos sobre o consumo terem grande importância arrecadatória em um país com Estado grande

Há uma combinação de dois fatores no horizonte que aumentam a urgência de reduzir o custo da folha nas empresas: a reforma tributária de criação do imposto sobre o valor adicionado (IVA) — passo fundamental para destravar o crescimento sustentado — e o inevitável avanço no uso de tecnologias modernas.

As novas tecnologias tendem a reduzir a oferta de vagas em atividades operacionais e repetitivas, que são mais facilmente substituídas por máquinas. A automação e a robotização, há décadas, já vinham reduzindo o trabalho de “chão de fábrica”, enquanto as tecnologias digitais passaram a afetar bastante o setor de serviços. O uso de inteligência artificial é mais um passo nessa direção.

Lu Aiko Otta - Juro alto ofusca semestre positivo

Valor Econômico

Ata da mais recente reunião do Copom foi classificada nos bastidores do governo como “deselegante” e “inapropriada”

A ata da mais recente reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) acendeu sinais de alerta no governo. Um diz respeito à perspectiva para a atividade econômica daqui por diante. Outro foi uma inédita crítica à política fiscal, classificada nos bastidores de “deselegante” e “inapropriada”.

Causou preocupação a elevação da taxa de juros neutra da economia de 4% para 4,5%. Indica que é preciso uma taxa um pouco mais elevada para se chegar a um ponto em que não haja estímulo inflacionário nem deflacionário.

Para um integrante do governo, quer dizer que os modelos utilizados pelo Banco Central estabelecem uma taxa de equilíbrio para o desemprego na casa dos 8,5%. E que não há espaço para a economia rodar num ritmo superior ao que se encontra, algo como 2% a 3%.

Pelo contrário, seria preciso desacelerar a atividade para fazer a inflação convergir mais rápido para a meta (3,25%, com 1,5 ponto percentual de margem de tolerância).

Nilson Teixeira - Difícil tarefa do economista de mercado

Valor Econômico

Incontáveis fatores imprevisíveis influenciam os fundamentos e fogem do alcance dos modelos

Os economistas de mercado que trabalham com análise de conjuntura têm sido acusados de má-fé com o governo de esquerda por terem previsto no fim de 2022 uma inflação mais alta e um crescimento mais baixo para este ano. De fato, a maioria dos analistas julgava que a eventual vitória do atual presidente seria acompanhada de medidas que contribuiriam para maior inflação e desaceleração mais expressiva da atividade. Apesar de reconhecer claro viés político por parte de alguns analistas, prefiro crer que a maioria errou suas projeções devido à leitura equivocada sobre a dinâmica da economia.

A capacidade preditiva dos economistas sobre diversas variáveis econômicas é baixa, mesmo quando o time é competente, bem formado e utiliza modelos e instrumentos sofisticados. A subjetividade - apelidada de arte por muitos - é determinante em muitas ocasiões, pois incontáveis fatores imprevisíveis influenciam os fundamentos e fogem do alcance dos modelos.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Copom cogitou anunciar queda de juros em agosto

Valor Econômico

Contribuiu para moderar a mensagem do Copom a expectativa sobre as decisões da reunião de amanhã do Conselho Monetário Nacional

A ata da reunião do Comitê de Política Monetária tornou explícito o que já estava implícito no comunicado emitido logo após o encontro: os juros começarão a cair. A novidade do documento foi a “avaliação predominante” de que isso poderia ocorrer já em agosto, o que não foi mencionado no comunicado que, no entanto, dava sinais na mesma direção.

Houve “divergência” no Copom em relação à comunicação dos próximos passos da política monetária. Na visão da maioria, “a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”. Houve acordo, porém, com os que acreditam que é melhor esperar “maior reancoragem das expectativas longas e acumular mais evidências de desinflação nos componentes mais sensíveis ao ciclo”.