domingo, 23 de julho de 2023

Opinião do dia - Antonio Gramsci* (Partido Político)


"Será necessária a ação política (em sentido estrito) para que se possa falar de "partido político"? Pode-se observar que no mundo moderno, em muitos países, os partidos orgânicos e fundamentais, por necessidade de luta ou por alguma outra razão, dividiram-se em frações, cada uma das quais assume o nome de partido e, inclusive, de partido independente. Por isso, muitas vezes o Estado-Maior intelectual do partido orgânico não pertence a nenhuma dessas frações, mas opera como se fosse uma força dirigente em si mesma, superior aos partidos e às vezes reconhecida como tal pelo público. Esta função pode ser estudada com maior precisão se se parte do ponto de vista de que de um jornal (ou um grupo de jornais), uma revista (ou um grupo de revistas) são também "partidos", "frações de partido" ou "funções de determinados partidos",

*Antonio Gramsci(1891-1937), Cadernos do Cárcere, V. 3, p. 349, Civilização Brasileira, 2007

Merval Pereira - Virar a chave

O Globo

Cabe ao governo atenuar a atitude belicosa de alguns de seus ministros, sobretudo o da Justiça Flávio Dino, e ao STF encerrar os inquéritos que estão ativos há anos, punir os responsáveis, e voltar a uma autocontenção que será benéfica à sociedade

O país vive uma espécie de estresse pós-traumático, comum em pessoas (e instituições) caracterizado pela dificuldade de voltar ao normal depois de passar por uma situação extremamente dolorosa. O que nos aconteceu durante o governo Bolsonaro, culminando com a tentativa de golpe de 8 de janeiro, continua guiando nosso sistema político-partidário sem dar descanso, fazendo com que vivamos em constante disputa ideológica que exaure a sociedade.

A agressão sofrida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e sua família no aeroporto de Roma é exemplar desse estado de espírito coletivo. Não é possível convivermos eternamente com esses sobressaltos que impedem que o país se desenvolva socialmente. O ministro Alexandre de Moraes tem se destacado nos últimos anos como o ponta de lança do sistema judiciário no combate às fake news e aos ataques à democracia, e nesse papel, fundamental para barrar os ímpetos golpistas do bolsonarismo, virou alvo preferencial de agressores de todo o tipo.

Não é aceitável o que aconteceu em Roma, e merece punição severa o que descreveu em sua denúncia. Talvez seja esse o momento para darmos uma virada de chave, e entrarmos no modo normalidade. Já superamos momentos críticos na vida nacional recente, quando o impeachment da então presidente Dilma e a prisão do hoje presidente Lula levaram a que petistas radicalizassem a luta política, atacando os que consideravam inimigos em qualquer lugar em que estivessem.

Míriam Leitão - Erros e acertos externos de Lula

O Globo

Presidente já reinseriu o Brasil no mundo, mas brigou sem razão com Boric e erra nas posições sobre Venezuela, Nicarágua e Rússia

O presidente Lula já reinseriu o Brasil no mundo, com ações que começaram antes mesmo da posse. Mas, ao mesmo tempo, coleciona arestas, erros de avaliação e gafes. Na briga da semana passada com o presidente do Chile, Gabriel Boric, Lula não tinha razão alguma. Foi uma agressão gratuita, em que afirmou que Boric era “sequioso”, “apressado” e que não tinha experiência em reuniões internacionais. A resposta do presidente chileno foi elegante. Disse que tinha “respeito infinito” e “muito carinho” por Lula.

Por que divergiram os dois líderes da esquerda latino-americana? Desta vez foi por causa da Rússia. Na mesma semana, a Rússia suspendeu o acordo de exportação de grãos e bombardeou portos ucranianos, numa ação contra o comércio de alimentos que afeta mais diretamente países pobres da África, importadores de milho e trigo da Ucrânia.

Mais uma vez o governo de Vladimir Putin mostra o mal que tem produzido por sua decisão de invadir a Ucrânia e começar esse flagelo. A paz é o sonho de todos, mas quem condena a Rússia, como faz Gabriel Boric, tem mais razão do que quem tem uma atitude ambígua, como a diplomacia brasileira.

Elio Gaspari - Os maganos precisam acabar com as 'farofas'

O Globo

Palestras e participações em congressos no exterior, como fez Moraes em Siena, são ridículas e têm aspecto tóxico

A Corte Suprema dos Estados Unidos tem mais de 200 anos e um só caso de juiz que renunciou com a reputação tisnada. Abe Fortas entrou para a Corte em 1965, depois de ter sido advogado pessoal do presidente Lyndon Johnson. Três anos depois, abriu-se a vaga da presidência do tribunal (lá esse cargo é vitalício) e o amigo resolveu promovê-lo. Os senadores republicanos obstruíram a escolha e balearam Fortas mostrando que ele havia recebido US$ 15 mil por palestras numa universidade. O dinheiro vinha de um fundo irrigado por empresas que tinham processos na Corte. Fortas pediu que a nomeação fosse retirada e continuou no tribunal, até que apareceu outro caso, pior, e ele renunciou.

Se a primeira etapa do caso de Fortas for copiada no Brasil, serão centenas as vagas abertas no Judiciário.

Dorrit Harazim - O elevador

O Globo

Desde a instalação em edifícios residenciais no Brasil, a função primeira do equipamento sempre foi a segregação racial e social

Qualquer vida é uma travessia contínua de fronteiras. Somos todos uma cartografia ambulante. Desde o momento da concepção sem volta — narrada de forma memorável pelo personagem central do romance “O tambor”, de Günter Grass — até nosso enredamento final, do qual também não tem volta. Entre o nascer e o morrer, a sucessão de rupturas nem sempre é percebida. O simples movimento de sair de casa (do privado) para a rua (o público), por exemplo, tão corriqueiro e banal , traz embutido todo um ritual preparatório. Vai de uma checada em alguma luz acesa, o fechar de janela ainda aberta, um apalpar de bolsos, uma espiadela na bolsa para ver se está tudo lá, talvez uma última conferida no espelho. Mas, a cada vez que giramos a chave da porta de saída, deixamos para trás nossa vida interior. E do lado de fora, escreveu Georges Perec em “Espèces d’espaces”, “outras gentes, o mundo, o público, a política. Você não pode simplesmente passar de um a outro espaço; para atravessar a soleira você precisa mostrar suas credenciais, saber se comunicar com o universo exterior”.

Vinicius Torres Freire - O maior benefício social da história

Folha de S. Paulo

Tamanho das transferências diretas de renda é muito maior que sob Lula 1, 2 e Dilma

Lula 3 faz a maior transferência de renda direta da história do governo federal. Dado que a tendência de pagamento de benefícios sociais em dinheiro é de crescimento faz um quarto de século, o recorde não soa surpreendente. Não é bem assim.

De qualquer modo, os números têm certo interesse para especular sobre o prestígio político do presidente e sobre o papel que o Desenrola pode ter na percepção popular do desempenho do governo.

Considerem-se apenas benefícios como Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada (para idosos e pessoas com deficiência muito pobres) e abono salarial. Levam 11,8% da despesa total do governo federal e 2,16% do PIB (nos últimos 12 meses. Até o fim do ano, ainda vai ser mais). É um aumento de 76% em relação ao pico desses gastos nos governos Lula 1 e 2, que ocorreu em agosto de 2010. Ou quase 47% maior que no pico de Dilma Rousseff, em setembro de 2013.

Celso Rocha de Barros* - Lula quer taxar os muito ricos

Folha de S. Paulo

Regime atual da taxação dos fundos exclusivos é aberração evidente

O governo Lula vai tentar cobrar mais impostos dos muito ricos. O Ministério da Fazenda planeja propor novas regras para tributar os fundos exclusivos, um tipo de aplicação financeira para quem tem muitos milhões para investir.

Dá até vergonha explicar isso, mas, pelas regras atuais, os ricos que aplicam no fundo exclusivo "Guedes Totoso" pagam menos impostos que a classe média que, por exemplo, investe no fundo de renda fixa "Merreca DI". Para um resumo das vantagens que isso proporciona aos investidores, sugiro a reportagem de Lucas Bombana publicada na Folha da última quinta-feira.

Bruno Boghossian – A fila para 2026

Folha de S. Paulo

Presidente e aliados evitam discutir reeleição, mas se permitem dar pistas do que pensam

Quando alguém pergunta a Lula e seus aliados o que o PT planeja para 2026, eles gastam metade da resposta com a advertência de que é bobagem falar do assunto tão cedo. Na outra metade do tempo, eles se permitem dar pistas do que pensam.

Há duas semanas, Lula disse ao SBT que "seria uma irresponsabilidade" discutir agora a chance de disputar a reeleição. Em seguida, deixou o juízo de lado e brincou com o caso de Joe Biden, que deve concorrer aos 81 anos: "Isso é um estímulo. Eu sou mais novo do que ele".

Muniz Sodré* - Um torso à vista

Folha de S. Paulo

O corpo exposto deixa ver na barriga o rastro da febre coletiva que o elegeu

Apesar da difícil decifração, terá havido algum sentido de marketing na exposição pública do torso nu do ex-presidente, agora cabo eleitoral. Comparou-se o gesto ao de Putin, mas este se exibiu em aparente boa forma física e, mesmo assim, com um retoque de sombra que atenua a naturalidade imediata da pele. O autocrata russo pretendia provavelmente evidenciar, com certa discrição, marcas de saúde ou de sua alegada capacidade esportiva.

Supõe-se de bom tom político a prova pública da sanidade física de um governante. O mesmo não acontece com a mental, em princípio levada oficialmente na flauta. Dona Maria 1º, rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, louca varrida, batia os braços como se fossem asas de galinha. Já Delfim Moreira, oitavo presidente do Brasil e o único considerado clinicamente louco, era manso, notório por comportamentos descosidos como vestir-se de fraque com condecorações para solenidades que não existiam.

Hélio Schwartsman - A próxima pandemia

Folha de S. Paulo

Livro faz balanço do que não funcionou na Covid-19 e tenta tirar lições para o futuro

As leis da biologia asseguram que vírus e bactérias evoluem em ritmo mais acelerado do que o de seres cujo ciclo reprodutivo é mais longo. E sempre que certos patógenos assumirem formas suficientemente novas para ludibriar nossos sistemas imunes, teremos epidemias. Num mundo em que viajantes atravessam continentes em poucas horas, elas se tornam pandemias. É questão de tempo até que venha a próxima. Devemos tentar nos preparar para ela.

É um pouco o que tenta fazer Monica Gandhi em "Endemic". A autora, que é médica infectologista, especializada em Aids, faz um bom apanhado da Covid-19, explicando didaticamente como o vírus Sars-CoV-2 se transmite, a fisiopatologia da doença e as melhores formas de lidar com ela. E, é claro, ela tem o benefício de recontar essa história com o apoio de três anos de anos de pesquisas maciças sobre a moléstia. Para nós que acompanhamos o processo em tempo real e, portanto, atabalhoadamente, é útil saber o que foi confirmado e o que não foi pelo acúmulo dos estudos. A obrigatoriedade das máscaras, para dar um exemplo, não funcionou bem.

Luiz Carlos Azedo - Papa e Biden recorrem a Lula para negociar com Ortega e Maduro

Correio Braziliense

O presidente Lula mudou o discurso em relação aos presidentes da Venezuela e da Nicarágua, seus amigos das horas mais difíceis, mas que se tornaram verdadeiros ditadores

O título até parece fake news, mas não é. A política internacional é feita de interesses permanentes e conjunturas específicas, que se movem como as nuvens na clássica definição do banqueiro, ex-governador mineiro e ex-chanceler Magalhães Pinto: “Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou”. A visita ao Brasil da subsecretária de Estado dos Estados Unidos, Victoria Nuland, revelou uma mudança de postura do presidente Joe Biden sobre a polêmica atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação à Venezuela e à Nicarágua, bem como quanto ao esforço do líder brasileiro em participar das negociações de paz na Ucrânia para se projetar como liderança mundial.

O presidente Lula também mudou o discurso em relação aos presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Nicarágua, Daniel Ortega, seus amigos das horas mais difíceis, mas que se tornaram verdadeiros ditadores, após fraudar eleições e excluir os adversários do processo político. O posicionamento de Lula no encontro dos chefes de Estado latino-americanos com os líderes da União Europeia, em Bruxelas, em muita sintonia com o do presidente francês, Emmanuel Macron, foi interpretado como um realinhamento do governo brasileiro pelo Departamento de Estado norte-americano.

Eliane Cantanhêde - Lula e seus fantasmas

O Estado de S. Paulo

Pra que reforçar equipe de redatores, se Lula detesta discursos e só fala o que quer?

Dizem que, com a maturidade, as pessoas “melhoram” e, com a velhice, ficam mais suaves. Sei não... O presidente Lula, por exemplo, está mais arisco, afoito e boquirroto do que nos dois primeiros mandatos e, com a idade, os seus defeitos e convicções, como os nossos, só aprofundam.

Nos governos 1 e 2, o redator dos discursos de Lula era o baiano Carlos Tibúrcio, jornalista, escritor e ex-líder estudantil preso na ditadura. Agora, é o mineiro José Rezende Jr., também jornalista, culto, discreto, com ótimo texto, que vai ganhar reforços, até de uma assessora de Janja. Mas Lula não gostava e continua não gostando de ler discursos. Dá uma espiada e deixa de lado. Na posse do governo 3, pôs os óculos para ler o texto da assessoria, ironizando: “para parecer intelectual”.

Rolf Kuntz - A crise e o metalúrgico

O Estado de S. Paulo

Baixar os juros pode ajudar, mas é preciso algo mais para promover a reindustrialização do País

O metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva poderia estar encrencado, hoje, se ainda precisasse de um emprego industrial. A indústria fechará 2023 com mais um desempenho pífio, produção 0,8% maior que a do ano passado, segundo a nova estimativa do Ministério da Fazenda. Essa projeção supera a de abril (0,5%), mas é bem inferior aos números calculados para os serviços (1,7%) e para a agropecuária (13,2%). O agro tem sido, por vários anos, o setor mais dinâmico da economia brasileira e a fonte mais segura de superávit comercial. É excelente – e invejável, obviamente – dispor de uma grande e competitiva produção de alimentos e de matérias-primas agropecuárias. Mas isso de nenhum modo compensa a degradação de um setor industrial construído em décadas de muito esforço político e de muito investimento.

O governo continua devendo o prometido programa de “neoindustrialização”, até agora materializado apenas em financiamentos oferecidos pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Esses financiamentos serão destinados, segundo se anunciou, principalmente a projetos de modernização da indústria. Mas falta definir o sentido e o alcance dessa transformação, assim como os papéis do governo e do setor privado.

Lourival Sant’Anna - O falso salvador do mundo

O Estado de S. Paulo

Lula embarcou em uma fantasia calcada em premissas moralmente indefensáveis

O forte viés ideológico da política externa do governo Lula cria fraturas na América Latina e inviabiliza o exercício da liderança que naturalmente caberia ao Brasil. A complacência de Lula com as ditaduras russa, venezuelana e nicaraguense, assim como sua repulsa ao livre-comércio e ao Ocidente, anulam o peso da credencial do presidente no que realmente interessa ao mundo quando olha para o Brasil: a proteção ambiental.

O desmatamento da Amazônia foi reduzido em 34% no primeiro semestre deste ano. A conquista confirma as incomparáveis credenciais de Lula e da ministra Marina Silva, que conseguiram reduzir o desmatamento em 84% entre 2004 e 2012, enquanto o PIB do agronegócio crescia espetaculares 75%.

Ricardo Noblat - Pacificar o Brasil passa pela punição dos que atacaram a democracia

Metrópoles

Uma justiça apressada só produz vítimas inocentes

Há dois anos e quase sete meses, o mundo assistiu, estarrecido, ao vivo e a cores como se dizia antigamente, a invasão do prédio do Congresso dos Estados Unidos, incentivada pelo então presidente republicano Donald Trump, derrotado pelo democrata Joe Biden.

Fazia muito frio em Washington naquele 6 de janeiro de 2021. Os católicos celebravam o Dia de Reis, data em que, segundo a tradição cristã, os Três Reis Magos visitaram o recém-nascido Jesus de Nazaré. Trump disse que a eleição lhe fora roubada.

Dali a 14 dias. Biden, o segundo presidente católico do país (o primeiro foi John Kennedy), tomaria posse, e era isso que Trump e seus seguidores brancos da extrema-direita queriam impedir. Fracassaram. Nem por isso a democracia por lá está segura.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Pedido da PGR sobre bolsonaristas deve ser negado

O Globo

Requisição para ter nomes e dados de identificação é inaceitável, inconstitucional e antidemocrática

É injustificável o pedido feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para que Facebook, Instagram, TikTok e outras plataformas digitais forneçam “nomes e dados de identificação” de seguidores de Jair Bolsonaro, uma devassa inconstitucional que pode atingir 30 milhões de pessoas. Por isso o responsável pelo inquérito, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), precisa negá-lo.

É legítimo e esperado pela sociedade que a responsabilidade do ex-presidente nos atos golpistas do 8 de Janeiro seja investigada. Porém não há nenhum espaço para qualquer tipo de voluntarismo na execução dessa tarefa. A Constituição, que prestigia de forma tão explícita a democracia e o Estado Democrático de Direito, precisa ser sempre o guia das instituições.

Na tentativa de justificar o injustificável, a PGR divulgou nota. Começou dizendo o óbvio: os seguidores de Bolsonaro nas redes sociais não estão sendo investigados. Mas, em seguida, perdeu a linha ao afirmar que o objetivo do pedido era “obter informações que permitam avaliar o conteúdo e a dimensão alcançada pelas publicações do ex-presidente em relação aos fatos ocorridos em 8 de janeiro, nas redes sociais”. O trecho ignora flagrantemente a existência de empresas privadas especializadas em analisar mensagens postadas e audiência.