terça-feira, 14 de novembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Gestão Pochmann no IBGE desperta os piores temores

O Globo

Economista do PT é criticado pelos traços ideológicos que quer imprimir a sua gestão na presidência do instituto

O quase nonagenário Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é uma instituição fundamental para a formulação de políticas públicas. Saem de lá as informações mais relevantes do país: inflação, desemprego, PIB e produção industrial, além do Censo. Trata-se de uma instituição de Estado, na acepção mais nobre do termo. Por isso seus técnicos, de capacidade reconhecida, precisam trabalhar com transparência, independência e isenção. Essas características estão em risco agora, sob a gestão do economista Marcio Pochmann.

A escolha de Pochmann, quadro histórico do PT, veio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, passando por cima da ministra do Planejamento, Simone Tebet. Causou desconforto em setores do próprio governo, por despertar temores de gestão ideológica numa instituição que precisa ser eminentemente técnica. Com menos de um ano à frente do IBGE, Pochmann vem infelizmente confirmando tais temores.

Vinícius Müller* - Para salvar a democracia, mais democracia

Resenha de O horizonte democrático: o hiperpluralismo e a renovação do liberalismo político, de Alessandro Ferrara

A democracia está numa encruzilhada? Segundo Alessandro Ferrara, sim. O autor italiano, professor de filosofia política na Universidade de Roma Tor Vergata, apresenta em seu novo livro, O horizonte democrático: o hiperpluralismo e a renovação do liberalismo político (Editora da Unicamp e FAP – Fundação Astrojildo Pereira, 2023), uma abordagem que, embora prescinda da história para seu entendimento mais imediato a partir da filosofia política – especialmente de John Rawls, de quem Ferrara se declara um seguidor –,  pode e deve usar a história como sua aliada para entender, afinal, o que fez, “paradoxalmente, na conjuntura histórica, quando se tornou um horizonte compartilhado por quase metade da humanidade e poderia se tornar o horizonte comum para quase todas as sociedades do planeta, [a democracia] foi atravessada, naqueles lugares onde existia há mais tempo, por inquietantes processos de desmocratização ou reelitização, muitas vezes vítima do populismo e do descontentamento, e em qualquer caso é obrigada a operar em condições sociais, culturais e econômicas muito mais inóspitas que em qualquer época de seu passado recente” (p. 271).

Merval Pereira - Um código de conduta

O Globo

Os integrantes do mais alto escalão da Justiça americana resolveram prestar contas aos cidadãos, divulgando as regras a que devem obedecer.

A Suprema Corte dos Estados Unidos divulgou ontem seu primeiro Código de Conduta, assinado pelos nove ministros. Por si só, a divulgação de tal Código é importante. Não apenas por ser o primeiro desde 1789, como para demonstrar que os integrantes do mais alto escalão da Justiça americana, que vêm recebendo críticas severas pelo comportamento de alguns, em vez de considerar todas as críticas de conduta como ações políticas contra a Corte, resolveram prestar contas aos cidadãos, divulgando as regras a que devem obedecer.

Essa possibilidade vinha sendo discutida havia anos, sempre que o Congresso americano ameaçava regulamentar as atividades da Suprema Corte a partir de um código de ética elaborado pelos parlamentares. Recentemente, a ministra Elena Kagan apoiou a criação de um código, reforçando o grupo de ministros que entendem importante tal conduta diante das acusações que vêm surgindo.

A partir de março deste ano, já houve mudança nas regras. Os justices (como se designam os ministros da Suprema Corte) tiveram de declarar vantagens como viagens para palestras ou seminários em universidades e instituições privadas. Embora aleguem que elas já são seguidas e se baseiam numa variedade de legislações que regem outros integrantes do sistema de Justiça federal, em sugestões do Comitê Judiciário de Código de Condutas e na prática histórica, consideraram que a inexistência de um código levou a mal-entendidos que sugeriam que os ministros da Suprema Corte, diferentemente de outros juízes no país, se consideravam acima de qualquer regra ética.

Míriam Leitão - Os detalhes da Reforma Tributária

O Globo

Os próximos 180 dias serão de intensa negociação para definir os limites das concessões e, assim, influenciar na alíquota final do novo imposto

Os dois impostos sobre valor agregado vão se transformar em um só. É o que se ouve no Congresso e no governo. Acham que foi necessário fazer dois pela desconfiança federativa, que poderá ser superada com o tempo. O esforço na hora da regulamentação será para fazer tudo o mais simples possível. A ideia que se tem na Fazenda é que a CBS e o IBS tenham um sistema de cobrança só. Serão dois impostos com a mesma legislação, as mesmas regras, o mesmo regulamento. A tramitação da Reforma Tributária ainda não acabou, falta a Câmara, mas já se pensa na implementação.

A proposta tem aberrações. Há um setor que terá redução de alíquota que está definido como “segurança nacional, soberania e cibersegurança”. Como dizer o que é isso? Os técnicos explicam que cada setor foi nomeado genericamente e, por isso, as leis complementares serão tão importantes para definir.

Só a lei dirá exatamente a dimensão de cada concessão, os limites de cada regime específico, como o de educação, por exemplo, me disse um técnico. O que ficará em educação? Eles dão como certo que seja a educação do básico ao superior. “Mas, e os cursos avulsos como inglês ou jiu-jitsu também terão redução da alíquota padrão?”, perguntou um técnico.

Carlos Andreazza - Inviável Cláudio Castro

O Globo

Inviável é o governo Cláudio Castro, falido, incompetente, opaco, fraco, cada vez mais nas mãos dos donos da Alerj, desautorizado a escolher o secretário de Polícia Civil e ainda com três anos para (nos) sangrar.

É frequente a pergunta sobre o destino dos bilhões de reais que o Rio de Janeiro recebeu pela concessão da Cedae. Não sei a resposta. Sei que o dinheiro acabou. (Garantidos ao governador sete camarotes no Maracanã, regados pelo concessionário, mais 200 ingressos de arquibancada por jogo.) Sei também que o segundo semestre do ano passado — eleitoral — foi rico em obras estado adentro.

Informa-nos de que o dinheiro acabou o próprio Cláudio Castro, viajante a Brasília para pedir arrego ao ministro da Fazenda. Em 3 de outubro último, carpindo por nova renegociação nos termos do regime de recuperação fiscal, dramatizou: “Se não avançarmos nisso, é quebradeira de novo dos estados, que já estão em situação difícil”. Prantearia ainda mais miséria:

Andrea Jubé - Massa e Milei voltam às urnas na eleição da rejeição

Valor Econômico

Para um dos marqueteiros de Massa, vencerá quem demonstrar que tem as melhores condições para tirar a Argentina da crise

Uma sequência de frames do rosto de Donald Trump com expressões características do ex-mandatário como fúria, deboche, histeria, ódio abre o filme de 30 segundos. A voz grave do locutor lembra que os americanos elegeram “este tipo”, mas o preço foi a morte de 400 mil pessoas de covid-19, e a tentativa de golpe contra a democracia. Entram imagens da invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021.

Seguem-se frames do rosto do ex-presidente Jair Bolsonaro com expressões típicas do então mandatário como fúria, deboche, histeria, máscara no queixo... A voz grave do locutor relata que os brasileiros “também caíram nesse conto”, e o preço foi a morte de 700 mil pessoas de covid-19, e a tentativa de golpe contra a democracia. Entram imagens da invasão ao Congresso, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 8 de janeiro.

Maria Clara R. M. do Prado - Aguenta Argentina, enquanto pode

Valor Econômico

Os subsídios e as benesses acabam por desencadear uma espécie de bola de neve. Quanto mais os preços aumentam, maior é o gasto público

Por insistência do Ministro da Economia, Sergio Massa, candidato à Presidência da Argentina, seu opositor, Javier Milei, reiterou no debate de domingo que vai dolarizar a economia. Mencionou a intenção apenas uma vez. Poucos minutos antes, diante da mesma pergunta referente à dolarização, Milei havia respondido positivamente com a palavra “conversibilidade”, termo que voltou a usar em outros momentos ao longo do debate. São, como se sabe, iniciativas diferentes. Mencionadas de forma inconsequente só ajudam a causar confusão e insegurança.

A menos de uma semana do segundo e definitivo turno das eleições presidenciais naquele país, o que se ouviu no embate entre os dois candidatos deu a impressão de que os argentinos estarão diante de uma “escolha de Sofia” no próximo domingo. Terão de optar entre um salto no escuro e uma política que, pelo visto, será mais do mesmo. Fora um plano de segurança nacional ousado, Massa não se comprometeu com nenhuma medida econômica nova e diversa daquela que tem pautado os governos mais recentes desde os primeiros anos da era Kirchner, baseada na larga distribuição de subsídios à sociedade.

Pedro Cafardo - Novos Bardellas fizeram e farão muita falta

Valor Econômico

Desindustrialização precoce ocorreu porque industriais abdicaram do debate e da defesa dos interesses do setor e perderam o protagonismo na discussão econômico

Talvez os mais jovens não tenham dado muita importância à notícia da morte do empresário Cláudio Bardella, presidente do Conselho de Administração da Bardella Indústrias Mecânicas. Afinal, a empresa dele, fabricante de bens de capital desde 1911, enfrenta dificuldades financeiras, está em recuperação judicial, e ele próprio, adoentado há anos, desapareceu da mídia.

Mas Bardella é uma dessas figuras brasileiras que merecem aplausos. Lá nos anos 1970, em plena ditadura militar e em meio a um contingente empresarial favorável ao governo, ele era voz firme na defesa da democracia e da indústria nacional.

Em obituário, o Valor lembrou que em 1977, em discurso feito no Rio de Janeiro, na IV Conferência Nacional das Classes Produtoras, Bardella disse que “queria uma democracia sem adjetivos”.

Eliane Cantanhêde - Livre, leve e solta em Brasília

O Estado de S. Paulo

‘Dama do tráfico’ expõe audácia do crime e desleixo na capital da República

É inadmissível e imperdoável o Ministério da Justiça, responsável pela Segurança Pública, abrir as portas e os gabinetes, com direito a fotos, a uma mulher conhecida como “dama do tráfico”, condenada a dez anos de prisão por diferentes crimes e casada com o “Tio Patinhas”, líder do Comando Vermelho no Amazonas, que cumpre pena de 30 anos, inclusive por homicídios (no plural).

O secretário de Assuntos Legislativos do ministério, Elias Vaz, assumiu a responsabilidade, mas isso é pouco para quem recebeu a “dama do tráfico”, Luciane Barbosa Farias, e a encaminhou a outros três integrantes da cúpula da pasta do ministro Flávio Dino. O mínimo que Vaz deveria fazer, até para reduzir a pressão sobre Dino, era pedir demissão – se é que não o fez após a conclusão desta edição.

Rubens Barbosa* - Os EUA e a questão palestina

O Estado de S. Paulo

A pressão da opinião pública, no contexto eleitoral que se aproxima, deverá fortalecer o apoio, desta vez decisivo, para a criação do Estado Palestino

Desde a decisão da ONU, em 1947, pela criação dos Estados de Israel e da Palestina até a crise atual, uma retrospectiva objetiva da política externa americana em relação às crises no Oriente Médio mostra que, ao ignorar as violações do Direito Internacional – ocupação do território palestino, assentamentos ilegais na Cisjordânia, isolamento da Faixa de Gaza, tentativa de anexar o que resta da Palestina e outras considerações geopolíticas –, Washington não contribuiu nem para o encaminhamento de decisões para garantir a segurança de Israel nem para a busca da paz pela desocupação do território palestino e a criação do segundo Estado definido na partilha.

Agora, pela primeira vez, de forma pública e privada, os EUA estão insistindo fortemente numa solução política. Os entendimentos em 1978 (Camp David) e em 1983 (Oslo) estavam na direção correta, mas a política dos dois Estados não contou com o apoio decisivo de Washington.

Luiz Carlos Azedo - Subida no tom e comparação de Israel com o Hamas

Correio Braziliense

"Os Estados Unidos fracassam na tarefa de ser o xerife do mundo, principalmente no Oriente Médio. Biden é tratado como 'pato manco' por Netanyahu"

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu o tom contra o governo de Israel, ontem, ao criticar os bombardeios das Forças de Defesa de Israel (FDI) na Faixa de Gaza, que atingiram civis inocentes, principalmente mulheres e crianças. A mudança de tom ocorreu em evento no qual comemorou o resgate pelo Itamaraty de 32 brasileiros que estavam na Faixa de Gaza e chegaram ao Brasil no avião da Presidência, que os aguardava no Egito.

Desde o começo da reação ao ataque terrorista de 7 de outubro, quando o Hamas matou 1.400 pessoas em território israelense — a maioria mulheres e crianças — e sequestrou 200 reféns, foram mortos pelo exército israelense 12 mil palestinos. Em fala muito dura, Lula equiparou a reação de Israel em Gaza ao atentado terrorizara do Hamas: "A quantidade de mulheres e crianças que já morreram, de crianças desaparecidas, a gente não tem conhecimento em outra guerra. Depois do ato de terrorismo do Hamas, a solução do Estado de Israel é tão grave quanto foi o ato do Hamas, porque eles estão matando inocentes sem nenhum critério".

Joel Pinheiro da Fonseca - Converter-se ao cristianismo é nossa única esperança na guerra de civilizações?

Folha de S. Paulo

O 'Novo Ateísmo' virou peça de museu e havia, de fato, uma certa ingenuidade nele

A conversão de Ayaan Hirsi Ali ao cristianismo —descrita em seu artigo "Why I am now a Christian", na revista UnHerd— é um sinal dos tempos. Para quem não a conhece, Ali é uma intelectual de origem somali (já foi cidadã holandesa, hoje é americana) que se notabilizou pela crítica ferrenha ao islã, num momento em que todos ficavam (como ainda ficam) cheios de dedos para apontar problemas na religião. Quando publicou seus primeiros livros, Ali era uma ateia convicta. Fazia parte do chamado "Novo Ateísmo", junto com Richard Dawkins, Daniel Dennett, Christopher Hitchens e outros, lá por 2010.

Hoje, o "Novo Ateísmo" virou peça de museu. Havia, de fato, uma certa ingenuidade nele. Primeiro a crença no poder da argumentação para vencer a fé no sobrenatural. E, em segundo, a certeza de que a história chegava ao fim: a democracia liberal e laica era a campeã inconteste no mundo; restava apenas varrer os atavismos da religião, fosse ela qual fosse.

Dora Kramer - Fome de anteontem

Folha de S. Paulo

Congresso quer criar novas emendas com base no critério do famigerado fundo eleitoral

No conceito, não há nada de errado nas emendas que os parlamentares têm direito de apresentar ao Orçamento da União para destinar verbas a estados, municípios e/ou instituições. O problema está no uso, e principalmente no abuso, do instrumento.

Tanto por parte do Executivo quanto do Legislativo. Até 2015 o Palácio do Planalto tinha poder discricionário total sobre elas, fazendo da liberação do dinheiro uma maneira de manipular a vontade dos congressistas nas votações de interesse do governo.

A partir daí, quando foi instituída a obrigatoriedade do pagamento, a lógica se inverteu, e o Parlamento passou a dar as cartas. E com cada vez mais poder, cujo ápice se deu na gestão de Jair Bolsonaro na forma do Orçamento secreto, depois derrubado pelo Supremo Tribunal Federal.

Hélio Schwartsman - Honra ao mérito

Folha de S. Paulo

Meritocracia, na acepção forte, é um mito; daí não decorre que certas seleções não devam ser feitas pelo critério da excelência

Encerrei minha coluna anterior afirmando que a meritocracia é um mito. Ato contínuo, leitores me escreveram contestando a asserção ou, ao menos, cobrando esclarecimentos. Vamos a eles.

A meritocracia em sua acepção forte sustenta que os recursos e as oportunidades que a sociedade oferece devem ser distribuídos segundo as competências de cada indivíduo e que utilizar tal critério significa fazer justiça, já que recompensa os méritos e deméritos de cada um.

Luiz Gonzaga Belluzzo* - Homenagem a Claudio Bardella

CartaCapital

Ele representava uma geração de empresários comprometidos com as empresas, o País e o povo

Leio com pesar, no jornal Valor: “Claudio Bardella morreu na sexta-feira (3), aos 85 anos.”

Conheci Claudio Bardella na segunda metade dos anos 70 do século passado. O Fórum Gazeta Mercantil, iniciativa do então diretor de redação do jornal, Roberto Muller, realizava eleições entre as lideranças empresariais. Bardella figurava entre os escolhidos em 1978. Pertencia a uma geração de empresários brasileiros comprometidos com suas companhias, seu País e com o progresso econômico e social do seu povo.

Nessa geração figuravam Antônio Ermírio de Moraes, Paulo Cunha, Paulo Villares, Abraham Kasinski, José ­Mindlin, e outros. Muitos deles tiveram o desassombro de assinar, em 1978, o ­Documento dos Oito, um grito empresarial em defesa do Brasil que ainda avançava nas rotas da industrialização.

Não posso conceber mais digna homenagem ao grande empresário, senão oferecer uma sucinta narrativa da saga da industrialização brasileira. Saga que contou com seu valioso protagonismo.