sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

IHU On-Line – As instituições continuam funcionando neste governo?

Luiz Werneck Vianna Um dos alvos preferidos deste governo é o Judiciário, especialmente o STF, que conta como cavalo de batalha do ex-juiz Moro, o qual, em nome de uma cruzada contra a corrupção - uma cruzada idiota e que não faz sentido algum -, ganhou uma parte da opinião pública e projeção na mídia, e provoca o Supremo a cada passo.

A vida institucional tem servido de obstáculo para o aprofundamento das experiências autoritárias que o governo quer fazer. Aonde isso vai parar? Guerras de posição podem se converter em guerras de movimentos. Não é o caso de a sociedade se mobilizar agora para uma guerra de movimentos, pois ela não tem força para isso; mas o governo pode. Mas pode cometer aventuras nessa direção. Ele tem tentado descobrir um caminho para isso, mas está difícil, porque ele não tem suporte interno. Por exemplo, os militares são muito avessos a concepções aventureiras.

A instituição militar tem séculos de experiência da vida republicana brasileira. A tentativa de fazer o governo passar de uma guerra de posição para uma guerra de movimento é uma aventura sem tamanho. Ele não tem força na sociedade, nem partido, nem movimentos sociais para isso. Tem arremedos como esse novo partido [Aliança pelo Brasil], que é uma ressurreição do Partido Integralista.

Estamos num momento de empate; não de impasse. A sociedade vai tendo mais força a cada momento que passa e novas lideranças surgem, como Armínio Fraga e outras que estão surgindo por aí. O novo é imprevisível e a emergência dele não está sendo abafada por um autoritário. Veja a mídia: ela está desenvolta, você encontra articulistas e colunistas trabalhando facilmente nessa linha de procurar frentes de resistência ao que está aí. Agora, quando isso vai se constituir num movimento ofensivo por parte da oposição, não dá para saber. O fato é que as eleições deste ano são um balão de ensaio para isso, especialmente em alguns estados relevantes da federação.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio, Em entrevista 13/1/2020

Antônio Cláudio Mariz de Oliveira* - O Brasil está a caminho da distopia?

- O Estado de S.Paulo

Resta-nos resistir para ela não retirar os ares de liberdade e democracia que ainda respiramos

Procurei em vários dicionários, incluídos os dedicados aos sinônimos e aos antônimos, mas encontrei em apenas um, o Houaiss, o significado de distopia. Está lá explicado tratar-se de “localização anômala de um órgão”. Já para o Google, trata-se de um lugar ou Estado imaginário em que se vive em condições de extrema opressão.

Parece ser esse o sentido emprestado ao vocábulo pela seção Estante, do caderno Aliás, publicado pelo Estado de 21 dezembro de 2019, que versa sobre alguns livros a respeito da chamada “literatura futurista distópica”. Segundo definição da matéria, “a distopia parece ser o oposto de utopia, já que esta descreve um mundo ideal alcançável, enquanto a distopia fala de um mundo árido”.

Seria a antítese do sonho, da esperança, do otimismo. A descrença, a visão catastrófica, a hecatombe de um porvir indesejável e temido, por vezes inimaginado. Por estar fora de nossas previsões, foi sempre colocado na forma de obras ficcionais, na literatura ou no cinema.

Pois bem, os livros comentados confirmam a síntese da matéria. O mundo distópico é cruel, marcado pela supremacia absoluta do Estado, em substituição ao querer social e ao livre-arbítrio, com consequências nefastas sobre os direitos humanos. A vontade dos governantes prevalece sobre tudo e todos, deixando de lado o ordenamento jurídico, os princípios que preservam a dignidade da pessoa e as liberdades públicas e individuais.

Entrevista / A aposta da nova direita

Eleições municipais são estratégicas para bolsonarismo, mas partidos tradicionais é que devem se destacar, diz José Augusto Guilhon

Por Diego Viana — Para o Valor Eu &Fim de Semana

SÃO PAULO - Após a vitória conservadora nas eleições de 2018, os grupos de direita ligados ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) têm a expectativa de crescer também nas prefeituras e câmaras de vereadores neste ano. Entretanto, quem tem a vantagem na política local são os partidos tradicionais, de maior capilaridade e conhecedores dos problemas de cada região, afirma o cientista político José Augusto Guilhon de Albuquerque, professor de relações internacionais da Universidade de São Paulo.

Para Guilhon, o cenário político deste ano não será muito diferente do ano passado, com os deputados do “Centrão” decidindo o que vão aprovar e o que vão barrar das iniciativas vindas do Planalto. O Executivo continuará enredado em problemas que ele mesmo cria, mas as demais forças políticas não têm interesse ou capacidade de inviabilizar completamente o governo. Essa é a garantia de um certo grau de estabilidade.

O cientista político também vê pouca perspectiva para as oposições. Embora goze de popularidade, depois que foi solto da prisão o ex-presidente Lula (PT) adotou um discurso que mais prejudica do que favorece seu partido. Lula tem reforçado a radicalização, com propostas que desagradam tanto o sistema político quanto a maioria do eleitorado. As movimentações que buscam apelar para os eleitores de centro, porém, são desprovidas de base e excessivamente vinculadas a candidatos que não atraem votos. Por isso, para Guilhon, têm pouco futuro, embora apelem para a maioria da população.

Valor: Este é um ano de eleições municipais, as primeiras depois do avanço conservador de 2018. O que esperar dessas eleições?

José Augusto Guilhon de Albuquerque: Não acredito que haja grande mudança. O sistema de partidos depende da lei eleitoral, e a nossa produz multiplicidade de partidos. Não creio numa grande mudança no cenário, porque o resultado das eleições nacionais, em geral, têm efeito limitado nas eleições locais. Estas dependem mais de questões locais e da política estadual. Os grandes partidos não vão ser tão esvaziados como em 2018. Ocorreu esvaziamento do PT, mas ele continua sendo o mais forte na Câmara, por exemplo.

Valor: E quanto ao impulso da nova direita que levou Bolsonaro ao poder? Continua com fôlego?

Guilhon: Não acredito que essa direita, próxima à extrema-direita, tenha qualidade organizacional para pesar no eleitor municipal. Na eleição municipal, é preciso mobilizar prefeitos e vereadores, que são ligados a quadros partidários locais. Essa capilaridade falta à nova direita, mas os partidos tradicionais têm. Além disso, não há por que obter a polarização de 2018. O segundo turno polariza, sobretudo no plano nacional. Quando há dois grupos que radicalizam, o centro desaparece. Isso dificilmente vai se reproduzir localmente, onde, no geral, as forças conservadoras são mais fortes.

José de Souza Martins* - O corte de palavras

- Valor Econômico / Eu &Fim de Semana

O governo quer diminuir o número de palavras dos livros didáticos, quer ampliar o espaço do silêncio na boca das crianças e dos adolescentes

Declaração antipedagógica do presidente da República, sobre seu governo reduzir palavras nos livros didáticos, é um desses indícios cotidianos de fragilidade governativa. Alarma os que se inquietam com os riscos de toscas concepções de política. Nesse caso, especialmente os educadores, pelo amadorismo e pelos perigos que tais palavras acarretam ao sistema de ensino e à formação das novas gerações.

Elas terão na capa dos livros as cores da bandeira, mas não saberão o significado social e político da palavra “pátria”, que é uma síntese do sentido de muitas palavras, unidade do diverso, a do nosso nós. Não há pátria onde faltam palavras para que a poesia do destino em comum se faça ouvir. É a poesia de nossa abundância barroca de palavras que nos faz um povo único, brasileiro.

É assim que se pode compreender o incompreensível da fala de porta de palácio, há alguns dias, ao dizer o presidente que nossos livros didáticos têm excesso de palavras: “Em 21, todos os livros serão nossos. Feitos por nós. Os pais vão vibrar. Vai estar lá a bandeira do Brasil na capa, vai ter lá o hino nacional. Os livros hoje em dia, como regra, é (sic) um amontoado Muita coisa escrita, tem que suavizar aquilo”, disse ele.

É da lógica da economia neoliberal que governar é fazer cortes. O governo quer diminuir o número de palavras dos livros didáticos, quer ampliar o espaço do silêncio na boca das crianças e dos adolescentes. Ora, livros não são caixas registradoras. O que se espera é que os livros sejam o abrigo de palavras em abundância, com sentido. Não palavras tuitadas para dizer muito sem dizer nada.

A fala à porta do Palácio do Planalto é um indício do advento político da pós-modernidade, a das reduções e simplificações do pensamento aplainado, linearizado, da inteligência de distâncias curtas entre a premissa e a conclusão. O pensamento de quem não sabe pensar.

A pós-modernidade é isso. A sociedade mergulhada no tempo da intemporalidade, a das equivalências gerais, do critério chão do “eu acho”.

Fernando Abrucio*: A reforma mais urgente

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

A aprovação de um novo Fundeb, fonte que regula o financiamento de toda a educação básica brasileira, deveria encabeçar a pauta legislativa

O Brasil precisa fazer uma série de reformas legais para resolver seus principais problemas e alcançar um novo nível de desenvolvimento. Assuntos não faltam neste campo, e muitos deles são considerados prioritários, como a reforma tributária, que pode ao mesmo tempo aumentar a competitividade do país e reduzir desigualdades. Mas qual seria o tema mais urgente em 2020, isto é, algo que se não for aprovado neste ano terá mais consequências negativas? A resposta talvez não seja a esperada pela maioria dos leitores, porém, os dados são eloquentes: a aprovação de um novo Fundeb, fonte que regula o financiamento de toda a educação básica brasileira, deveria encabeçar a pauta legislativa.

Não se trata aqui de escolher o tópico mais importante entre os vários que dependem de PECs ou novas legislações. Na seleção do que é mais importante para a nação, alguns escolheriam a reforma administrativa, outros, a autonomia do Banco Central, e provavelmente a maioria optaria pela mudança tributária. Contudo, mesmo que todos esses pontos sejam fundamentais, a sua não aprovação imediata não causaria um enorme transtorno aos cidadãos.

Neste sentido, a escolha do Fundeb vincula-se ao impacto imediato de sua possível extinção, que acontecerá em 2021, caso não seja aprovada sua prorrogação. O fim desse fundo educacional geraria uma situação de calamidade pública em boa parte do país.

Segundo os dados da Consultoria de Orçamento e Finanças da Câmara dos Deputados, um hipotético fim do Fundeb levaria à redução de cerca de 15% da capacidade de investimento em educação em cerca de três mil municípios brasileiros, onde estudam 20 milhões de alunos, oriundos geralmente dos estratos mais pobres da população. Nestes lugares, faltarão recursos para pagar os professores que lecionam nas escolas. Imaginem como ficariam essas cidades e seus cidadãos. Seria um tipo de “Mad Max” da ignorância que se instalaria nestes territórios.

Malu Delgado - Explosões das pedras de toque da ética pública

- Valor Econômico

Secretário põe a Comissão de Ética Pública em evidência

Não fica claro que pontes de diálogo o secretário especial de Comunicação da Presidência da República, Fábio Wajngarten, vê “explodidas” com veículos de comunicação após reportagem da “Folha de S. Paulo” ter revelado que ele, funcionário do primeiro escalão do Palácio do Planalto, detém 95% das cotas de uma empresa que faz negócios e ganha dinheiro de emissoras de televisão e agências contratadas por órgãos da administração pública federal. Num governo em que boa parte dos integrantes despreza, desrespeita, hostiliza e desqualifica o jornalismo profissional e o trabalho da imprensa, dia sim e outro também, Wajngarten deve ter a ciência, melhor do que ninguém, da impossibilidade de buscar diálogos em campos que seu chefe insiste em minar.

Celso Bandeira de Mello usou a expressão “pedras de toque” para definir princípios basilares do direito administrativo. A noção de conflito de interesse, para quem se dispõe a entrar na administração pública, seria uma dessas pedras de toque, apropriando-se da definição. É aquele assunto recorrente, que no Brasil é ignorado por parte expressiva (sem generalizar) dos políticos, do funcionalismo público e da população: a dificuldade de se entender que não se faz negócio privado na esfera pública. Para ficar claro: não se usa o Estado (o público) ao bel prazer do indivíduo (o privado). A miopia - na maioria das vezes proposital - dos agentes públicos para enxergar com clareza o conceito de conflito de interesses é recorrente e não um privilégio de integrantes do governo de Jair Bolsonaro.

Chama a atenção o fato de Wajngarten, em sua defesa, ter citado a Lei 8.112/90 que, segundo a Secretaria de Comunicação (Secom), “define as regras para o exercício de cargo público e seus impedimentos” e “determina que ao ocupante de cargo público basta se afastar da administração, da gestão da empresa da qual é acionista”, para exercer a função pública. Em nenhum momento o secretário menciona a existência da lei posterior e específica, de 2013, a Lei 12.813, que “dispõe sobre o conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego do Poder Executivo federal e impedimentos posteriores ao exercício do cargo ou emprego”. A legislação citada pela Secom trata do Regime Jurídico Único, é o estatuto servidor público federal, concursado. Não cabe, portanto, invocar tal lei quando se trata de cargo de confiança, de acordo com o ex-presidente da Comissão de Ética Pública (CEP), Mauro Menezes.

Dora Kramer - Uma cajadada só

- Revista Veja

Bolsonaro usa criação de legenda para mobilizar tropa eleitoral

A cena política dita tradicional está em risco, de novo, de perder para o presidente da República o bonde que já havia perdido em 2018 para o candidato Jair Bolsonaro. Daquela vez a bobeada foi em relação ao uso das redes sociais como instrumento de campanha. Agora, os partidos marcam passo no campo da mobilização popular ao não dar a devida atenção aos movimentos feitos em torno da criação da legenda Aliança pelo Brasil.

O debate tem se dado sobre a possibilidade de Bolsonaro e companhia reunirem as assinaturas necessárias para conseguir o registro no Tribunal Superior Eleitoral até abril, a fim de concorrer às eleições de outubro na nova casa. Bobagem, perda de energia, saliva, cliques e papel. Bolsonaro não está preocupado com isso. Ainda que houvesse tempo, e não há, ele preferiria deixar a formalização do partido para o próximo ano ou mais um pouco porque o que interessa são as eleições de 2022. Para isso, tem até abril daquele ano para obter o registro.

Desse período, Jair Bolsonaro vem sabendo tirar vantagem. Nas barbas dos adversários, cuja visão estreita os impede de enxergar meio palmo para além dos respectivos narizes ocupados com outras tarefas. Umas mais, outras menos produtivas.

Parte da esquerda é refém de Lula, presa voluntária e/ou involuntariamente ao culto daquela personalidade; parte está procurando escapar dessa armadilha, buscando diálogos ao centro.

Desse campo para a direita a preocupação também é construir consensos, coisa que toma todo o tempo de seus autores.

Monica de Bolle* - Quando os gigantes encolhem

- Revista Época

Quando encolhem, os motivos para comemoração de anúncios como o acordo China-EUA devem ser vistos com um olhar crítico e bastante cético

Escrevo este artigo no dia em que, a algumas quadras de onde trabalho, Trump comemora a primeira fase do acordo selado com a China. A primeira fase do acordo pouco altera aquilo que já está em vigência. Os Estados Unidos concordaram em suspender a imposição de tarifas de importação adicionais aos produtos chineses, reduzir algumas das hoje existentes e manter muitas das que foram instituídas ao longo da guerra comercial iniciada há dois anos. Em troca, a China prometeu comprar mais produtos agrícolas dos EUA, além de outros bens e serviços. 

O governo Trump haverá de monitorar o cumprimento do acordo, mas sem estabelecer critérios claros sobre que tipo de ação poderia provocar o recrudescimento da guerra comercial com a China, deixando no ar incertezas consideráveis para o restante do mundo. Nas declarações antes da assinatura dos documentos, Trump exaltou seu feito dizendo que se abria uma nova era de comércio livre, justo e recíproco. Há uma falsa qualificação entre os três adjetivos: livre o comércio com a China não é mais, já que as tarifas médias passaram de 3% a quase 20% desde o início do governo Trump.

Guilherme Amado - Brasil, país do passado

- Revista Época

O currículo de contribuições para que o país do futuro passasse a ser visto como um palco do retrocesso é longo. Tudo isso não passa despercebido de quem observa o país

Daqui a algumas décadas, quando os livros (com muito texto, de preferência) tiverem a missão de discorrer sobre os anos Bolsonaro e os prejuízos por eles causados à imagem do Brasil no exterior, poucas cenas vão resumir tanto o período quanto a da quarta-feira 8, quando Bolsonaro ligou a câmera, postou-se de costas para ela e se deixou filmar para seus milhões de seguidores nas redes sociais. Em silêncio, assistiu por 8 minutos e 50 segundos ao pronunciamento de Donald Trump sobre os ataques do Irã, na véspera, a bases americanas no Iraque. Nada simbolizou mais até agora a vassalagem brasileira em relação aos Estados Unidos, uma postura que tem chocado gerações de diplomatas, de diferentes matizes ideológicos, não só por ir contra tudo que pregam as diretrizes da diplomacia mundial, mas também por trazer dividendos que o país conseguiria da mesma maneira. A mansidão para o lado de Trump seria só mais um traço da caricatura de um homem que se regozija de falar grosso para baixo e fino para o alto, se não viesse acompanhada por decisões e episódios que têm manchado uma reputação conquistada pelo Brasil — de alegria, esperança e boas perspectivas para o futuro —, fosse quem fosse o ocupante do terceiro andar do Planalto.

O currículo de contribuições para que o país do futuro passasse a ser visto como um palco do retrocesso é longo: a leniência diante do aumento das queimadas na Amazônia, a verborragia contra os direitos humanos de qualquer humano que não o apoie, a ideologização das relações bilaterais com países historicamente amigos, como a Argentina e a França, a mudança de posições antigas do Brasil de respeito à identidade de gênero, a ameaça de mudar a embaixada de Israel, gerando uma crise com países árabes, a obsessão olavista de que o Brasil esteve à beira de um regime comunista, a crise com o Irã por apoiar o assassinato americano ao general Qassem Soleimani. Tudo isso, ora gerando irritação, ora só deboches, não passa despercebido de quem observa o país.

Merval Pereira - Talvez nunca

- O Globo

Juiz de garantias é uma boa medida, mas foi criado como uma espécie de vingança contra a Operação Lava-jato

Com a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) ministro Dias Toffoli de adiar em seis meses a implantação do sistema do juiz de garantias, que dividiria com o juiz de sentença os processos, não apenas verifica-se que não há condições de incluir essa nova figura sem uma ampla reorganização do sistema judicial brasileiro. Estamos novamente às voltas com uma disputa entre os membros do STF, que já tem seis ministros declaradamente a favor do novo sistema.

O ministro Luis Fux, que substitui em setembro Toffoli na presidência do STF, é contra essa mudança e poderia acatar as ações de inconstitucionalidade já a partir de domingo, quando assume interinamente a presidência no recesso do judiciário.

O novo prazo dado por Toffoli para a implantação do juiz de garantias, que considera “um avanço sem precedentes”, se esgota em julho, e se tiver que ser prorrogado mais uma vez - o que é bastante provável - corre o risco de não entrar em vigor tão cedo, ou nunca.

De saída, Toffoli limitou a atuação dos juizes de garantias. Eles não atuarão em casos dos tribunais superiores e nem nos tribunais regionais, de segunda instância. Também não serão parte de disputas nos tribunais eleitorais. E só participarão dos novos processos, a partir da sua implementação. Os processos em curso não terão essa nova figura jurídica.

Bela Megale- As relações da família Bolsonaro com o chefe da Secom

- O Globo

Desafeto de Carluxo, o chefe da Secom conta com o apreço de uma figura de peso para Jair Bolsonaro, a primeira-dama Michelle. Fábio Wajngarten enfrenta desgaste no governo desde quarta, quando o jornal "Folha de S. Paulo" revelou que sua empresa mantém contratos com emissoras de TV e agências de publicidade que recebem verba federal.

Quando Wajngarten assumiu a comunicação da Presidência, Michelle não escondeu que o achava expansivo e agitado demais. Depois, porém, passou a ter afeição pelo secretário.

Há cerca de dois meses, a primeira-dama foi até o Palácio do Planalto, onde raramente aparece, para participar de uma pequena comemoração do aniversário de Wajngarten. A festinha teve direito a bolo com boneco reproduzindo o chefe da Secom.

A palavra de Michelle tem força junto ao presidente. Nomes como o do ex-senador Magno Malta não entraram no governo por veto da primeira-dama. Já a secretária nacional da pessoa física, Priscila Gaspar, foi nomeada graças ao apoio dela.

Bernardo Mello Franco - Nostalgia da mordaça

- O Globo

Bolsonaro sonha com a volta do tempo em que o governo podia calar a imprensa. Na impossibilidade de mandar censores às redações, ele ataca os jornalistas que são obrigados a ouvi-lo

Não é só a lembrança do DOI-Codi que faz Jair Bolsonaro sentir saudades da ditadura. O presidente sonha com a volta do tempo em que o governo podia amordaçar a imprensa. Na impossibilidade de mandar censores às redações, ele ataca jornalistas que, por dever de ofício, são obrigados a ouvir suas grosserias diárias.

Ontem o capitão esbravejou em três turnos. De manhã, na porta do Alvorada, mandou uma repórter “calar a boca”. À tarde, no Planalto, afirmou aos gritos que os jornalistas não têm “vergonha na cara”. À noite, no Facebook, disse que a imprensa “estraga o país”.

A razão da ira foi a notícia de que o chefe da Secretaria de Comunicação mantém negócios com empresas que recebem verbas do governo. Fábio Wajngarten se formou em direito, mas incorreu num caso clássico de conflito de interesses. Ele aprova repasses de dinheiro público para emissoras que contratam sua firma particular.

Flávia Oliveira - Os desaparecidos da crise hídrica

- O Globo

Problema deveria ser tratado pelo primeiro escalão, mas está entregue ao segundo

O Rio de Janeiro tem governador e secretário estadual do Ambiente, mas parece estar com assentos vagos. Wilson Witzel (PSC) e Altineu Côrtes (PL) tornaram-se invisíveis durante crise hídrica que já dura duas semanas. De férias, o chefe do Executivo não antecipou o fim da temporada na Disney, quando moradores da Região Metropolitana começaram a denunciar que a Cedae estava entregando água com cheiro, cor e gosto, contrariando tudo o que aprendemos sobre potabilidade. Até ontem, o problema alcançava 71 bairros da capital e seis municípios da Baixada Fluminense, com implicações na qualidade de vida, na saúde, na economia e até na área policial. Deveria ser tratado pelo primeiro escalão, mas está entregue ao segundo.

Desde a virada do ano, Witzel publicou uma centena de tuítes — a forma de comunicação preferida de governantes contemporâneos para se comunicarem com eleitores, contribuintes e opinião pública. Apenas dois posts diziam respeito à estatal fluminense de água e esgoto. O governador do Rio gastou 396 caracteres para declarar que “são inadmissíveis os transtornos”; determinou “apuração rigorosa”; cobrou “solução definitiva para aprimorar a qualidade da água e do tratamento de esgoto das cidades próximas aos mananciais”. Só ontem à noite, de volta à capital, se reunia com o presidente da Cedae, Hélio Cabral. Houve um tempo em que mandatários de palácios demonstravam preocupação — ou disfarçavam a indiferença — formando grupo de trabalho, gabinete de crise ou comitê de emergência para tratar de temas urgentes como uma pane no abastecimento de água na temporada de mais calor e maior número de turistas.

Eliane Cantanhêde - Pau para toda obra

- O Estado de S.Paulo

Militares fazem ponte, combatem criminosos, limpam praias e... vão parar no INSS

Nos estertores do regime militar, toda vez que aparecia alguma encrenca, o presidente João Figueiredo ameaçava: “Chama o Pires!” Era uma senha para tentar assustar a oposição. Ou ela se comportava direitinho, ou o governo convocava o ministro do Exército para dar um jeito. No fim, Figueiredo nunca convocou para valer os militares e, afora os percalços e recuos, a transição foi concluída e o poder reassumido pelos civis.

Hoje, quatro décadas depois, numa situação bem diferente, a ordem do capitão presidente Jair Bolsonaro é mais genérica e vale para tudo: “Chama os militares!” E, assim, ele entupiu o governo de militares de diferentes patentes, desde oito ministérios até o segundo e o terceiro escalões de praticamente todas as áreas.

Eles estão na infraestrutura, nos transportes, no meio ambiente, na educação, no turismo, nas agências reguladoras, nas estatais. E as sucessivas demissões de generais, por cima, não desestimularam os colegas de várias patentes, por baixo. Calcula-se que em torno de 80% deles sejam do Exército, mas Marinha e Aeronáutica não ficaram de fora. Pelo menos, não reclamam.

O fato é que, com a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que permitiu o uso das Forças Armadas na guerra urbana de cada dia, os militares são pau para toda obra. Já eram essenciais para a construção de estradas e pontes em locais distantes, por exemplo, apagam incêndio na Amazônia, limpam praias do maior derramamento de óleo da história, estão em todas. E vão parar no INSS.

Bruno Boghossian – Um presidente em desequilíbrio

- Folha de S. Paulo

Presidente tenta intimidar imprensa, mas jornais não são a única vítima desses ataques

Jair Bolsonaro sabia que seu secretário de Comunicação tinha negócios com empresas contratadas pelo governo? Vai pedir os nomes dos clientes de seu auxiliar para avaliar o caso? Enxerga o óbvio conflito de interesses no episódio? O presidente acha que os cidadãos não merecem essas explicações.

Numa jornada de evidente desequilíbrio, Bolsonaro tentou intimidar quem perguntava sobre o assunto. Disse a uma repórter da Folha que calasse a boca, deu berros durante uma cerimônia no Palácio do Planalto e lançou a outro jornalista uma provocação das mais apalermadas: “Tá falando da tua mãe?”.

Já se sabe que o presidente não acredita na liberdade de imprensa, mas o surto de estupidez mostra também que Bolsonaro se recusa a prestar contas ao país e esclarecer questões que o incomodam.

Pelo segundo dia seguido, ele foi incapaz de produzir uma justificativa para o fato de que Fabio Wajngarten, chefe da Secretaria de Comunicação, gerencia contratos públicos com empresas que são suas clientes na iniciativa privada.

Bolsonaro mentiu, tentou mudar de assunto e fugiu de dar entrevistas sobre o tema. Numa explosão de sinceridade ao fim de um discurso no Planalto, confessou aos jornalistas seu desejo, aos gritos: “Deixem o nosso governo em paz!”. Foi aplaudido pela plateia de aduladores.

Ruy Castro* - Aloprar ou recrudescer

- Folha de S. Paulo

Nossos presidentes, quando menos se espera, cometem ousadas piruetas verbais

Há semanas, agoniado com as investigações do Ministério Público do Rio sobre a “rachadinha” no gabinete de seu filho Flávio quando deputado estadual, Jair Bolsonaro ejaculou: “Se não tiver a cabeça no lugar, eu alopro!”. Aloprar significa ficar inquieto, agitado —aloprado. E Bolsonaro tem razão para aloprar —talvez já esteja sentindo a Justiça perigosamente perto das trampolinagens da família. Mas vamos ser justos. Num governo estrelado por tantos analfabetos, inclusive ele, surpreende vê-lo resgatar um verbo tão exótico e pouco usado.

O general João Batista Figueiredo, último presidente da ditadura, também apelou certa vez para um verbo incomum. Reagindo às tremendas pressões sobre ele, vindas tanto dos civis quanto da linha-dura militar, Figueiredo explodiu: “Olha que eu recrudesço!”. O país parou, expectante. Parecia uma ameaça —mas de quê, como e contra quem? No Pasquim, Jaguar botou seus dois calunguinhas para discutir. Um deles pergunta: “O que é ‘recrudesço’?”. E o outro: “Não sei. Mas tem cru no meio”.

Luiz Carlos Azedo - A locomotiva do Brasil

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Depois de um ano à frente das finanças do governo paulista, Meirelles saiu do silêncio obsequioso em que estava em relação ao ministro Paulo Guedes”

Em conversa com a jornalista Miriam Leitão, do jornal O Globo, o secretário de Fazenda do governo de São Paulo, Henrique Meirelles, resolveu fazer um contraponto com o ministro da Economia, Paulo Guedes, comparando o desempenho da economia paulista com a do Brasil em 2019, primeiro ano dos governos Jair Bolsonaro e João Doria. São Paulo cresceu 2,6%, com uma projeção de 3% e 3,5% em 2020. A comparação foi puro veneno: “Imagina 2019 se o Brasil tivesse crescido à taxa de São Paulo. Agora, tire São Paulo da taxa nacional e o país teria crescido só 0,3%, por aí”.

A maldade não parou: “Nos serviços, em 12 meses até novembro, o país teve 0,9%, e São Paulo teve 3,2%. A indústria caiu 1,1% no país, enquanto em São Paulo cresceu 0,3%”. Segundo Meirelles, o estado gerou 40% dos empregos formais do ano passado. Presidente do Banco Central nos governos Lula e Dilma e ministro da Fazenda do presidente Michel Temer, Meirelles continua com seu prestígio inabalado no mercado financeiro, pois tem a seu favor o fato de ter administrado a crise de 2008 do ponto de vista cambial e ter tirado o país da recessão, após o impeachment de Dilma Rousseff.

Ou seja, depois de um ano à frente das finanças do governo paulista, Meirelles saiu da espécie de silêncio obsequioso em que estava em relação à gestão do ministro Paulo Guedes. Elogiou o Banco Central, em cujos os modelos macroeconômicos disse confiar, e revelou sua intenção de debater a reforma tributária. Segundo ele, o projeto dos estados foi apresentado como substitutivo à emenda 45, em tramitação na Câmara, e à emenda 110, que está no Senado. A proposta é uma alíquota única para todos os produtos em cada estado, com uma margem para subir ou descer, de acordo como a avaliação de comitê gestor formado por União, estados e municípios, para acabar com a guerra fiscal.

Vinicius Torres Freire - O arrochão é a sobrevida de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Sem aprovar emenda de talho emergencial de gastos, governo balança em 2021

A sobrevida política de Jair Bolsonaro depende de pelo menos uma votação no Congresso neste 2020. Trata-se da emenda constitucional que permite o arrochão do gasto com servidores federais, entre outras contenções de despesas obrigatórias, uma guerra política em potencial.

O talho de gastos começaria ainda neste ano, como previsto na emenda constitucional que foi ao Congresso em novembro passado, a “PEC Emergencial”, ora esquecida depois da ressaquinha da Previdência e do pilequinho da ideia do PIB “bombando na nova era”.

O arrochão é quase tão importante para a sobrevivência econômica do governo quanto a reforma da Previdência em 2019. Dado que não haverá aumento relevante de imposto, se algum, sem esse arrochão o gasto do governo vai bater no teto constitucional em 2021. Haveria então tumulto, da quase paralisação da máquina federal a alguma balbúrdia no mercado financeiro.

Sim, na hipótese de a economia e a receita crescerem 4% neste 2020 e no ano seguinte, o problema seria adiado. Mas fantasia grande é coisa de Carnaval.

Em seu primeiro relatório do ano, a Instituição Fiscal Independente (IFI) refresca a memória do tamanho crítico da pindaíba. A IFI é um órgão de análise das contas públicas, ligado ao Senado.

Míriam Leitão - Tamanho real da privatização

- O Globo

Banco do Brasil, Caixa e Petrobras, justamente as empresas que estão fora da privatização, são 75% dos ativos das empresas estatais no país e 71% do patrimônio líquido. O BNDES tem 17% dos ativos. A Eletrobras, 4%. Se não vender a estatal de energia, sobram 4% dos ativos. Essas são estatísticas do Boletim das Estatais. O secretário de Desestatização, Salim Mattar, explica que o governo continuará vendendo ativos dessas empresas, mas admite que todas elas estão fora do programa. Sobre o BNDES, Mattar afirma que o governo quer vender todas as ações da BNDESPar, mas devagar, para não derrubar o mercado.

Levei dados do relatório da Secretaria das Estatais para mostrar ao secretário, em programa que fiz com ele na Globonews, que se essas empresas estão fora então não se pode falar em “acelerar” o programa. Ele será pequeno.

— Não haverá privatização da Petrobras, Banco do Brasil e Caixa, por isso eu falo em desestatização. A Petrobras tinha distribuidora de petróleo, tinha distribuição de gás no Uruguai, tinha Pasadena, que foi uma aberração — disse Salim Mattar.

Todas essas vendas estavam sendo preparadas desde o governo passado. A propósito, o governo Temer pegou o país com 228 estatais e reduziu para 208, segundo gráfico do Boletim. Salim Mattar usa outro número, diz que são 695 empresas. E explica:

— Temos empresas controladas pelo governo, como Banco do Brasil e outras. Temos subsidiárias das estatais, do BB, da Petrobras, por exemplo. Temos as coligadas, quando há uma participação estatal mas não o controle. E temos as investidas, a Caixa Econômica tem investimento em um banco na Venezuela. A sociedade brasileira conhece muito pouco disso e a desestatização é reduzir esse número — diz o secretário.

Elena Landau* - Coalas

- O Estado de S.Paulo

A receita da Austrália é simples: rigor fiscal, câmbio flexível e economia aberta

Coalas e jornalistas são espécies ameaçadas de extinção, uma pelos trágicos incêndios que atingiram a costa leste da Austrália, outra apenas por um mórbido desejo de um presidente que não convive bem com críticas.

Os ataques à mídia vêm escalando, dos boicotes via propaganda e exclusão de licitação ao desejo de extinguir a classe. É mais uma ameaça desse governo aos pilares da democracia liberal. Essas investidas têm consequências: dão base para os intolerantes saírem do armário nas redes sociais, cometerem atentado terrorista e tomarem decisões judiciais absurdas, como a censura imposta ao episódio de Natal do Porta dos Fundos. A reação da sociedade, em defesa da democracia e liberdade de expressão, ajuda a dar limites ao presidente.

O Congresso teve importante papel ano passado, ao dar andamento a uma agenda econômica relevante, mas também ao recusar iniciativas da Presidência de viés populista ou autoritário. O STF é mais errático, deu suporte inicial à fragilização do Coaf, mas se posicionou claramente contra os rompantes de Bolsonaro. Por enquanto, os pesos e contrapesos da democracia vão funcionando.

Os coalas têm menos sorte. Um verão excepcionalmente quente e seco tem tornado os incêndios, normais nesta época do ano, incontroláveis. Lá, como cá, os governantes não dão muita bola para o meio ambiente e ignoram os perigos do aquecimento global. O fogo consumiu áreas equivalentes nos dois países. Mas as semelhanças param aí: a Amazônia não pega fogo sozinha. Piadinhas com Macron e ONGs mostram o nível de irresponsabilidade de nosso governo. As queimadas em 2019 foram 30% maiores que no ano anterior, por obra de homens, que se sentiram encorajados pelo discurso do próprio presidente. O Dia do Fogo é um exemplo.

Claudia Safatle - Economia está em recuperação cíclica

- Valor Econômico

Caminho pela frente não comporta nem euforia nem depressão, mas persistência nas reformas e no mix da política econômica com ênfase no rigor fiscal e no afrouxamento monetário

Sobre a direção, não há muitas dúvidas: o país vive um momento de recuperação cíclica da atividade econômica. Quanto à velocidade, há divergências. Com o carregamento estatístico de 1% já garantido, as expectativas giram entre pouco mais de 2% de crescimento do PIB este ano e algo mais próximo a 3%. Os indicadores decepcionantes de novembro e dezembro de 2019 não afetam os prognósticos para 2020. A economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Ibre/FGV, crava 2,2% de expansão da atividade econômica para 2020 calcula 1,2% para o ano passado. Carlos von Doellinger, presidente do Instituto de Economia Aplicada (Ipea), arrisca um resultado melhor, mais perto de 2,7%.

Ambos asseguram que o país está em recuperação cíclica, com volatilidade nos indicadores. O último trimestre de 2019 deverá trazer um crescimento de 0,6% a 0,7% sobre o período anterior, quando a expansão foi de 0,6%. Quem esperava uma aceleração se frustrou, sobretudo pelo comportamento da indústria de transformação, muito dependente do setor automobilístico, que teve uma “ressaca”, avaliam.

Falar em política industrial, agora, é “palavrão”
Novembro e dezembro foram “um soluço que não compromete o futuro”, garante Doellinger.

Pelo lado da oferta, portanto, há sinais positivos vindos da agropecuária, da construção civil e da recuperação da indústria extrativa, que teve queda em 2019, decorrente do desastre na barragem da Vale em Brumadinho (MG), juntamente com uma esperada reação da indústria de transformação.

O IBC-Br, divulgado ontem pelo Banco Central, mostra um alento. O índice, que é uma proxy do Produto Interno Bruto (PIB), apresentou em novembro expansão de 0,2% na comparação mês contra mês e de 1,1% ano/ano. A expectativa de mercado era, respectivamente, de zero e 0,9%.

Foi o BC que alertou a área econômica, no fim do ano passado, para a piora dos indicadores em novembro e dezembro.

Neste ano, pela ótica da demanda, o grande protagonista é o consumo das famílias, que deve crescer 2,6% em comparação com 2% no ano passado, de acordo com a economista do Ibre.

Naercio Menezes Filho* - Salários, faculdade, gênero e raça

- Valor Econômico

As diferenças de salário entre as pessoas parecem estar mais associadas à sua raça e gênero do que aos tipos de faculdades cursadas

Há muito tempo é possível comparar os ganhos salariais dos alunos que fizeram faculdade com relação aos que deixaram a escola após o final de ensino médio no Brasil. Mas, não tínhamos como calcular esses diferenciais separadamente para os alunos da rede pública e privada.

Agora isso já é possível, pois os novos questionários da Pnad Contínua do IBGE perguntam que tipo de escola as pessoas cursaram no ensino médio e no superior. Com esses dados, podemos responder questões interessantes. Por exemplo, qual a diferença salarial entre os alunos que cursaram universidades públicas e privadas? Existe diferença salarial entre brancos e negros que frequentaram o mesmo tipo de escola no ensino médio e também o mesmo tipo de faculdade?

E entre os homens e as mulheres? Fazer ensino médio num colégio privado aumenta em quanto as chances de ingresso numa universidade pública? Vamos aos dados.

Antes disso, é importante deixar claro que não estamos descrevendo aqui uma relação de causalidade entre estudar numa faculdade pública, por exemplo, e os salários dos diferentes grupos demográficos, uma vez que as pessoas acumulam diferentes níveis de capital humano ao longo da sua vida, que são importantes para seu desempenho futuro e que podem ser correlacionadas com o tipo de escola que frequentam. Além disso, a qualidade das escolas públicas e privadas varia muito e as pessoas escolhem cursos diferentes no ensino superior. Dito isso, é interessante entender como se comportam os diferenciais salariais entre pessoas diferentes que cursaram faculdades diferentes.

Para fazer essa análise, juntamos os dados de 2016, 2017 e 2018 e separamos somente as pessoas com entre 25 e 39 anos de idade que moram em regiões metropolitanas, para trabalhar com uma amostra mais homogênea. O primeiro resultado interessante é que quem cursou ensino médio em uma escola privada ganha 126% a mais do que quem cursou uma escola pública, independentemente das suas escolhas futuras. E quem cursou uma faculdade pública ganha 11% a mais do que quem frequentou uma faculdade privada. O diferencial de cursar uma universidade pública com relação a parar de estudar no ensino médio para quem estudou em uma escola pública é de 150% e para quem estudou em uma escola privada é de 186%.

Como criar campeões da indústria

Por Cherif, Hasanov e Schlorke* - Valor Econômico

O Estado atuou basicamente como um investidor de capital de risco para catalisar o novo setor. Institutos públicos lideraram um grande esforço de pesquisa e desenvolvimento, junto com investimentos em treinamento e construção de relacionamentos com multinacionais

Para muitas empresas de economias emergentes e em desenvolvimento, emular o sucesso de empresas como a Samsung e a Hyundai pode parecer um sonho impossível. Mas o rápido crescimento econômico do Japão, da Coreia do Sul e de outros países asiáticos na segunda metade do século XX mostra que isso pode ser feito.

Japão e Coreia do Sul, por exemplo, já foram países pobres que se esforçavam para alcançar o status de países de alta renda o mais rápido possível. Cada um alcançou esse objetivo por meio de fortes intervenções estatais, como políticas industriais que ajudaram as empresas domésticas a se aventurarem em setores sofisticados e a competirem mundialmente.

O “milagre asiático” foi em grande medida o resultado de uma estratégia em três partes. Primeiro, o Estado estabeleceu metas ambiciosas e as alcançou ao incentivar e apoiar empresas privadas para que se concentrassem em entrar rapidamente em setores industriais de alta tecnologia. Em seguida, os governos entenderam que seus países tinham que desenvolver setores de exportação fortes para poder subir para o escalão superior das economias de alta renda. Finalmente, os formuladores de políticas precisavam estimular uma cultura de concorrência empresarial robusta, bem como uma prestação estrita de contas sobre o apoio que as empresas recebiam. A simbiose resultante entre o Estado e o mercado mostrou-se bem-sucedida e tornou-se um modelo para outros países em desenvolvimento.

As exportações tornaram-se a medida de sucesso para as economias da Ásia. Em toda a região, as empresas evoluíram sistematicamente de negócios domésticos de baixa tecnologia para fabricantes mundiais de alta tecnologia em automóveis, navios e eletrônicos. Como precisavam justificar o apoio que recebiam, elas se adaptaram rapidamente à evolução nas condições do mercado. As empresas que administraram bem essa transformação tiveram um enorme sucesso, enquanto as que tiveram desempenho inferior acabaram por ser reestruturadas.

O que a mídia pensa – Editoriais

Linha cruzada – Editorial | Folha de S. Paulo

Chefe da Secom confunde interesses ao manter empresa ligada a grupos de mídia

A empresa FW Comunicação e Marketing presta serviços a algumas das maiores emissoras de televisão do país e a agências de publicidade que têm contratos com ministérios e estatais.

O dono do negócio, Fabio Wajngarten, assumiu em abril do ano passado o cargo de secretário de Comunicação do governo Jair Bolsonaro, função que lhe dá poderes para influir na distribuição das verbas para a propaganda oficial.

Não é preciso muito esforço para perceber que é difícil conciliar as duas atividades sem ofender os princípios que regem a administração pública, entre os quais está a obrigação de evitar que interesses particulares se misturem com os da função exercida no governo.

Wajngarten achou que bastava se afastar formalmente da administração de sua empresa para resolver o problema, como disse nesta semana depois que a Folha revelou sua ligação com a FW. Trata-se de um equívoco.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Composição

E é sempre a chuva
nos desertos sem guarda-chuva,
e a cicatriz, percebe-se, no muro nu.

E são dissolvidos fragmentos de estuque
e o pó das demolições de tudo
que atravanca o disforme país futuro.
Débil, nas ramas, o socorro do imbu.
Pinga, no desarvorado campo nu.

Onde vivemos é água. O sono, úmido,
em urnas desoladas. Já se entornam,
fungidas, na corrente, as coisas caras
que eram pura delícia, hoje carvão.

O mais é barro, sem esperança de escultura.