O Estado de S. Paulo
Com toda a certeza, uma frente unicamente
de esquerda não bastará para reconstruir o País a partir de janeiro, em caso de
vitória.
O debate sobre frentes e alianças, que
compõe a rotina da política nos momentos de relativa calmaria, acende-se
verdadeiramente nas situações em que se percebem ameaças existenciais à
convivência civil e à natureza democrática dos Estados, como é evidente no caso
brasileiro, e não só nele. Já existe, a propósito, um amplo inventário de
exemplos clássicos que de certa forma nos assediam teimosamente quando buscamos
parâmetros e termos de comparação. Examinemos um deles.
Weimar e a corrosão da sua república
estiveram, há um século, no cerne da vaga reacionária que levaria ao nazismo. A
cisão na esquerda – a partir dos anos 1920, dilacerada entre o “reformismo”
social-democrata e o “revolucionarismo” bolchevique – abriria as portas para o
nacional-socialismo. Do ponto de vista dos comunistas, os social-democratas não
passavam de linha auxiliar da extrema-direita. Eram, pura e simplesmente,
“social-fascistas”, ainda piores do que os adeptos declarados do nazismo.
A catástrofe que se evidenciaria depois produziu uma reviravolta na política de alianças. Desta vez, a precisa definição do adversário comum permitiu agregar em frentes populares não só os “irmãos inimigos”, socialistas e comunistas, como também uma ampla gama de liberais e democratas. Uma operação virtuosa, que levaria à extraordinária luta comum contra o nazifascismo. Mas, convenhamos, não tinha virtude alguma o fato de o comunismo no poder não se abrir aos ventos democratizantes advindos da frente, instalando assim a contradição grave: uma clarividente política de alianças “para fora”, uma repressão ensandecida “para dentro”, como nos processos de Moscou e demais crimes do comunismo stalinista.